Crise geral do capitalismo Análise e sugestões
por Carlos A. G. Gomes
[*]
I Crise de 1974
II A crise de 1974 e o 25 de Abril
III Economia mundial entre as crises de 1974 e 2008
IV Crise de 2008
V Medidas para ultrapassar esta crise
I - CRISE DE 1974
O ano de 1973 marca o fim brusco do processo de crescimento que se desenvolveu
desde o fim da segunda guerra mundial. O ano seguinte constituiu um ponto de
viragem no funcionamento da economia capitalista mundial. Como em todas as
crises anteriores do capitalismo, a crise de 1974 consistiu no aparecimento dum
período histórico em que se acentuam as
contradições do sistema, neste caso agravadas por algumas
características específicas. Nomeadamente, foi a primeira
recessão generalizada que atingiu simultaneamente todas as grandes
potências capitalistas, especialmente EUA, Japão e Reino Unido.
Assumiu inicialmente as características duma crise clássica de
sobreprodução, com a produção acumulada durante os
anos de prosperidade a exceder o que os mercados podiam consumir. São
sinais reveladores deste facto a capacidade de produção
excedentária num número crescente de ramos industriais
importantes, tais como, construção, matérias-primas, bens
intermediários, de equipamento e de consumo.
Surge uma ruptura brutal do equilíbrio já instável entre a
oferta e a procura de mercadorias. Bruscamente a oferta ultrapassa a procura
solvível ao ponto de provocar um recuo das encomendas e uma
redução importante da produção corrente. À
venda ao desbarato, com prejuízo, segue-se a diminuição
dos estoques e da produção corrente, fenómenos que
conduzem ao movimento cumulativo da crise. Verifica-se, então, a
redução em espiral: do emprego, dos rendimentos, dos
investimentos, da produção, das encomendas. Ao não
venderem as suas mercadorias, os produtores e comerciantes vêem-se
incapacitados de pagar as suas dívidas. Os lucros param ou diminuem,
não podendo continuar a ser reinvestidos. Uma das causas das crises
é explicada pelo subconsumo das massas a contrapor-se à
sobreprodução. À pobreza e limitação do
consumo das populações opõe-se a persistente
tendência da produção capitalista em continuar a
desenvolver as forças produtivas. O incremento da ganância
empresarial contradiz com a possibilidade de acesso da população
aos produtos necessários à manutenção do
nível de vida, ou seja, da sua capacidade de compra, do que resulta uma
redução paulatina do consumo.
A produção capitalista implica a interacção entre
mercadoria e dinheiro. A obtenção de lucro não se realiza
automaticamente, mas sim quando as mercadorias são vendidas. O
desequilíbrio desta ligação entre mercadoria e dinheiro
é uma primeira possibilidade de crise de superprodução ou
de subconsumo. Mesmo em ambiente já denunciador da iminência de
crise, verifica-se uma redução do poder aquisitivo dos
trabalhadores resultante da política de travagem ou
redução de salários e do desemprego em crescimento
massivo. É de salientar que, mesmo na fase posterior de
recuperação, o desemprego não deixou de aumentar
adquirindo características crónicas, fenómeno que se
mantém na actualidade.
Na fase de actividade febril, que precede a explosão da crise, há
em geral um acréscimo e não redução dos
investimentos, como geralmente há um aumento e não
redução dos salários. Investimentos, emprego e
produtividade não aumentam em proporção suficiente para
sustentar por si próprios a expansão habitual. Quando o mercado
está em expansão as empresas procuram obter uma parte deste bolo
em crescimento, precipitando assim o sobreinvestimento e a capacidade
excedentária. Logo que surge uma venda ao desbarato é absurdo
aumentar a capacidade de produção de cada empresa. Pelo
contrário, torna-se necessário reduzir as perdas e baixar os
preços ou seja reduzir a produção, do que resulta um
subinvestimento cumulativo ao nível macroeconómico. O
investimento empresarial regista então uma queda acentuada na
generalidade dos países capitalistas.
Em 1973, os preços dos principais produtos eram determinados pelo
mercado mundial e não pelo mercado nacional. A alta de preços do
petróleo deteriorou a relação de forças à
escala mundial e obrigou a conceder às classes dominantes dos
países da OPEP uma brusca e enorme parcela do rendimento
petrolífero. A inflação manteve-se e acentuou-se na
generalidade dos produtos industriais. No final de 1974 não havia ainda
qualquer sinal de redução da pressão inflacionista. O
processo inflacionário empobreceu os níveis de vida da classe
trabalhadora e reduziu o poder aquisitivo.
A crise de superprodução amplia por sua vez a queda da taxa
média de lucro, o que desencadeia o recurso acrescido ao crédito,
o agravamento do endividamento das empresas e acentua a concorrência
entre os capitalistas. As empresas, mais fortes sob o ponto de vista
tecnológico e as mais poderosas sob o ponto de vista da dimensão
dos seus capitais, dispõem de vantagens evidentes em
relação às empresas mais retardatárias ou mais
fracas. Como dominam o mercado tentam manter pelo máximo de tempo
possível o anterior lucro médio.
