Bolívar, precursor da luta anti-neoliberal

A «retenção» pelas FARC-EP de parlamentares, governadores e  autarcas  por elas publicamente acusados de envolvimento em graves actos de corrupção  tem provocado na Colômbia e noutros países campanhas de protesto. Apesar de o Estado Maior da guerrilha de Marulanda esclarecer que tais iniciativas tem por objectivo prioritário forçar o Governo de Bogotá a aceitar a troca de prisioneiros, essas «retenções» são sempre  qualificadas no país e no estrangeiro como "acções de terrorismo".

Assim, resistir.info sugere aos seus leitores que reflictam sobre o texto do decreto  assinado  por Símon Bolívar em  Janeiro de 1824 (ver acima). Naquele diploma legal, o Libertador  estabelece que os funcionários públicos responsáveis por crimes de corrupção cometem um delito contra a nação, susceptível de ser punido com a pena  máxima.

Bolívar encontrava-se então em Lima, no Peru, e o decreto aqui reproduzido foi firmado meses  antes da batalha de Ayacucho, que pôs fim ao império espanhol na América do Sul. É um facto que  nenhum governo colombiano tomou até hoje a iniciativa de editar as obras completas de Bolívar. Não lhe perdoam  nem o projecto revolucionário nem  as medidas que promulgou em beneficio  dos explorados. Contudo, nem mesmo o mais reaccionário dos presidentes da Colômbia ousou  definir Símon Bolívar como um incentivador do terrorismo. Isso apesar de ele ter sido ainda mais severo do que as FARC na punição  daqueles que ao serviço do Estado praticavam actos de corrupção.

resistir.info



Editorial de "Resistencia" [*]

A histórica ilegitimidade do regime político colombiano tornou-se mais patente após as eleições de 10 de Março último. Foi não só a violência e a chantagem exercida sobre a população (física, económica, laboral, militar, virtual) como também as trapaças que manipularam as urnas ao término da jornada eleitoral. Como se isso fosse pouco, foi grotescamente evidente que na Colômbia continuou-se a votar até 15 dias depois de guardadas as cédulas eleitorais nos "cofres de três chaves" da Registraduria Nacional.

Esta é a tradição democrática do país de maior 'estabilidade institucional da América Latina', segundo nos recordam os ministros de todos os governos da Colômbia.
 
E nada se passou por causa disso, nem se vai passar... a nível oficial.
 
Só que tamanho descaramento político atiça a chama da confrontação e aumenta as distâncias que separam os colombianos. Como é possível que tal delito fique impune e ainda por cima os trapaceiros continuem no poder?

Será que estes usurpadores, que são os mesmos que repartem entre si os orçamentos nacional, regionais e municipais, os mesmos que ordenham as finanças públicas, os que definem a quem são concedidos os contratos oficiais e recebem os dízimos correspondentes, será que são alheios ao conflito que padecemos?

Eles, os chefes politiqueiros dos partidos tradicionais, que com seu comportamento corrupto arruinaram hospitais, fecharam escolas, amontoaram presídios, impediram a construção de caminhos e estradas, então não têm responsabilidade na horrível noite em que vivemos?

Eles que, por acção ou por omissão, como administradores, legisladores ou latifundiários, são co-responsáveis pela estratégia paramilitar do Estado, não podem continuar a posar como civis alheios ao conflito, nem esconder sua condição de beneficiários de tal estratégia.

Quando nós as FARC-EP retemos políticos corruptos com o objectivo de obter uma troca, fazemo-lo conscientes da sua condição de RESPONSÁVEIS DIRECTOS desta guerra fratricida. Candidatos, parlamentares, governadores, ex-ministros, deputados fazem parte desta voragem que se aproxima das seis décadas.

Os usurpadores do poder na Colômbia devem tomar consciência de que apesar das suas mentiras sobre a realidade da confrontação, a crise que criaram traz consequências que acabarão por desencadear a ira popular contida durante estas décadas. Porque um Estado sustentado na ilegitimidade e na injustiça só gera crise, instabilidade e conflitos.
______________

[*] Revista Trimestral do Secretariado do Estado Maior das FARC-EP

Este artigo encontra-se em http://resistir.info

22/Ago/02