Capítulos do livro "Una hipótesis macabra:
el autogolpe como mecanismo de política exterior"

Fernando Montiel T. (*)
Tradução de José Colaço Barreiros

QUEM FOI?

À primeira vista, parece importante perguntar quem é o responsável pelos acontecimentos de 11 de Setembro; contudo, não o é. Para efeitos práticos, independentemente de quem tenha sido o responsável, a evolução que tiveram os factos favoreceram em termos absolutos a elite governante norte-americana, como veremos mais adiante. Mesmo assim, convém explorar, nem que seja de forma muito concisa, as diferentes hipóteses que se levantam em relação à autoria desse facto, pois como se tem visto, estão a fazer pagar os justos pelos pecadores. O leque dos suspeitos poderá ser formado pelos seguintes elementos:

1) os rogue states ,
2) grandes grupos terroristas formalmente estabelecidos,
3) grupos terroristas marginais,
4) grupos norte-americanos de ultradireita,
5) o próprio governo norte-americano,
6) a combinação de alguns dos anteriores.

Dentro do primeiro grupo colocaríamos países como o Irão, o Iraque, a Líbia, a Síria ou a Coreia do Norte, pois são dos países que mais têm sofrido as agressões da política externa norte-americana e muitos deles com efeito têm patrocinado actos terroristas
24 . O princípio lógico em que assenta uma acusação contra algum dos rogue states seria o seguinte: como são alguns dos países que têm sido mais agredidos pelos Estados Unidos, é “lógico” pensar que seriam os primeiros interessados em orquestrar represálias. Este é um sofisma que só é válido e eficiente para fins propagandísticos, não na realidade. Em primeiro lugar porque se parte da ideia de que todos os países actuam em função da vingança, pressuposto que só encontra apoio num dito popular “Os chacais julgam todos seus iguais”; e em segundo lugar a realidade que sofre a maior parte destes países pelas políticas que contra eles tem implementado o império, impossibilitam-nos materialmente da realização de um atentado como o que nos ocupa. É significativa a análise de dois casos para demonstrar que nem todos os países actuam em função da vingança, nem os acusados “lógicos” poderiam organizar materialmente com facilidade um atentado como o de 11 de Setembro. Primeiro: países como Cuba – ao contrário dos Estados Unidos – têm-se distinguido pela solidariedade e pela integridade moral da sua política externa apesar da agressão de que têm sido objecto: para o regime cubano a “vingança” contra os Estados Unidos por mais de 40 anos de terrorismo sistemático – que além de seiscentas tentativas de assassínio do seu presidente, incluem atentados de carácter químico e bacteriológico – não tem lugar nos seus projectos políticos 25 .

Segundo: como exemplo, é significativo o caso de Iraque. O antigo aliado dos Estados Unidos hoje sofre represálias brutais por parte dos “antiterroristas”. Para amostra basta um dado: no Iraque, de 1991 até agora morreram mais de milhão e meio de homens, mulheres e crianças de fome e de doenças curáveis, devido ao “bloqueio” organizado pelos Estados Unidos e imposto pelas Nações Unidas.

Análogos são os casos da Líbia, Síria e Coreia do Norte, embora, com as suas respectivas particularidades, é claro. Em síntese, o que vemos é que os “Estados violentos” dificilmente poderiam ter planeado e realizado o ataque de 11 de Setembro visto que são Estados que, embora seja certo que não lhes faltam motivos para organizar uma coisa assim, estão altamente vigiados pelos serviços secretos norte-americanos, britânicos e israelitas. Se a esta situação acrescentarmos o facto de sofrerem graves penúrias sociais e económicas e que além disso têm carência de praticamente tudo o que se puder imaginar
26 , daí resulta que para eles a organização e realização de um acto como o de 11 de Setembro se mostra quase impossível 27 .

No segundo grupo entrariam organizações terroristas estabelecidas – dentro da definição dogmática que se tem do termo – como o Setembro Negro dos palestinianos, o IRA irlandês ou o Terrorismo contra Terrorismo judeu. Evidentemente, muitos destes grupos são apoiados por Estados (como seria o caso da Al Fatah , apoiada pela Organização para a Libertação da Palestina) mas isso não sucede em todos os casos, pelo que existe a possibilidade de tais grupos actuarem por conta própria. Neste caso, a realização de um acto como o ocorrido contra as Torres Gémeas e o Pentágono ainda é mais difícil, porque a infra-estrutura e os recursos de que se dispõem são muito mais limitados. De facto, tecnicamente, para um grupo civil – terrorista – organizar algo desta envergadura sem apoio estatal implica um grau de dificuldade quase intransponível, tornando praticamente necessária a intervenção, se não de um Estado como tal, pelo menos de uma agência semi-estatal como o Mossad ou a CIA
28 .

No terceiro grupo encontraríamos todas as organizações minúsculas mas radicais dispostas a realizar um atentado com os resultados que teve o de 11 de Setembro. Argumenta-se que alguma destas organizações poderia ser a responsável porque, como os serviços secretos norte-americanos se encontram concentrados nas organizações terroristas estabelecidas, então estas pequenas organizações não são tão vigiadas pelo que poderiam, num dado momento, ter o espaço suficiente para organizar um atentado deste tipo, espaço que de facto lhes forneceria a sua própria – relativamente insignificante – existência.

Parece-nos que esta mesma limitação – a insignificância da organização – tornaria impossível a realização de algo como o ocorrido a 11 de Setembro, para cuja realização foi necessário um planeamento especializado por um longo período de tempo – provavelmente anos – além de uma logística que só os especialistas são capazes de desenvolver. Assim, qualquer organização incluída neste terceiro grupo se pode eliminar de antemão
29 .

Se pegarmos no caso de Timothy McVeigh como antecedente, surge a possibilidade de o autor do atentado de 11 de Setembro ter sido um dos tantos grupos da ultradireita norte-americana que integram o quarto ponto que temos vindo a definir.

Contudo, neste caso, a opção parece remota pela complexidade que implica o desvio coordenado de quatro aviões nos Estados Unidos, visto que definitivamente não é a mesma coisa realizar uma operação deste tipo e pôr uma bomba diante de um edifício. Em certa medida, as limitações analisadas acima para o caso dos grupos terroristas estabelecidos e dos marginais, aqui também se tornam efectivas, e mais ainda, até se agudizam. Assim, também podemos eliminar a possibilidade de algum dos integrantes do quarto grupo ter planeado e realizado por sua conta e risco e sem assistência estatal ou semi-estatal os atentados contra as Torres Gémeas e contra o Pentágono.


A HIPÓTESE DO AUTOGOLPE


Na primeira metade do século XIX o orgulho da armada norte-americana, o Couraçado Maine , foi afundado, provocando assim a guerra entre os Estados Unidos e o Império Espanhol. Os Estados Unidos ganharam a guerra, o que lhes permitiu alargar o seu domínio a Cuba, ao resto das Antilhas e até às Filipinas. Com o tempo veio a descobrir-se que a acusação contra o Império Espanhol de ter atacado o navio norte-americano era infundada, pois foram os próprios Estados Unidos que afundaram a embarcação com o objectivo de declarar a guerra ao Império e assim tornar realidade a tese da “Gravitação Política” expressa por John Quincy Adams em 1823. A história repetiu-se no século XX em 1941 quando os serviços secretos norte-americanos, depois de decifrarem o Código Púrpura dos japoneses, informaram o Presidente Roosevelt do iminente ataque a Pearl Harbor. Roosevelt, sabendo o que iria acontecer, permitiu o ataque e assim conseguiu entrar na Segunda Guerra Mundial, de que os Estados Unidos saíram sem um único ataque ao seu território e como uma potência económica ímpar perante uma Europa devastada. Este foi um crime por omissão: podia ter-se feito alguma coisa mas não se fez, pelo que existe uma corresponsabilidade nos factos. Igualmente, a 1 de Dezembro de 1981 se pôs em acção por uma ordem secreta de Ronald Reagan a operação que pretendia vender armas ao Irão para financiar os Contras nicaraguenses. Nesta operação estavam implicadas diversas personagens do narcotráfico internacional e era organizada logisticamente pela CIA . Isto significava apoiar com armamento um governo abertamente declarado por Reagan como “violento” e “terrorista”, com o que, paradoxalmente, se oficializava de facto o apoio a um governo “inimigo” dos Estados Unidos... pelos Estados Unidos. Tecnicamente este pode ser considerado um auto-atentado com o objectivo de conseguir um bem maior: derrotar o governo popular da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) após a morte de Anastasio Somoza. Os três episódios aqui descritos têm uma constante: a participação directa – como no primeiro e no terceiro casos expostos – ou indirecta – como no segundo – dos Estados Unidos nesses episódios de “agressão”. Não são os únicos, mas só alguns dos mais significativos.

Estes antecedentes são de facto provas da possibilidade real de os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 não terem sido precisamente um atentado , mas antes um auto-atentado . A favor deste cenário temos o facto de que, se foi o governo norte-americano o responsável pelo ataque terrorista, então o problema da dificuldade técnica de organizar o golpe fica resolvido. Com um orçamento de cerca de 30 mil milhões de dólares anuais, torna-se difícil que mais de uma dúzia de serviços secretos norte-americanos não pudessem detectar o planear de um atentado desta envergadura, e no entanto, com esse mesmo orçamento poder-se-ia muito bem coordenar um golpe como o que sofreram as Torres Gémeas e o Pentágono.

Por outro lado, temos o facto de estar na própria essência de um atentado terrorista o influir na evolução de um acontecimento ou de um processo político específico. Com este objectivo, enquanto o atentado ao Pentágono parece ter tido um conteúdo mais simbólico que homicida, o ataque às Torres Gémeas tem uma componente simbólica – o facto de nessas torres se encontrarem os escritórios do World Trade Center – embora seja mais poderoso o seu conteúdo homicida: aproximadamente 4 mil pessoas perderam a vida. Neste ponto é conveniente determo-nos por um momento e distinguir o que aconteceu do que poderia ter acontecido.