São diversas as formas de aparecimento do acontecimento detonador que
precipita as crises. Pode ser um escândalo financeiro, um brusco
pânico bancário, a bancarrota duma grande empresa ou simplesmente
a queda dum sector fundamental do mercado mundial. Pode ser mesmo uma brusca
escassez de uma matéria-prima ou energética essencial. Mas a
existência dum detonador não é a causa da crise. Para
desencadear a crise é necessário que coincidam uma série
de pré-condições que não derivam do detonador. Os
elementos conducentes a uma próxima crise estavam já reunidos e
apenas aguardavam por um elemento catalisador para se manifestar.
A crise revela-se primeiramente sob a forma de uma fracção do
capital acumulado que, não podendo ser investida produtivamente em
condições de rentabilidade habituais, é encaminhada para
actividades especulativas e mais arriscadas. Esta acumulação de
capital não permite aos capitalistas o usufruto imediato dos altos
ganhos que procuram. Daí uma tendência dominante para um
acréscimo de dificuldades financeiras difíceis de ultrapassar a
curto prazo.
A crise de 1974 caracterizou-se também por uma
sobreacumulação de capital, a avançar com uma rapidez
sempre crescente que ultrapassa o ritmo de extensão da
produção. As incoerências consequentes desta
sobreacumulação introduzem na produção
distorções múltiplas: incertezas nos mercados, perdas
devido à anarquia da concorrência, desordem na
execução de meios técnicos, agravamento das tensões
sociais, da luta ideológica e política. Tudo isto constitui um
labirinto que os Estados procuram permanentemente desenredar em conluio com a
burguesia e em particular os seus grupos monopolistas.
O desenvolvimento de grupos financeiros está estreitamente ligado a esta
sobreacumulação, à sua internacionalização e
à capacidade de mobilizar créditos. Os capitais excedentes,
não aplicáveis na produção ou em novos
investimentos nos sectores de actividade económica, tendem a procurar
uma valorização com carácter especulativo que se
desenvolve com todos os riscos que comporta.
Os bancos atingidos pela crise estavam ligados, duma maneira ou de outra, aos
grupos monopolistas. A dilatação do crédito, além
de contribuir para uma alta de preços e das taxas de juro, provocou um
avolumar considerável de créditos incobráveis. A
utilização de capitais no curto prazo no financiamento de
operações a longo prazo a elevadas taxas de juro ocasionou
situações em que os bancos já não podiam fazer face
aos seus compromissos para com os depositantes.
No sistema monetário registou-se um desvio de sustentação
com o abandono da convertibilidade do dólar com o ouro, ocorrida em 1971
por decisão do governo americano, incapaz de resistir ao ataque
especulativo contra o dólar. Reconstruiu-se então um novo sistema
baseado na livre flutuação das taxas de câmbio, deixando a
cargo de cada governo a adopção do regime cambial que preferisse.
Os défices nas balanças de pagamentos cresceram bruscamente para
além da média normal.
O receituário do economista Keynes, em defesa duma política de
intervencionismo do Estado com o objectivo de suavizar os efeitos adversos dos
períodos de regressão e das flutuações
cíclicas, foi posto em causa. Em consequência disso, verificou-se
uma viragem na prática de regulação estatal da actividade
económica e financeira e defendido o mecanismo de mercado e a sua
liberalização.
As sociedades multinacionais, surgidas após a Segunda Guerra Mundial,
empenharam-se na criação de alicerces para a
integração global dos ramos de actividade com maior
relevância no comércio internacional. Em 1975, destacavam-se entre
as grandes sociedades multinacionais a Exxon no ramo petrolífero, a
General Motors como primeiro construtor de automóveis e, entre os
fabricantes de aço, o grupo japonês Nippon Steel e o grupo
americano US Steel.
II A CRISE DE 1974 E O 25 DE ABRIL
Em 1973, e nos anos seguintes, a economia portuguesa esteve exposta ao impacto
do rápido aumento, a nível mundial, dos preços dos
produtos alimentares, das matérias-primas importadas, principalmente do
petróleo, e dos produtos industriais. A aceleração, em
1974, da subida dos preços mundiais chegou a atingir a média de
25 a 30 %. No final do ano ainda não havia qualquer sintoma de
redução da pressão inflacionista mundial. As
exportações de bens e serviços registaram um fraco
movimento explicado pelas condições externas tendo em conta as
tendências de recessão dos outros países. (Relatório
duma missão do FMI em 06/12/74)
"No período imediatamente anterior à revolução
ocorreu ainda, por acréscimo, mas de modo sincronizado relativamente
à crise internacional, uma situação de importante crise
conjuntural: a taxa de inflação aproximava-se dos 30%;
após tempos de intensa especulação, era já evidente
a quebra nos mercados de títulos e de valores imobiliários; o
défice da balança cambial de Janeiro a Abril de 1973 atingia
cerca de 7 milhões de contos; e o sistema bancário debatia-se
cada vez mais com graves problemas de liquidez. Entretanto a baixa
económica internacional com a crise do petróleo e a
instabilidade monetária, combinando inflação com
estagnação ("estagflação") em termos que
se não podem analisar mais aprofundadamente marcou decisivamente
esta fase anterior a 25 de Abril (recordem-se as primeiras altas de
preços de gasolina no último trimestre de 1973, como
situação emblemática do que iria ser a nova conjuntura),
em termos que, aliás, iriam continuar, agravados, durante os anos de
1974 e 1975. Pode, assim, sublinhar-se que o 25 de Abril de 1974 ocorreu num
momento em que a economia portuguesa combinava diversos dos factores de
deterioração que resultavam, por um lado, da
situação interna, e, por outro, da crise económica
internacional, que se agravara sobretudo a partir do último trimestre de
1973." (História de Portugal 20 Anos de Democracia,
Coordenação de António Reis, pág.175. Ed.
