Capítulos do livro
"Una hipótesis macabra:
el autogolpe como mecanismo de política exterior"
Fernando Montiel T.
(*)
Tradução de José Colaço Barreiros
QUEM FOI?
À primeira vista, parece importante perguntar quem é o
responsável pelos acontecimentos de 11 de Setembro; contudo, não
o é. Para efeitos práticos, independentemente de quem tenha sido
o responsável, a evolução que tiveram os factos
favoreceram em termos absolutos a elite governante norte-americana, como
veremos mais adiante. Mesmo assim, convém explorar, nem que seja de
forma muito concisa, as diferentes hipóteses que se levantam em
relação à autoria desse facto, pois como se tem visto,
estão a fazer pagar os justos pelos pecadores. O leque dos suspeitos
poderá ser formado pelos seguintes elementos:
1) os
rogue states
,
2) grandes grupos terroristas formalmente estabelecidos,
3) grupos terroristas marginais,
4) grupos norte-americanos de ultradireita,
5) o próprio governo norte-americano,
6) a combinação de alguns dos anteriores.
Dentro do primeiro grupo colocaríamos países como o Irão,
o Iraque, a Líbia, a Síria ou a Coreia do Norte, pois são
dos países que mais têm sofrido as agressões da
política externa norte-americana e muitos deles com efeito têm
patrocinado actos terroristas
24
. O princípio lógico em que assenta uma acusação
contra algum dos
rogue states
seria o seguinte: como são alguns dos países que têm sido
mais agredidos pelos Estados Unidos, é lógico pensar
que seriam os primeiros interessados em orquestrar represálias. Este
é um sofisma que só é válido e eficiente para fins
propagandísticos, não na realidade. Em primeiro lugar porque se
parte da ideia de que todos os países actuam em função da
vingança, pressuposto que só encontra apoio num dito popular
Os chacais julgam todos seus iguais; e em segundo lugar a realidade
que sofre a maior parte destes países pelas políticas que contra
eles tem implementado o império, impossibilitam-nos materialmente da
realização de um atentado como o que nos ocupa. É
significativa a análise de dois casos para demonstrar que nem todos os
países actuam em função da vingança, nem os
acusados lógicos poderiam organizar materialmente com
facilidade um atentado como o de 11 de Setembro. Primeiro: países como
Cuba ao contrário dos Estados Unidos têm-se
distinguido pela solidariedade e pela integridade moral da sua política
externa apesar da agressão de que têm sido objecto: para o regime
cubano a vingança contra os Estados Unidos por mais de 40
anos de terrorismo sistemático que além de seiscentas
tentativas de assassínio do seu presidente, incluem atentados de
carácter químico e bacteriológico não tem
lugar nos seus projectos políticos
25
.
Segundo: como exemplo, é significativo o caso de Iraque. O antigo aliado
dos Estados Unidos hoje sofre represálias brutais por parte dos
antiterroristas. Para amostra basta um dado: no Iraque, de 1991
até agora morreram mais de milhão e meio de homens, mulheres e
crianças de fome e de doenças curáveis, devido ao
bloqueio organizado pelos Estados Unidos e imposto pelas
Nações Unidas.
Análogos são os casos da Líbia, Síria e Coreia do
Norte, embora, com as suas respectivas particularidades, é claro. Em
síntese, o que vemos é que os Estados violentos
dificilmente poderiam ter planeado e realizado o ataque de 11 de Setembro visto
que são Estados que, embora seja certo que não lhes faltam
motivos para organizar uma coisa assim, estão altamente vigiados pelos
serviços secretos norte-americanos, britânicos e israelitas. Se a
esta situação acrescentarmos o facto de sofrerem graves
penúrias sociais e económicas e que além disso têm
carência de praticamente tudo o que se puder imaginar
26
, daí resulta que para eles a organização e
realização de um acto como o de 11 de Setembro se mostra quase
impossível
27
.
No segundo grupo entrariam organizações terroristas estabelecidas
dentro da definição dogmática que se tem do termo
como o
Setembro Negro
dos palestinianos, o
IRA
irlandês ou o
Terrorismo contra Terrorismo
judeu. Evidentemente, muitos destes grupos são apoiados por Estados
(como seria o caso da
Al Fatah
, apoiada pela Organização para a Libertação da
Palestina) mas isso não sucede em todos os casos, pelo que existe a
possibilidade de tais grupos actuarem por conta própria. Neste caso, a
realização de um acto como o ocorrido contra as Torres
Gémeas e o Pentágono ainda é mais difícil, porque a
infra-estrutura e os recursos de que se dispõem são muito mais
limitados. De facto, tecnicamente, para um grupo civil terrorista
organizar algo desta envergadura sem apoio estatal implica um grau de
dificuldade quase intransponível, tornando praticamente
necessária a intervenção, se não de um Estado como
tal, pelo menos de uma agência semi-estatal como o
Mossad
ou a
CIA
28
.
No terceiro grupo encontraríamos todas as organizações
minúsculas mas radicais dispostas a realizar um atentado com os
resultados que teve o de 11 de Setembro. Argumenta-se que alguma destas
organizações poderia ser a responsável porque, como os
serviços secretos norte-americanos se encontram concentrados nas
organizações terroristas estabelecidas, então estas
pequenas organizações não são tão vigiadas
pelo que poderiam, num dado momento, ter o espaço suficiente para
organizar um atentado deste tipo, espaço que de facto lhes forneceria a
sua própria relativamente insignificante existência.
Parece-nos que esta mesma limitação a
insignificância da organização tornaria
impossível a realização de algo como o ocorrido a 11 de
Setembro, para cuja realização foi necessário um
planeamento especializado por um longo período de tempo
provavelmente anos além de uma logística que só os
especialistas são capazes de desenvolver. Assim, qualquer
organização incluída neste terceiro grupo se pode eliminar
de antemão
29
.
Se pegarmos no caso de Timothy McVeigh como antecedente, surge a possibilidade
de o autor do atentado de 11 de Setembro ter sido um dos tantos grupos da
ultradireita norte-americana que integram o quarto ponto que temos vindo a
definir.
Contudo, neste caso, a opção parece remota pela complexidade que
implica o desvio coordenado de quatro aviões nos Estados Unidos, visto
que definitivamente não é a mesma coisa realizar uma
operação deste tipo e pôr uma bomba diante de um
edifício. Em certa medida, as limitações analisadas acima
para o caso dos grupos terroristas estabelecidos e dos marginais, aqui
também se tornam efectivas, e mais ainda, até se agudizam. Assim,
também podemos eliminar a possibilidade de algum dos integrantes do
quarto grupo ter planeado e realizado por sua conta e risco e sem
assistência estatal ou semi-estatal os atentados contra as Torres
Gémeas e contra o Pentágono.
A HIPÓTESE DO AUTOGOLPE
Na primeira metade do século XIX o orgulho da armada norte-americana, o
Couraçado Maine
, foi afundado, provocando assim a guerra entre os Estados Unidos e o
Império Espanhol. Os Estados Unidos ganharam a guerra, o que lhes
permitiu alargar o seu domínio a Cuba, ao resto das Antilhas e
até às Filipinas. Com o tempo veio a descobrir-se que a
acusação contra o Império Espanhol de ter atacado o navio
norte-americano era infundada, pois foram os próprios Estados Unidos que
afundaram a embarcação com o objectivo de declarar a guerra ao
Império e assim tornar realidade a tese da
Gravitação Política expressa por John Quincy
Adams em 1823. A história repetiu-se no século XX em 1941 quando
os serviços secretos norte-americanos, depois de decifrarem o
Código Púrpura dos
japoneses, informaram o Presidente Roosevelt do iminente ataque a Pearl Harbor.
Roosevelt, sabendo o que iria acontecer, permitiu o ataque e assim conseguiu
entrar na Segunda Guerra Mundial, de que os Estados Unidos saíram sem um
único ataque ao seu território e como uma potência
económica ímpar perante uma Europa devastada. Este foi um crime
por omissão: podia ter-se feito alguma coisa mas não se fez, pelo
que existe uma corresponsabilidade nos factos. Igualmente, a 1 de Dezembro de
1981 se pôs em acção por uma ordem secreta de Ronald Reagan
a operação que pretendia vender armas ao Irão para
financiar os
Contras
nicaraguenses. Nesta operação estavam implicadas diversas
personagens do narcotráfico internacional e era organizada
logisticamente pela
CIA
. Isto significava apoiar com armamento um governo abertamente declarado por
Reagan como violento e terrorista, com o que,
paradoxalmente, se oficializava
de facto
o apoio a um governo inimigo dos Estados Unidos... pelos Estados
Unidos. Tecnicamente este pode ser considerado um auto-atentado com o objectivo
de conseguir um bem maior: derrotar o governo popular da Frente Sandinista de
Libertação Nacional (FSLN) após a morte de Anastasio
Somoza. Os três episódios aqui descritos têm uma constante:
a participação directa como no primeiro e no terceiro
casos expostos ou indirecta como no segundo dos Estados
Unidos nesses episódios de agressão. Não
são os únicos, mas só alguns dos mais significativos.
Estes antecedentes são de facto provas da possibilidade real de os
acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 não terem sido precisamente um
atentado
, mas antes um
auto-atentado
. A favor deste cenário temos o facto de que, se foi o governo
norte-americano o responsável pelo ataque terrorista, então o
problema da dificuldade técnica de organizar o golpe fica resolvido. Com
um orçamento de cerca de 30 mil milhões de dólares anuais,
torna-se difícil que mais de uma dúzia de serviços
secretos norte-americanos não pudessem detectar o planear de um atentado
desta envergadura, e no entanto, com esse mesmo orçamento poder-se-ia
muito bem coordenar um golpe como o que sofreram as Torres Gémeas e o
Pentágono.
Por outro lado, temos o facto de estar na própria essência de um
atentado terrorista o influir na evolução de um acontecimento ou
de um processo político específico. Com este objectivo, enquanto
o atentado ao Pentágono parece ter tido um conteúdo mais
simbólico que homicida, o ataque às Torres Gémeas tem uma
componente simbólica o facto de nessas torres se encontrarem os
escritórios do World Trade Center embora seja mais poderoso o seu
conteúdo homicida: aproximadamente 4 mil pessoas perderam a vida. Neste
ponto é conveniente determo-nos por um momento e distinguir o que
aconteceu do que poderia ter acontecido.
