AO POVO DA BOLÍVIA:
O binómio neoliberal deve ir-se
pelo Comité de Defesa do Património Nacional
(CODEPANAL)
[*]
Os lutuosos acontecimentos dos dias 12 e 14 do corrente revelam que o povo
chegou ao limite da sua tolerância. O "impuestazo" que o
governo de Sánchez de Lozada pretendeu impor ao país, a ferro e
fogo e sob as ordens do FMI e das transnacionais, provocou uma
previsível e generalizada reacção que demonstra o
esgotamento do regime, incapaz e impor a sua vontade e de continuar a governar.
Contudo, é tal a teimosia do presidente e dos seus seguidores que
estão dispostos a afundar o país e continuar a massacrar o povo,
ao invés de rectificar a sua política e submeter-se a uma
confrontação democrática. A actuação dos
franco-atiradores, que assassinaram gente desarmada e até pessoa
médico, é uma demonstração do que é capaz
este regime para continuar a explorar e oprimir o povo e beneficiar as
transnacionais.
O
impuestazo
foi derrotado e a reacção popular produziu uma grande crise nos
altos escalões do regime que o obrigou a aparentes mudanças no
poder executivo, retirando alguns personagens odiosos para substituí-los
por outros operadores da mesma política. Tudo indica que Sánchez
de Lozada efectua operações cosméticas e tomas medidas
diversionistas que não trarão as rectificações
exigidas pelo povo. Na mensagem presidencial, do dia 16, prometeu apenas uma
redução de ministérios e despesas supérfluas e que
não cobrará o seu salário de acordo com a tabela oficial.
Isto, que foi imposto ao regime pela sua patente imoralidade, não
solucionará os problemas de fundo e é apenas um gesto
propagandísticos para "dar o exemplo", ou seja, para que o
povo aceite sacrifícios impossíveis. Tudo está voltado
para salvar a presidência e para salvar o regime oligárquico e
neoliberal a fim de continuar a aplicar a política ditada pelos
organismos financeiros internacionais e pelas transnacionais. O novo gabinete
é a confirmação do que dizemos. Esta equipe e todos os
assessores não são senão os instrumentos de quem decide a
linha do governo e esse é o Presidente da República. As
fricções entre sócios da coligação e
tensões intrapartidárias são apenas mesquinha disputas
pessoais por fatias do orçamento do Estado. O novo gabinete é
só um arranjo de compromisso para superar a crise política do
regime mas não trará nenhuma mudança importante, nenhuma
revisão da política neoliberal.
Iludindo os problemas de fundo e lançando uma verdadeira cortina de
fumaça continua obstinadamente a preparar-se para entregar o gás
natural às transnacionais a preço irrisório e a
exportá-lo pelo Chile, contra o interesse e o sentimento nacional.
Nestas circunstâncias, a luta por uma solução global para
os problemas do país deve continuar até uma mudança de
governo com a renúncia do presidente e do vice-presidente, a
formação de um governo transitório, conforme a
Constituição Política do Estado e com a
convocação de eleições antecipadas e num prazo
imperativo. O governo transitório deverá ocupar-se
exclusivamente em administrar as eleições e aplicar medidas para
enfrentar a crise que assola o país. O novo poder surgido das
eleições deve convocar uma Assembleia Popular Constituinte.
Um plano económico-financeiro anti-crise deverá basear-se em
medidas tendentes a uma gestão soberana da economia nacional,
atenção preferencial ao aparelho produtivo e
satisfação prioritária das necessidades mais urgentes do
povo. As medidas principais, que também se convertem em plataforma de
luta do povo, são as seguintes:
1- Elaboração de
um Orçamento Geral da Nação participativo que estimule a
expansão do aparelho produtivo nacional, atenda as necessidades mais
prementes do povo e reduza drástica e generalizadamente o gasto fiscal
supérfluo.
2- Revisão imediata dos
contratos com as transnacionais petroleiras para repor uma
tributação de 60% a 75% até que posteriormente se resgate,
para o domínio da República, todo o património nacional
alienado, ferindo a Constituição Política do Estado.
Restituição à Yacimientos Petroliferos Fiscales Bolivianos
(YPFB) da sua participação em todo o processo da
exploração e venda dos hidrocarbonetos.
3- Declaração da
moratória
da dívida externa até alcançar a remissão total da
mesma. Formação de uma frente latino-americana para a
anulação total da dívida externa.
4- Desenvolvimento de uma
indústria petroquímica nos departamentos produtivos (em Tarija
inicialmente) e utilização do gás natural em primeiro
lugar para as necessidades do desenvolvimento nacional e para a
utilização dos bolivianos. Mudança da matriz
energética para a utilização preferencial do gás.
Exportação do gás num processo de integração
energética regional com o Peru, Argentina e Chile, desde que este
país aceite uma solução para o problema marítimo
[NR]
. Venda a preços acordados com os países produtores.
5- Incentivar o desenvolvimento
das forças produtivas nacionais, tanto privadas como públicas.
Proteger o mercado nacional num processo de integração
equilibrada e justa tanto regional como latino-americano. Congelar as
conversações para a instauração do ALCA.
Reorganização da banca estatal.
6- Desenvolvimento alternativo
agro-pecuário e agro-industrial planificado de El Chapare. Respeito
à economia familiar da coca nas proporções que se fixarem
com os interessados. Revogação da Lei 1008. Reactivar a
mineração nacional aplicando as últimas
disposições ao assunto.
7- Realizar uma segunda reforma
agrária que entregue terra aos que não a têm, aos que
trabalham a terra pessoalmente ou possuem-na em quantidade insuficiente.
Revogar o D.S. 21060.
Juntamente com esta proposta de
emergência, elaborar um plano económico-financeiro de longo prazo
no quadro de um desenvolvimento nacional soberano.
Conclamamos as
organizações populares, sindicais, profissionais,
universitárias e estudantis, gremiais, aos polícias e militares
patriotas a reforçarem as direcções surgidas na batalha e
a exigir que actuem unitária e democraticamente, tal como exige a luta
do povo para a consecução dos seus objectivos. Estas devem ter
uma representatividade real e trabalhar com mecanismos colectivos e
democráticos. O movimento sindical deve encontrar rapidamente
mecanismos para sua unificação em torno de uma
direcção transitória aceite plenamente pelas bases.
Finalmente, é
responsabilidade da principal força da oposição
política popular laborar no sentido de articular efectiva e
unitariamente as forças do povo, superando prática hegemonistas e
sectárias. Os objectivos da luta popular devem fixar-se coordenada e
responsavelmente devendo evitar-se a improvisação e a
mudança de tácticas sem uma análise do que determina a
situação política, a correlação de
forças e o estado de ânimo das massas.
La Paz, 20 de Fevereiro de 2003
Enrique Mariaca
Presidente
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Hugo Vaca de la Torre
Vice-presidente
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Carlos Carvajal Nava
Secretário de imprensa
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Walter Pers
Secr. Organização
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Teofanes Díaz
Secr. Vinculação
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Marcos Domich
Vogal
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[*]
A CODEPANAL é constituída por quatro partidos progressistas da Bolívia.
Sede: Calle Comercio Ed. Camiri, 8º Piso, La Paz, Bolívia, Tel.
+591.2.240 6038
[NR]
Refere-se à saída da Bolívia para o Oceano Pacífico. Os 120 mil km
2
de território que lhe davam acesso ao mar foram tomados
manu militari
pelo Chile no fim do século XIX.
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http://resistir.info
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