"Círculo de Leitores, Lisboa 1993)
Em Abril de 1974, todos os bancos privados estavam ligados a grandes empresas
industriais, comerciais e alguns a latifúndios. Grupos dispondo de meios
financeiros poderosos, utilizando abusivamente as poupanças dos
depositantes, dirigiam e controlavam os sectores básicos da economia:
produção de aço, transportes, construção
naval, indústria química, etc.
Os fundos depositados nos bancos resultavam: das poupanças dos
cidadãos residentes ou emigrados; dos excedentes de tesouraria das
empresas, instituições ou serviços públicos: da
acumulação de capital destinada a compensar os accionistas a
investir nas próprias empresas ou em operações
especulativas.
As taxas de juro eram legalmente fixadas. Porém, os grandes
depositantes, empresas e pessoas ligadas aos bancos, ou os seus
intermediários, beneficiavam de taxas mais elevadas, sendo os
respectivos montantes retirados dos famosos "sacos azuis".
As pessoas ou sociedades relacionadas com os bancos pagavam pelo crédito
obtido, sem limite e sem garantias, taxas inferiores ao mínimo legal ou
até nulas. Em contrapartida, aos pequenos e médios comerciantes,
agricultores e industriais, eram exigidos juros "por fora", debitadas
comissões, muitas vezes irregulares, e exigidas hipotecas, penhoras ou
avales, como garantias nem sempre justificáveis. Os juros cobrados acima
dos máximos legais constituíam receita dos "sacos
azuis".
Milhões de contos estavam envolvidas em meras operações
especulativas, compra e venda de títulos, contribuindo para a espiral
das cotações da Bolsa. Pequenas economias individuais foram
absorvidas pela avidez de obtenção de fáceis mas falsos
lucros.
Compete ao sistema bancário proceder a uma correcta
aplicação dos seus recursos que se traduza na sua
contribuição para o desenvolvimento económico e social do
País. É da competência do Estado e do Banco Central
estabelecer regras, norma técnicas e éticas, que devem ser
respeitadas pelos bancos. Porém, a concessão de crédito
não correspondia ao interesse nacional, mas sim aos interesses dos
grupos monopolistas, em que os bancos se inseriam, e á
realização de elevados lucros. Muitas das empresas mais
rentáveis acabavam por ficar tuteladas através do crédito
ou das garantias prestadas.
Em anos anteriores a 1974, foram constituídas, por intermédio de
um dos principais bancos nacionais, perto de uma centena de firmas com o
capital mínimo de 50 contos, quase todas domiciliadas na mesma morada,
sem qualquer actividade económica, mas dispondo cada uma dum
crédito avultado que chegava a atingir cerca de 150 mil contos. Tais
sociedades "fantasmas" pertenciam aos administradores, accionistas,
colaboradores ou suas famílias. A principal filial deste Banco chegou a
absorver mais de 70% dos seus depósitos locais na concessão de
crédito às próprias sociedades do grupo em que estava
inserido.
Os lucros apresentados nos balanços dos bancos eram previamente fixados
pelas respectivas administrações segundo critérios da sua
conveniência, tais como: influência na cotação das
acções na Bolsa; melhoria dos dividendos a pagar aos accionistas;
aumento dos vencimentos ou gratificações aos administradores ou
directores. No final do ano de 1973, os resultados dos bancos comerciais,
expurgados dos lucros obtidos em aplicações financeiras, em
valores mobiliários ou em actividades especulativas, eram negativos.
Em 13 de Setembro foram nacionalizados os Bancos Emissores: Banco de Portugal,
Banco Nacional Ultramarino e Banco de Angola. No mês seguinte, o Governo
determinou a intervenção estatal no BIP - Banco Intercontinental
Português, suspendendo os administradores em exercício e nomeando
dois administradores por parte do Estado. Este banco foi posteriormente
extinto, em Abril de 1977, absorvido pelo BPSM.
Em 29 de Novembro de 1974, o Governo nomeou delegados em
instituições de crédito com funções de exame
e apreciação da sua actuação nomeadamente no
domínio da política de distribuição de
crédito.
A nacionalização bancária, determinada em Março de
1975, travou a anarquia existente no funcionamento e o comportamento dos
banqueiros que, uma vez perdido o poder político, enveredaram pela
utilização das instituições financeiras como meio
de contrariarem a política seguida pelos governos provisórios.
Os critérios de concessão de crédito foram então
alterados e baseados fundamentalmente: na finalidade do crédito,
segurança, liquidez e rentabilidade. Os sectores, que não podiam
prescindir do crédito, foram os mais beneficiados tendo em
atenção a sua maior utilidade económica e social.