Se considerarmos que nas Torres Gémeas trabalhavam de base não
menos de 50 mil pessoas, será esta a quantidade mínima de pessoas
que eram vítimas potenciais do atentado quantidade a que se
deveria acrescentar o número médio de visitantes e
então temos de perguntar-nos porque morreram cerca de 6 mil pessoas e
não mais de 50 mil?. A resposta é simples: pelo modo como foi
realizado o atentado. O primeiro avião chocou contra uma das torres
praticamente na parte mais alta por volta das 8:30 da manhã. Este facto
que primeiro se pensou ter sido um acidente provocou a
evacuação imediata do pessoal que já se encontrava nessa
torre. Cerca de 18 minutos depois choca o segundo avião na parte mais
baixa do terço mais alto da segunda torre e é então que se
torna claro que não é um acidente, mas um atentado. Cerca de 30
minutos depois, desmoronam-se ambos os edifícios.
Perante tal estado de coisas, são válidas três perguntas:
1) porque chocaram os aviões na parte superior dos edifícios e
não na parte mais baixa possível?
2) porque chocaram os aviões com 18 minutos de diferença e
não ao mesmo tempo?
3) porque se realizou o atentado às 8:30 da manhã e não,
por exemplo, à uma da tarde?.
Se se tivessem cumprido estas três condições a quantidade
de vítimas teria significado uma tragédia humana para os Estados
Unidos superior à que lhes significou a morte de 60 mil soldados na
guerra do Vietname. Se os aviões tivessem chocado contra as Torres
Gémeas um a seguir ao outro com poucos minutos de diferença, ou
quase ao mesmo tempo, na parte mais baixa possível dos edifícios
à 1 da tarde e não às 8:30 da manhã quando
ainda mal começaram a chegar os trabalhadores e se encontram fechados os
escritórios e muitos dos estabelecimentos comerciais os
edifícios teriam ruído de imediato sem dar tempo a serem
evacuados e no momento em que se encontravam saturados de pessoas. Se o
perpetrador já se tinha dado ao incómodo de desviar não
um, nem dois, mas quatro aviões comerciais em território
norte-americano apanhando de surpresa todos os serviços de espionagem e
segurança, é inexplicável que não tivesse podido
cumprir as três condições acima expostas, relativamente
simples considerando a dificuldade que implicava o planear o desvio e a
execução do atentado em si; sem dúvida, para a
lógica de um atentado terrorista convencional, 50 mil mortes teriam sido
preferíveis a 6 mil. Assim, no caso de o ataque ter ocorrido do modo
como foi planeado, então quase poderemos dizer que se procurou ocasionar
a menor quantidade de mortes o que nem por sombras significa que tenham
sido poucas da forma mais espectacular possível (isto
explicará que não tenha sido de noite).
Nesta altura e já entrando em pleno na tese do auto-atentado, as
perguntas a que é necessário responder são:
1) quem nos serviços secretos norte-americanos pilotaria os
aviões sabendo que morreria na operação?
2) o que justificaria a realização de um atentado desta
envergadura com todas as suas implicações simbólicas,
materiais e humanas?
Quanto à primeira pergunta tem de se reconhecer que pelas
características suicidas-homicidas do atentado poderia supor-se que se
tratava de gente com mentalidade definitivamente extremista não
necessariamente muçulmanos dispostos a morrer por uma causa, que,
não sendo material, teria de ser ideológica. Este tipo de
compromisso será difícil encontrá-lo no pessoal da CIA ou
no de organizações do mesmo tipo, de modo que é
improvável que o governo norte-americano tivesse feito uma coisa assim
pelos seus próprios meios: materialmente falando, necessitariam de
alguém que lhes fizesse o trabalho
difícil
: pilotar o avião e morrer com ele. Deste modo fica eliminada a tese de
um auto-atentado planeado e efectuado por elementos puramente norte-americanos,
o que nos dá aso à última opção que
referimos acima: a possibilidade de ser uma combinação de actores
a responsável. Neste caso, obviamente, só podemos especular pois
a falta de dados e a proximidade dos acontecimentos impedem que se fale com
certezas.
Supondo que o atentado teria sido planeado e efectuado por diversos actores, a
participação da elite política norte-americana é um
requisito indispensável para que os atentados fossem levados a cabo do
modo como efectivamente ocorreram.
Assim, embora se afaste a tese do auto-atentado
puramente norte-americano
, parece factível a possibilidade de as mais elevadas esferas da classe
política nos Estados Unidos terem urdido o referido atentado utilizando
algum grupo extremista para a sua realização. Dentro desta
lógica não é incompatível a autoria intelectual dos
Estados Unidos, com a autoria material de militantes pertencentes a um grupo
como o de Osama bin Laden, que de imediato foi apontado como o
responsável sem se apresentar nenhuma prova que avalize a
acusação. Recorde-se que não seria a primeira vez que
trabalham lado a lado os Estados Unidos e bin Laden
30
. Já no passado o apoiaram por meio da CIA contra os soviéticos,
e depois contra os russos fomentando as guerrilhas muçulmanas na
Tchetchénia e nos Estados da Ásia Central. A tese torna-se ainda
mais factível se acrescentarmos o facto de, como veremos a seguir, neste
momento estarem os
falcões
no poder nos Estados Unidos, ou seja, políticos de ultradireita que
são pela militarização das relações
internacionais, e que de resto são os responsáveis por muitos dos
mais atrozes massacres da história mundial contemporânea
31
. A eles não os impressiona a morte de inocentes sempre e quando o
requererem os lucros em termos de poder político, económico e de
controlo social. Mesmo assim, ainda fica por responder a segunda pergunta que
fizemos no parágrafo anterior: o que justificaria a
realização de um atentado desta envergadura com todas as suas
implicações simbólicas, materiais e humanas? Para
responder a esta questão, convém fazer um balanço da
situação existente no interior dos Estados Unidos e no contexto
internacional.
REAGAN, BUSH E BUSH JR. OU A CONTINUIDADE POLÍTICA
A ferocidade com que foi atacado culpado ou não o regime
talibã era perfeitamente previsível se tivermos em conta os
antecedentes de quem orquestrou a matança: a família Bush e o seu
séquito. O perfil internacional que terá de distinguir a era de
George W. Bush na política internacional foi inaugurado com grandes
fanfarras pelos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, e curiosamente o
citado perfil não é nada novo. A luta contra o
terrorismo só efectiva nas palavras já
havia sido utilizada no passado, durante a administração Reagan,
como eixo da política externa norte-americana. Por este motivo e
como exercício de perspectiva é conveniente estabelecer os
paralelos que existem entre uma e outra administração para, na
medida do possível, tentar projectar um cenário a médio
prazo do que se poderá esperar da administração de Bush II
em termos de política externa, a partir da invasão do
Afeganistão de Setembro de 2001.
Numa primeira abordagem, vemos as administrações Reagan, Bush e
Bush II chegarem ao poder apoiadas pelos mesmos votantes, a saber, os sectores
mais poderosos e conservadores da classe política norte-americana dos
quais se destacam os corporativos petroleiros e o complexo militar industrial.
Continuando com as semelhanças, vemos que o discurso Combater o
Império do Mal foi a razão de ser de Reagan do mesmo modo
que hoje o presidente dos Estados Unidos fala de acabar com o mal do
mundo, com a pequena diferença de que nos tempos de Reagan, o
inimigo eram os comunistas, enquanto hoje com George W. Bush
são os terroristas muçulmanos de quem se tem de
livrar o mundo
32
. Do mesmo modo que
Fontes da Conduta Soviética
(texto que George Kennan publicou em 1947 sob o pseudónimo de
X) guiou o pensamento propagandístico dos Estados Unidos por
mais de quarenta anos, agora, ao entrarmos no século XXI, George W. Bush
apela embora com mais discrição aos postulados do
Choque de Civilizações
de Samuel P. Huntington para dar alguma base à sua agressão
contra o Afeganistão.
As presidências de Reagan e de George Bush pai e filho também se
entrelaçam pela composição dos seus gabinetes e pelas suas
acções de política externa como veremos a seguir. Reagan
teve Manuel Noriega (terrorista de Estado no Panamá e traficante de
drogas em grande escala), Bush II tem Osama bin Laden. Tanto Noriega como bin
Laden foram personagens ligadas à CIA ambos nos tempos em que
George Bush pai era director da mesma com amplos antecedentes de
práticas terroristas contra os inimigos da liberdade, da
justiça, da democracia e da
civilização como a entendem os Estados Unidos, porque
não os atacou com toda a maquinaria justiceira que se tornou
efectiva injustamente no caso da Nicarágua dos Sandinistas ou no Chile
de Salvador Allende (dois governos amplamente legitimados pelas respectivas
populações), quando era evidente que viviam à margem da
legalidade? Por uma simples razão: eram de facto terroristas, mas dos
nossos
terroristas, isto é, dos Estados Unidos. Logo podiam ser tolerados, eles
e os seus abusos.
Como já mencionámos, a configuração dos gabinetes
das duas administrações Bush e de Reagan é muito
semelhante. George Bush tinha sido o director da
Central Intelligence Agency
(CIA) quando Ronald Reagan era presidente, e posteriormente ocupou o cargo de
vice-presidente. Com aquele cargo, Bush foi o directo responsável pela
operação que ao ser ventilada publicamente seria conhecida como o
escândalo Irão-Contras ou Irangate
33
. Naturalmente, a seguir a Reagan, Bush foi eleito presidente dos Estados
Unidos, sendo no seu mandato que se levou a cabo a
Operação Tempestade no Deserto
no Iraque em princípios da década de Noventa.
Enquanto foi director da CIA, Bush conhecia muito bem o papel que desempenhava
Osama bin Laden e não fez reparo quando Reagan chegou a
denominá-lo, juntamente com o resto dos mujahidins,
freedom fighter
(lutador pela liberdade) oferecendo-lhe todo o apoio necessário.
Mas as coisas não ficaram por aqui. Após os dois períodos
em que William Clinton foi presidente, George W. Bush assumiu o cargo a seguir
a um virtual golpe de Estado.
Já como presidente, Bush Jr. encarregou-se de instalar no gabinete
membros da ultradireita mais recalcitrante e personagens de negra
trajectória reciclados das administrações de seu pai e de
Ronald Reagan. Entre os primeiros encontramos gente como John Ashcroft. O
actual Procurador da Justiça é um reconhecido membro da
ultradireita norte-americana; educado em escolas abertamente racistas; de
facto, o fundamentalismo de ultradireita de Ashcroft chegou a criar
problemas ao próprio George W. Bush com um Congresso que se recusava a
ratificá-lo no cargo pelos seus conhecidos antecedentes e pela sua
retórica semifascista. Entre os segundos ou seja, entre as
personagens recicladas de administrações anteriores
encontramos gente como Collin Powell, John Negroponte e Otto Reich. O actual
Secretário do Departamento de Estado não só foi um dos
principais promotores dos
Contras
nicaraguenses na administração Reagan, como foi também o
chefe do Estado Maior que organizou e recomendou a intervenção no
Panamá durante a administração de George Bush pai; nesta
mesma administração, Powell desempenhou também um papel
determinante na instrumentalização da
Operação Tempestade no Deserto
contra o Iraque.
