O défice orçamental fictício de 2011
Um governo e uma "troika" estrangeira, cegos pela ideologia
neoliberal, querem destruir a economia e a sociedade portuguesa
RESUMO DESTE ESTUDO
Tal como aconteceu com Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal dos
EUA, cuja cegueira ideológica neoliberal o impediu de tomar medidas que
evitassem a crise iniciada em 2007, também em Portugal a cegueira
ideológica neoliberal que domina Passos Coelho e o ministro das
Finanças está a impedi-los de ver que estão a destruir o
país. A política de austeridade, assente na ideologia neoliberal,
tem como objectivo garantir o pagamento aos credores, que são os grandes
grupos financeiros, como afirma o Nobel da economia Joseph Stiglitz. E isto
mesmo que seja à custa da destruição da economia e da
sociedade.
Apesar da falência de milhares de empresas e do aumento brutal do
desemprego e da pobreza em Portugal em 2011, o objectivo de
redução do défice para 5,9% não foi atingido porque
era irrealista. O défice orçamental de 5,9% em 2011, anunciado
triunfalmente pelo governo e pela "troika" estrangeira, não
é real. É sim um défice fictício, já que
só foi conseguido com a utilização de uma parte dos
activos dos fundos pensões dos bancários. O verdadeiro
défice de 2011 foi de 7,5% do PIB, o que corresponde a 12.737,5
milhões . E em 2012, o governo e a "troika" pretendem
reduzir o défice orçamental para 4,5%, ou seja, para 7.556,9
milhões , o que significa uma diminuição de 40,7%
(-5.180 milhões ). A redução do défice nesta
dimensão, quando Portugal já se encontra em plena recessão
económica, só poderá determinar mais
destruição da economia, a falência de milhares de empresas,
o aumento brutal do desemprego, a generalização da pobreza e da
miséria, e sacrifícios enormes para a maioria dos portugueses.
É um objectivo que, se for concretizado, só poderá levar o
país a um grande retrocesso económico e social.
É urgente reagir ao estado de choque causado pela
intervenção estrangeira, e exigir um período mais alargado
para fazer a consolidação orçamental, pois quanto maior
for o prazo menor será a destruição da economia e da
sociedade portuguesa. A análise das medidas para 2012 constantes do
Memorando revisto em Dezembro de 2011, à margem da Assembleia da
República, entre o governo e a "troika" estrangeira, confirma
o carácter irrealista e desumano daquilo que o governo e
"troika" pretendem impor aos portugueses em 2012. Governo e
"troika" tencionam reduzir os salários do sector
público em, pelo menos, 3.000 milhões , o que vai
determinar uma degradação, por falta de pessoal e
desmotivação, de serviços públicos essenciais
à população (educação, saúde,
segurança social, justiça, etc); diminuir as despesas com
pensões em 1.260 milhões o que vai lançar muitos
milhares de pensionistas na pobreza; cortar 1000 milhões nas
despesas públicas com a saúde e 380 milhões nas
despesas com educação, o que levará a uma grande
degradação dos serviços públicos de saúde e
de educação; reduzir o investimento público em 200
milhões , o que contribuirá para que não se crie
emprego; baixar em 100 milhões as transferências do OE
destinadas a prestações sociais, o que fará aumentar a
pobreza e a miséria; reduzir as transferências para as Autarquias
em 175 milhões e cortar mais 130 milhões despesas
pública por aumento da eficiência, embora não diga onde e
como, etc, etc.
Estes cortes na despesa pública com efeitos negativos nas
condições de vida dos portugueses são realizados
simultaneamente com um aumento brutal dos impostos em 3.040 milhões
, sendo 2.040 milhões só no IVA; 265 milhões
no IRS; 180 milhões em impostos sobre o consumo; 50
milhões no IMI, etc. Portanto, por um lado, reduz
significativamente as despesas públicas com efeitos grandes nas
condições de vida dos portugueses (saúde,
educação, assim como as prestações sociais
destinadas a combater a pobreza e a fome) e, por outro lado, aumenta
brutalmente os impostos e apropria-se dos subsídios de férias e
do Natal, reduzindo os rendimentos nominais dos portugueses. E tudo isto para
garantir os pagamentos aos credores, que são grupos económicos e
financeiros. Se juntarmos as privatizações a preço de
saldo das partes de capital de empresas estratégicas que eram ainda
detidas pelo Estado, entregando o seu controlo a grupos económicos
estrangeiros; o aumento do horário semanal de trabalho em 2,5 horas, a
redução de dias de férias e de feriados o que, somado,
corresponde a mais um mês de trabalho anual gratuito (uma espécie
de imposto pago aos patrões com trabalho gratuito, à
semelhança de
corveia
que existiu na Idade Média prestada em trabalho gratuito pelos servos
ao senhor feudal), associado à liberalização das rendas,
à redução das indemnizações por despedimento
e do subsidio de desemprego, ao aumento de preços, etc, pode-se dizer
que se está perante um verdadeiro programa de destruição
da economia e da sociedade em Portugal.