Predominou, como objectivos principais, a estabilização, o
relançamento da conjuntura económica, a criação de
empregos, a atenuação dos efeitos da crise reflectidos no
comércio externo.
Algumas decisões relevantes merecem ser referidas. Em Maio de 1975 foi
instituído a CAE Crédito Agrícola de
Emergência, destinado a beneficiar os pequenos e médios
agricultores, com o objectivo a apoiar as preparação das
culturas, o pagamento dos salários, a aquisição de
sementes, rações, fertilizantes, combustíveis, pequenos
equipamentos e outros produtos indispensáveis ao bom aproveitamento das
explorações agrícolas. A formação no Norte
dum grupo de intervenção no sector têxtil GIEST
que acompanhou algumas empresas têxteis, devedoras à banca
de quantias volumosas, manteve as unidades fabris em actividade, evitando o seu
encerramento, com todas as suas gravosas consequências, como o desemprego
de famílias inteiras, a redução das
exportações e prejuízos para os bancos. Em
relação às PME's, ainda antes da
nacionalização bancária, o Banco Emissor passou a
enquadrar um modelo de apoio financeiro destinado a facilitar a compra de
matérias-primas, o financiamento de campanhas de produção,
a cobertura de necessidades permanentes de tesouraria.
Em Dezembro de 1975, estes benefícios começaram a ser
restringidos e as taxas preferenciais praticamente banidas três meses
depois. Foi sol de pouca dura! O Banco de Portugal criou uma nova tabela de
taxas de juros que vieram beneficiar os grandes agrários. Mês
após mês, o CAE foi sistematicamente combatido de forma a perder
todo o seu significado, o GIEST rapidamente extinto.
Todas estas medidas tiveram um efeito de contenção das graves
consequências da crise de 1974 que afectaram o funcionamento da economia
a nível mundial, mas que Portugal conseguiu em certa medida escapar
III ECONOMIA MUNDIAL ENTRE AS CRISES DE 1974 E 2008
Durante mais de trinta anos, ocorreram mudanças que alterarem
substancialmente a fisionomia do sistema capitalista e se reflectiram nas
características específicas da actual crise.
O avanço da tecnologia conduziu a novas formas de produzir:
- a maquinaria requeria maiores investimentos e uma força de trabalho
preparada para operar em sistemas integrados de automação;
- o aparecimento de computadores e a sua aplicação nas esferas da
produção, da distribuição, dos serviços ou
da investigação, revolucionou os processos de trabalho e as
relações económicas e sociais existentes;
- a produção de matérias-primas sintéticas, a custo
menor do que as naturais, afectou grandes áreas de
produção tradicionais, relações entre os povos e
suscitou questões ambientais de alguma gravidade;
- a adopção de meios de informação e de
telecomunicações mais eficazes, velozes e seguras permitiu a
realização de transacções económicas e
financeiras com grande rapidez e extensivas a todos os continentes.
O desenvolvimento acelerado das técnicas colocou ao sistema capitalista
novos problemas: necessidade de manter, com o auxílio do Estado,
importantes actividades científicas, técnicas, de
formação, não imediatamente rentáveis; necessidade
de pagar a trabalhadores qualificados salários mais elevados, em
contradição com a tendência para limitar o valor da
força de trabalho.
O aumento da produtividade acentuou o obstáculo resultante das
restrições ao livre funcionamento dos mercados, acentuou a
escalada do desemprego e a diversificação das suas formas, os
riscos de movimentações políticas e sociais. Com a
redução do emprego, a massa total da mais-valia produzida
reduz-se em relação ao nível atingido no final do
período de expansão, isto apesar do aumento sem cessar da taxa de
exploração dos trabalhadores ainda empregados.
A luta de classes intensifica-se em todos os planos, na luta quotidiana pelas
suas condições de trabalho e de reacção contra as
medidas que tendem a agravar a sua exploração. Por estes e outros
motivos, novas camadas de assalariados (investigadores, professores, quadros)
entram igualmente em luta. Ao mesmo tempo, grandes camadas sociais não
monopolistas, incluindo urbanas, põem-se em movimento. Tanto os
países ricos como os pobres, os regimes autoritários ou as
democracias, enfrentam a instabilidade social, ante a massiva perda de postos
de trabalho e a falta duma adequada rede de segurança social e a sua
ineficácia, a pobreza e a fome.
Durante este período, floresceu a empresa multinacional como
instituição fundamental da produção e
distribuição das mercadorias que já não podiam ser
conseguidas num só país. A elaboração e
junção de componentes e o acabamento final passaram a realizar-se
por várias empresas em geral agrupadas ou dependentes a funcionar em
diferentes regiões. São exemplo disso: automóveis,
computadores, electrodomésticos, etc. A expansão do capital a
nível mundial implicou o rompimento das barreiras nacionais ao livre
fluxo de exportação de capitais, tanto na forma mercantil como
financeira. Estes fenómenos conduziram ao liberalismo económico e
financeiro.
A fractura do mundo socialista, o colapso da URSS e do chamado euro-comunismo,
facilitou a consolidação da hegemonia dos EUA como centro do
imperialismo, criou condições para atingir uma nova fase de
mundialização ou globalização, isto é, deu
lugar a um novo facto económico e social da Humanidade, de que resultou
uma nova repartição duma fracção importante do
planeta entre as grandes potências.