Com antecedentes parecidos temos John Negroponte. O actual Embaixador dos
Estados Unidos nas Nações Unidas foi o chefe de
operações nas Honduras entre 1980 e 1982, durante o mandato
de Ronald Reagan, precisamente quando as Honduras se tornaram a maior base de
agressão militar contra a Nicarágua, pois dali se lançavam
os ataques dos
Contras
. Finalmente, temos Otto Reich. Durante a administração Reagan,
Reich, entre muitas outras coisas, foi o encarregado do chamado Serviço
para a Diplomacia Pública (ODP). Este serviço não era mais
que um órgão de propaganda governamental cujo objectivo era
conseguir mediante enganos e por meios ilegais o apoio do povo
americano às actividades que estavam a ter os Estados Unidos em El
Salvador e, por meio dos
Contras
, na Nicarágua. Hoje em dia, Reich é o flamante secretário
assistente do Departamento de Estado para a América Latina, isto
é, o funcionário norte-americano de maior poder quanto à
política externa para a América Latina
34
. É evidente que os funcionários das três
administrações se entrelaçam, o que só pode indicar
continuidade prática e ideológica em matéria de
política externa. Estes são apenas os antecedentes da
administração actual do país mais poderoso do globo.
Reagan e Bush pai têm um amplo historial em matéria de
violações aos direitos humanos e dezenas de milhares de mortos
nos seus activos, o primeiro na América Central e o segundo no
Médio Oriente principalmente embora não de forma exclusiva.
AS CAUSAS INTERNAS
Supondo então que houve altas esferas do governo norte-americano
envolvidas no planeamento-execução do atentado de 11 de Setembro,
além dos antecedentes de crime internacional que acabamos de passar em
revista e que caracterizam a actual administração, teremos de
explicar os motivos que tiveram para realizar um acto como o que nos ocupa.
A primeira situação que temos de considerar como motivo para
desencadear uma operação como a que está em prática
sobre o Afeganistão é a situação eleitoral que deu
o triunfo a George W. Bush, pois não foi particularmente a mais
conveniente. Após um controverso empate técnico e uma
alegação de fraude por parte do candidato democrata, Al Gore,
precisamente no Estado governado por Jeb Bush irmão do seu
adversário, o Tribunal Supremo decidiu do modo mais
antidemocrático possível sem dúvida que Bush II ia
ser o presidente. Deste modo terminou um episódio que manteve a
nação mais poderosa do mundo sem primeiro mandatário por
várias semanas. Como acertadamente se chegou a afirmar na altura, Bush
II tornou-se um dos presidentes mais ilegítimos na história dos
Estados Unidos, pois tomou a presidência marcado por um duplo estigma: 1)
a decisão arbitrária dos juizes do tribunal que o ungiram como
presidente e 2) depois de receber a maior quantidade de votos
contra
por parte da cidadania norte-americana. A fraqueza política de origem
que significou esta situação para o regime de George W. Bush
fazia prever a formação não só de um gabinete como
o que acima vimos de forma superficial, mas também de uma
acção como a que se desencadeou sobre o Afeganistão
(embora evidentemente não fosse muito seguro naquele momento sobre quem
recairia essa operação). Por outras palavras, George W. Bush
tinha necessidade de conseguir por qualquer meio possível a legitimidade
que a sociedade norte-americana não lhe deu nas urnas. Para compreender
melhor este assunto convém pôr na mesa um antecedente
análogo. Em fins do verão de 1999 eclode a segunda guerra
russo-tchetchena.
O detonador deste novo conflito bélico foram uns atentados terroristas
ocorridos em Moscovo e pelos quais os tchetchenos foram acusados como
responsáveis. No dizer do Dr. Pablo Thelman
35
:
A segunda guerra russo-tchetchena... foi concebida pelo Kremlin com o
objectivo de assegurar ao candidato presidencial Vladimir Putin... o seu
triunfo nas eleições presidenciais celebradas em Março de
2000. Nesse momento era
necessária e útil politicamente
para o Kremlin uma guerra desse tipo porque
uma vitória militar na Tchetchénia se transformava na via mais
idónea para assegurar a vitória política de Putin
em Moscovo.
36
Embora os atentados terroristas que funcionaram como detonador da segunda
guerra russo-tchetchena hajam sido atribuídos às guerrilhas
tchetchenas, a verdade é que nunca se demonstrou a sua culpabilidade
como também não se demonstrou suficientemente a
culpabilidade de bin Laden além de que existiu sempre uma forte
suspeita de que os atentados que tanto ajudaram Putin não foram na
realidade
atentados
, mas sim
auto-atentados
, coisa que obviamente também nunca se conseguiu demonstrar. Depois
disto vemos que, neste sentido, a diferença mais considerável
entre as duas guerras Tchetchénia e Afeganistão
é que, política e eleitoralmente, enquanto a guerra da
Tchetchénia foi utilizada por Putin como tratamento preventivo para
garantir a vitória, a do Afeganistão foi utilizada por Bush de
forma terapêutica com o mesmo fim.
Em segundo lugar temos a diferença de projectos políticos que se
baralhavam dentro da política norte-americana, entre os quais os de Bush
tinham uma posição pouco favorável. Após a imediata
viragem na correlação de forças no Congresso que
significou a conversão a independente do Senador republicano James
Jeffords, a administração Bush e o Partido Republicano perderam o
controlo absoluto do congresso, o que favoreceu os democratas. O momento
certamente foi o menos adequado visto que a divergência de projectos
entre os dois partidos era abismal. Enquanto os democratas defendiam a ideia de
incrementar os gastos sociais (saúde, habitação, etc.), os
republicanos estavam com a ideia de elevar o montante orçamental
destinado à defesa e aos projectos militares minando assim a viabilidade
dos de feição eminentemente social. O abandono das fileiras
republicanas de Jeffords implicou para os republicanos a necessidade de
negociar com os democratas, situação que punha em causa a sua
possibilidade de cumprir em termos absolutos os compromissos contraídos
com as indústrias que compõem o complexo militar-industrial
norte-americano; compromissos que, diga-se de passagem, ao triunfar
Bush deixaram de ser exclusivos dos republicanos para se transformarem em
compromissos políticos de Estado. O repentino fortalecimento dos
democratas caiu mal no ânimo da nova administração visto
que a limitava enormemente para cumprir os compromissos contraídos.
Entre os compromissos mais importantes encontravam-se sem dúvida os
respeitantes às negociações dos projectos
energéticos para explorar os recursos da Ásia Central
particularmente os do Azerbaidjão no Mar Cáspio e o do
arranque do denominado Sistema Nacional de Defesa Antimíssil
(National Missile Defense)
.
À ilegítima administração de George W. Bush e
à limitadora política que acabamos de passar em resenha teremos
de somar mais uma: a situação económica dos Estados
Unidos. O que propagandisticamente era conhecido e escondido como uma
desaceleração estava prestes a transformar-se numa
autêntica recessão de grandes proporções. A
necessidade de reactivar a economia e proteger os sectores industriais chave
para a administração Bush (ou seja, o petrolífero e o
armamentista nesta ordem), por si mesmas, eram causas suficientes para fazer o
esforço para desencadear uma conflagração bélica. A
questão era simplesmente averiguar contra quem e de que modo. Em resumo,
podemos afirmar que existia uma agenda interna entupida que não podia
desenvolver-se por outros meios que não fossem bélicos, e
daí a necessidade, se não de intervir num conflito já
existente, pelo menos de inventar um.
AS CAUSAS EXTERNAS
Desde o seu início, a administração de Bush Jr. tem-se
distinguido pela sua hostilidade para com a comunidade internacional. Embora
seja certo que esta hostilidade é já habitual no governo
norte-americano independentemente de estar no poder um governo democrata ou
republicano, a dinastia Bush não só parece sofrer do que em
termos psiquiátricos se conhece como atitudes passivo-agressivas, mas
até procura mesmo o confronto aberto, adoptando assim sempre
dentro da psiquiatria um comportamento francamente antisocial ou
psicopático. Estas afirmações apoiam-se na realidade, como
o demonstraram factos como os seguintes, que, apesar de não serem os
mais importantes, são os mais recentes:
1) A recusa de ratificar o Protocolo de Kyoto para a protecção do
meio ambiente. A ratificação do referido estatuto internacional
prejudicaria as grandes transnacionais norte-americanas ao obrigá-las a
reduzir a sua emissão de poluentes. Evidentemente, isto viria a
traduzir-se não só em graves dispêndios económicos
dessas companhias para modernizar e sanear os seus sistemas produtivos
até cumprirem o Estatuto, mas também limitaria a sua capacidade
de crescimento pois teriam de adquirir tecnologia muito mais cara mas
menos poluente se quisessem abrir novas instalações, com a
agravante de terem de se submeter à auditoria e
revisão de agentes exteriores;
2) o abandono da delegação norte-americana juntamente com
a de Israel da Conferência Mundial contra o Racismo em Durban,
África do Sul. Durante o período imediatamente anterior à
citada conferência, o Estado israelita com o apoio
logístico e militar norte-americano implementara uma
política homicida para responder à Intifada palestiniana
(movimento de rebelião popular que se seguiu à
provocação do primeiro-ministro israelita Ariel Sharon)
37
;
3) a recusa de respeitar o
Anti-Ballistic Missile Treaty
(ABM) de 1978 a que se encontravam obrigados os Estados Unidos. Este tratado
ergueu-se como um obstáculo legal importante para o arranque do Sistema
Nacional de Defesa Antimíssil, dado que este não só atenta
contra os interesses de segurança nacional russos e chineses
(principalmente) ao quebrar o equilíbrio nuclear existente, como
também contra a segurança internacional de qualquer Estado em
todo o globo, pois implica uma escalada militar nuclear unilateral no
espaço, isto é, implica uma revitalização melhorada
da Iniciativa para a Defesa Estratégica (IDE) ou Guerra das
Estrelas proposta por Ronald Reagan na década de Oitenta.