Se considerarmos que nas Torres Gémeas trabalhavam de base não menos de 50 mil pessoas, será esta a quantidade mínima de pessoas que eram vítimas potenciais do atentado – quantidade a que se deveria acrescentar o número médio de visitantes – e então temos de perguntar-nos porque morreram cerca de 6 mil pessoas e não mais de 50 mil?. A resposta é simples: pelo modo como foi realizado o atentado. O primeiro avião chocou contra uma das torres praticamente na parte mais alta por volta das 8:30 da manhã. Este facto – que primeiro se pensou ter sido um acidente – provocou a evacuação imediata do pessoal que já se encontrava nessa torre. Cerca de 18 minutos depois choca o segundo avião na parte mais baixa do terço mais alto da segunda torre e é então que se torna claro que não é um acidente, mas um atentado. Cerca de 30 minutos depois, desmoronam-se ambos os edifícios.

Perante tal estado de coisas, são válidas três perguntas:
1) porque chocaram os aviões na parte superior dos edifícios e não na parte mais baixa possível?
2) porque chocaram os aviões com 18 minutos de diferença e não ao mesmo tempo?
3) porque se realizou o atentado às 8:30 da manhã e não, por exemplo, à uma da tarde?.

Se se tivessem cumprido estas três condições a quantidade de vítimas teria significado uma tragédia humana para os Estados Unidos superior à que lhes significou a morte de 60 mil soldados na guerra do Vietname. Se os aviões tivessem chocado contra as Torres Gémeas um a seguir ao outro com poucos minutos de diferença, ou quase ao mesmo tempo, na parte mais baixa possível dos edifícios à 1 da tarde – e não às 8:30 da manhã quando ainda mal começaram a chegar os trabalhadores e se encontram fechados os escritórios e muitos dos estabelecimentos comerciais – os edifícios teriam ruído de imediato sem dar tempo a serem evacuados e no momento em que se encontravam saturados de pessoas. Se o perpetrador já se tinha dado ao incómodo de desviar não um, nem dois, mas quatro aviões comerciais em território norte-americano apanhando de surpresa todos os serviços de espionagem e segurança, é inexplicável que não tivesse podido cumprir as três condições acima expostas, relativamente simples considerando a dificuldade que implicava o planear o desvio e a execução do atentado em si; sem dúvida, para a lógica de um atentado terrorista convencional, 50 mil mortes teriam sido preferíveis a 6 mil. Assim, no caso de o ataque ter ocorrido do modo como foi planeado, então quase poderemos dizer que se procurou ocasionar a menor quantidade de mortes – o que nem por sombras significa que tenham sido poucas – da forma mais espectacular possível (isto explicará que não tenha sido de noite).

Nesta altura e já entrando em pleno na tese do auto-atentado, as perguntas a que é necessário responder são:     1) quem nos serviços secretos norte-americanos pilotaria os aviões sabendo que morreria na operação?      2) o que justificaria a realização de um atentado desta envergadura com todas as suas implicações simbólicas, materiais e humanas?

Quanto à primeira pergunta tem de se reconhecer que pelas características suicidas-homicidas do atentado poderia supor-se que se tratava de gente com mentalidade definitivamente extremista – não necessariamente muçulmanos – dispostos a morrer por uma causa, que, não sendo material, teria de ser ideológica. Este tipo de compromisso será difícil encontrá-lo no pessoal da CIA ou no de organizações do mesmo tipo, de modo que é improvável que o governo norte-americano tivesse feito uma coisa assim pelos seus próprios meios: materialmente falando, necessitariam de alguém que lhes fizesse o trabalho difícil : pilotar o avião e morrer com ele. Deste modo fica eliminada a tese de um auto-atentado planeado e efectuado por elementos puramente norte-americanos, o que nos dá aso à última opção que referimos acima: a possibilidade de ser uma combinação de actores a responsável. Neste caso, obviamente, só podemos especular pois a falta de dados e a proximidade dos acontecimentos impedem que se fale com certezas.

Supondo que o atentado teria sido planeado e efectuado por diversos actores, a participação da elite política norte-americana é um requisito indispensável para que os atentados fossem levados a cabo do modo como efectivamente ocorreram.

Assim, embora se afaste a tese do auto-atentado puramente norte-americano , parece factível a possibilidade de as mais elevadas esferas da classe política nos Estados Unidos terem urdido o referido atentado utilizando algum grupo extremista para a sua realização. Dentro desta lógica não é incompatível a autoria intelectual dos Estados Unidos, com a autoria material de militantes pertencentes a um grupo como o de Osama bin Laden, que de imediato foi apontado como o responsável sem se apresentar nenhuma prova que avalize a acusação. Recorde-se que não seria a primeira vez que trabalham lado a lado os Estados Unidos e bin Laden
30 . Já no passado o apoiaram por meio da CIA contra os soviéticos, e depois contra os russos fomentando as guerrilhas muçulmanas na Tchetchénia e nos Estados da Ásia Central. A tese torna-se ainda mais factível se acrescentarmos o facto de, como veremos a seguir, neste momento estarem os falcões no poder nos Estados Unidos, ou seja, políticos de ultradireita que são pela militarização das relações internacionais, e que de resto são os responsáveis por muitos dos mais atrozes massacres da história mundial contemporânea 31 . A eles não os impressiona a morte de inocentes sempre e quando o requererem os lucros em termos de poder político, económico e de controlo social. Mesmo assim, ainda fica por responder a segunda pergunta que fizemos no parágrafo anterior: o que justificaria a realização de um atentado desta envergadura com todas as suas implicações simbólicas, materiais e humanas? Para responder a esta questão, convém fazer um balanço da situação existente no interior dos Estados Unidos e no contexto internacional.


REAGAN, BUSH E BUSH JR. OU A CONTINUIDADE POLÍTICA


A ferocidade com que foi atacado – culpado ou não – o regime talibã era perfeitamente previsível se tivermos em conta os antecedentes de quem orquestrou a matança: a família Bush e o seu séquito. O perfil internacional que terá de distinguir a era de George W. Bush na política internacional foi inaugurado com grandes fanfarras pelos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, e curiosamente o citado perfil não é nada novo. A luta contra o “terrorismo” – só efectiva nas palavras – já havia sido utilizada no passado, durante a administração Reagan, como eixo da política externa norte-americana. Por este motivo – e como exercício de perspectiva – é conveniente estabelecer os paralelos que existem entre uma e outra administração para, na medida do possível, tentar projectar um cenário a médio prazo do que se poderá esperar da administração de Bush II em termos de política externa, a partir da invasão do Afeganistão de Setembro de 2001.

Numa primeira abordagem, vemos as administrações Reagan, Bush e Bush II chegarem ao poder apoiadas pelos mesmos votantes, a saber, os sectores mais poderosos e conservadores da classe política norte-americana dos quais se destacam os corporativos petroleiros e o complexo militar industrial. Continuando com as semelhanças, vemos que o discurso “Combater o Império do Mal” foi a razão de ser de Reagan do mesmo modo que hoje o presidente dos Estados Unidos fala de “acabar com o mal do mundo”, com a pequena diferença de que nos tempos de Reagan, o inimigo eram os “comunistas”, enquanto hoje com George W. Bush são os “terroristas muçulmanos” de quem se tem de livrar o mundo
32 . Do mesmo modo que Fontes da Conduta Soviética (texto que George Kennan publicou em 1947 sob o pseudónimo de “X”) guiou o pensamento propagandístico dos Estados Unidos por mais de quarenta anos, agora, ao entrarmos no século XXI, George W. Bush apela – embora com mais discrição – aos postulados do Choque de Civilizações de Samuel P. Huntington para dar alguma base à sua agressão contra o Afeganistão.

As presidências de Reagan e de George Bush pai e filho também se entrelaçam pela composição dos seus gabinetes e pelas suas acções de política externa como veremos a seguir. Reagan teve Manuel Noriega (terrorista de Estado no Panamá e traficante de drogas em grande escala), Bush II tem Osama bin Laden. Tanto Noriega como bin Laden foram personagens ligadas à CIA – ambos nos tempos em que George Bush pai era director da mesma – com amplos antecedentes de práticas terroristas contra os inimigos da “liberdade”, da “justiça”, da “democracia” e da “civilização” como a entendem os Estados Unidos, porque não os atacou com toda a maquinaria “justiceira” que se tornou efectiva injustamente no caso da Nicarágua dos Sandinistas ou no Chile de Salvador Allende (dois governos amplamente legitimados pelas respectivas populações), quando era evidente que viviam à margem da legalidade? Por uma simples razão: eram de facto terroristas, mas dos nossos terroristas, isto é, dos Estados Unidos. Logo podiam ser tolerados, eles e os seus abusos.

Como já mencionámos, a configuração dos gabinetes das duas administrações Bush e de Reagan é muito semelhante. George Bush tinha sido o director da Central Intelligence Agency (CIA) quando Ronald Reagan era presidente, e posteriormente ocupou o cargo de vice-presidente. Com aquele cargo, Bush foi o directo responsável pela operação que ao ser ventilada publicamente seria conhecida como o “escândalo Irão-Contras” ou “Irangate”
33 . Naturalmente, a seguir a Reagan, Bush foi eleito presidente dos Estados Unidos, sendo no seu mandato que se levou a cabo a Operação Tempestade no Deserto no Iraque em princípios da década de Noventa.

Enquanto foi director da CIA, Bush conhecia muito bem o papel que desempenhava Osama bin Laden e não fez reparo quando Reagan chegou a denominá-lo, juntamente com o resto dos mujahidins, freedom fighter (lutador pela liberdade) oferecendo-lhe todo o apoio necessário.
Mas as coisas não ficaram por aqui. Após os dois períodos em que William Clinton foi presidente, George W. Bush assumiu o cargo a seguir a um virtual golpe de Estado.

Já como presidente, Bush Jr. encarregou-se de instalar no gabinete membros da ultradireita mais recalcitrante e personagens de negra trajectória reciclados das administrações de seu pai e de Ronald Reagan. Entre os primeiros encontramos gente como John Ashcroft. O actual Procurador da Justiça é um reconhecido membro da ultradireita norte-americana; educado em escolas abertamente racistas; de facto, o “fundamentalismo” de ultradireita de Ashcroft chegou a criar problemas ao próprio George W. Bush com um Congresso que se recusava a ratificá-lo no cargo pelos seus conhecidos antecedentes e pela sua retórica semifascista. Entre os segundos – ou seja, entre as personagens recicladas de administrações anteriores – encontramos gente como Collin Powell, John Negroponte e Otto Reich. O actual Secretário do Departamento de Estado não só foi um dos principais promotores dos Contras nicaraguenses na administração Reagan, como foi também o chefe do Estado Maior que organizou e recomendou a intervenção no Panamá durante a administração de George Bush pai; nesta mesma administração, Powell desempenhou também um papel determinante na instrumentalização da Operação Tempestade no Deserto contra o Iraque.