Os países que compõem o Sudeste da Ásia
constituíram, no período de 1990-96, o grupo de maior crescimento
económico do mundo. O mercado global de capitais dirigiu os
investimentos dos países ricos para a periferia emergente. O manancial
destes capitais impulsionou a expansão das economias daqueles
países mas também absorveu grande parte do mercado externo,
originando um rápido aprofundamento da divisão de trabalho entre
os países desenvolvidos e a periferia do Sudeste Asiático. Os
primeiros exportavam produtos que incorporam tecnologia de ponta, os
últimos vendiam produtos industriais em que o uso de mão-de-obra
ainda intensivo lhes oferecia uma vantagem comparativa. O crescimento
económico ocorrido no Sudeste Asiático, que atingiu três ou
quatro vezes mais do que no resto da economia mundial, provocou uma euforia que
caracterizou a maioria dos mercados financeiros. Um vasto excedente de capitais
dirigiu-se para esta parte do mundo atraído por um crescimento
económico vigoroso.
Com a globalização, as fronteiras nacionais tornaram-se
permeáveis à passagem dos fluxos financeiros, o que provocou a
unificação dos mercados de capitais e de moedas. A possibilidade
duma crise financeira global é dada pela própria
globalização. As bolsas de todo o mundo, onde grande parte das
transacções é feita com acções e
títulos das empresas e governos, entraram em fase crítica.
A crise monetária, persiste à escala nacional e internacional. As
massas monetárias em circulação são multiplicadas
pelo crédito entre bancos, o crédito internacional organizado
pelos Estados. As deslocações de capitais flutuantes provocam a
instabilidade monetária à escala mundial. Para escapar à
insolvência e reforçar momentaneamente a sua
posição, os Estados desvalorizam mais frequentemente a sua moeda.
Mas estas desvalorizações não resolvem os
desequilíbrios das balanças de pagamentos.
No âmbito da circulação do capital, a
super-acumulação financeira ultrapassa uma possível
absorção pelo investimento produtivo, daí resultando
aplicações de carácter especulativo com tendência
crescente. A centralização do capital já não se
concretiza apenas entre empresas ou grupos de empresas, mas passa a envolver os
próprios países formando-se blocos económicos.
A super-disponibilidade de capital pressionou as barreiras legais que impediam
a sua mobilidade e, portanto, as barreiras à especulação
financeira e à procura de aplicações em
transacções altamente rentáveis. Um punhado de gigantes
financeiros pode diversificar a actividades especulativa, controlar o mercado
financeiro e imobiliário a nível mundial e as bolsas de valores.
Os grandes aglomerados capitalistas passaram a determinar a estrutura dos
preços e das taxas de juros, a penetrar nos mercados dos países
em desenvolvimento, a consolidar uma posição hegemónica na
banca mundial. A capacidade reguladora e a supervisão desvaneceram-se.
O sector comercial associou-se com os banqueiros com o fim de tornar mais
acessível o crédito ao consumo. Isto encareceu as mercadorias
porque os consumidores tinham de pagar os produtos e os custos do
crédito, mas permitiu o pagamento parcelar e a manutenção
temporária da capacidade de consumo. Este entendimento entre os sectores
comerciais e financeiros, com o apoio dos Estados, permitiu ocultar a
progressiva contracção do mercado adiando o estalar da crise.
As cadeias produtivas tentaram colocar parte dos seus excedentes de capital nas
bolsas de valores ou em instituições financeiras,
bancárias, seguradoras e outras, em vez de os investirem na
produção. Assim, cresceu o montante dos capitais flutuantes que
procuravam lucros sem se inserirem nos processos produtivos. Os
empresários conseguiram assim aplicar os seus capitais em
condições altamente rentáveis.
As fronteiras que se tinham estabelecido nos anos trinta entre a banca de
investimento e a banca comercial foram eliminadas no final do século XX
e, posteriormente, liberalizados os requisitos de capital das
instituições bancárias. Libertados dos impedimentos
legais, os bancos multiplicaram os negócios financeiros, converteram as
dívidas em títulos comercializáveis, posteriormente
vendidos a outras entidades financeiras, como fundos de investimento, confiados
numa valorização contínua.
A crise financeira transmite-se à economia real através da
insolvência do sistema bancário. Os bancos não conseguem
recuperar os créditos de mutuários arruinados pelos craques e
portanto não podem honrar suas obrigações para com os seus
depositantes. Se houver bancarrotas em grande escala, muitas das empresas
produtivas inevitavelmente são atingidas. A incapacidade do sector
financeiro contamina o sector real, causando a falência de uma
série de empresas, desemprego em massa, queda vertical da procura, etc.
Por isso, os governos não deixam os bancos falir.
Os governos que constituíram a Comunidade Europeia resolveram manter
paridades cambiais relativamente fixas entre as suas moedas, o que acabou por
desembocar na unificação monetária do continente. A moeda
que cobria as funções de dinheiro mundial era o dólar e,
parcialmente, a libra. A formação do bloco económico
europeu consolidou o euro como medida de valor e meio de pagamento e
circulação, gerando um novo equivalente como dinheiro mundial.