Se a estes três acontecimentos acrescentarmos o conflito
diplomático suscitado entre a China e os Estados Unidos devido à
queda de um avião espia norte-americano em território
chinês, então temos que o confronto aberto e perigoso com o mundo
inteiro era perfeitamente previsível como constante na política
exterior da nova administração norte-americana.
Esta hostilidade por parte da elite política norte-americana tem
primordialmente dois objectivos em matéria de política externa
relacionados com o atentado:
1) dar uma demonstração de poder ao terceiro mundo, não
só por parte dos Estados Unidos, mas também dos seus aliados do
primeiro mundo ao estabelecer uma aliança para defender um interesse de
classe comum;
2) fortalecer politicamente a posição norte-americana na
Ásia Central.
Para compreender o primeiro destes objectivos temos de recordar a
citação de que em política a forma também
é fundo, o que é eternamente real. Num mundo em que a
globalização
38
como processo se ergueu contra o que qualquer pessoa medianamente
racional desejaria, não como veículo, mas como condutor do
desenvolvimento internacional, as demonstrações de
poder dos fortes são ainda mais necessárias para manter os fracos
como tal. Isto é, a agressão da aliança militar mais
poderosa da história dirigida pelo país mais rico e
poderoso do globo contra um dos países mais pobres e socialmente
mais atrasados tem um grande conteúdo simbólico que não se
pode ignorar: assim, a forma, efectivamente, também é fundo. Por
outro lado temos o Afeganistão como peça geoestratégica na
Ásia Central. É a sua enorme importância para a
política externa norte-americana que se desenvolverá a seguir
mais detidamente.
Afeganistão: Uma jóia geopolítica
Os meios de comunicação deram ênfase à ideia de que
a reacção que iriam ter os Estados Unidos como resposta ao
atentado de 11 de Setembro seria uma vingança. Esta
ênfase foi tão acentuada e tão centrada nos aspectos
viscerais que iria ter a contestação dos Estados Unidos, que
permitiu aos meios de comunicação omitir um facto fundamental:
qualquer acção que determinasse levar a cabo o gabinete de George
W. Bush não seria irreflectida e por motivos viscerais como se
tentou fazer crer à opinião pública, mas antes
seria friamente pensada e, o mais importante, seria coerente com os
princípios e objectivos da política externa dos Estados Unidos.
O Afeganistão é um país na miséria devastado pela
guerra, habitado por 21 milhões de pessoas com um dos PIB per capita
mais baixos do mundo. As suas terras áridas mal dão para semear
uns quantos produtos agrícolas e para a alimentação dos
rebanhos dos pastores da região, além de a sociedade afegã
no seu conjunto viver em condições análogas às que
existiam antes da revolução industrial. Ao contrário da
Colômbia país cujo controlo se tornou estratégico
devido aos recursos da Amazónia, o Afeganistão é
provavelmente uma das regiões menos solicitadas para o investimento
produtivo, porque não é terra de modo algum atraente para a
actividade industrial e/ou económica para além de um débil
sector primário. Sendo esta a situação da região do
conflito, que interesse poderiam ter os Estados Unidos em controlar
militarmente, se não todo o país, pelo menos um sector da terra
afegã?. Em si mesmo, o Afeganistão é um objectivo militar
fácil mas sem importância de maior. A resistência que os
talibãs são capazes de opor contra o exército mais
poderoso do mundo apoiado por uma aliança militar sem precedentes (a
Organização do Tratado do Atlântico Norte) é
insignificante no mais amplo dos sentidos. A pergunta de fundo então
é: o que ganham os Estados Unidos com o ataque ao talibã?, e a
resposta é simples: uma posição geopolítica
importantíssima. Apesar de a terra afegã ser pobre em recursos de
todo o tipo, a sua posição geopolítica torna-a uma chave
para influir na política internacional, pois é um ponto de
pressão interna e regional tanto contra a China como contra a
Rússia; além disso, do Afeganistão pode-se muito bem
controlar a evolução política regional, pois não
devemos esquecer que existem diversos actores regionais com armamento nuclear e
que se encontram em conflito. Como se ainda fosse pouco, o controlo total, ou
mesmo só parcial do Afeganistão abre novas possibilidades para a
exploração dos recursos petrolíferos do Mar Cáspio
que são dos mais abundantes em todo o globo e cuja
exploração se encontra monopolizada actualmente pela
Rússia apesar da série de projectos alternativos que já
existem.
Um primeiro dado que convém ter em conta é o facto de o
Afeganistão se encontrar no centro do mundo islâmico. Como
é bem sabido a região da Ásia Central compõe-se de
um mosaico de culturas
39
cujas diferenças podem ser facilmente exacerbadas pelas potências
ocidentais com fins políticos. Isto já ocorreu no passado e pode
ocorrer de novo. Uma posição militar norte-americana no
Afeganistão seria um foco de desestabilização para as
grandes potências regionais como a China e a Rússia, e
também se repercutiria no equilíbrio de forças das
potências regionais do Médio Oriente como o Irão e Israel,
e das do subcontinente indiano em que se encontram o Paquistão e a
própria Índia. Como prova basta ver o caso da Tchetchénia,
onde a CIA apoiava o movimento separatista tchetcheno para enfraquecer
internamente o Estado russo. Este é o mesmo perigo que corre a China,
pois na província ocidental de Xing Kiang existem guerrilhas
muçulmanas já estabelecidas que arvoram a bandeira do separatismo
tal como na Tchetchénia. A situação na Tchetchénia
e Xing Kiang
40
agrava-se se considerarmos que não são movimentos isolados e que
têm fortes ligações entre si, com o talibã no
Afeganistão e com muitos outros movimentos separatistas no resto da
Ásia Central como o
Islamic Movement of Uzbekistan
(IMU). Estes movimentos separatistas integracionistas na Ásia Central
têm tal importância para os países na região que os
levaram inclusivamente a assinar acordos militares
41
para os combaterem. De tudo isto resulta que, de acordo com os ensinamentos da
real politik
, o que menos convém aos Estados Unidos é combater o terrorismo
na Ásia Central, porque de facto lhes é favorável em
termos absolutos visto que dessangra internamente os seus competidores
políticos na região (China e Rússia): se não se
possuir estabilidade interna, dificilmente se pode projectar força para
o exterior. Causar problemas tanto aos chineses como aos russos encontra-se
certamente na agenda de política externa norte-americana pois não
podemos nem devemos esquecer as aproximações evidentes entre
ambas as potências com vista a formar um bloco político para se
opor à agenda militarista que representava o desenvolvimento do Sistema
Nacional de Defesa Antimíssil. É importante considerar tudo o que
se disse antes porque quase todos os jogadores aqui mencionados contam com
armamento nuclear
42
, além de que no caso da China e da Rússia não se pode
omitir que possuem lugares permanentes no Conselho de Segurança das
Nações Unidas com direito a veto. Por outro lado, uma
posição militar no Afeganistão seria ideal para cobrir o
flanco oriental do Mar Cáspio cujos recursos petrolíferos
são cobiçados por todas as potências ocidentais
(actualmente, todo o petróleo que sai do porto de Baku no
Azerbaidjão tem de passar por território russo). O
Afeganistão, enfim, pela sua localização, é uma
jóia que os Estados Unidos não podiam deixar perder-se.
A COMUNICAÇÃO SOCIAL E A PROPAGANDA
Um dos mecanismos que mais auxiliou o governo norte-americano na sua tarefa de
despertar a histeria, o racismo e a xenofobia necessários para
começar a
Liberdade Duradoura
foi a utilização da propaganda nos meios de
informação de massas. A manipulação
ideológica que dominou o inconsciente colectivo mundial não
acabou nos inícios da década de Noventa com a
dissolução da URSS; de facto, aconteceu exactamente o
contrário. Como se demonstra desde a hipótese de Francis Fukuyama
do fim da história (em que se garantia que a democracia
liberal e o mercado livre tinham vindo para ficar), até ao
Choque de Civilizações
de Samuel P. Huntington, os mecanismos propagandísticos norte-americanos
estão mais vivos que nunca. O tratamento mediático que se deu aos
acontecimentos de 11 de Setembro não foi nem objectivo nem comedido: a
intoxicação informativa e as campanhas de
desinformação que se utilizaram para acusar Osama bin Laden
serviram para avalizar, dentro e fora dos Estados Unidos, as iniciativas
bélicas com que a elite norte-americana levaria a cabo os seus projectos
geoestratégicos internacionais, a sua política de
reactivação económica e os seus projectos de
dominação política interna.
A utilização dos meios de comunicação para
conseguir objectivos políticos tem uma longa história e existe
uma ampla bibliografia a esse respeito. De todos os livros escritos sobre o
tema destaca-se o de Edward S Herman e Noam Chomsky,
Os Guardiães da Liberdade
. Considerados como os paradigmas da imprensa livre, crítica e
objectiva, neste texto, Chomsky e Herman põem a nu o apoio que prestaram
o
New York Times
e o
Washington Post
entre outros aos objectivos da administração em
serviço, omitindo, exagerando ou distorcendo a informação
conforme o caso com o objectivo de manter sob controlo a
opinião pública doméstica e internacional. No caso que nos
ocupa os meios não actuaram de forma diferente, e de facto, não
tinham motivos para o fazer, dado que a desinformação e a
manipulação do consenso
43
por parte dos meios de informação mais importantes têm
sido constantes ao longo de toda a história dos EUA de forma quase
sistemática e praticamente sem excepção. Existem
antecedentes suficientemente importantes a este respeito para avalizar esta
afirmação, pois, como muito bem afirma Martha Montaño:
Em matéria de conflitos étnicos e internacionais, enquanto
uns são exagerados, como o Iraque, outros correm, talvez a sorte, de ser
ignorados. Os curdos na Turquia, oprimidos com violência, são
menos importantes que os estabelecidos no Iraque cujo idioma é oficial.
O Haití não é mais importante que o Sudão, o maior
país da África onde tem lugar a guerra mais esquecida do planeta.
Um milhão de mortes no Ruanda numa semana não contaram com a
atenção e os recursos que provocaram 200 mil na
Bósnia-Herzegovina em três anos.
44
Para efeitos do presente ensaio centrar-me-ei a título de exemplo em
quatro casos particulares: Iraque, Ruanda, Sérvia e Somália. Isto
com o objectivo de verificar o tratamento mediático que dão os
meios aos acontecimentos internacionais e que também se tornou efectivo
desde o primeiro momento nos atentados de 11 de Setembro, que irei analisar
também mais adiante.