Com antecedentes parecidos temos John Negroponte. O actual Embaixador dos Estados Unidos nas Nações Unidas foi o “chefe de operações” nas Honduras entre 1980 e 1982, durante o mandato de Ronald Reagan, precisamente quando as Honduras se tornaram a maior base de agressão militar contra a Nicarágua, pois dali se lançavam os ataques dos Contras . Finalmente, temos Otto Reich. Durante a administração Reagan, Reich, entre muitas outras coisas, foi o encarregado do chamado Serviço para a Diplomacia Pública (ODP). Este serviço não era mais que um órgão de propaganda governamental cujo objectivo era conseguir – mediante enganos e por meios ilegais – o apoio do povo americano às actividades que estavam a ter os Estados Unidos em El Salvador e, por meio dos Contras , na Nicarágua. Hoje em dia, Reich é o flamante secretário assistente do Departamento de Estado para a América Latina, isto é, o funcionário norte-americano de maior poder quanto à política externa para a América Latina
34 . É evidente que os funcionários das três administrações se entrelaçam, o que só pode indicar continuidade prática e ideológica em matéria de política externa. Estes são apenas os antecedentes da administração actual do país mais poderoso do globo. Reagan e Bush pai têm um amplo historial em matéria de violações aos direitos humanos e dezenas de milhares de mortos nos seus activos, o primeiro na América Central e o segundo no Médio Oriente principalmente embora não de forma exclusiva.

AS CAUSAS INTERNAS

Supondo então que houve altas esferas do governo norte-americano envolvidas no planeamento-execução do atentado de 11 de Setembro, além dos antecedentes de crime internacional que acabamos de passar em revista e que caracterizam a actual administração, teremos de explicar os motivos que tiveram para realizar um acto como o que nos ocupa.

A primeira situação que temos de considerar como motivo para desencadear uma operação como a que está em prática sobre o Afeganistão é a situação eleitoral que deu o triunfo a George W. Bush, pois não foi particularmente a mais conveniente. Após um controverso empate técnico e uma alegação de fraude por parte do candidato democrata, Al Gore, precisamente no Estado governado por Jeb Bush – irmão do seu adversário, – o Tribunal Supremo decidiu – do modo mais antidemocrático possível sem dúvida – que Bush II ia ser o presidente. Deste modo terminou um episódio que manteve a nação mais poderosa do mundo sem primeiro mandatário por várias semanas. Como acertadamente se chegou a afirmar na altura, Bush II tornou-se um dos presidentes mais ilegítimos na história dos Estados Unidos, pois tomou a presidência marcado por um duplo estigma: 1) a decisão arbitrária dos juizes do tribunal que o ungiram como presidente e 2) depois de receber a maior quantidade de votos contra por parte da cidadania norte-americana. A fraqueza política de origem que significou esta situação para o regime de George W. Bush fazia prever a formação não só de um gabinete como o que acima vimos de forma superficial, mas também de uma acção como a que se desencadeou sobre o Afeganistão (embora evidentemente não fosse muito seguro naquele momento sobre quem recairia essa operação). Por outras palavras, George W. Bush tinha necessidade de conseguir por qualquer meio possível a legitimidade que a sociedade norte-americana não lhe deu nas urnas. Para compreender melhor este assunto convém pôr na mesa um antecedente análogo. Em fins do verão de 1999 eclode a segunda guerra russo-tchetchena.

O detonador deste novo conflito bélico foram uns atentados terroristas ocorridos em Moscovo e pelos quais os tchetchenos foram acusados como responsáveis. No dizer do Dr. Pablo Thelman
35 :     “A segunda guerra russo-tchetchena... foi concebida pelo Kremlin com o objectivo de assegurar ao candidato presidencial Vladimir Putin... o seu triunfo nas eleições presidenciais celebradas em Março de 2000. Nesse momento era necessária e útil politicamente para o Kremlin uma guerra desse tipo porque uma vitória militar na Tchetchénia se transformava na via mais idónea para assegurar a vitória política de Putin em Moscovo.” 36

Embora os atentados terroristas que funcionaram como detonador da segunda guerra russo-tchetchena hajam sido atribuídos às guerrilhas tchetchenas, a verdade é que nunca se demonstrou a sua culpabilidade – como também não se demonstrou suficientemente a culpabilidade de bin Laden – além de que existiu sempre uma forte suspeita de que os atentados que tanto ajudaram Putin não foram na realidade atentados , mas sim auto-atentados , coisa que obviamente também nunca se conseguiu demonstrar. Depois disto vemos que, neste sentido, a diferença mais considerável entre as duas guerras – Tchetchénia e Afeganistão – é que, política e eleitoralmente, enquanto a guerra da Tchetchénia foi utilizada por Putin como tratamento preventivo para garantir a vitória, a do Afeganistão foi utilizada por Bush de forma terapêutica com o mesmo fim.

Em segundo lugar temos a diferença de projectos políticos que se baralhavam dentro da política norte-americana, entre os quais os de Bush tinham uma posição pouco favorável. Após a imediata viragem na correlação de forças no Congresso que significou a conversão a independente do Senador republicano James Jeffords, a administração Bush e o Partido Republicano perderam o controlo absoluto do congresso, o que favoreceu os democratas. O momento certamente foi o menos adequado visto que a divergência de projectos entre os dois partidos era abismal. Enquanto os democratas defendiam a ideia de incrementar os gastos sociais (saúde, habitação, etc.), os republicanos estavam com a ideia de elevar o montante orçamental destinado à defesa e aos projectos militares minando assim a viabilidade dos de feição eminentemente social. O abandono das fileiras republicanas de Jeffords implicou para os republicanos a necessidade de negociar com os democratas, situação que punha em causa a sua possibilidade de cumprir em termos absolutos os compromissos contraídos com as indústrias que compõem o complexo militar-industrial norte-americano; compromissos que, diga-se de passagem, ao “triunfar” Bush deixaram de ser exclusivos dos republicanos para se transformarem em compromissos políticos de Estado. O repentino fortalecimento dos democratas caiu mal no ânimo da nova administração visto que a limitava enormemente para cumprir os compromissos contraídos.

Entre os compromissos mais importantes encontravam-se sem dúvida os respeitantes às negociações dos projectos energéticos para explorar os recursos da Ásia Central – particularmente os do Azerbaidjão no Mar Cáspio – e o do arranque do denominado Sistema Nacional de Defesa Antimíssil (National Missile Defense) .

À ilegítima administração de George W. Bush e à limitadora política que acabamos de passar em resenha teremos de somar mais uma: a situação económica dos Estados Unidos. O que propagandisticamente era conhecido e escondido como uma “desaceleração” estava prestes a transformar-se numa autêntica recessão de grandes proporções. A necessidade de reactivar a economia e proteger os sectores industriais chave para a administração Bush (ou seja, o petrolífero e o armamentista nesta ordem), por si mesmas, eram causas suficientes para fazer o esforço para desencadear uma conflagração bélica. A questão era simplesmente averiguar contra quem e de que modo. Em resumo, podemos afirmar que existia uma agenda interna entupida que não podia desenvolver-se por outros meios que não fossem bélicos, e daí a necessidade, se não de intervir num conflito já existente, pelo menos de inventar um.

AS CAUSAS EXTERNAS

Desde o seu início, a administração de Bush Jr. tem-se distinguido pela sua hostilidade para com a comunidade internacional. Embora seja certo que esta hostilidade é já habitual no governo norte-americano independentemente de estar no poder um governo democrata ou republicano, a dinastia Bush não só parece sofrer do que em termos psiquiátricos se conhece como atitudes passivo-agressivas, mas até procura mesmo o confronto aberto, adoptando assim – sempre dentro da psiquiatria – um comportamento francamente antisocial ou psicopático. Estas afirmações apoiam-se na realidade, como o demonstraram factos como os seguintes, que, apesar de não serem os mais importantes, são os mais recentes:

1) A recusa de ratificar o Protocolo de Kyoto para a protecção do meio ambiente. A ratificação do referido estatuto internacional prejudicaria as grandes transnacionais norte-americanas ao obrigá-las a reduzir a sua emissão de poluentes. Evidentemente, isto viria a traduzir-se não só em graves dispêndios económicos dessas companhias para modernizar e sanear os seus sistemas produtivos até cumprirem o Estatuto, mas também limitaria a sua capacidade de crescimento pois teriam de adquirir tecnologia muito mais cara – mas menos poluente – se quisessem abrir novas instalações, com a “agravante” de terem de se submeter à auditoria e revisão de agentes exteriores;

2) o abandono da delegação norte-americana – juntamente com a de Israel – da Conferência Mundial contra o Racismo em Durban, África do Sul. Durante o período imediatamente anterior à citada conferência, o Estado israelita – com o apoio logístico e militar norte-americano – implementara uma política homicida para responder à Intifada palestiniana (movimento de rebelião popular que se seguiu à provocação do primeiro-ministro israelita Ariel Sharon)
37 ;

3) a recusa de respeitar o Anti-Ballistic Missile Treaty (ABM) de 1978 a que se encontravam obrigados os Estados Unidos. Este tratado ergueu-se como um obstáculo legal importante para o arranque do Sistema Nacional de Defesa Antimíssil, dado que este não só atenta contra os interesses de segurança nacional russos e chineses (principalmente) ao quebrar o equilíbrio nuclear existente, como também contra a segurança internacional de qualquer Estado em todo o globo, pois implica uma escalada militar nuclear unilateral no espaço, isto é, implica uma revitalização melhorada da Iniciativa para a Defesa Estratégica (IDE) ou “Guerra das Estrelas” proposta por Ronald Reagan na década de Oitenta.