Como escreveu Naomi Klein em "
A doutrina do choque a ascensão do capitalismo de desastre
", este programa ultraliberal do FMI-BCE-CE, decalcado na escola de
Chicago de Friedman, só é possível implementar quando um
país está em estado de choque, provocado por uma
situação anormal, como foi aquela que levou ao pedido de resgate.
E é ainda mais grave quando existe um governo cego pela ideologia
neoliberal e uns media que difundem na opinião pública uma
mensagem de submissão, de inevitabilidade, de que a única
solução é cumprir as imposições da
"troika" estrangeira, é ser "bom aluno" como alguns
sem dignidade e sem pudor dizem mesmo.
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A CEGUEIRA IDEOLÓGICA NEOLIBERAL DO MINISTRO DAS FINANÇAS E DO
GOVERNO DE PASSOS COELHO IMPEDE-OS DE VER QUE ESTÃO A DESTRUIR O
PAÍS
Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal americana, o banco central dos
EUA, ao depor, em 2008, perante uma comissão do Senado americano
confessou que a sua cegueira ideológica neoliberal o tinha impedido de
tomar medidas que evitassem a crise iniciada em 2007. Perante a pergunta do
presidente da comissão que o confrontou da seguinte forma:
"Por outras palavras, descobriu que a sua visão do mundo, a sua
ideologia, não estava correcta, não resultava",
respondeu:
"Precisamente. Foi precisamente por isso que fiquei chocado, porque
durante 40 anos ou mais andei convencido que resultava
excepcionalmente bem"
(Mota, 2009).
Apesar da responsabilidade da ideologia neoliberal na crise actual, em Portugal
está-se a assistir actualmente a uma situação muito
parecida. O governo do PSD/CDS, e nomeadamente o seu ministro das
Finanças, cegos pela ideologia neoliberal que os domina e uma
"troika" estrangeira, estão a aproveitar o estado de choque
provocado pelo pedido de resgate feito por Sócrates, com o apoio do
PS/PSD/CDS, para impor as soluções ultraliberais do FMI. Numa
entrevista dada ao
Diário Económico
de 22/12/2011, o arrogante burocrata do FMI, Poul Thomsen, declarou que "
o FMI está de mente aberta para suavizar os objectivos
orçamentais se a situação económica na Europa piorar
". Portanto, o doente tem de ficar antes totalmente destruído para
depois o "grande senhor" pensar em suavizar os sacrifícios
exigidos. É típico dos burocratas sem coração do
FMI que ao longo dos tempos, aproveitando-se do poder do dinheiro e de
situações de choques provocadas pelas crises que têm
atingido muitos países, têm imposto aos povos
"soluções" que os deixam em pior situação
do que aquela em que antes se encontravam.
E tudo isto em Portugal tem sido facilitado, por um lado, pela
actuação dos principais media e dos comentadores com acesso
privilegiado a eles, que têm procurado difundir a ideia junto da
opinião pública que não existe alternativa, que a
única e melhor solução é cumprir as
imposições, que todos os meses são agravadas e, por outro
lado, por um governo submisso, por medo ou por convicção
ideológica, sem vontade e pensamento próprio, que se transformou
numa autêntica marionete submissa das imposições da troika
estrangeira.