Grandes quantidades de dinheiro proveniente da delinquência organizada
(narcotráfico, prostituição, pornografia, tráfico
de pessoas, fraudes fiscais, contrabando, sequestros, etc.) passam pelos
estabelecimentos domiciliados nos paraísos fiscais onde procuraram
conseguir a lavagem para entrar no mercado financeiro legal e aí poderem
ser desfrutado pelos seus possuidores.
A desregulamentação financeira só se tornou
política explícita dos principais governos capitalistas na
década de 80. Os governos ficaram descomprometidos de controlar os
fluxos internacionais de valores e revogaram as sanções fiscais
adoptadas com a finalidade de coibir a exportação de capitais.
Uma vez posta em prática a desregulamentação do movimento
internacional de capitais, tornou-se ineficaz e insustentável a
regulamentação financeira dentro de cada país. Pouco a
pouco processou-se uma verdadeira regressão institucional. Os bancos
centrais foram desprovidos dos instrumentos de controlo da oferta
monetária e limitados a administrar a oferta de liquidez, a
dívida pública e a respectiva taxa de juros básica.
A desregulamentação do mercado financeiro ocasionou um movimento
cíclico de euforia prolongada, periodicamente interrompida por
pânicos. Os capitais disponíveis são, pela sua natureza,
financeiros e portanto susceptíveis de se valorizarem na esfera das
aplicações, em que dinheiro se troca por dinheiro diferente,
tendo em vista as expectativas. Na esperança de que se valorizem, os
capitais dirigem-se em bando mais ou menos às mesmas
aplicações. Fluem à esfera da produção e
vice-versa, podem escolher uma imensa lista de investimentos produtivos,
aplicações em empréstimos de diferentes espécies,
opções por operações a prazo, etc.
IV CRISE DE 2008
Em 2001, após os atentados terroristas nos EUA, criaram-se
condições para uma economia de guerra com o objectivo de animar e
impulsionar a produção mundial. Como segunda medida, o Governo
dos Estados Unidos fixou uma política de baixas taxas de juro para
permitir a recuperação da economia americana, oferecendo dinheiro
barato tanto a capitalistas como à população em geral,
ampliando a quantidade de clientes devedores, animando a gestão dos
empréstimos e, com ele, o consumo massivo.
Novas linhas de crédito foram difundidas, em especial as relativas
às hipotecas. Os bancos, incluindo os comerciais, começaram a
outorgar créditos a longo prazo para a compra de apartamentos ou
vivendas com facilidades excessivas sem cuidar da capacidade de pagamento por
parte dos compradores. Conjuntos de dívidas eram posteriormente vendidos
a instituições especializadas com base em pagamentos futuros e na
valorização sistemática dos próprios
imóveis. Este auge de hipotecas denominou-se "subprime". A
política seguida beneficiou dum êxito inicial porque se ampliou o
mercado imobiliário, mantendo-se uma forte procura de casas cujos
preços não paravam de subir.
Em vários países, incluindo Portugal, tornou-se viável
obter novos empréstimos pela diferença entre o valor actualizado
da casa e o valor que faltava pagar da hipoteca, através do
refinanciamento da dívida, o que permitia obter empréstimos
destinados a outros usos. Este mecanismo baseado no incremento do valor da casa
entra em rotura se o valor das casas deixa de subir e começa a descer.
Foi o que começou a acontecer nos começos de 2006. Nessa altura a
Reserva Federal Americana voltou a subir as taxas de juro para evitar um
aumento da inflação e para de algum modo reter este mecanismo,
pois já se começava a notar a formação duma bolha
especulativa. Esta bolha forma-se quando muitos investidores compram qualquer
coisa na perspectiva de uma subida de preço e a mudança dessa
tendência gera uma explosão.
A forte procura pelos mesmos activos não pode deixar de elevar as
cotações, de modo que se afigura muito fácil ganhar
dinheiro especulando com acções, títulos de
crédito, divisas, contratos futuros, etc. Assim se alimenta a
auto-euforia. Como a economia está sempre a mudar, espera-se que algumas
empresas sejam favorecidas pelas transformações e que, em
compensação, outras sejam desfavorecidas. Por consequência,
é de esperar uma maior procura pelas acções das primeiras
e menor pelas últimas, daí resultando a subida da
cotação daquelas e a queda da cotação destas. O
efeito líquido das subidas e descidas de cotações deveria
aproximar-se do zero. Mas não é isso o que se observa, devido
às frequentes manobras especulativas que visam o controlo das grandes
empresas, inclusive as multinacionais.
Em 2007, regista-se uma desaceleração dos indicadores de
produção mundial nos níveis de custos laborais,
produtividade do trabalho e receitas. O colapso financeiro mundial iniciou-se
um ano antes da data em que se desencadeou na fatídica semana iniciada
em 14 de Setembro de 2008 com a falência de um dos cinco grandes bancos
de investimento norte-americanos, a que se seguiu o resgate da principal
empresa de seguros (AIG), a venda forçada dos activos do principal banco
de aforro e crédito (Washington Mutual), dum dos maiores bancos
comerciais (Wachovia). Já nos meses anteriores, outros bancos mais
pequenos tinham falido. Desencadeou-se igualmente a falência de bancos
europeus.