Se a estes três acontecimentos acrescentarmos o conflito diplomático suscitado entre a China e os Estados Unidos devido à queda de um avião espia norte-americano em território chinês, então temos que o confronto aberto e perigoso com o mundo inteiro era perfeitamente previsível como constante na política exterior da nova administração norte-americana.

Esta hostilidade por parte da elite política norte-americana tem primordialmente dois objectivos em matéria de política externa – relacionados com o atentado:
1) dar uma demonstração de poder ao terceiro mundo, não só por parte dos Estados Unidos, mas também dos seus aliados do primeiro mundo ao estabelecer uma aliança para defender um interesse de classe comum;
2) fortalecer politicamente a posição norte-americana na Ásia Central.

Para compreender o primeiro destes objectivos temos de recordar a citação de que em política “a forma também é fundo”, o que é eternamente real. Num mundo em que a globalização
38 como processo se ergueu – contra o que qualquer pessoa medianamente racional desejaria, – não como veículo, mas como condutor do “desenvolvimento” internacional, as demonstrações de poder dos fortes são ainda mais necessárias para manter os fracos como tal. Isto é, a agressão da aliança militar mais poderosa da história – dirigida pelo país mais rico e poderoso do globo – contra um dos países mais pobres e socialmente mais atrasados tem um grande conteúdo simbólico que não se pode ignorar: assim, a forma, efectivamente, também é fundo. Por outro lado temos o Afeganistão como peça geoestratégica na Ásia Central. É a sua enorme importância para a política externa norte-americana que se desenvolverá a seguir mais detidamente.

Afeganistão: Uma jóia geopolítica

Os meios de comunicação deram ênfase à ideia de que a reacção que iriam ter os Estados Unidos como resposta ao atentado de 11 de Setembro seria uma “vingança”. Esta ênfase foi tão acentuada e tão centrada nos aspectos viscerais que iria ter a contestação dos Estados Unidos, que permitiu aos meios de comunicação omitir um facto fundamental: qualquer acção que determinasse levar a cabo o gabinete de George W. Bush não seria irreflectida e por motivos viscerais – como se tentou fazer crer à opinião pública, – mas antes seria friamente pensada e, o mais importante, seria coerente com os princípios e objectivos da política externa dos Estados Unidos.

O Afeganistão é um país na miséria devastado pela guerra, habitado por 21 milhões de pessoas com um dos PIB per capita mais baixos do mundo. As suas terras áridas mal dão para semear uns quantos produtos agrícolas e para a alimentação dos rebanhos dos pastores da região, além de a sociedade afegã no seu conjunto viver em condições análogas às que existiam antes da revolução industrial. Ao contrário da Colômbia – país cujo controlo se tornou estratégico devido aos recursos da Amazónia, – o Afeganistão é provavelmente uma das regiões menos solicitadas para o investimento produtivo, porque não é terra de modo algum atraente para a actividade industrial e/ou económica para além de um débil sector primário. Sendo esta a situação da região do conflito, que interesse poderiam ter os Estados Unidos em controlar militarmente, se não todo o país, pelo menos um sector da terra afegã?. Em si mesmo, o Afeganistão é um objectivo militar fácil mas sem importância de maior. A resistência que os talibãs são capazes de opor contra o exército mais poderoso do mundo apoiado por uma aliança militar sem precedentes (a Organização do Tratado do Atlântico Norte) é insignificante no mais amplo dos sentidos. A pergunta de fundo então é: o que ganham os Estados Unidos com o ataque ao talibã?, e a resposta é simples: uma posição geopolítica importantíssima. Apesar de a terra afegã ser pobre em recursos de todo o tipo, a sua posição geopolítica torna-a uma chave para influir na política internacional, pois é um ponto de pressão interna e regional tanto contra a China como contra a Rússia; além disso, do Afeganistão pode-se muito bem controlar a evolução política regional, pois não devemos esquecer que existem diversos actores regionais com armamento nuclear e que se encontram em conflito. Como se ainda fosse pouco, o controlo total, ou mesmo só parcial do Afeganistão abre novas possibilidades para a exploração dos recursos petrolíferos do Mar Cáspio que são dos mais abundantes em todo o globo e cuja exploração se encontra monopolizada actualmente pela Rússia apesar da série de projectos alternativos que já existem.

Um primeiro dado que convém ter em conta é o facto de o Afeganistão se encontrar no centro do mundo islâmico. Como é bem sabido a região da Ásia Central compõe-se de um mosaico de culturas
39 cujas diferenças podem ser facilmente exacerbadas pelas potências ocidentais com fins políticos. Isto já ocorreu no passado e pode ocorrer de novo. Uma posição militar norte-americana no Afeganistão seria um foco de desestabilização para as grandes potências regionais como a China e a Rússia, e também se repercutiria no equilíbrio de forças das potências regionais do Médio Oriente como o Irão e Israel, e das do subcontinente indiano em que se encontram o Paquistão e a própria Índia. Como prova basta ver o caso da Tchetchénia, onde a CIA apoiava o movimento separatista tchetcheno para enfraquecer internamente o Estado russo. Este é o mesmo perigo que corre a China, pois na província ocidental de Xing Kiang existem guerrilhas muçulmanas já estabelecidas que arvoram a bandeira do separatismo tal como na Tchetchénia. A situação na Tchetchénia e Xing Kiang 40 agrava-se se considerarmos que não são movimentos isolados e que têm fortes ligações entre si, com o talibã no Afeganistão e com muitos outros movimentos separatistas no resto da Ásia Central como o Islamic Movement of Uzbekistan (IMU). Estes movimentos separatistas integracionistas na Ásia Central têm tal importância para os países na região que os levaram inclusivamente a assinar acordos militares 41 para os combaterem. De tudo isto resulta que, de acordo com os ensinamentos da real politik , o que menos convém aos Estados Unidos é combater o terrorismo na Ásia Central, porque de facto lhes é favorável em termos absolutos visto que dessangra internamente os seus competidores políticos na região (China e Rússia): se não se possuir estabilidade interna, dificilmente se pode projectar força para o exterior. Causar problemas tanto aos chineses como aos russos encontra-se certamente na agenda de política externa norte-americana pois não podemos nem devemos esquecer as aproximações evidentes entre ambas as potências com vista a formar um bloco político para se opor à agenda militarista que representava o desenvolvimento do Sistema Nacional de Defesa Antimíssil. É importante considerar tudo o que se disse antes porque quase todos os jogadores aqui mencionados contam com armamento nuclear 42 , além de que no caso da China e da Rússia não se pode omitir que possuem lugares permanentes no Conselho de Segurança das Nações Unidas com direito a veto. Por outro lado, uma posição militar no Afeganistão seria ideal para cobrir o flanco oriental do Mar Cáspio cujos recursos petrolíferos são cobiçados por todas as potências ocidentais (actualmente, todo o petróleo que sai do porto de Baku no Azerbaidjão tem de passar por território russo). O Afeganistão, enfim, pela sua localização, é uma jóia que os Estados Unidos não podiam deixar perder-se.

A COMUNICAÇÃO SOCIAL E A PROPAGANDA

Um dos mecanismos que mais auxiliou o governo norte-americano na sua tarefa de despertar a histeria, o racismo e a xenofobia necessários para começar a Liberdade Duradoura foi a utilização da propaganda nos meios de informação de massas. A manipulação ideológica que dominou o inconsciente colectivo mundial não acabou nos inícios da década de Noventa com a dissolução da URSS; de facto, aconteceu exactamente o contrário. Como se demonstra desde a hipótese de Francis Fukuyama do “fim da história” (em que se garantia que a democracia liberal e o mercado livre tinham vindo para ficar), até ao Choque de Civilizações de Samuel P. Huntington, os mecanismos propagandísticos norte-americanos estão mais vivos que nunca. O tratamento mediático que se deu aos acontecimentos de 11 de Setembro não foi nem objectivo nem comedido: a intoxicação informativa e as campanhas de desinformação que se utilizaram para acusar Osama bin Laden serviram para avalizar, dentro e fora dos Estados Unidos, as iniciativas bélicas com que a elite norte-americana levaria a cabo os seus projectos geoestratégicos internacionais, a sua política de reactivação económica e os seus projectos de dominação política interna.

A utilização dos meios de comunicação para conseguir objectivos políticos tem uma longa história e existe uma ampla bibliografia a esse respeito. De todos os livros escritos sobre o tema destaca-se o de Edward S Herman e Noam Chomsky, Os Guardiães da Liberdade . Considerados como os paradigmas da imprensa livre, crítica e objectiva, neste texto, Chomsky e Herman põem a nu o apoio que prestaram o New York Times e o Washington Post – entre outros – aos objectivos da administração em serviço, omitindo, exagerando ou distorcendo a informação – conforme o caso – com o objectivo de manter sob controlo a opinião pública doméstica e internacional. No caso que nos ocupa os meios não actuaram de forma diferente, e de facto, não tinham motivos para o fazer, dado que a desinformação e a “manipulação do consenso”
43 por parte dos meios de informação mais importantes têm sido constantes ao longo de toda a história dos EUA de forma quase sistemática e praticamente sem excepção. Existem antecedentes suficientemente importantes a este respeito para avalizar esta afirmação, pois, como muito bem afirma Martha Montaño: “Em matéria de conflitos étnicos e internacionais, enquanto uns são exagerados, como o Iraque, outros correm, talvez a sorte, de ser ignorados. Os curdos na Turquia, oprimidos com violência, são menos importantes que os estabelecidos no Iraque cujo idioma é oficial. O Haití não é mais importante que o Sudão, o maior país da África onde tem lugar a guerra mais esquecida do planeta. Um milhão de mortes no Ruanda numa semana não contaram com a atenção e os recursos que provocaram 200 mil na Bósnia-Herzegovina em três anos.” 44

Para efeitos do presente ensaio centrar-me-ei a título de exemplo em quatro casos particulares: Iraque, Ruanda, Sérvia e Somália. Isto com o objectivo de verificar o tratamento mediático que dão os meios aos acontecimentos internacionais e que também se tornou efectivo desde o primeiro momento nos atentados de 11 de Setembro, que irei analisar também mais adiante.

