O historiador comunista Edgar Carone
deixa o cenário brasileiro
Todos os que estudam a história da República brasileira, agora e
no futuro, terão que usar, necessariamente, seus livros. São
quase trinta volumes que cobrem todo o período posterior a 1889,
publicação iniciada em 1963 com um pequeno e notável
ensaio intitulado
Revoluções do Brasil Contemporâneo
. Historiador reconhecido, sua obra desenvolveu-se à margem da
academia, embora tenha chegado a professor livre docente da USP em 1985 (ele
formou-se em 1948 e só fez seu doutoramento em 1970) este foi Edgard
Carone, falecido em São Paulo, no último dia 28, aos 79 anos de
idade.
Carone foi aquilo que se chama de escritor engajado. Definia-se como um
"velho marxista" e "auxiliar de militante". Aproximou-se
dos comunistas ainda na juventude, na década de 1940, através de
seu irmão Maxim, que era filiado ao Partido. Juntou-se também a
intelectuais de esquerda, como Aziz Simão, Antonio Cândido, Paulo
Emílio Salles Gomes, Mário Pedrosa e, por conta da amizade com
eles, filiou-se ao Partido Socialista, em 1947. Foi na fazenda que seu pai
tinha em Bofete, no interior de São Paulo, que Antonio Cândido
encontrou em 1948 os materiais sobre a cultura caipira reunidos em um livro
clássico,
Parceiros do Rio Bonito
.
Carone, cujo pai foi um imigrante libanês (apesar da sonoridade italiana
de seu nome) sempre escreveu com finalidade política, e não
acadêmica. Em uma entrevista publicada no livro
Conversas com historiadores brasileiros
, disse que "não faço meus livros por razões
históricas, mas por razões políticas".
Começou a escrever a história da República "para
entender essa mixórdia que era o país". Marxista, para ele
o fundamental era entender "como ocorre o processo de luta de classe no
Brasil" e, nesse sentido, organizou seus livros expondo o cenário
político de cada período e descrevendo a ação dos
protagonistas, as classes sociais e os partidos e forças
políticas.
Fugindo aos modismos historiográficos que, ironicamente, dizia
não compreender tinha grande preocupação com o
"problema do revisionismo", como dizia. Com o revisionismo
político que levou muitos a abandonar a revolução em nome
da modernidade. Essa preocupação aproximou-o do Partido
Comunista do Brasil nas últimas décadas. Foi colaborador
freqüente da revista
Princípios
e um interlocutor importante e freqüente em questões sobre a
história do movimento operário e do socialismo; apoiou o trabalho
da comissão encarregada de escrever a história do Partido, com
opiniões, ajudando a esclarecer alguns pontos, aconselhando sobre a
bibliografia e sobre escritores e emprestando, generosamente, materiais de
interesse para essa história.
Inquieto, bem humorado e algumas vezes áspero quando se defrontava com
opiniões mal fundamentadas, ou contra-revolucionárias, Carone
deixa o cenário neste momento crucial em que o país se abre para
mudanças. Como historiador comunista e como militante da causa do
socialismo, fará uma falta imensa.
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Jornalista, co-editor da revista
Princípios
e membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil
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