Nessa semana, o sistema financeiro dos Estados Unidos esteve à beira dum
colapso total; desencadeou-se uma virtual paralisação do
crédito interbancário e da emissão de papeis comerciais de
curto prazo.
Os preços das matérias-primas começaram a subir devido
à expansão desordenada do sector da construção e
à alteração sistemática das cotações
do petróleo. Tanto as matérias-primas fundamentais derivadas da
agricultura como as relativas à indústria energética em
geral, deram lugar ao aumento dos custos de produção e à
redução dos lucros.
Cada promessa de pagamento ou letra tem um prazo de vencimento mas, com a
redução de recursos e perda de liquidez, as exigências de
pagamento multiplicam-se e os devedores declaram falência. Muitas
empresas quebram ou reduzem o seu nível de operações,
despedem trabalhadores, aumentando o desemprego. Como ficam endividadas,
compram menos a outras empresas, o mercado contrai-se e surge a
aceleração do desemprego, a redução de
salários, a contracção do mercado consumidor.
As empresas tentam adaptar-se às flutuações do mercado.
Entendem que a etapa fundamental do ciclo económico é o mercado e
não a produção, e assim procuram pôr em
prática um sistema de trabalho adequado à pretensão de
produzir apenas o que é possível vender. Procuram seguir uma
política de diminuição sensível das
existências em armazém, ou seja, adoptar o princípio
"zero de inventário" através duma
produção cingida à procura, encomendas ou consumo
corrente. Neste quadro se insere a política de
flexibilização do trabalho imposta pelos governos, em
colaboração com as empresas capitalistas, que tem como
consequências: o embaratecimento da força de trabalho, a
redução de salários, o aumento da intensidade do trabalho,
a manutenção ou o aumento dos lucros. Trata-se de concretizar o
objectivo de fugir aos efeitos das crises transferindo-os para o mundo do
trabalho.
As bolhas especulativas estalam quando a economia enfrenta o embargo produtivo
e a queda estrondosa da taxa de lucro. Quando a bolha da
especulação rebenta todos os capitalistas acham que foram
vítimas de circunstâncias marginais e exigem dos governos o apoio
financeiro que permita manter os seus rendimentos. A realidade revela que os
governos correm a salvar os detentores do capital outorgando o dinheiro do
erário público aos bancos e outras instituições
financeiras, à custa dos contribuintes.
As soluções esboçadas concentraram-se num dos problemas
específicos, a provisão da liquidez. Só depois se
concentraram num segundo problema, facilitar a venda de activos arriscados
(denominados tóxicos) e só em terceiro lugar, de facto o mais
importante, a recapitalização das entidades financeiras, sem o
que não pode haver uma recuperação do crédito. A
compra de activos "tóxicos" evita que se depreciem mas
não soluciona o problema principal que é a falta de capital das
entidades. Por fim, é considerada a possibilidade legal dos governos
adquirirem acções das entidades financeiras.
O mundo enfrenta uma insolvência generalizada que afecta, em primeiro
lugar, os países e organizações, públicas e
privadas, sobre-endividados e/ou muito dependentes dos serviços
financeiros. A situação que prevalece nos princípios do
ano 2009 no sistema financeiro mundial é que uma parte importante dos
agentes económicos, incluindo os Estados, baseou o seu crescimento
nestes últimos anos no endividamento, o que reflecte e amplia o problema
da solvência global. As receitas fiscais dos Estados já
estão em queda o que poderá conduzir a um agravamento do
défice. O problema da insolvência coloca-se igualmente em
relação aos fundos de pensões.
As baixas das taxas de juro podem ser ineficazes em caso de crises de
solvência, pois não produzem qualquer estímulo e incitam ao
endividamento. O recurso dos bancos centrais ao Banco Central Europeu é
uma forma de aumentar a quantidade de moeda em circulação
correndo-se o risco do regresso da inflação. A emissão de
novos títulos do tesouro traduz-se numa criação
monetária pura e simples.
V MEDIDAS PARA ULTRAPASSAR ESTA CRISE
A convicção dos adeptos do liberalismo económico, segundo
a qual o interesse geral é perfeitamente assegurado se cada um
prosseguir com o seu interesse particular, revela-se manifestamente
ilusória perante as evoluções decisivas do ciclo,
além do facto de esta posição mascarar a
oposição de interesses entre capitalistas e entre estes e os
assalariados.
Os sistemas financeiros são incapazes de se auto-regularem e, por
conseguinte, as medidas de liberalização financeira contêm
o germe das crises. À medida que crescem as fortunas aumenta a
confiança e os investidores tomam posições cada vez mais
arriscadas, intercalando maior endividamento em relação ao
capital que possuem. A lógica deste modo de operar permite conseguir
grandes lucros com pouco capital, graças à inflação
dos preços dos activos que se auto-engendra. O auge termina com os
níveis de endividamento excessivo de todos os agentes e a escassa
capitalização das entidades financeiras, facto que lança a
semente das falências dos devedores e dos intermediários
financeiros.
Todas as políticas do neo-liberalismo têm como efeitos, directos
ou indirectos, centrais ou laterais, enriquecer os mais ricos e poderosos
à custa do empobrecimento e a opressão da maioria da humanidade.