O Iraque, após a Guerra do Golfo, perdeu muito mais coisas do que o observador não familiarizado com esta questão supõe. Não só perdeu o controlo de mais de metade do seu território com o estabelecimento das chamadas “zonas de exclusão” sob controlo britânico-norte-americano, como também perdeu – e continua a perder – algo muito mais importante: milhões de vidas inocentes. Como já tinha mencionado as sanções impostas ao país por meio da ONU – embora por mandato norte-americano – já provocaram até à data a morte de quase 2 milhões de pessoas por falta de alimentos e medicamentos; ou seja, a “solução” imposta pelos Estados Unidos ocasionou mais mortes de fome e doenças que a quantidade de pessoas que assassinou o próprio Saddam Hussein durante a Guerra do Golfo. Que meio de informação de massas nos Estados Unidos denunciou publicamente de forma reiterada este acto criminoso acusando directamente os responsáveis?. Nenhum. Embora seja certo que Saddam Hussein é um governante atroz, os Estados Unidos mataram directamente no Iraque muito mais pessoas – com bombardeamentos e por meio do bloqueio – que aquele sátrapa a quem acusam de assassino. Quantos “críticos” nos meios denunciaram esta situação? A distorção que tem a opinião pública sobre o que sucede no Iraque tem possibilitado que tanto os comandantes britânicos como os norte-americanos possam afirmar sem rebuço com toda a naturalidade que no Iraque se realizam bombardeamentos “periódicos” sem que ninguém se alarme ou recrimine esta política de extermínio.

Porventura os homens, mulheres e crianças iraquianos que sofrem diariamente este inferno serão mais culpados do que quem morreu no ataque de 11 de Setembro?. Humanamente falando, será mais tolerável a morte de iraquianos inocentes do que a de norte-americanos inocentes? Porque é que o facto de habitualmente morrerem homens, mulheres e crianças no Iraque já não é importante para os meios de informação?. Por uma simples razão: não são estúpidos e também não são suicidas; e é que neste caso os directos responsáveis não são apenas Saddam Hussein e quem o apoia, mas também quem concebe a política exterior dos Estados Unidos para aquele país e os próprios meios de informação.

Deste mesmo teor encontramos outro exemplo importante que é o caso do Ruanda. Na guerra civil do Ruanda entre hutus e tutsis, cerca de um milhão de pessoas destruíram-se principalmente com pedras, paus e catanas no lapso de uma semana. Deste facto hoje já pouquíssimos se recordam, embora o inferno continue: a Amnistia Internacional denunciou que à data se podem contar mais de 2 milhões e meio de mortes relacionadas com a guerra civil. Tal como no caso do Iraque, a situação no Ruanda também não interessou muito os meios de comunicação norte-americanos pela dupla atenuante racista com que funcionam: não só são “negros”, mas também africanos, e por isso estas notícias não fazem subir muito o rating .

Comparado com este inferno sobre a terra, a tragédia – que o foi – de 11 de Setembro parece realmente minúscula, e no entanto o caso do Ruanda não mereceu espaço de maior nas principais cadeias de televisão ou em influentes jornais e revistas. Muitas pessoas de facto, nunca deram pela situação por que passou o Ruanda e que ainda atravessa. Neste caso, os meios de comunicação têm-se comportado como se a tragédia humana que está a ocorrer naquele lugar não existisse, ou como se não fosse minimamente importante.

Tal como em relação ao Iraque, a manipulação dos meios de comunicação é evidente embora de forma diferente. No primeiro caso – o do Iraque – trata-se de habituar o público a uma notícia (o assassínio de iraquianos pelas forças aliadas britânico-norte-americanos) a ponto de ser aceite como coisa natural e sem importância; em contrapartida, no segundo caso – o do Ruanda – a intenção é fazer como se não existissem os factos ignorando-os de propósito para que a opinião pública não lhes preste demasiada atenção dentro da lógica de “olhos que não vêem, coração que não sente”. Os casos aqui expostos são apenas dois dos muitos exemplos com que se pode mostrar a manipulação informativa por parte dos Estados Unidos e seus aliados.

Em contraste com estes exemplos em que os meios fomentam a indiferença e o desconhecimento respectivamente, encontramos a outra face da moeda: a histeria colectiva e a exaltação dos sentimentos excludentes e condenatórios do público que por eles se “informa”. A este respeito convém recordar dois episódios mais que tiveram lugar recentemente: a Sérvia e a Somália.

Ao eclodir o conflito no Kosovo, nos fins da década de Noventa, começou uma campanha militar por parte da OTAN em que se lançaram 3300 mísseis Tomahawk diários sobre Belgrado. Provocou uma destruição praticamente total da capital sérvia matando muitos milhares de inocentes. Isso não preocupou muito os meios de comunicação que preferiram fomentar uma histeria global quando um F-117 Stealth foi derrubado pelas baterias antiaéreas sérvias. A vida dos prisioneiros de guerra norte-americanos foi respeitada e no fim foram devolvidos à sua pátria. Se o ataque da OTAN se fez por motivos “humanitários” para deter as atrocidades que os sérvios cometiam contra os albaneses kosovares porque é que a intervenção da OTAN provocou mais mortos do que os causados pelas forças sérvias? Porque é que nada disto importou aos meios de comunicação que defenderam a OTAN como um paradigma de justiça e valentia? Valerá mais a vida de dois soldados norte-americanos do que a de milhares de sérvios inocentes? Para os meios a resposta é inquestionável: sim.

Uma situação semelhante ocorreu na Somália, quando marines norte-americanos foram assassinados por milicianos locais treinados pela Al-Qaeda; o mundo inteiro consternou-se com as notícias que apresentaram a imprensa escrita e os meios electrónicos pela morte de militares norte-americanos e pelo macabro festejo que realizaram os assassinos pelo facto; no entanto, de todos eles nenhum ergueu a voz para protestar com a mesma veemência pela morte de fome de dezenas de milhares de somalis que por essa altura já haviam ocorrido e que continuam hoje em dia.

Como é evidente, a atitude que tiveram os meios na Sérvia e Somália foi totalmente diferente da que tiveram no Iraque e Ruanda. Tanto na Sérvia como na Somália, os meios de informação de massas conseguiram provocar a consternação mundial ampliando e exagerando de forma desproporcionada as notícias sobre a captura e morte de soldados “ocidentais”, actuação que, como é claro, coincidia com os interesses do governo norte-americano.

Estes fenómenos demonstram uma coisa muito importante: para o público norte-americano – vítima da intoxicação e da desinformação dos seus próprios meios de informação e do seu próprio governo – o que vale não é a vida humana nem as tragédias sociais, mas sim o perigo de que tudo o que tenha barras e estrelas possa ser manchado.

Obviamente, o cidadão comum norte-americano não age assim por natureza, mas fazem-no reagir deste modo, e como? por meio de complexos mecanismos de controlo psicossocial como o foi na sua época o Serviço para a Diplomacia Pública
45 (ODP) durante a administração Reagan. No caso do atentado de 11 de Setembro o novo Serviço para a Diplomacia Pública foram os meios de comunicação. Imediatamente a seguir ao atentado, por todo o mundo circularam imagens da CNN em que se via crianças e mulheres palestinianas “festejando” os acontecimentos de Washington e Nova Iorque. Como é natural, estas imagens feriram no mais profundo a cidadania norte-americana que, agravada, não estava disposta a suportar também a troça. O efeito foi imediato e poucas horas depois dos acontecimentos havia já um consenso quase absoluto na população norte-americana quanto à necessidade de atacar militarmente alguém, fosse quem fosse. Poucos dias após o atentado começou a circular informação indicando que as imagens mostradas pela CNN em que se via o suposto festejo de palestinianos, eram manipuladas. Neste sentido havia duas versões. A primeira afirmava que as imagens eram legítimas, ou seja, as crianças palestinianas e as mulheres de facto festejavam, não o atentado porém, mas a invasão ao Kuwait de 1991 por parte do Iraque. A segunda destas versões dizia que às mulheres e crianças palestinianas pagaram para que festejassem, coisa que fizeram inocentemente (e dizemos inocentemente porque não estavam a par do uso que iriam dar a essas imagens). Após o desmentido oficial da CNN as imagens não voltaram a ser transmitidas e lançou-se um véu de silêncio sobre o assunto. Se as imagens foram adaptadas à circunstância, se toda a cena foi uma montagem, ou se as imagens eram legítimas tiradas de um festejo pela atrocidade do 11 de Setembro já não tem muita importância, tal como também não a tem o facto de essas mesmas imagens não terem voltado a ser transmitidas pois a precoce transmissão das mesmas conseguiu a sua função imediata: indignar e enfurecer o povo norte-americano para avalizar uma resposta militar. Se algum ensinamento deixou aos governantes dos Estados Unidos a guerra de Vietname – com o seu consequente “Síndroma do Vietname” – é que para levar a cabo um acto de agressão duradoura, é indispensável contar com o apoio da opinião pública, para o que é importante a cumplicidade dos meios. Isto é valido não só dentro dos Estados Unidos mas para todo o mundo cristão, onde o que dizem o New York Times , a CNN e o Washington Post é dogma de fé.

OSAMA BIN LADEN E O ´CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES´

Os pilares ideológico-propagandísticos em que se apoiou a elite norte-americana no caso do atentado de 11 de Setembro foram precisamente os expostos por Huntington no seu Choque de Civilizações
46 . De acordo com o professor de Harvard, os próximos conflitos bélicos terão de ser regidos pelas diferenças entre civilizações e não tanto pelos interesses políticos da nações. O conteúdo do texto na sua essência não passa da proposta ideológica de que o inimigo a vencer a partir do fim da Guerra Fria são as civilizações diferentes dado que a sua alteridade atenta contra os “nossos – deles – princípios e valores mais fundamentais”. Essencialmente, e para fins políticos, a proposta de Huntington é que o inimigo a vencer já não são os “comunistas”, mas os “muçulmanos”, visto que, no dizer de Huntington: “as fronteiras do Islão se encontram banhadas de sangue”. De acordo com esta proposta – sempre dentro de um âmbito propagandístico, – de agora em diante, os responsáveis de tudo o que de terrível ocorrer nas relações internacionais pode ser atribuído aos “islâmicos” ( what ever that means ); a partir deste momento já não importa que os “russos” ou os “comunistas” tenham desaparecido com o Império do mal (Reagan), pois já existe um novo bode expiatório que pode justificar a injecção directa de recursos no complexo militar-industrial norte-americano e os projectos bélicos que dele derivem. Embora qualquer analista sério de assuntos internacionais dê aos postulados de Huntington o valor que têm (de mera propaganda), o bombardeamento mediático – quer em filmes, artigos ou comentários de “especialistas” nos meios de informação de massas, – já criou um cerco que, além de ser difícil de evitar, distorceu a percepção da realidade que tem o cidadão comum. Esta é uma campanha de guerra psicológica permanente que lhes tem sido muito eficaz até agora: “os árabes” são a nova ameaça internacional, ergo , temos – todo o mundo cristão – de combatê-los. É à luz destes antecedentes que tem de se estudar o tratamento mediático do atentado e das suas consequências socio-políticas.