UMA POLÍTICA QUE SÓ PODERÁ CAUSAR
DESTRUIÇÃO AINDA MAIOR
DA ECONOMIA E DA SOCIEDADE PORTUGUESA
Entre 2010 e 2011, o governo de Passos Coelho e o trio estrangeiro FMI-BCE-CE
pretendiam reduzir o défice orçamental de 16.863,5 milhões
(9,8% do PIB) para 10.020,2 milhões (5,9% do PIB), ou
seja, em 40% (6.843,3 milhões ) num único ano. Apesar do
país ter entrado em recessão como consequência das medidas
de austeridade impostas, aquele objectivo não foi possível de
atingir, sendo o défice orçamental real no fim de 2011 de
12.737,8 milhões (7,5% do PIB). Para ocultar tal
situação, e para atingirem ficticiamente o défice
orçamental de 5,9% utilizaram indevidamente uma parte dos activos dos
fundos de pensões dos bancários. No entanto, apesar de 2011 ter
mostrado que uma politica de redução do défice com aquela
dimensão num único ano não é realista e está
a destruir a economia e a sociedade portuguesa, mesmo assim o governo e
"troika" estrangeira tencionam insistir na mesma politica em 2012.
Como consta do Memorando revisto em Dezembro de 2011, à margem da
Assembleia da República, em 2012, tencionam reduzir o défice
orçamental para 7.556,9 milhões (4,5% do PIB) o que
significa, em relação ao défice real de 2011 (12.737,5
milhões ), uma redução de 40,7%, ou seja, uma
diminuição de 5.180 milhões . É evidente que
uma redução do défice com esta dimensão num
único ano, depois da redução real verificada em 2011 de
4.126 milhões (2,3% do PIB), quando Portugal já se
encontra em plena recessão económica e os seus principais
parceiros da União Europeia já estão em
pré-recessão, revela ou cegueira ideológica ou
irresponsabilidade ou então ausência de qualquer
preocupação em relação à
destruição da economia e da sociedade portuguesa que isso
inevitavelmente causará.
AS MEDIDAS PARA 2012 DO "MEMORANDO" REVISTO VÃO LANÇAR
O PAIS NUMA RECESSÃO AINDA MAIS PROFUNDA, E CAUSAR SACRIFICIOS ENORMES
AOS PORTUGUESES
A análise das medidas previstas para 2012 constantes do Memorando
revisto sem conhecimento e autorização da Assembleia da
República, no segredo dos gabinetes, apenas pelo governo e pelo trio
estrangeiro FMI-BCE-CE, em Dezembro de 2011, revela que, se forem
implementadas, determinarão o agravamento da recessão
económica e um grave retrocesso social.
Assim, a "troika" FMI-BCE-CE impôs, e o governo de Passos
Coelho aceitou por convicção ou submissão, a
redução dos salários do sector público em, pelo
menos, 3.000 milhões (ponto 1.8 do Memorando). Este corte, com
esta dimensão, vai determinar inevitavelmente uma
degradação dos serviços públicos prestados a
população (educação, saúde, segurança
social, etc.). Para além do corte nas remunerações dos
trabalhadores da Função Pública, a "troika"
estrangeira também impôs a redução das despesas com
pensões em 1.260 milhões (ponto 1.9 do Memorando) o que
inclui, para além da apropriação indevida do subsidio de
férias e de Natal dos reformados que, enquanto trabalharam, descontaram
para ter esse direito, inclui também em 2012 o congelamento das
pensões de valor superior a 485 (em 2011, todas as pensões
foram congeladas). Se associarmos a isto, a redução para um
terço as despesas de saúde que poderão ser descontadas no
IRS, o aumento significativo das taxas moderadoras, a redução dos
isentos do pagamento dessas taxas, e a redução da
dedução especifica no rendimento que tem origem nas
pensões para efeitos de IRS, rapidamente conclui-se que centenas de
milhares de reformados sofrerão em 2012 uma degradação
acentuada nas suas condições de vida que atirarão muitos
para a pobreza.
A "troika" estrangeira também impôs que o governo
reduza, em 2012, em 1.000 milhões as despesas com a saúde
dos portugueses. Obedientemente o governo já começou a
implementar medidas, algumas delas bastante gravosas para os utentes. Assim,
reduziu as comparticipações ou eliminou-as em muitos medicamentos
o que obriga, a quem precise deles, a ter de pagar a totalidade do
preço; aumentou as taxas moderadoras, sendo a subida de 122% nas
consultas dos Centros de Saúde (passa de 2,25 para 5); de
108% nas urgências hospitalares (sobe de 9,6 para 20); de
100% em média nos exames médicos. No entanto, a
redução da despesa pública em saúde em 1.000
milhões num único ano, como pretende o governo e a
"troika" estrangeira, não se obtém apenas com estes
aumentos; para conseguir uma tal redução certamente muitas
unidades de saúde terão de ser fechadas e ter-se-ão de
realizar muitos cortes na prestação de saúde. E Portugal
é já um dos países da UE onde é mais elevada a
parte que os utentes têm de pagar do seu bolso (segundo a OCDE, 35% das
despesas com saúde já são pagas, em Portugal, directamente
pelos utentes, que é um dos valores mais altos em toda a UE).