O Iraque, após a Guerra do Golfo, perdeu muito mais coisas do que o
observador não familiarizado com esta questão supõe.
Não só perdeu o controlo de mais de metade do seu
território com o estabelecimento das chamadas zonas de
exclusão sob controlo britânico-norte-americano, como
também perdeu e continua a perder algo muito mais
importante: milhões de vidas inocentes. Como já tinha mencionado
as sanções impostas ao país por meio da ONU embora
por mandato norte-americano já provocaram até à
data a morte de quase 2 milhões de pessoas por falta de alimentos e
medicamentos; ou seja, a solução imposta pelos
Estados Unidos ocasionou mais mortes de fome e doenças que a quantidade
de pessoas que assassinou o próprio Saddam Hussein durante a Guerra do
Golfo. Que meio de informação de massas nos Estados Unidos
denunciou publicamente de forma reiterada este acto criminoso acusando
directamente os responsáveis?. Nenhum. Embora seja certo que Saddam
Hussein é um governante atroz, os Estados Unidos mataram directamente no
Iraque muito mais pessoas com bombardeamentos e por meio do bloqueio
que aquele sátrapa a quem acusam de assassino. Quantos
críticos nos meios denunciaram esta situação?
A distorção que tem a opinião pública sobre o que
sucede no Iraque tem possibilitado que tanto os comandantes britânicos
como os norte-americanos possam afirmar sem rebuço com toda a
naturalidade que no Iraque se realizam bombardeamentos
periódicos sem que ninguém se alarme ou recrimine
esta política de extermínio.
Porventura os homens, mulheres e crianças iraquianos que sofrem
diariamente este inferno serão mais culpados do que quem morreu no
ataque de 11 de Setembro?. Humanamente falando, será mais
tolerável a morte de iraquianos inocentes do que a de norte-americanos
inocentes? Porque é que o facto de habitualmente morrerem homens,
mulheres e crianças no Iraque já não é importante
para os meios de informação?. Por uma simples razão:
não são estúpidos e também não são
suicidas; e é que neste caso os directos responsáveis não
são apenas Saddam Hussein e quem o apoia, mas também quem concebe
a política exterior dos Estados Unidos para aquele país e os
próprios meios de informação.
Deste mesmo teor encontramos outro exemplo importante que é o caso do
Ruanda. Na guerra civil do Ruanda entre hutus e tutsis, cerca de um
milhão de pessoas destruíram-se principalmente com pedras, paus e
catanas no lapso de uma semana. Deste facto hoje já
pouquíssimos se recordam, embora o inferno continue: a Amnistia
Internacional denunciou que à data se podem contar mais de 2
milhões e meio de mortes relacionadas com a guerra civil. Tal como no
caso do Iraque, a situação no Ruanda também não
interessou muito os meios de comunicação norte-americanos pela
dupla atenuante racista com que funcionam: não só são
negros, mas também africanos, e por isso estas
notícias não fazem subir muito o
rating
.
Comparado com este inferno sobre a terra, a tragédia que o foi
de 11 de Setembro parece realmente minúscula, e no entanto o caso
do Ruanda não mereceu espaço de maior nas principais cadeias de
televisão ou em influentes jornais e revistas. Muitas pessoas de facto,
nunca deram pela situação por que passou o Ruanda e que ainda
atravessa. Neste caso, os meios de comunicação têm-se
comportado como se a tragédia humana que está a ocorrer naquele
lugar não existisse, ou como se não fosse minimamente importante.
Tal como em relação ao Iraque, a manipulação dos
meios de comunicação é evidente embora de forma diferente.
No primeiro caso o do Iraque trata-se de habituar o
público a uma notícia (o assassínio de iraquianos pelas
forças aliadas britânico-norte-americanos) a ponto de ser aceite
como coisa natural e sem importância; em contrapartida, no segundo caso
o do Ruanda a intenção é fazer como se
não existissem os factos ignorando-os de propósito para que a
opinião pública não lhes preste demasiada
atenção dentro da lógica de olhos que não
vêem, coração que não sente. Os casos aqui
expostos são apenas dois dos muitos exemplos com que se pode mostrar a
manipulação informativa por parte dos Estados Unidos e seus
aliados.
Em contraste com estes exemplos em que os meios fomentam a indiferença e
o desconhecimento respectivamente, encontramos a outra face da moeda: a
histeria colectiva e a exaltação dos sentimentos excludentes e
condenatórios do público que por eles se informa. A
este respeito convém recordar dois episódios mais que tiveram
lugar recentemente: a Sérvia e a Somália.
Ao eclodir o conflito no Kosovo, nos fins da década de Noventa,
começou uma campanha militar por parte da OTAN em que se lançaram
3300 mísseis
Tomahawk
diários sobre Belgrado. Provocou uma destruição
praticamente total da capital sérvia matando muitos milhares de
inocentes. Isso não preocupou muito os meios de
comunicação que preferiram fomentar uma histeria global quando um
F-117
Stealth
foi derrubado pelas baterias antiaéreas sérvias. A vida dos
prisioneiros de guerra norte-americanos foi respeitada e no fim foram
devolvidos à sua pátria. Se o ataque da OTAN se fez por motivos
humanitários para deter as atrocidades que os sérvios
cometiam contra os albaneses kosovares porque é que a
intervenção da OTAN provocou mais mortos do que os causados pelas
forças sérvias? Porque é que nada disto importou aos meios
de comunicação que defenderam a OTAN como um paradigma de
justiça e valentia? Valerá mais a vida de dois soldados
norte-americanos do que a de milhares de sérvios inocentes? Para os
meios a resposta é inquestionável: sim.
Uma situação semelhante ocorreu na Somália, quando
marines
norte-americanos foram assassinados por milicianos locais treinados pela
Al-Qaeda; o mundo inteiro consternou-se com as notícias que apresentaram
a imprensa escrita e os meios electrónicos pela morte de militares
norte-americanos e pelo macabro festejo que realizaram os assassinos pelo
facto; no entanto, de todos eles nenhum ergueu a voz para protestar com a mesma
veemência pela morte de fome de dezenas de milhares de somalis que por
essa altura já haviam ocorrido e que continuam hoje em dia.
Como é evidente, a atitude que tiveram os meios na Sérvia e
Somália foi totalmente diferente da que tiveram no Iraque e Ruanda.
Tanto na Sérvia como na Somália, os meios de
informação de massas conseguiram provocar a
consternação mundial ampliando e exagerando de forma
desproporcionada as notícias sobre a captura e morte de soldados
ocidentais, actuação que, como é claro,
coincidia com os interesses do governo norte-americano.
Estes fenómenos demonstram uma coisa muito importante: para o
público norte-americano vítima da
intoxicação e da desinformação dos seus
próprios meios de informação e do seu próprio
governo o que vale não é a vida humana nem as
tragédias sociais, mas sim o perigo de que tudo o que tenha barras e
estrelas possa ser manchado.
Obviamente, o cidadão comum norte-americano não age assim por
natureza, mas fazem-no reagir deste modo, e como? por meio de complexos
mecanismos de controlo psicossocial como o foi na sua época o
Serviço para a Diplomacia Pública
45
(ODP) durante a administração Reagan. No caso do atentado de 11
de Setembro o novo Serviço para a Diplomacia Pública foram os
meios de comunicação. Imediatamente a seguir ao atentado, por
todo o mundo circularam imagens da CNN em que se via crianças e mulheres
palestinianas festejando os acontecimentos de Washington e Nova
Iorque. Como é natural, estas imagens feriram no mais profundo a
cidadania norte-americana que, agravada, não estava disposta a suportar
também a troça. O efeito foi imediato e poucas horas depois dos
acontecimentos havia já um consenso quase absoluto na
população norte-americana quanto à
necessidade
de atacar militarmente alguém, fosse quem fosse. Poucos dias após
o atentado começou a circular informação indicando que as
imagens mostradas pela CNN em que se via o suposto festejo de palestinianos,
eram manipuladas. Neste sentido havia duas versões. A primeira afirmava
que as imagens eram legítimas, ou seja, as crianças palestinianas
e as mulheres de facto festejavam, não o atentado porém, mas a
invasão ao Kuwait de 1991 por parte do Iraque. A segunda destas
versões dizia que às mulheres e crianças palestinianas
pagaram para que festejassem, coisa que fizeram inocentemente (e dizemos
inocentemente porque não estavam a par do uso que iriam dar a essas
imagens). Após o desmentido oficial da CNN as imagens não
voltaram a ser transmitidas e lançou-se um véu de silêncio
sobre o assunto. Se as imagens foram
adaptadas
à circunstância, se toda a cena foi uma montagem, ou se as imagens
eram legítimas tiradas de um festejo pela atrocidade do 11 de Setembro
já não tem muita importância, tal como também
não a tem o facto de essas mesmas imagens não terem voltado a ser
transmitidas pois a precoce transmissão das mesmas conseguiu a sua
função imediata: indignar e enfurecer o povo norte-americano para
avalizar uma resposta militar. Se algum ensinamento deixou aos governantes dos
Estados Unidos a guerra de Vietname com o seu consequente
Síndroma do Vietname é que para levar a cabo
um acto de agressão duradoura, é indispensável contar com
o apoio da opinião pública, para o que é importante a
cumplicidade dos meios. Isto é valido não só dentro dos
Estados Unidos mas para todo o mundo cristão, onde o que dizem o
New York Times
, a
CNN
e o
Washington Post
é dogma de fé.
OSAMA BIN LADEN E O ´CHOQUE DE CIVILIZAÇÕES´
Os pilares ideológico-propagandísticos em que se apoiou a elite
norte-americana no caso do atentado de 11 de Setembro foram precisamente os
expostos por Huntington no seu
Choque de Civilizações
46
. De acordo com o professor de Harvard, os próximos conflitos
bélicos terão de ser regidos pelas diferenças entre
civilizações e não tanto pelos interesses políticos
da nações. O conteúdo do texto na sua essência
não passa da proposta ideológica de que o inimigo a vencer a
partir do fim da Guerra Fria são as civilizações
diferentes dado que a sua
alteridade
atenta contra os nossos deles princípios e valores
mais fundamentais. Essencialmente, e para fins políticos, a
proposta de Huntington é que o inimigo a vencer já não
são os comunistas, mas os muçulmanos,
visto que, no dizer de Huntington: as fronteiras do Islão se
encontram banhadas de sangue. De acordo com esta proposta sempre
dentro de um âmbito propagandístico, de agora em diante, os
responsáveis de tudo o que de terrível ocorrer nas
relações internacionais pode ser atribuído aos
islâmicos (
what ever that means
); a partir deste momento já não importa que os
russos ou os comunistas tenham desaparecido com
o Império do mal
(Reagan), pois já existe um novo bode expiatório que pode
justificar a injecção directa de recursos no complexo
militar-industrial norte-americano e os projectos bélicos que dele
derivem. Embora qualquer analista sério de assuntos internacionais
dê aos postulados de Huntington o valor que têm (de mera
propaganda), o bombardeamento mediático quer em filmes, artigos
ou comentários de especialistas nos meios de
informação de massas, já criou um cerco que,
além de ser difícil de evitar, distorceu a
percepção da realidade que tem o cidadão comum. Esta
é uma campanha de guerra psicológica permanente que lhes tem sido
muito eficaz até agora: os árabes são a nova
ameaça internacional,
ergo
, temos todo o mundo cristão de combatê-los.