Evidentemente, esta propaganda ideológica é para consumo interno – isto é, para todos os países não muçulmanos. Com este fundamento ideológico (intoxicação propagandística), vender ao mundo ocidental a ideia de que os autores dos atentados ao Pentágono e às Torres Gémeas são de origem muçulmana é coisa fácil
47 .

Segundo a propaganda oficial a intervenção no Afeganistão é um meio para alcançar um objectivo , que é acabar com Osama bin Laden. Na realidade, passa-se o contrário: acusar Osama bin Laden é um meio que vai permitir aos Estados Unidos conseguirem os objectivos que vimos. Osama bin Laden foi apontado como presumível responsável do atentado, o que quer dizer que, em primeira instância, não passa de um suspeito ; no entanto, o tratamento que guiou as acções posteriores dos Estados Unidos e seus aliados em relação a bin Laden e à Al-Qaeda não foi o que se daria a um suspeito , mas sim a um culpado . A distinção é importante porque após os acontecimentos que fizeram de bin Laden o homem mais procurado do mundo, os Estados Unidos e seus aliados nunca mostraram nada mais que suspeitas e “provas” tão fracas da sua culpabilidade que a sua utilização para uma condenação num julgamento sério e formal seria ridícula. Isto não quer dizer que o saudita seja um anjo de bondade, só quer dizer que apontá-lo como culpado sem apresentar provas concludentes – como efectivamente ocorreu – é muito fácil, como o é também fazer o público acreditar nisso (coisa que também aconteceu).

Todos os que sem pensar condenam bin Laden não reparam no facto de que, além de ter ligações pessoais-empresariais à família Bush, ele foi também um agente destacado da CIA enquanto se tratou de combater o Império do Mal no Afeganistão. Tal como no passado o governo norte-americano o utilizou contra um amigo externo e depois como inimigo, hoje utiliza-o como bode expiatório para justificar os objectivos internos e de política externa que vimos acima. É certo que bin Laden dirige uma organização terrorista responsável por uma série abundante de graves atentados terroristas; contudo, vale a pena reflectir sobre a conveniência real que teria para bin Laden a realização destes atentados. Quem o rotula de responsável directo da acção de 11 de Setembro omite um dado revelador. A Al-Qaeda, a organização de Osama bin Laden, opera em pelo menos 60 países, dos quais fazem parte o Paquistão e o Afeganistão. Que sentido teria realizar um atentado como o de 11 de Setembro se a reacção imediata dos Estados Unidos seria bombardear o Afeganistão, provavelmente o único país no mundo em que bin Laden teria um refúgio seguro pela sua afinidade com o talibã?. Poder-se-ia alegar que a visão política de bin Laden se limita ao âmbito regional, mas dificilmente poderá ser verdade, se consideramos o alcance internacional que tem a Al-Qaeda. Como alguns analistas chegaram a afirmar correctamente: após o 11 de Setembro, quem quer que seja o autor do atentado, tornou-se imediatamente o melhor aliado dos norte-americanos e o pior inimigo do Islão, pois foi este último que ficou mais prejudicado
48 .

Curiosamente, dentro de um uso excessivo de termos como “fundamentalismo” e “radicalismo” (propagandisticamente utilizados para desqualificar “os muçulmanos”), a posição mais comedida demonstrou-a o talibã e até o próprio bin Laden, sendo eles os “intolerantes muçulmanos radicais fundamentalistas” por excelência. Numa das suas primeiras declarações, Osama bin Laden chegou a garantir que se apresentassem provas – note-se que pediu provas – indicando que foi ele o autor, estava disposto a entregar-se a um tribunal internacional imparcial. Por seu lado, o regime talibã a todo o momento manteve a disposição de negociar para evitar um confronto bélico. Até aqui, tanto a afirmação de bin Laden como a dos talibãs são tudo menos radicais e/ou fundamentalistas. De facto, são propostas por demais racionais que tiveram como resposta a recusa sistemática à negociação por parte dos Estados Unidos e seus aliados, e a agressão sem fundamento contra o povo afegão.

O TRIUNFO

Se a hipótese que me propus defender for correcta – a do auto-atentado – então os factos que ocorreram pouco depois do 11 de Setembro significaram um êxito praticamente absoluto para George W. Bush. Os benefícios para a classe política no poder nos Estados Unidos foram imediatos. Poucas horas depois do atentado foi aprovado quase por unanimidade – só se opôs uma congressista afro-americana – um orçamento de 40 mil milhões de dólares para enfrentar a crise, dos quais 20 mil milhões teriam um uso exclusivamente militar. Esta acção teve diversos resultados:

1) Dava-se por acabado o debate interno entre republicanos e democratas quanto à orientação que deveriam ter as dotações orçamentais. Tem de se recordar que enquanto os democratas pretendiam um orçamento reforçando a política social, os republicanos estavam por um orçamento mais focado nas questões militares e de segurança interna. Como vimos acima, ao perderem os republicanos o controlo absoluto do congresso, era incerta a possibilidade de levarem por diante os sues projectos. Após os atentados, este problema ficou resolvido.

2) Ter disponíveis não menos de 20 mil milhões de dólares prontos para contratos com a industria militar traduz-se, em primeiro lugar, num balão de oxigénio para as firmas ligadas a esta indústria, pois não podemos esquecer que a desaceleração económica que sofriam os Estados Unidos estava prestes a transformar-se numa recessão, que desencadearia como consequência uma crise económica de grandes proporções. Assim, se havia uma indústria que devia ser salva, tinha de ser a militar pela afinidade política que existe entre estas empresas e a ideologia e os antecedentes de George W. Bush e seu gabinete.

3) Ter um cheque em branco de mais de 20 mil milhões de dólares
49 para contratos com as firmas da indústria militar, é sem dúvida uma grande oportunidade para saldar as dívidas eleitorais que contraíram Bush e a sua equipa com estes sectores que abertamente lhes deram todo o apoio durante o período eleitoral. Assim, resolvido o problema do congresso e da falta de fundos para gastos militares, não há razão para não saldar as dívidas da campanha.

4) Intervir militarmente no Afeganistão é a ponta de lança do que posteriormente pode ser assegurar as fontes energéticas do Mar Cáspio.

5) O choque psicológico que foi para o povo norte-americano ver em todos os canais de televisão como se desmoronaram as Torres Gémeas e como se encontrava ferido o centro do seu poder militar; além de observar com raiva como se “festejava” na Palestina, foi demasiado, embora positivo para os projectos intervencionistas dos republicanos, dado que assim se superava –embora de forma transitória – o chamado “Síndroma do Vietname”, isto é, a oposição de um povo a empreender uma guerra de agressão contra uma nação mais fraca. Este problema vinha-se arrastando desde a década de Setenta, mas após o atentado o “Síndroma do Vietname” foi superado pelos sentimentos racistas, xenófobos e patrioteiros (que não patriotas) que o governo – através dos meios de comunicação – conseguiu despertar na sua população.

6) A restrição das liberdades civis como medida de “segurança”, que foi implementada por George W. Bush, deu carta branca às agências de segurança e espionagem política para fazer praticamente o que quiserem dentro dos Estados Unidos. Após os atentados e de acordo com as novas disposições, nesse país basta só a suspeita de terrorismo para dar a qualquer agente de segurança norte-americano a faculdade de deter qualquer pessoa por mais de 72 horas – para ser interrogada – sem a obrigação de a apresentar perante um juiz; igualmente, esta mesma suspeita de terrorismo abre a possibilidade de revistar o domicílio de qualquer pessoa sem necessidade de ordem de busca; e também se aprovaram disposições jurídicas para julgar pessoas suspeitas em segredo e condená-las até mesmo à pena capital na sua ausência e sem o seu conhecimento. A aplicação de todas estas medidas de corte fascistóide acarreta o perigo de poderem ser utilizadas como mecanismos de repressão da dissidência política interna com a desculpa do combate ao terrorismo.

7) Finalmente, a coragem popular do povo norte-americano – justificada sem dúvida, apesar de manipulada politicamente – exigia uma resposta rápida e contundente de George W. Bush, pelo que era a oportunidade perfeita para o novo presidente se legitimar perante uma sociedade que não votou nele e que, de facto, não acreditava nele como presidente. O ataque ao Afeganistão é uma acção a todos os títulos de violação não só dos direitos humanos mais fundamentais mas também contrária aos princípios mais básicos do direito internacional estabelecidos na carta das Nações Unidas. Esta acção permitiu a Bush demonstrar a ferocidade de que era capaz “para defender a pátria” tentando a Justiça Infinita primeiro, e Liberdade Duradoura depois. Para além da retórica, a guerra de agressão empreendida contra o Afeganistão permitiu a George W. Bush obter do seu público interno a legitimidade que não conseguiu nas urnas.

Como se pode observar, a resposta que deu a elite norte-americana à crise originada pelo atentado coincide totalmente com as necessidades políticas internas e externas da classe política no poder. É por isso que convém reafirmar o que já se exprimiu acima: quem quer que tenha sido o responsável pelos atentados em Washington e Nova Iorque fez um grande favor ao regime de George W. Bush e aos sectores mais conservadores da classe política norte-americana. Foram eles os beneficiários absolutos de um atentado que ao Islão e seus seguidores em geral não lhes trouxe nada de bom em nenhum sentido.

