Carta aberta aos governos e povos da União Europeia


por Partido Comunista Colombiano

O homem da AUC, a organização paramilitar da Colômbia que funciona como braço não legal das forças armadas. Nos próximos dias o Presidente da República da Colômbia, Álvaro Uribe Vélez, realizará uma viagem por vários países da União Europeia e atenderá um controverso convite no plenário do Parlamento Europeu em que tentará apresentar o seu projecto político dito de "segurança democrática", eixo do seu programa de governo rumo a um Estado comunitário.

O percurso pela Europa é uma manobra do governo colombiano a fim de convidar a União Europeia a participar na chamada "Mesa de Donantes", com a qual quer legitimar o Plano Colômbia, instrumento de intervenção do governo dos Estados Unidos de perfil militarista para atiçar a guerra e o conflito colombiano. Mais do que um plano guerreirista, o que a Colômbia precisa é de uma cruzada nacional e internacional, com o apoio humanista de governos e povos, para sair da encruzilhada de violência exacerbada pela agudização do confronto armado. A único alternativa para resolver o problema política é pela via da negociação política e da democratização da vida nacional. Precisamente ao contrário do ganhar a guerra pretendido pelo presidente Uribe Vélez.

Ao longo dos 17 meses do actual governo, no qual se aplicou a "segurança democrática", o conflito endureceu-se mais e de maneira implacável afecta com maior rigor os colombianos. A aprovação do estatuto antiterrorista, ignorando recomendações das Nações Unidas e da União Europeia, ameaça seriamente os direitos humanos, já por si seriamente afectados pelas medidas autoritárias governamentais. O presidente Uribe Vélez nega-se de maneira sistemática a aceitar as recomendações sucessivas da Comissão de Direitos Humanos da ONU e do Gabinete do Alto Comissariado para os Direitos Humanos das Nações Unidas em Bogotá, o que repercutiu em factos como a perseguição sistemática aos opositores de esquerda, sindicalistas, activistas populares e membros de Organizações Não Governamentais de percurso conhecido e reconhecimento a nível nacional e internacional.

Actualmente, a aplicação da "segurança democrática" — longe de afectar a existência de grupos insurgentes, cuja erradicação o Governo Nacional anunciara num prazo de 18 meses que já estão a cumprir-se — está a atingir os direitos e liberdades da população civil, vítima de detenções em massa e montagens por supostas ligações com as guerrilhas. Na maioria dos casos, os detidos tiveram que ser deixados em liberdade, depois de estarem semanas e meses na prisão. Segundo reconheceu o próprio ministro do Interior e da Justiça, Sabas Pretelt de la Vega, uma média de mil cidadãos estão a ser detidos por mês, acusados de vínculos com a guerrilha. Quase 90 por cento deles fica em liberdade posteriormente.

O Governo Nacional depositou toda a esperança de paz na guerra aberta e prolongada, dedicando mais de 8 por cento do Produto Interno Bruto ao agigantamento do aparelho bélico estatal, enquanto não há dinheiro para o investimento social e em especial para a saúde e a educação. Segundo a estatística oficial, no nível de pobreza no país chegou a 56 por cento e o de indigência a 30 por cento. Entretanto, a crise da saúde acentua-se com o encerramento de importantes centros hospitalares, dentre eles os de atenção às crianças e à maternidade, e está ameaçada a existência da educação pública no país.

O governo nacional opõe-se a qualquer possibilidade de solução política negociada do conflito com as organizações guerrilheiras e nem sequer aceita um acordo humanitário, como o que propõe a Igreja Católica e destacadas personalidades colombianas, agravando as infames consequências do conflito e a deterioração humanitária no país. A política e a economia foram colocadas ao serviço da guerra oficial, numa cruel polarização do país.

As gestões do delegado do secretário-geral da ONU para a paz na Colômbia e da Comissão de Facilitação da Igreja Católica são, quando não ignoradas, obstaculizadas pelos funcionários governamentais e são utilizadas antes como elemento dilatório de um compromisso com uma política de paz. O presidente Uribe Vélez e outros altos funcionários pronunciaram-se contra o acordo humanitário e eventuais diálogos de paz. Há poucos dias, no Palácio de Nariño (sede presidencial em Bogotá), por ocasião da saudação protocolar anual do Corpo Diplomático, o presidente Uribe Vélez, de forma desafiante declarou aos embaixadores: "Os senhores dediquem-se ao diálogo, que eu avanço com meus soldados e polícias para impor a segurança democrática".

A única porta ao diálogo foi para os grupos paramilitares, responsáveis pelo tráfico de cocaína e pelos piores massacres e ataques aos direitos humanos. Com a agravante de que o diálogo com estes irregulares realiza-se de maneira incondicional e com o objectivo de aprovar uma lei de alternatividade penal que consagra o perdão e o esquecimento aos crimes dos paramilitares. De maneira perversa, o governo nacional pretende comprometer a comunidade internacional e os governos da União Europeia neste projecto distorcido, que gerará mais dificuldades para a solução política. Fingindo não ouvir a ONU, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, o colombiano e ex-presidente César Gaviria, decidiu pactar com o presidente Uribe Vélez a verificação deste processo, quando nem sequer existem acordos reais para verificar e controlar. O certo é que os crimes do paramilitarismo e do tráfico de narcóticos dos seus integrantes continuam a ser uma prática no território nacional.

No ano passado, a 25 de Outubro, os colombianos negaram ao Presidente da República a aprovação de um referendo para elevar a norma constitucional a política de segurança democrática e várias medidas fiscalistas de ajuste, lesivas aos trabalhadores e ao interesse popular. Nem sequer 20 por cento do potencial de eleitores deram aval ao seu projecto. Fizeram-no apenas três dos 24 milhões de votantes aptos e menos de cinco milhões depositaram o seu voto pelo presidente nas eleições presidenciais. Entretanto, em desafio à Constituição Política e à vontade da maioria dos colombianos, o governo nacional, apoiado nas maiorias no Congresso, prestando-se às práticas clientelistas, politiqueiras e de corrupção que diz combater, pretende fazer aprovar as medidas negadas no referendo.

Por esta razão, a visita do presidente Álvaro Uribe Vélez à Europa deve servir de ocasião para que os seus governos e povos lhe recordem:

  • as obrigações que tem com os protocolos, tratados internacionais e recomendações da ONU e da comunidade internacional a fim de diminuir a intensidade do conflito e pelo respeito dos direitos humanos;

  • a importância de um acordo humanitário que termine com a tragédia de milhares de colombianos no cativeiro;

  • a necessidade de fazer esforços para avançar numa política real de paz, favorável à solução negociada do conflito e para procurar o caminho da democracia e da justiça social; e

  • o cumprimento das 24 recomendações sobre direitos humanos que o gabinete da ONU na Colômbia vem sugerindo.

    Partido Comunista Colombiano
    Comité Executivo Central

    Bogotá D.C. Colômbia, Janeiro de 2004

    Fonte: Agencia de Noticias Nueva Colombia .

    Esta carta aberta encontra-se em http://resistir.info .
  • 06/Fev/04