É à luz destes antecedentes que tem de se estudar o tratamento
mediático do atentado e das suas consequências
socio-políticas.
Evidentemente, esta propaganda ideológica é para consumo interno
isto é, para todos os países não muçulmanos.
Com este fundamento ideológico (intoxicação
propagandística), vender ao mundo ocidental a ideia de que os autores
dos atentados ao Pentágono e às Torres Gémeas são
de origem muçulmana é coisa fácil
47
.
Segundo a propaganda oficial a intervenção no Afeganistão
é um
meio
para alcançar um
objectivo
, que é acabar com Osama bin Laden. Na realidade, passa-se o
contrário: acusar Osama bin Laden é um
meio
que vai permitir aos Estados Unidos conseguirem os
objectivos
que vimos. Osama bin Laden foi apontado como
presumível responsável
do atentado, o que quer dizer que, em primeira instância, não
passa de um
suspeito
; no entanto, o tratamento que guiou as acções posteriores dos
Estados Unidos e seus aliados em relação a bin Laden e à
Al-Qaeda não foi o que se daria a um
suspeito
, mas sim a um
culpado
. A distinção é importante porque após os
acontecimentos que fizeram de bin Laden o homem mais procurado do mundo, os
Estados Unidos e seus aliados nunca mostraram nada mais que
suspeitas
e provas tão fracas da sua culpabilidade que a sua
utilização para uma condenação num julgamento
sério e formal seria ridícula. Isto não quer dizer que o
saudita seja um anjo de bondade, só quer dizer que apontá-lo como
culpado sem apresentar provas concludentes como efectivamente ocorreu
é muito fácil, como o é também fazer o
público acreditar nisso (coisa que também aconteceu).
Todos os que sem pensar condenam bin Laden não reparam no facto de que,
além de ter ligações pessoais-empresariais à
família Bush, ele foi também um agente destacado da CIA enquanto
se tratou de combater o
Império do Mal
no Afeganistão. Tal como no passado o governo norte-americano o utilizou
contra um amigo externo e depois como inimigo, hoje utiliza-o como bode
expiatório para justificar os objectivos internos e de política
externa que vimos acima. É certo que bin Laden dirige uma
organização terrorista responsável por uma série
abundante de graves atentados terroristas; contudo, vale a pena reflectir sobre
a conveniência real que teria para bin Laden a realização
destes atentados. Quem o rotula de responsável directo da
acção de 11 de Setembro omite um dado revelador. A Al-Qaeda, a
organização de Osama bin Laden, opera em pelo menos 60
países, dos quais fazem parte o Paquistão e o Afeganistão.
Que sentido teria realizar um atentado como o de 11 de Setembro se a
reacção imediata dos Estados Unidos seria bombardear o
Afeganistão, provavelmente o único país no mundo em que
bin Laden teria um refúgio seguro pela sua afinidade com o
talibã?. Poder-se-ia alegar que a visão política de bin
Laden se limita ao âmbito regional, mas dificilmente poderá ser
verdade, se consideramos o alcance internacional que tem a Al-Qaeda. Como
alguns analistas chegaram a afirmar correctamente: após o 11 de
Setembro, quem quer que seja o autor do atentado, tornou-se imediatamente o
melhor aliado dos norte-americanos e o pior inimigo do Islão, pois foi
este último que ficou mais prejudicado
48
.
Curiosamente, dentro de um uso excessivo de termos como
fundamentalismo e radicalismo (propagandisticamente
utilizados para desqualificar os muçulmanos), a
posição mais comedida demonstrou-a o talibã e até o
próprio bin Laden, sendo eles os intolerantes muçulmanos
radicais fundamentalistas por excelência. Numa das suas primeiras
declarações, Osama bin Laden chegou a garantir que se
apresentassem provas note-se que pediu
provas
indicando que foi ele o autor, estava disposto a entregar-se a um tribunal
internacional imparcial. Por seu lado, o regime talibã a todo o momento
manteve a disposição de negociar para evitar um confronto
bélico. Até aqui, tanto a afirmação de bin Laden
como a dos talibãs são tudo menos radicais e/ou fundamentalistas.
De facto, são propostas por demais racionais que tiveram como resposta a
recusa sistemática à negociação por parte dos
Estados Unidos e seus aliados, e a agressão sem fundamento contra o povo
afegão.
O TRIUNFO
Se a hipótese que me propus defender for correcta a do
auto-atentado então os factos que ocorreram pouco depois do 11 de
Setembro significaram um êxito praticamente absoluto para George W. Bush.
Os benefícios para a classe política no poder nos Estados Unidos
foram imediatos. Poucas horas depois do atentado foi aprovado quase por
unanimidade só se opôs uma congressista afro-americana
um orçamento de 40 mil milhões de dólares para
enfrentar a crise, dos quais 20 mil milhões teriam um uso exclusivamente
militar. Esta acção teve diversos resultados:
1) Dava-se por acabado o debate interno entre republicanos e democratas quanto
à orientação que deveriam ter as dotações
orçamentais. Tem de se recordar que enquanto os democratas pretendiam um
orçamento reforçando a política social, os republicanos
estavam por um orçamento mais focado nas questões militares e de
segurança interna. Como vimos acima, ao perderem os republicanos o
controlo absoluto do congresso, era incerta a possibilidade de levarem por
diante os sues projectos. Após os atentados, este problema ficou
resolvido.
2) Ter disponíveis não menos de 20 mil milhões de
dólares prontos para contratos com a industria militar traduz-se, em
primeiro lugar, num balão de oxigénio para as firmas ligadas a
esta indústria, pois não podemos esquecer que a
desaceleração económica que sofriam os Estados Unidos
estava prestes a transformar-se numa recessão, que desencadearia como
consequência uma crise económica de grandes
proporções. Assim, se havia uma indústria que devia ser
salva, tinha de ser a militar pela afinidade política que existe entre
estas empresas e a ideologia e os antecedentes de George W. Bush e seu
gabinete.
3) Ter um cheque em branco de mais de 20 mil milhões de dólares
49
para contratos com as firmas da indústria militar, é sem
dúvida uma grande oportunidade para saldar as dívidas eleitorais
que contraíram Bush e a sua equipa com estes sectores que abertamente
lhes deram todo o apoio durante o período eleitoral. Assim, resolvido o
problema do congresso e da falta de fundos para gastos militares, não
há razão para não saldar as dívidas da campanha.
4) Intervir militarmente no Afeganistão é a ponta de lança
do que posteriormente pode ser assegurar as fontes energéticas do Mar
Cáspio.
5) O choque psicológico que foi para o povo norte-americano ver em todos
os canais de televisão como se desmoronaram as Torres Gémeas e
como se encontrava ferido o centro do seu poder militar; além de
observar com raiva como se festejava na Palestina, foi demasiado,
embora positivo para os projectos intervencionistas dos republicanos, dado que
assim se superava embora de forma transitória o chamado
Síndroma do Vietname, isto é, a
oposição de um povo a empreender uma guerra de agressão
contra uma nação mais fraca. Este problema vinha-se arrastando
desde a década de Setenta, mas após o atentado o
Síndroma do Vietname foi superado pelos sentimentos
racistas, xenófobos e
patrioteiros
(que não patriotas) que o governo através dos meios de
comunicação conseguiu despertar na sua
população.
6) A restrição das liberdades civis como medida de
segurança, que foi implementada por George W. Bush, deu
carta branca às agências de segurança e espionagem
política para fazer praticamente o que quiserem dentro dos Estados
Unidos. Após os atentados e de acordo com as novas
disposições, nesse país basta só a suspeita de
terrorismo para dar a qualquer agente de segurança norte-americano a
faculdade de deter qualquer pessoa por mais de 72 horas para ser
interrogada sem a obrigação de a apresentar perante um
juiz; igualmente, esta mesma suspeita de terrorismo abre a possibilidade de
revistar o domicílio de qualquer pessoa sem necessidade de ordem de
busca; e também se aprovaram disposições jurídicas
para julgar pessoas suspeitas em segredo e condená-las até mesmo
à pena capital na sua ausência e sem o seu conhecimento. A
aplicação de todas estas medidas de corte fascistóide
acarreta o perigo de poderem ser utilizadas como mecanismos de repressão
da dissidência política interna com a desculpa do combate ao
terrorismo.
7) Finalmente, a coragem popular do povo norte-americano justificada sem
dúvida, apesar de manipulada politicamente exigia uma resposta
rápida e contundente de George W. Bush, pelo que era a oportunidade
perfeita para o novo presidente se legitimar perante uma sociedade que
não votou nele e que, de facto, não acreditava nele como
presidente. O ataque ao Afeganistão é uma acção a
todos os títulos de violação não só dos
direitos humanos mais fundamentais mas também contrária aos
princípios mais básicos do direito internacional estabelecidos na
carta das Nações Unidas. Esta acção permitiu a Bush
demonstrar a ferocidade de que era capaz para defender a
pátria tentando a
Justiça Infinita
primeiro, e
Liberdade Duradoura
depois. Para além da retórica, a guerra de agressão
empreendida contra o Afeganistão permitiu a George W. Bush obter do seu
público interno a legitimidade que não conseguiu nas urnas.
Como se pode observar, a resposta que deu a elite norte-americana à
crise originada pelo atentado coincide totalmente com as necessidades
políticas internas e externas da classe política no poder.
É por isso que convém reafirmar o que já se exprimiu
acima: quem quer que tenha sido o responsável pelos atentados em
Washington e Nova Iorque fez um grande favor ao regime de George W. Bush e aos
sectores mais conservadores da classe política norte-americana. Foram
eles os beneficiários absolutos de um atentado que ao Islão e
seus seguidores em geral não lhes trouxe nada de bom em nenhum sentido.