CONCLUSÕES

Por tudo o que vimos, podemos tirar uma série de conclusões que, sem serem definitivas (teriam de ser avalizadas pelos acontecimentos futuros), podem servir como referência para descodificar o atentado de 11 de Setembro e a posterior agressão ao Afeganistão como o que de facto são: lições de real politik .

  1. Os Estados Unidos responderam a um acto de terrorismo com meios terroristas totalmente proibidos pela legislação internacional, facto pelo qual se colocam – eles e quem os apoia – à mesma altura de quem cometeu o atentado de 11 de Setembro.
  2. O apoio das nações às operações militares no Afeganistão responde a interesses de classe no caso dos países ricos, a medo no caso das nações pobres, e a interesses de estabilização política no caso dos países da Ásia Central, e a Rússia e China em certa medida.
  3. Os antecedentes da política externa norte-americana fizeram-nos crer na possibilidade real de serem objectivo de atentados terroristas de grande envergadura. Devido a muitos países terem sido agredidos e sofrido violações severas aos seus direitos humanos, esses mesmos países poderiam ser suspeitos da autoria dos atentados de 11 de Setembro; contudo nenhum deles tem capacidade real para organizar e executar um golpe com as características do ocorrido a 11 de Setembro.
  4. A participação das mais altas esferas do poder norte-americano na realização dos atentados de 11 de Setembro é um requisito incontornável para a execução de um atentado como o que teve lugar nessa data, enquanto nenhum grupo isolado – ou inclusivamente com o apoio de algum Estado – teria a capacidade por si só de executá-lo tal como foi. Por outras palavras, a cumplicidade interna a altos níveis resulta indispensável.
  5. As condições políticas internas bem como o contexto internacional que rodearam o atentado são antecedentes que, juntamente com as vantagens que traz a médio e longo prazo a “vingança” contra os “terroristas” no Afeganistão, são importantes pois demonstram que a elite norte-americana tinha motivos políticos reais e de peso para montar um auto-atentado, como já aconteceu no passado. Além de que a natureza do governo em funções reforça esta possibilidade como uma opção real.
  6. O facto de não se terem dado a conhecer provas juridicamente concludentes que sirvam para demonstrar a culpabilidade de Osama bin Laden e da sua organização Al-Qaeda, e de já se ter empreendido uma acção militar – que juridicamente se pode interpretar como uma guerra de agressão, – reforçam a tese de que os Estados Unidos não procuraram culpados mas sim bodes expiatórios que lhes permitam fazer o que deviam fazer para preservar o status quo . Por outras palavras, não se procurou quem a fez, mas quem a pague; e não para executar uma “vingança” mas para conseguir, com maior facilidade, os objectivos políticos da nova administração dos Estados Unidos.
  7. Os meios de informação serviram de idóneo mecanismo para despertar sentimentos de xenofobia, racismo, chauvinismo e mesmo de atitudes neofascistas ao fazerem uso sistemático da desinformação e da intoxicação informativa por meio de estímulos propagandísticos baseados nos esquemas estabelecidos por Samuel P. Huntington para o pós-guerra fria. Dentro destes esquemas, Osama bin Laden era muito fácil de vender como culpado independentemente de ser o verdadeiro culpado ou não.
  8. As características políticas presentes na região da Eurásia fazem do Afeganistão uma jóia em termos geopolíticos. A sua localização e a possibilidade de estabelecer um complexo militar norte-americano no Afeganistão, faziam deste país a chave para o controlo geopolítico e geoeconómico da região; assim, o ataque e o – muito provável – controlo do Afeganistão por parte dos Estados Unidos coincide com os seus objectivos e as suas estratégias de domínio de recursos e de contenção dos seus adversários políticos na região.
  9. A agressão da aliança militar mais poderosa da história contra um dos países mais pobres do globo não é coisa nova e tem como objectivo, além do controlo regional, o aviso às nações do terceiro mundo por parte das nações ricas: como ocorreu na Nicarágua, Guatemala e Vietname entre outros, que o terceiro mundo não pode nem deve fazer nada que não coincida com os interesses das nações do primeiro mundo sem correr o risco de ser agredido por este.
  10. Os sectores mais duros e conservadores da elite política nos Estados Unidos foram os mais beneficiados pelos acontecimentos de 11 de Setembro, do mesmo modo que também os sectores mais duros dos grupos anti-norte-americanos resultaram beneficiados. Os mais prejudicados foram os sectores moderados e racionais, assim como o direito internacional e todos os avanços que se tinham conseguido como os princípios de resolução pacífica das controvérsias e de proscrição da ameaça internacional.
  11. A forma como ocorreram os acontecimentos de 11 de Setembro, os antecedentes que gravam sobre o governo norte-americano, a natureza da administração que está actualmente em funções, o comportamento que teve a administração Bush perante a crise e as oportunidades que a curto, médio e longo prazo trouxeram consigo as tragédias de Washington e Nova Iorque são elementos suficientes para afirmar que o que se exibe como um atentado foi na realidade um auto-atentado .
  12. A lógica que pode explicar as guerras e o que é conhecido como “terrorismo” no Século XXI não é muito diferente da que se aplica para entender os mesmos fenómenos no Século XX: os ricos contra os pobres, os fortes contra os fracos e os que têm mais do que querem contra os que não sabem sequer se se têm a si próprios.

BIBLIOGRAFIA E HEMEROGRAFIA
LIVROS
  • BRZEZINSKY, Zbigniew, The Grand Chessboard, Edit. Basic Books, New York, 1997.
  • CHOMSKY, Noam & Herman, Edward S. Los Guardianes de la Libertad, Edit. Grijalbo Mondadori, España, 1995.
  • The New Military Humanism: Lessons From Kosovo, Edit. Common Courage Press, New York, 1998.
  • Lo Que Realmente Quiere el Tio Sam, Edit. Siglo XXI, México, 1997.
  • Como Mantener a raya a la Plebe, Edit. Siglo XXI, México, 2001.
  • DIETERICH, Heinz , Cuba ante la Razón Cínica, Edit. Nuestro Tiempo, México, 1994.
  • EU y el Terrorismo Internacional, Edit. Plaza e Valdez, México, 1988.
  • Identidad Nacional y Globalización; La Tercera Vía; Crisis en las Ciencias Sociales, Edit. Nuestro Tiempo, México, 2000.
  • FERNÁNDEZ. M., Jorge , Narcotráfico y poder, Edit. Rayuela, México, 1999.
  • GARCÍA R., Miguel & OJEDA F. Djalma , El Nuevo Orden Petrolero Global: El Mercado en Manos de los Monopolios, Edit. Media Comunicación, México, 1999.
  • GONZÁLEZ J., Mónica & SÁNCHEZ R., Pablo T. Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo, Edit. Quimera, México 2001.
  • GUTIÉRREZ DEL CID, Ana Teresa , Rusia y Estados Unidos en la Posguerra Fría, Edit. UAM-X, México, 2000.
  • Rusia en la Era de Vladimir Putin y el Conflicto Checheno, Edit. Quimera, México, 2001.
  • HUNTINGTON, Samuel P. , El Choque de Civilizaciones y la Reconfiguración del Nuevo Orden Mundial, Edit. Piados, México, 1998.
  • JALIFE-RAHME, Alfredo , El Lado Obscuro de la Globalización: Post-Globalización y Balcanización, Edit. Cadmo & Europa, México, 2000.
  • Guerras Geoeconómicas y Financieras: Del Golfo Pérsico al Golfo de México, Edit. Niza, México, 1997.
  • KLARE, Michael T. & KORNBLUH, Peter , Contrainsurgencia, Proinsurgencia y Antiterrorismo en los 80´s, Edit. CONACULTA, México, 1995.
  • KURNITZKY, Horst. (comp.) , Globalización de la Violencia, Edit. Colibrí, México, 2000.
  • MARCHETTI, Victor & MARKS, John D. , La CIA y el Culto del Espionaje, Edit. Euros, España, 1975.
  • MONTIEL T., Fernando & DIETERICH, Heinz, Geopolítica y Globalización en México y América Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés, Edit. Quimera, México, 2002.
  • PEARSONS, Frederic S. & ROCHESTER, J. Martin , Relaciones Internacionales: Situación Global en el Siglo XXI, Edit. Mc.Graw Hill, México, 2000.
  • SÁNCHEZ R. Pablo T. , Rusia: Un Futuro Incierto, Edit. Rus, México, 1998.
  • V., Modesto , Derecho Internacional Público, Edit. Porrúa, México, 1998.
  • SHOULTZ, William , Estados Unidos y la Red Internacional de Terrorismo de Estado, Edit. Prisma, Chile, 1990
  • VARGAS Ll., Alvaro , En el Reino del Espanto, Edit. Grijalbo, México, 2000

INSTITUTOS
  • Federation of American Scientists (http://www.fas.org)
  • Stockholm Institute Peace Research Institute (http://www.sipri.se)
  • Organização das Nações Unidas (http://www.um.org)