Mas existem outras reduções da despesa pública impostos
pelo duo governo/"troika". Por ex., em relação à
Educação o corte sobe de 224 milhões , como constava
no OE-2012, para 380 milhões (ponto 1.12), o que vai ter efeitos
negativos no funcionamento das escolas; também tencionam reduzir em 200
milhões o investimento público (ponto 1.13), o que
contribuirá para o aumento do desemprego; pretendem baixar em 100
milhões as transferências do OE destinadas a financiar
prestações sociais (ponto 1.14), o que fará aumentar a
pobreza; reduzir em 175 milhões as transferências para as
Autarquias (ponto 1.15 do Memorando), o que diminuirá a capacidade
destas para resolver problemas das populações; cortar mais de 130
milhões nas despesas pública com a
justificação de aumento da eficiência (ponto 1.16), embora
não se diga onde e como será alcançado; etc, etc;
Em suma, o "Memorando" revisto em Dezembro de 2011, à margem
da Assembleia da República, é um gigantesco pacto de
redução dos serviços públicos essenciais à
população visando obrigar, quem precisar deles, a
pagá-los. E isto é feito simultaneamente com um aumento brutal
dos impostos em 3.040 milhões , sendo 2.040 milhões
de IVA (ponto 1.19); 265 milhões de IRS (1.20); 180
milhões em impostos de consumo (1.22); 50 milhões
de IMI (1.23); etc, a apropriação indevida do subsídios de
ferias e de Natal dos reformados e aposentados e dos trabalhadores do sector
público, incluindo os das empresas publicas, o que provocará uma
redução acentuada dos rendimentos nominais dos portugueses. Em
suma, aumenta-se brutalmente os impostos e reduz-se significativamente os
serviços de saúde e de educação prestados à
população, as prestações sociais destinadas a
combater a pobreza e a fome, assim como os rendimentos de todos os portugueses.
É um autêntico programa de destruição da sociedade
portuguesa.
O AGRAVAMENTO DA CRISE ECONÓMICA E SOCIAL EM PORTUGAL PROVOCADA PELO
CAPITALISMO DO DESASTRE VISANDO GARANTIR O PAGAMENTO AOS CREDORES
A politica de austeridade imposta pela "troika" estrangeira
FMI-BCE-CE, e executada pelo governo PSD/CDS, é uma politica de classe
que visa garantir o pagamento aos credores, que são os grandes grupos
económicos e financeiros, mesmo que isso seja à custa da
destruição da economia e da sociedade portuguesa, e de enormes
sacrifícios para a grande maioria dos portugueses. Em Portugal, a
politica de austeridade visa: (a) Uma redução significativa da
despesa pública, nomeadamente com as funções sociais do
Estado (educação, saúde, segurança social, apoio
aos desempregados, combate à pobreza) e com o investimento
público; (b) Um aumento brutal dos impostos e a
apropriação, pelo governo, do subsidio de ferias e do Natal que
tem como objectivo reduzir o rendimento nominal dos trabalhadores e
pensionistas; (c) Um imposto pago aos patrões através da
imposição de trabalho gratuito (corveia); (d) Uma
redução drástica do crédito às empresas e
às famílias através da redução do
"rácio de transformação" e do aumento do
"rácio de capital" (Tier I). Como consequência o
agravamento da recessão económica é inevitável,
sendo o governo obrigado a corrigir para pior e continuamente as suas
previsões. Assim, a variação do PIB em 2012 segundo as
previsões do governo tem sido as seguintes: Em Set.2011:
-1,8%;
em Out.2011:
-2,8%
; e em Dez.2011:
-3%
. E certamente a recessão económica será muito pior do que
as previsões do governo.
28/Dezembro/2011
[*]
Economista,
edr2@netcabo.pt
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