CONCLUSÕES
Por tudo o que vimos, podemos tirar uma série de conclusões que,
sem serem definitivas (teriam de ser avalizadas pelos acontecimentos futuros),
podem servir como referência para descodificar o atentado de 11 de
Setembro e a posterior agressão ao Afeganistão como o que de
facto são: lições de
real politik
.
-
Os Estados Unidos responderam a um acto de terrorismo com meios terroristas
totalmente proibidos pela legislação internacional, facto pelo
qual se colocam eles e quem os apoia à mesma altura de quem
cometeu o atentado de 11 de Setembro.
-
O apoio das nações às operações militares
no Afeganistão responde a interesses de classe no caso dos países
ricos, a medo no caso das nações pobres, e a interesses de
estabilização política no caso dos países da
Ásia Central, e a Rússia e China em certa medida.
-
Os antecedentes da política externa norte-americana fizeram-nos crer na
possibilidade real de serem objectivo de atentados terroristas de grande
envergadura. Devido a muitos países terem sido agredidos e sofrido
violações severas aos seus direitos humanos, esses mesmos
países poderiam ser suspeitos da autoria dos atentados de 11 de
Setembro; contudo nenhum deles tem capacidade real para organizar e executar um
golpe com as características do ocorrido a 11 de Setembro.
-
A participação das mais altas esferas do poder norte-americano
na realização dos atentados de 11 de Setembro é um
requisito incontornável para a execução de um atentado
como o que teve lugar nessa data, enquanto nenhum grupo isolado ou
inclusivamente com o apoio de algum Estado teria a capacidade por si
só de executá-lo tal como foi. Por outras palavras, a
cumplicidade interna a altos níveis resulta indispensável.
-
As condições políticas internas bem como o contexto
internacional que rodearam o atentado são antecedentes que, juntamente
com as vantagens que traz a médio e longo prazo a
vingança contra os terroristas no
Afeganistão, são importantes pois demonstram que a elite
norte-americana tinha motivos políticos reais e de peso para montar um
auto-atentado, como já aconteceu no passado. Além de que a
natureza do governo em funções reforça esta possibilidade
como uma opção real.
-
O facto de não se terem dado a conhecer provas juridicamente
concludentes que sirvam para demonstrar a culpabilidade de Osama bin Laden e da
sua organização Al-Qaeda, e de já se ter empreendido uma
acção militar que juridicamente se pode interpretar como
uma guerra de agressão, reforçam a tese de que os Estados
Unidos não procuraram culpados mas sim bodes expiatórios que lhes
permitam fazer o que deviam fazer para preservar o
status quo
. Por outras palavras, não se procurou quem a fez, mas quem a pague; e
não para executar uma vingança mas para conseguir,
com maior facilidade, os objectivos políticos da nova
administração dos Estados Unidos.
-
Os meios de informação serviram de idóneo mecanismo para
despertar sentimentos de xenofobia, racismo, chauvinismo e mesmo de atitudes
neofascistas ao fazerem uso sistemático da desinformação e
da intoxicação informativa por meio de estímulos
propagandísticos baseados nos esquemas estabelecidos por Samuel P.
Huntington para o pós-guerra fria. Dentro destes esquemas, Osama bin
Laden era muito fácil de vender como culpado independentemente de ser o
verdadeiro culpado ou não.
-
As características políticas presentes na região da
Eurásia fazem do Afeganistão uma jóia em termos
geopolíticos. A sua localização e a possibilidade de
estabelecer um complexo militar norte-americano no Afeganistão, faziam
deste país a chave para o controlo geopolítico e
geoeconómico da região; assim, o ataque e o muito
provável controlo do Afeganistão por parte dos Estados
Unidos coincide com os seus objectivos e as suas estratégias de
domínio de recursos e de contenção dos seus
adversários políticos na região.
-
A agressão da aliança militar mais poderosa da história
contra um dos países mais pobres do globo não é coisa nova
e tem como objectivo, além do controlo regional, o aviso às
nações do terceiro mundo por parte das nações
ricas: como ocorreu na Nicarágua, Guatemala e Vietname entre outros, que
o terceiro mundo não pode nem deve fazer nada que não coincida
com os interesses das nações do primeiro mundo sem correr o risco
de ser agredido por este.
-
Os sectores mais duros e conservadores da elite política nos Estados
Unidos foram os mais beneficiados pelos acontecimentos de 11 de Setembro, do
mesmo modo que também os sectores mais duros dos grupos
anti-norte-americanos resultaram beneficiados. Os mais prejudicados foram os
sectores moderados e racionais, assim como o direito internacional e todos os
avanços que se tinham conseguido como os princípios de
resolução pacífica das controvérsias e de
proscrição da ameaça internacional.
-
A forma como ocorreram os acontecimentos de 11 de Setembro, os antecedentes
que gravam sobre o governo norte-americano, a natureza da
administração que está actualmente em
funções, o comportamento que teve a administração
Bush perante a crise e as oportunidades que a curto, médio e longo prazo
trouxeram consigo as tragédias de Washington e Nova Iorque são
elementos suficientes para afirmar que o que se exibe como um
atentado
foi na realidade um
auto-atentado
.
-
A lógica que pode explicar as guerras e o que é conhecido como
terrorismo no Século XXI não é muito diferente
da que se aplica para entender os mesmos fenómenos no Século XX:
os ricos contra os pobres, os fortes contra os fracos e os que têm mais
do que querem contra os que não sabem sequer se se têm a si
próprios.
BIBLIOGRAFIA E HEMEROGRAFIA
LIVROS
-
BRZEZINSKY, Zbigniew,
The Grand Chessboard, Edit. Basic Books, New York, 1997.
-
CHOMSKY, Noam & Herman, Edward S.
Los Guardianes de la Libertad, Edit. Grijalbo Mondadori, España, 1995.
-
The New Military Humanism: Lessons From Kosovo, Edit. Common Courage Press,
New York, 1998.
-
Lo Que Realmente Quiere el Tio Sam, Edit. Siglo XXI, México, 1997.
-
Como Mantener a raya a la Plebe, Edit. Siglo XXI, México, 2001.
-
DIETERICH, Heinz
, Cuba ante la Razón Cínica, Edit. Nuestro Tiempo, México,
1994.
-
EU y el Terrorismo Internacional, Edit. Plaza e Valdez, México, 1988.
-
Identidad Nacional y Globalización; La Tercera Vía; Crisis en
las Ciencias Sociales, Edit. Nuestro Tiempo, México, 2000.
-
FERNÁNDEZ. M., Jorge
, Narcotráfico y poder, Edit. Rayuela, México, 1999.
-
GARCÍA R., Miguel & OJEDA F. Djalma
, El Nuevo Orden Petrolero Global: El Mercado en Manos de los Monopolios, Edit.
Media Comunicación, México, 1999.
-
GONZÁLEZ J., Mónica & SÁNCHEZ R., Pablo T.
Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo, Edit.
Quimera, México 2001.
-
GUTIÉRREZ DEL CID, Ana Teresa
, Rusia y Estados Unidos en la Posguerra Fría, Edit. UAM-X,
México, 2000.
-
Rusia en la Era de Vladimir Putin y el Conflicto Checheno, Edit. Quimera,
México, 2001.
-
HUNTINGTON, Samuel P.
, El Choque de Civilizaciones y la Reconfiguración del Nuevo Orden
Mundial, Edit. Piados, México, 1998.
-
JALIFE-RAHME, Alfredo
, El Lado Obscuro de la Globalización: Post-Globalización y
Balcanización, Edit. Cadmo & Europa, México, 2000.
-
Guerras Geoeconómicas y Financieras: Del Golfo Pérsico al Golfo
de México, Edit. Niza, México, 1997.
-
KLARE, Michael T. & KORNBLUH, Peter
, Contrainsurgencia, Proinsurgencia y Antiterrorismo en los 80´s, Edit.
CONACULTA, México, 1995.
-
KURNITZKY, Horst. (comp.)
, Globalización de la Violencia, Edit. Colibrí, México,
2000.
-
MARCHETTI, Victor & MARKS, John D.
, La CIA y el Culto del Espionaje, Edit. Euros, España, 1975.
-
MONTIEL T., Fernando & DIETERICH, Heinz,
Geopolítica y Globalización en México y América
Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés, Edit. Quimera,
México, 2002.
-
PEARSONS, Frederic S. & ROCHESTER, J. Martin
, Relaciones Internacionales: Situación Global en el Siglo XXI, Edit.
Mc.Graw Hill, México, 2000.
-
SÁNCHEZ R. Pablo T.
, Rusia: Un Futuro Incierto, Edit. Rus, México, 1998.
-
V., Modesto
, Derecho Internacional Público, Edit. Porrúa, México,
1998.
-
SHOULTZ, William
, Estados Unidos y la Red Internacional de Terrorismo de Estado, Edit. Prisma,
Chile, 1990
-
VARGAS Ll., Alvaro
, En el Reino del Espanto, Edit. Grijalbo, México, 2000
INSTITUTOS
-
Federation of American Scientists
(http://www.fas.org)
-
Stockholm Institute Peace Research Institute
(http://www.sipri.se)
-
Organização das Nações Unidas
(http://www.um.org)
_____________________
NOTAS
24) Obviamente podemos deixar de considerar que em muitos casos a
violência de que se acusa estes Estados é
infinitamente menor do que a que exerce diariamente contra eles o seu acusador,
ou até a própria acusação é infundada.
25) Com efeito, após a catástrofe, o governo cubano ofereceu
todo o
auxílio em pessoal médico que os Estados Unidos viessem a
requerer para lidar com a crise. A atitude poderá parecer paradoxal
perante o recorde de assistência humanitária que
têm tido os governos norte-americanos para com a ilha, mas não
é assim. O governo cubano compreende que pelos crimes de uma elite
política criminosa e agressiva nos Estados Unidos, não há
motivo para negar auxílio à população que ela
governa. Isto em poucas palavras chama-se coerência e decência
política.
26) Além de não podermos esquecer o facto de que após um
atentado como o que nos ocupa, o lógico seria um recrudescimento das
penúrias e das carências só pela suspeita de
participação.
27) A perfeição com que foi executado o atentado implicaria um
prolongado e complicado plano, assim como a disposição de
recursos humanos e tecnológicos que com dificuldade adquiriria um
rogue state
.
28) Embora oficialmente tanto o
Mossad
como a
CIA
sejam agências de informação e/ou espionagem, em termos
reais encaixam-se sem nenhum problema como grupos terroristas também.
