Há 70 anos
A Revolução de 1930 liquidou a 1ª República do
Brasil, anti-industrialista, dominada pelos latifundiários e submissa
ao imperialismo britânico. A dívida externa legada pela
República velha era assustadora. Uma das primeiras providências
do novo governo, encabeçado por Getúlio Vargas, foi efectuar uma
auditoria geral à mesma. A esta auditoria seguiu-se a sua
renegociação junto aos credores, trabalho que
foi brilhantemente executado pelo então ministro Oswaldo Aranha. Esta
simples operação de auditar a dívida, quantificá-la
com exactidão e renegociá-la permitiu reduzir o seu montante em
mais de 30%. Além disso foram extintas condições que
lesavam a soberania brasileira, como a célebre
"cláusula-ouro" e o penhoramento das receitas futuras da
alfândega do Rio de Janeiro.
Por que se conta esta história antiga? Por que a situação
do Brasil de hoje é análoga. Verifica-se que, mesmo sem defender
a solução radical do repúdio unilateral da dívida
externa, há muita coisa que pode e deve ser feita. O novo governo de
Lula terá de escolher entre servir os credores externos ou servir o povo
brasileiro. A tentativa do FMI de "amarrar" o futuro governo Lula
com o pacote dos US$ 30 mil milhões (dos quais 74% seriam
entregues só no próximo ano se fossem cumpridas as
condições impostas), assinado pelo governo de Fernando Henrique,
terá de ser repudiada. Se não o fizer, e logo de início,
as probabilidades de "argentinizar" a situação
brasileira são graves.
Dentro de pouco tempo, antes mesmo da posse, será possível ter um
indício de qual virá a ser a orientação do futuro
governo Lula ao serem anunciados os nomes que encabeçarão o
Ministério das Finanças e o Banco Central. Se forem homens
tão lúcidos, corajosos e firmes como foi Oswaldo Aranha há
70 anos atrás, o governo Lula terá conquistado a sua primeira
vitória pós-eleitoral.
resistir.info
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Professor da London School of Economics
considera moratória como "única saída" para o
Brasil
por Eric Brucher Camara
[*]
Rússia, Equador e Argentina já declararam moratórias para
as suas dívidas. O professor George Phillip, da London School of
Economics (LSE), acredita que o Brasil do futuro presidente Luís
Inácio Lula da Silva será, inevitavelmente, o próximo
dessa lista.
"Não vejo outra saída. Pode-se chamar o
não-pagamento de várias coisas: default, moratória,
calote ou renegociação. Se Rússia e Equador conseguiram
renegociar suas dívidas depois de uma moratória, por que o Brasil
não conseguiria?', perguntou Phillip, em debate sobre as
eleições presidenciais brasileiras na LSE realizado a 21 de
Outubro.
Tanto o Equador quanto a Rússia registaram taxas de crescimento maiores
após as moratórias, e das subseqüentes
renegociações das dívidas. A Argentina, no entanto, ainda
continua à espera de um novo acordo que lhe garanta mais
empréstimos para sair do buraco.
"No caso do Brasil, os juros dos empréstimos já estão
em patamares altíssimos. Quanto tempo se pode pagar juros a 20%?",
pergunta o professor de Política Latino-Americana da LSE,
reforçando a tese defendida pelo prêmio Nobel de economia em 2001,
Joseph Stiglitz.
Pessimismo
Para o economista Francisco Panizza, também da LSE, o governo Lula
tentará evitar a moratória até onde for possível.
"Muitos dizem que é inevitável, hoje a maioria está
pessimista. Acho que um governo do PT vai tentar evitar uma medida assim
enquanto as condições permitirem", disse Panizza.
O problema, na opinião do professor Phillip, é que as
condições do mercado internacional já não garantem
a sobrevivência do Brasil com o modelo adotado actualmente.
"As palavras terão que ser escolhidas cuidadosamente quando se for
falar sobre o assunto. Algo do tipo: Nós queremos pagar, mas
gostaríamos de conversar sobre isso", disse Phillip.
Consenso de Washington
O catedrático da LSE acredita que a era do "consenso de
Washington" expressão cunhada em 1989 pelo economista John
Williamson para descrever a política econômica que norteou os
órgãos financeiros internacionais e a maior parte dos governos da
América Latina na última década chegou ao fim.
"Sim, chegou ao fim. Só não se sabe o que virá
depois. O primeiro golpe foi a eleição de Hugo Chávez, na
Venezuela, e a ruptura definitiva aconteceu com a quebra da Argentina",
comentou Phillip.
O golpe de misericórdia seria a eleição de Lula no
próximo domingo. Phillip acredita que novos blocos geopolíticos
seriam, então, formados na América Latina.
"Não consigo vislumbrar o México dando uma guinada à
esquerda. Talvez ele se alinhe com o Chile. O Brasil, a Argentina e a
Venezuela podem formar outro grupo, e talvez ainda surjam outros",
especulou.
"O mundo está a mudar rapidamente. É uma época
interessante".
[*]
da BBC
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http://resistir.info
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