Todas tendem a escravizar e sujeitar os povos que despojaram dos seus
rendimentos e dos seus recursos. Entre todas as políticas destaca-se a
injusta dívida externa que pesa sobre os países
periféricos. Peritos e não peritos demonstram que os
países endividados reembolsam cada ano mais do que recebem como
empréstimo, que com o seu endividamento perdem a sua liberdade
política e que os seus governantes se convertem nos
intermediários dos grandes usurários para colocar no mercado a
soberania dos seus povos, malbaratada, nula de todo o direito. O liberalismo
tem sido a arma principal dos ganhos dos super-ricos e das grandes
potências em prejuízo dos povos e dos cidadãos. Todos os
estudos sérios levam à certeza de que com a
continuação desta política o futuro da humanidade
está gravemente ameaçado.
No decurso dos períodos de depressão, a interactividade entre
monopólios e Estado assume formas bem conhecidas. Em todas crises
financeiras o Estado aparece sempre como o único agente capaz de
garantir a confiança e de injectar capital. Por isso, as
nacionalizações temporais de entidades financeiras são
comuns, às quais se agrega agora a possibilidade de comprar
acções preferenciais. Esta solução permite ao
Estado recuperar parte ou a totalidade dos recursos adiantados, vendendo as
suas participações accionistas quando a situação
melhorar.
A gravidade dos efeitos desta crise exige a tomada de rigorosas medidas, umas
de possível aplicação imediata ou a curto prazo, outras
exigindo uma mudança mais longa envolvendo o próprio sistema.
O que se revela, em primeiro lugar, necessário é uma
democratização do Estado que empreenda a
modificação das relações sociais de
produção. É urgente substituir a intervenção
do Estado em proveito dos monopólios privados por uma
nacionalização progressiva dos sectores-chave da actividade
económica, planificando a orientação da
produção e distribuição em função das
necessidades dos cidadãos e do país. Só assim podem ser
suspensos os obstáculos postos pelo capitalismo monopolista à via
duma sociedade tendente à satisfação das necessidades dos
homens, à supressão das desigualdades sociais e à
eliminação do carácter constrangedor do trabalho.
No caso do nosso País, permito-me sugerir algumas medidas que considero
susceptíveis a implementar pelo Governo a curto prazo, tais como:
1- O Estado intervir no processo de encerramento de empresas, de
redução da sua actividade ou de despedimentos colectivos, com a
participação dos trabalhadores ou dos seus representantes, de
forma a acautelar a continuidade da produção e do emprego.
2- Acabar com a flexibilização do trabalho, suspender o actual
Código do Trabalho e fomentar a criação de novos empregos
directamente por parte do Estado e das autarquias.
3- Promover um aumento salarial de emergência beneficiando trabalhadores
com menores rendimentos e alargar o subsídio do Fundo de Desemprego.
4- Planificar e incrementar a produção nacional em conjunto com
as organizações representativas dos sectores produtivos, as
pequenas e médias empresas e produtores e comerciantes individuais e
familiares, as autarquias e instituições defensoras dos
interesses locais ou regionais.
5- Reduzir as importações, sobretudo de mercadorias que
são ou podem ser produzidas no País, numa óptica de defesa
dos interesses nacionais e não das multinacionais.
6- Apoiar as PMEs no incremento da sua actividade, organização e
gestão, política de crédito e criação de
novas actividades.
7- Proceder ao controlo efectivo dos preços, evitando a tendência
especulativa frequente em tempos de crise.
8- Acabar com a privatização de actividades públicas
rentáveis ou de exploração de recursos naturais e
serviços das comunidades,
9- Acabar com a utilização de meios financeiros do Estado ou de
instituições públicas para salvar os investidores
financeiros ou especuladores, compensar as descidas de lucros das grandes
empresas nacionais ou multinacionais.
10- Regulamentar e supervisionar as instituições financeiras,
incluindo fundos de pensões, impedir os empréstimos
bancários destinados a especulações financeiras, extinguir
o "offshore" da Madeira.
11- Definir uma política de concessão de crédito, de curto
e longo prazo, que contribua para o desenvolvimento económico e assegure
o interesse e a defesa dos cidadãos.
Outras medidas, não imediatas, são susceptíveis de virem a
ser implementadas com o apoio indispensável dos cidadãos:
1- Combater o liberalismo económico e financeiro.
2- Alterar o sentido da globalização, como meio de
domínio das multinacionais à escala mundial, substituindo-o por
uma campanha de solidariedade entre os povos que elimine as diferenças
entre os países ricos e os economicamente subordinados.
3- Promover a nacionalização da banca, dos seguros e doutras
instituições financeiras.
4- Reduzir o consumo petrolífero do País, o mais cedo
possível, e congelar de imediato os megas projectos do governo.
5- Eliminar o ascendente do poder económico sobre o poder
político.
6- Acabar com a democracia formal e instituir um regime democrático,
a nível político, social e económico, que salvaguarde os
iguais direitos de todos os cidadãos.
Almada/18/Março/2009
[*]
Economista, autor de
Economia do sistema comunitário
,
caggomes@clix.pt
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|