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NOTAS
  • 24) Obviamente podemos deixar de considerar que em muitos casos a “violência” de que se acusa estes Estados é infinitamente menor do que a que exerce diariamente contra eles o seu acusador, ou até a própria acusação é infundada.
  • 25) Com efeito, após a catástrofe, o governo cubano ofereceu todo o auxílio em pessoal médico que os Estados Unidos viessem a requerer para lidar com a crise. A atitude poderá parecer paradoxal perante o recorde de “assistência” humanitária que têm tido os governos norte-americanos para com a ilha, mas não é assim. O governo cubano compreende que pelos crimes de uma elite política criminosa e agressiva nos Estados Unidos, não há motivo para negar auxílio à população que ela governa. Isto em poucas palavras chama-se coerência e decência política.
  • 26) Além de não podermos esquecer o facto de que após um atentado como o que nos ocupa, o lógico seria um recrudescimento das penúrias e das carências só pela suspeita de participação.
  • 27) A perfeição com que foi executado o atentado implicaria um prolongado e complicado plano, assim como a disposição de recursos humanos e tecnológicos que com dificuldade adquiriria um rogue state .
  • 28) Embora oficialmente tanto o Mossad como a CIA sejam agências de informação e/ou espionagem, em termos reais encaixam-se sem nenhum problema como grupos terroristas também. Factos como os assassínios de militantes palestinianos efectuados pelo Mossad por ordem de Golda Meier assim o comprovam. O mesmo é válido para a CIA , que juntamente com a DINA chilena facilitou o assassínio de Orlando Letelier na cidade de Washington após o golpe militar que custou a vida a Salvador Allende em 1973. De facto, no libro La CIA y el Culto del Espionaje , Victor Marchetti e John D. Marks (ex-agente da CIA e ex-funcionário do Departamento de Estado respectivamente) concluem que a CIA, mais que uma agência de espionagem tem funcionado como uma agência de intervenção, enquanto a sua função principal é: “...a promoção da política exterior do governo dos Estados Unidos utilizando meios encobertos e frequentemente ilegais... trata de favorecer o papel dos Estados Unidos – papel que estes se atribuíram a si mesmos – como árbitro dominante nas transformações políticas, económicas e sociais que experimentam os países da Ásia, África e América Latina...” (Marchetti, Victor & Marks, John D., La CIA y el Culto del Espionaje , Edit. Euros, España, 1975, p. 32). Apesar de estas palavras terem sido escritas nos tempos da Guerra Fria, hoje, mais de 25 anos depois, não perderam a sua validade.
  • 29) Contudo, estas organizações podem ser as responsáveis pelos ataques com antrax que se registaram a seguir ao 11 de Setembro, pois ao contrário dos atentados contra o Pentágono e o World Trade Center, cultivar antrax não é difícil nem requer grande preparação técnica e logística.
  • 30) De facto, a relação entre bin Laden e a elite norte-americana chegou a tal ponto –particularmente com a família Bush – que até a própria família do actual presidente dos Estados Unidos chegou a travar negócios com a família do saudita.
  • 31) O sudeste asiático, a América Central e América do Sul são eloquentes exemplos a esse respeito. A bibliografia é ampla, ver Schoultz, William, Estados Unidos y la Red Internacional de Terrorismo de Estado , Edit. Prisma, Chile, 1986 e Chomsky, Noam & Herman, Edward, Los Guardianes de la Libertad , Edit. Grijalbo-Mondadori, España, 1995, entre outros.
  • 32) Tanto os “comunistas” como os “terroristas muçulmanos” não são mais que mecanismos linguísticos de propaganda que permitem ao polícia do mundo perseguir, atacar e até matar quem quer que se oponha às ordens da classe dirigente, sejam estes sindicalistas, líderes estudantis ou defensores dos direitos humanos ou ecologistas. Isto é natural dado que no dizer de Edward S. Herman: “O actual governo de Washington achou possível designar arbitrariamente como “terroristas” qualquer grupo ou país que se lhe oponha e isto é transmitido ao público pelos meios de informação de massas sem ser submetido a crítica séria ou provocar o riso... Na sua manipulação semântica de terrorismo e de outras palavras relacionadas, os Estados Unidos e os seus porta-vozes intelectuais têm de utilizar uma série de artifícios para diferenciar os amigos e a si próprios dos terroristas”. (Herman, Edward S., El Patrocinio Estadounidense del Terrorismo Internacional. Un Examen General , in E.U. y el Terrorismo Internacional , Dieterich, Heinz (comp.) Edit. Plaza e Valdéz, México, 1988. p. 70-71).
  • 33) Fernández M., Jorge, Narcotráfico y poder , Edit. Rayuela, México, 1999. p. 19-20.
  • 34) Dieterich, Heinz, El ALCA y el Plan Colombia: Por el Control de América Latina , en Geopolítica y Globalización en México y América Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés , Montiel T., Fernando & Dieterich, Heinz, (coordenadores), Ed. Quimera, México 2001.
  • 35) Ex-diplomata cubano. Especialista em política russa.
  • 36) Sánchez, Pablo T., El Conflicto en Chechenia , en Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo , González, Mónica & Sánchez, Pablo T., (coord.), Edit. Quimera, México 2001, p. 107. (O sublinhado é nosso.)
  • 37) Não é de estranhar o espírito belicoso de Sharon; basta recordar que, como membro destacado do Partido de ultradireita Likud, tem participado em todas as conflagrações bélicas que enfrentou o Estado de Israel – a ponto de estar a perder o ouvido – desde a sua criação por mandato norte-americano imediatamente após o fim da Segunda Guerra Mundial. Sharon é também o directo responsável pelas matanças nos acampamentos de refugiados de Sabra e Shatila na década de Oitenta em que milhares de pessoas inocentes perderam a vida.
  • 38) A “globalização” é a característica principal do sistema internacional e assenta numa nova divisão internacional do trabalho que afecta todas as esferas da vida humana: política, economia, cultura, etc.
  • 39) Zbigniew Brzezinski (ex-conselheiro de Segurança Nacional na administração Carter) chegou a denominar a região da Ásia Central como “Os Balcãs Euro-asiáticos” denotando assim a complexa composição étnico-religiosa que prevalece na região e que a transforma num barril de pólvora político que a médio prazo poderá incendiar-se pelos interesses que se cruzam na região. (Brzezinski, Zbigniew, The Grand Chessboard , Edit. Basic Books, New York, 1997. p. )
  • 40) Nesta região também temos de considerar que existe um grande potencial petrolífero que não tem podido ser explorado porque: “...se carece de infra-estruturas de comunicações... além de se poderem manter fechadas por causas políticas ou questões técnicas...” (García R., Miguel & Ojeda F. Djalma., El Nuevo Orden Petrolero Global: El Mercado en Manos de los Monopolios , Edit. Media Comunicación, México, 1999. p 20).
  • 41) O perigo é tão real que, como produto destes acordos, o exército russo tem colocados cerca de 20 mil soldados na fronteira entre o Tadjikistão e o Afeganistão para conter o expansionismo islâmico (Gutiérrez del Cid, Ana Teresa, Rusia en la Era de Vladimir Putin y el Conflicto Checheno , Edit. Quimera, México 2001).
  • 42) Salvo o Irão, embora haja relatórios da CIA a considerar que para 2002 teria a possibilidade real de o desenvolver. Ao clube nuclear tem de se acrescentar Israel, país que, embora não a tenha reconhecido de forma aberta e oficial, a sua capacidade nuclear é de todos conhecida. De acordo com o Dr. Alfredo Jalife: “Segundo um documento secreto do Departamento de Energia dos EUA... Israel é a sexta potência nuclear mundial. O documento proclama que Israel dispõe de 300 a 500 kgs. de armas carregadas de plutónio, susceptíveis de ser transformadas em 250 ogivas nucleares...” (Jalife-Rahme, Alfredo, El Lado Obscuro de la Globalización: Post-Globalización y Balcanización , Edit. Cadmo & Europa, México, 2000, p. 193). A razão por que é sistematicamente negada esta capacidade nuclear tanto pelo governo dos Estados Unidos como pelo israelita é porque: “...a legislação sobre ajuda estrangeira de 1977 proíbe fundos a qualquer país que secretamente produza armas nucleares”. (Chomsky, Noam, Lo Que Realmente Quiere el Tio Sam , Edit. Siglo XXI, México, 1997. p 75-76). Assim, negar a capacidade nuclear israelita permite aos Estados Unidos continuar a apoiá-los.
  • 43) Manufacturing Consent é o título original com que foi publicado Los Guardianes de la Libertad . O título deriva de um texto escrito por Walter Lippman em que se aborda a criação artificial do consenso popular através dos meios de informação.
  • 44) Montaño, Martha, Abkhazia: País Desconocido, Conflicto Oculto , em Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo , González, Mónica & Sánchez, Pablo T. (coord.), Edit. Quimera, México, 2001. p. 111.
  • 45) Este serviço era o encarregado de conseguir o apoio popular da sociedade aos actos de terrorismo de Estado que patrocinavam os Estados Unidos contra a Nicarágua na década de Oitenta.
  • 46) Daí que não seja estranho que pouco depois do atentado, os exemplares do livro disponíveis em todas as livrarias começassem a ostentar uma cinta promocional que dizia: “O livro mais citado após os atentados de 11 de Setembro” como se o livro tivesse antecipado que iria suceder uma coisa assim. O livro tem fins propagandísticos e nada mais, visto que no dizer do Dr. Heinz Dieterich (citando Huntington) ”o presente livro não é nem tem pretensões de ser uma obra de ciências sociais” e então o Dr. Dieterich interroga-se: “Se o Choque de Civilizações não é uma obra de carácter científico, conforme certifica o próprio autor, então a que género pertence? Se alguém se der ao incómodo de ler as quase quatrocentas páginas, a resposta é óbvia: trata-se de uma obra propagandística imperial, carente de rigor e valor científico...” (Dieterich, Heinz, Identidad Nacional y Globalización; La Tercera Vía; Crisis en las Ciencias Sociales , Edit. Nuestro Tiempo, México, 2000. p. 51).
  • 47) Além disso devemos ter em conta que Osama bin Laden é o saudita milionário dono e senhor de uma perigosíssima rede terrorista internacional, ou seja, o “mau perfeito” para uma sociedade dominada pelos estereotipos de Hollywood.
  • 48) Obviamente desta afirmação ficam excluídos os grupos militantes radicais do Islão. (Para mais informação a este respeito ver os ensaios de Noam Chomsky e de Heinz Dieterich neste mesmo volume).
  • 49) Este montante não é pequeno e é importante destacá-lo pois é 15 vezes superior ao conferido ao Plano Colômbia – posteriormente rebaptizado como Iniciativa Andina – cujo alcance não é regional (cone sul) mas continental. Para este Plano foram atribuídos 1.300 milhões de dólares que irão ser utilizados em mais de 80% para questões exclusivamente militares, embora o Plano seja apresentado como um projecto predominantemente social. Para saber mais a este respeito ver de Heinz Dieterich La Cuarta Vía al Poder: Venezuela, Colombia, Ecuador e Geopolítica y Globalización en México y América Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés , Montiel, Fernando & Dieterich Heinz (coords.) ambos publicados por Edit. Quimera, México 2001.

    (*) Analista. Director Editorial da Editorial Quimera, do México. Co-autor, coordenador e editor do livro "Geopolítica y Globalización en México y América Latina: Del ALCA a los Acuerdos de SanAndrés" .

    Este texto encontra-se em http://resistir.info
  • 01/Jun/02