Esquerda brasileira terá jornal

por Eduardo Ribeiro [*]

Eles não existem para a grande imprensa brasileira. Foto de Sebastião Salgado. Após três meses de intensas articulações, que envolveram diretamente o líder João Pedro Stédile do MST e dezenas de movimentos populares de todo o Brasil, a esquerda brasileira decidiu lançar seu próprio jornal, tendo por objetivos: expressar uma visão de esquerda sobre os fatos e a realidade brasileira e uma visão de solidariedade internacional entre os povos; ser plural nas idéias mas comprometido profundamente com os interesses de transformação social do povo brasileiro; servir de subsídio, com informação e reflexão para toda militância social do país; estimular as lutas sociais, os movimentos de massa e o engajamento político dos leitores; e promover permanentemente os valores humanistas e socialistas.

O projeto editorial e o desenvolvimento do jornal terão como referências permanentes o projeto político expresso num documento (Projeto Popular para o Brasil) que aborda as prioridades de atuação política, pela ótica dos movimentos sociais e populares.

Será um jornal semanal de abrangência nacional, com 24 páginas, 100 mil exemplares e equipe própria e profissionalizada. Seguirá um modelo de gestão praticamente inédito em termos de Brasil: a redação vai se reportar a um Comitê Editorial integrado por até 12 pessoas, representando os movimentos e forças sociais que dão suporte ao projeto; este Comitê, por sua vez, seguirá a orientação de um Conselho Político mais abrangente, composto por aproximadamente 80 participantes dos mais diferentes setores e que se reunirá a cada três meses; e atuando como base do projeto os Comitês de Apoiadores que serão criados em todo o País, com a missão de fortalecer a obtenção de recursos, de estimular a participação de colaboradores e de viabilizar a distribuição local.

O lançamento da edição zero está previsto para o final de janeiro, durante o Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Mas a chegada definitiva ao mercado, em edições regulares, ficará para a primeira semana de março, com lançamentos em todas as capitais. Isso se houver os recursos necessários.

O nome já está escolhido — Brasil de Fato — e o editor-chefe também - José Arbex Jr , colega com passagens por importantes veículos de comunicação do país, atualmente integrando a equipe de editores da revista Caros Amigos, e a quem caberá a montagem da equipe tanto de contratados quanto de colaboradores. Uma das editoras também já acertou com o jornal: Áurea Lopes (ex-Diário do Comércio e Indústria e Plano Editorial), que vinha participando também do planejamento do projeto. Serão, ao todo, quatro as editorias: Nacional (política brasileira e economia); Internacional (política e economia); Cultura e Esporte (nacional e internacional).

A editoria de Nacional, por exemplo, abrirá espaço para matérias e reportagens de temas como política, economia, educação, saúde, segurança, reforma agrária, habitação, povos indígenas, meio ambiente, riquezas naturais e demais áreas e assuntos do âmbito nacional. Na forma, vai buscar sempre pelo menos uma boa reportagem de política e uma boa reportagem de economia, além de várias matérias (reportagens, artigos, notas e resumos) das demais áreas e assuntos nacionais.

A pauta deverá ter, segundo definição do projeto a que Jornalistas&Cia teve acesso, "uma função estratégica para afirmação da linha editorial do jornal e a conquista de leitores; deverá construir, a cada edição, um pouco da dimensão nacional, seja com a produção de matérias nos mais diferentes pontos do território, seja na expressão das realidades, das lutas e dos movimentos sociais. A cobertura nacional deverá evitar o denuncismo, o sensacionalismo e o tratamento irresponsável e superficial dos fatos nacionais; ao contrário, deverá ter critérios claros e transparentes para uma cobertura rica, sóbria, atraente, inteligente, educativa e formadora de opinião".

A política, na definição do projeto editorial, "deverá ser vista além dos partidos e do jogo institucional dos executivos e legislativos; será preciso tratá-la como a ação humana na busca do bem comum; será preciso fornecer para o leitor os interesses existentes por trás dos fatos, os bastidores e onde estão os verdadeiros centros de poder".

A economia, por seu lado "precisará ser traduzida para que o cidadão comum -- medianamente informado -- entenda as relações da macroeconomia com os problemas do cotidiano, as relações internacionais do capital com as políticas governamentais. Será preciso desmascarar o tempo todo a visão economicista, segundo a qual tudo deve estar subordinado à economia; e também desmascarar o tecnicismo e a burocracia, que são instrumentos usados pelas classes dominantes para justificar seus atos anti-populares".

O jornal não pretende ser pautado pela chamada "grande mídia". Vai, ao contrário, produzir material próprio, original, adotando o ponto de vista dos movimentos sociais.

Também na linha cultural, Brasil de Fato pretende comprar brigas de grosso calibre. Seus princípios gerais serão os de "combater a mercantilização da cultura e priorizar processos e não produtos culturais; sugerir meios para que o desenvolvimento cultural seja possibilidade de todos e não apenas da elite; tratar cultura como ação política, sem doutrina nem medo de tomar partido; fugir do culto à personalidade; tratar a chamada cultura popular com o mesmo rigor da chamada cultura erudita; subverter os gêneros jornalísticos habituais; experimentar novas formas; comprar brigas com a grande imprensa; e também com as grandes editoras, gravadoras, teatros, televisões, e tudo o mais que tenha se tornado "grande" à custa da miséria alheia".

O jornal é dirigido predominantemente "às pessoas progressistas, integrantes ou não de organizações classistas e populares, que querem mudanças no Brasil, incluindo a classe média disposta a somar-se na luta pela transformação do país. Destinar-se-á também aos sindicalistas, intelectuais, estudantes universitários e secundários, profissionais liberais, funcionários públicos etc. e quem tem capacidade de formar opinião, multiplicar idéias e debates".

Quem quiser colaborar com a construção do Brasil de Fato poderá fazê-lo através de depósito no Banco Bradesco, agência 2716, Conta Corrente número 6776-8 (criada especificamente para este fim), em nome da Editora Expressão Popular . O comprovante de depósito deve ser enviado por fax para a Kamila através do número 11-3361.3866, ou pelo e-mail: brasildefato@cidadania.org.br .

O original deste artigo encontra-se em http://www.rbc.org.br/jdesquerda.htm

Este artigo encontra-se em http://resistir.info

08/Nov/02