Factos como os assassínios de militantes palestinianos efectuados pelo
Mossad
por ordem de Golda Meier assim o comprovam. O mesmo é válido
para a
CIA
, que juntamente com a DINA chilena facilitou o assassínio de Orlando
Letelier na cidade de Washington após o golpe militar que custou a vida
a Salvador Allende em 1973. De facto, no libro
La CIA y el Culto del Espionaje
, Victor Marchetti e John D. Marks (ex-agente da CIA e ex-funcionário do
Departamento de Estado respectivamente) concluem que a CIA, mais que uma
agência de espionagem tem funcionado como uma agência de
intervenção, enquanto a sua função principal
é: ...a promoção da política exterior do
governo dos Estados Unidos utilizando meios encobertos e frequentemente
ilegais... trata de favorecer o papel dos Estados Unidos papel que estes
se atribuíram a si mesmos como árbitro dominante nas
transformações políticas, económicas e sociais que
experimentam os países da Ásia, África e América
Latina... (Marchetti, Victor & Marks, John D.,
La CIA y el Culto del Espionaje
, Edit. Euros, España, 1975, p. 32). Apesar de estas palavras terem sido
escritas nos tempos da Guerra Fria, hoje, mais de 25 anos depois, não
perderam a sua validade.
29) Contudo, estas organizações podem ser as responsáveis
pelos ataques com antrax que se registaram a seguir ao 11 de Setembro, pois ao
contrário dos atentados contra o Pentágono e o World Trade
Center, cultivar antrax não é difícil nem requer grande
preparação técnica e logística.
30) De facto, a relação entre bin Laden e a elite norte-americana
chegou a tal ponto particularmente com a família Bush que
até a própria família do actual presidente dos Estados
Unidos chegou a travar negócios com a família do saudita.
31) O sudeste asiático, a América Central e América do Sul
são eloquentes exemplos a esse respeito. A bibliografia é ampla,
ver Schoultz, William,
Estados Unidos y la Red Internacional de Terrorismo de Estado
, Edit. Prisma, Chile, 1986 e Chomsky, Noam & Herman, Edward,
Los Guardianes de la Libertad
, Edit. Grijalbo-Mondadori, España, 1995, entre outros.
32) Tanto os comunistas como os terroristas
muçulmanos não são mais que mecanismos
linguísticos de propaganda que permitem ao polícia do mundo
perseguir, atacar e até matar quem quer que se oponha às ordens
da classe dirigente, sejam estes sindicalistas, líderes estudantis ou
defensores dos direitos humanos ou ecologistas. Isto é natural dado que
no dizer de Edward S. Herman: O actual governo de Washington achou
possível designar arbitrariamente como terroristas qualquer
grupo ou país que se lhe oponha e isto é transmitido ao
público pelos meios de informação de massas sem ser
submetido a crítica séria ou provocar o riso... Na sua
manipulação semântica de terrorismo e de outras palavras
relacionadas, os Estados Unidos e os seus porta-vozes intelectuais têm de
utilizar uma série de artifícios para diferenciar os amigos e a
si próprios dos terroristas. (Herman, Edward S.,
El Patrocinio Estadounidense del Terrorismo Internacional. Un Examen General
, in
E.U. y el Terrorismo Internacional
, Dieterich, Heinz (comp.) Edit. Plaza e Valdéz, México, 1988. p.
70-71).
33) Fernández M., Jorge,
Narcotráfico y poder
, Edit. Rayuela, México, 1999. p. 19-20.
34) Dieterich, Heinz,
El ALCA y el Plan Colombia: Por el Control de América Latina
, en
Geopolítica y Globalización en México y América
Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés
, Montiel T., Fernando & Dieterich, Heinz, (coordenadores), Ed. Quimera,
México 2001.
35) Ex-diplomata cubano. Especialista em política russa.
36) Sánchez, Pablo T.,
El Conflicto en Chechenia
, en
Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo
, González, Mónica & Sánchez, Pablo T., (coord.), Edit.
Quimera, México 2001, p. 107. (O sublinhado é nosso.)
37) Não é de estranhar o espírito belicoso de Sharon; basta
recordar que, como membro destacado do Partido de ultradireita Likud, tem
participado em todas as conflagrações bélicas que
enfrentou o Estado de Israel a ponto de estar a perder o ouvido
desde a sua criação por mandato norte-americano imediatamente
após o fim da Segunda Guerra Mundial. Sharon é também o
directo responsável pelas matanças nos acampamentos de refugiados
de Sabra e Shatila na década de Oitenta em que milhares de pessoas
inocentes perderam a vida.
38) A globalização é a característica
principal do sistema internacional e assenta numa nova divisão
internacional do trabalho que afecta todas as esferas da vida humana:
política, economia, cultura, etc.
39) Zbigniew Brzezinski (ex-conselheiro de Segurança Nacional na
administração Carter) chegou a denominar a região da
Ásia Central como Os Balcãs Euro-asiáticos
denotando assim a complexa composição étnico-religiosa que
prevalece na região e que a transforma num barril de pólvora
político que a médio prazo poderá incendiar-se pelos
interesses que se cruzam na região. (Brzezinski, Zbigniew,
The Grand Chessboard
, Edit. Basic Books, New York, 1997. p. )
40) Nesta região também temos de considerar que existe um grande
potencial petrolífero que não tem podido ser explorado porque:
...se carece de infra-estruturas de comunicações...
além de se poderem manter fechadas por causas políticas ou
questões técnicas... (García R., Miguel & Ojeda F.
Djalma.,
El Nuevo Orden Petrolero Global: El Mercado en Manos de los Monopolios
, Edit. Media Comunicación, México, 1999. p 20).
41) O perigo é tão real que, como produto destes acordos, o
exército russo tem colocados cerca de 20 mil soldados na fronteira entre
o Tadjikistão e o Afeganistão para conter o expansionismo
islâmico (Gutiérrez del Cid, Ana Teresa,
Rusia en la Era de Vladimir Putin y el Conflicto Checheno
, Edit. Quimera, México 2001).
42) Salvo o Irão, embora haja relatórios da CIA a considerar que
para 2002 teria a possibilidade real de o desenvolver. Ao clube nuclear tem de
se acrescentar Israel, país que, embora não a tenha reconhecido
de forma aberta e oficial, a sua capacidade nuclear é de todos
conhecida. De acordo com o Dr. Alfredo Jalife: Segundo um documento
secreto do Departamento de Energia dos EUA... Israel é a sexta
potência nuclear mundial. O documento proclama que Israel dispõe
de 300 a 500 kgs. de armas carregadas de plutónio, susceptíveis
de ser transformadas em 250 ogivas nucleares... (Jalife-Rahme, Alfredo,
El Lado Obscuro de la Globalización: Post-Globalización y
Balcanización
, Edit. Cadmo & Europa, México, 2000, p. 193). A razão por que
é sistematicamente negada esta capacidade nuclear tanto pelo governo dos
Estados Unidos como pelo israelita é porque: ...a
legislação sobre ajuda estrangeira de 1977 proíbe fundos a
qualquer país que secretamente produza armas nucleares. (Chomsky,
Noam,
Lo Que Realmente Quiere el Tio Sam
, Edit. Siglo XXI, México, 1997. p 75-76). Assim, negar a capacidade
nuclear israelita permite aos Estados Unidos continuar a apoiá-los.
43)
Manufacturing Consent
é o título original com que foi publicado
Los Guardianes de la Libertad
. O título deriva de um texto escrito por Walter Lippman em que se
aborda a criação artificial do consenso popular através
dos meios de informação.
44) Montaño, Martha,
Abkhazia: País Desconocido, Conflicto Oculto
, em
Minorías Étnicas y Movimientos Separatistas en el Mundo
, González, Mónica & Sánchez, Pablo T. (coord.), Edit.
Quimera, México, 2001. p. 111.
45) Este serviço era o encarregado de conseguir o apoio popular da
sociedade aos actos de terrorismo de Estado que patrocinavam os Estados Unidos
contra a Nicarágua na década de Oitenta.
46) Daí que não seja estranho que pouco depois do atentado, os
exemplares do livro disponíveis em todas as livrarias começassem
a ostentar uma cinta promocional que dizia: O livro mais citado
após os atentados de 11 de Setembro como se o livro tivesse
antecipado que iria suceder uma coisa assim. O livro tem fins
propagandísticos e nada mais, visto que no dizer do Dr. Heinz Dieterich
(citando Huntington) o presente livro não é nem tem
pretensões de ser uma obra de ciências sociais e
então o Dr. Dieterich interroga-se: Se o
Choque de Civilizações
não é uma obra de carácter científico, conforme
certifica o próprio autor, então a que género pertence? Se
alguém se der ao incómodo de ler as quase quatrocentas
páginas, a resposta é óbvia: trata-se de uma obra
propagandística imperial, carente de rigor e valor
científico... (Dieterich, Heinz,
Identidad Nacional y Globalización; La Tercera Vía; Crisis en las
Ciencias Sociales
, Edit. Nuestro Tiempo, México, 2000. p. 51).
47) Além disso devemos ter em conta que Osama bin Laden é o
saudita
milionário dono e senhor de uma perigosíssima rede terrorista
internacional, ou seja, o mau perfeito para uma sociedade dominada
pelos estereotipos de Hollywood.
48) Obviamente desta afirmação ficam excluídos os grupos
militantes radicais do Islão. (Para mais informação a este
respeito ver os ensaios de Noam Chomsky e de Heinz Dieterich neste mesmo
volume).
49) Este montante não é pequeno e é importante
destacá-lo pois é 15 vezes superior ao conferido ao Plano
Colômbia posteriormente rebaptizado como
Iniciativa Andina
cujo alcance não é regional (cone sul) mas continental. Para
este Plano foram atribuídos 1.300 milhões de dólares que
irão ser utilizados em mais de 80% para questões exclusivamente
militares, embora o Plano seja apresentado como um projecto predominantemente
social. Para saber mais a este respeito ver de Heinz Dieterich
La Cuarta Vía al Poder: Venezuela, Colombia, Ecuador
e
Geopolítica y Globalización en México y América
Latina: Del ALCA a los Acuerdos de San Andrés
, Montiel, Fernando & Dieterich Heinz (coords.) ambos publicados por Edit.
Quimera, México 2001.
(*) Analista. Director Editorial da Editorial Quimera, do México. Co-autor,
coordenador e editor do livro
"Geopolítica y Globalización en México y América Latina: Del ALCA a los
Acuerdos de SanAndrés"
.
Este texto encontra-se em
http://resistir.info
|