O Cerco
Nos dias que antecederam as eleições russas, acontecimentos de
grande importância desenrolaram-se na sua periferia. O ministro da
«Defesa» dos EUA, Rumsfeld, visitou a Geórgia. O que foi
lá fazer? Exigir a «retirada das forças militares russas da
Geórgia» (BBC, 7.12.03), exigência repetida pelo MNE Colin
Powell na Cimeira da OSCE (juntando a Moldova à lista de países
de onde a Rússia tem de sair). Mas se uns têm de sair, outros
planeiam ficar, ou entrar... É evidente que a visita de Rumsfeld (antes
das anunciadas «eleições») visa reforçar a
actual presença de tropas americanas na Geórgia. O jornal
Washington Times
(5.12.03) noticia que a Geórgia irá receber uma
«reconfiguração significativa do programa de auxílio
de Washington» que inclui a nomeação de um conselheiro
norte- americano junto do ministro do Interior (será da Florida?).
Além da Geórgia, Rumsfeld visitou o Azerbaijão. O jornal
indiano
The Hindu
(5.12.03) afirma que «os EUA planeiam estabelecer uma significativa
presença militar no Azerbaijão, a fim de conquistar uma maior
presença na região ex-soviética do Cáucaso».
Antes, estivera nesse país o vice-chefe do Comando militar Europeu dos
EUA, General Charles Wald, que afirmou que os EUA «tencionam empreender um
esforço global para garantir a segurança do sector Azeri no
disputado Mar Cáspio». Ou seja, que os EUA vão tomar o
partido do Azerbaijão na sua contenda com o Irão e o
Turquemenistão nas águas ricas em recursos energéticos do
Cáspio.
Aliás, a questão energética é também tema
central do interesse dos EUA pela Geórgia «em parte porque por
lá passará um oleoduto que levará o petróleo do Mar
Cáspio aos mercados europeus, passando pela Turquia» (
Financial Times
, 5.12.03). E também devido ao acordo assinado este ano pela
Geórgia com o monopólio estatal russo do gás, Gazprom, que
«parece dar à Gazprom o direito de expandir a rede de gasodutos da
Geórgia. Alguns pensam que isso significa que [a Rússia] procura
usar a Geórgia como rota de exportação do seu gás
para a Turquia, chegando lá antes de ser construído o oleoduto
trans-caucásico» defendido por Washington (
Economist
, 29.11.03). Poderá estar nesse acordo parte da explicação
para o golpe, patrocinado pelos EUA, que derrubou o Presidente da
Geórgia, igualmente patrocinado pelos EUA. Chevardnadze foi, nos
últimos 15 anos, um dos grandes serventuários da política
externa dos EUA. Desempenhando um papel de destaque na liquidação
da União Soviética, confessa-se agora surpreendido pelo facto de
os EUA «terem ajudado a retirá-lo do poder» (BBC, 27.11.03).
Afirma «não perceber porque foi abandonado por Washington depois de
lhe ter dado total apoio na política externa, até na
questão do Iraque». Depois de ter ajudado a destruir a
«outrora próspera ex-república soviética» (CNN,
23.11.03), Chevardnadze viu juntar o seu retrato aos do General Noriega e
Saddam Hussein, na galeria de ex- serventuários descartados pelos EUA.
Mas o apetite dos EUA extravasa o teatro caucasiano. Nesta segunda-feira esteve
na Polónia o vice de Rumsfeld, Douglas Feith. Assunto: a
instalação de bases militares dos EUA na Polónia, a que o
Governo polaco já deu o seu acordo (RTP 1, 8.12.03). E a agência
búlgara de notícias afirma que planos semelhantes estão na
forja, pois «militares dos EUA consideram que a Bulgária tem uma
localização estratégica para a defesa dos interesses
globais dos EUA» (BNN, 4.12.03). O cerco dos EUA à Rússia
parece ter-se acelerado após a prisão do oligarca Khodorkovski,
que planeava vender 40% da sua empresa petrolífera (a quarta maior do
planeta) ao «Ocidente». A sua detenção foi seguramente
a grande cartada eleitoral de Putin nestas eleições. Mas os EUA
não parecem ter achado grande graça.
O que está em causa não são, naturalmente, diferentes
opções de classe. Mas é por demais óbvio que o
grande capital dos EUA (e da Europa) sempre encarou a Rússia
pós-socialista como coutada e não como «parceiro».
Estão em curso medições de forças de contornos
imprevisíveis. Os próximos tempos adivinham-se quentes na Frente
Russa da estratégia imperial dos EUA.
O original encontra-se em
http://www.avante.pt/noticia.asp?id=3326&area=24
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
.
|