Einstein Cidadão e cientista
por Rui Namorado Rosa
Biografia breve
A importância da obra de Einstein
Einstein no nosso quotidiano
Vida cívica de 1900 a 1939
A era nuclear
Face ao sionismo
Porquê o socialismo?
O manifesto de Russell-Einstein
Alguma bibliografia online
BIOGRAFIA BREVE
Passam agora 50 anos sobre a sua morte e 100 anos sobre o memorável
período, de alguns meses apenas, durante o qual publicou cinco trabalhos
que revolucionaram a Física. Einstein foi um homem excepcional. Deu
contribuições revolucionárias ao avanço da
Ciência, foi um cidadão do mundo com empenho e acção
cívica exemplar e, pela sua personalidade, tornou-se em ícone
popular. A sua vida e obra merecem ser conhecidas e recordadas.
Albert Einstein nasceu em 1879 numa família alemã, burguesa e
liberal, de ascendência judia, secular. Aos dezasseis anos de idade, por
iniciativa própria, deixou Munique e mudou-se sozinho para a
Suíça, a fim de estudar no Instituto Politécnico de
Zurique, onde se licenciou em 1900. No ano seguinte, renunciou à
cidadania alemã, a fim de evitar o serviço militar, e adquiriu a
nacionalidade suíça. Aí também obteve o seu
doutoramento, em 1905.
Na falta de um emprego académico, foi admitido em 1902 como terceiro
oficial no Serviço de Patentes Suíço em Berna. Nele
desempenhou com competência as funções técnicas que
lhe couberam mas sobretudo aproveitou o tempo disponível para elaborar
os seus estudos e redigir os artigos que publicou em 1905 e lhe valeram, dentro
de alguns anos, o reconhecimento científico internacional.
Em 1914, pouco antes da deflagração da Primeira Guerra Mundial,
Albert Einstein foi nomeado professor da Universidade de Berlim e
académico na Academia das Ciências Prussiana. Instalou-se em
Berlim e readquiriu a nacionalidade alemã.
Por esse tempo, separou-se de sua primeira mulher Mileva Maric, que regressou a
Zurique com os dois filhos do casal e, em 1919, casa com sua prima Elsa
Löwenthal.
O seu pacifismo e a sua origem judaica tornaram-no impopular entre os
nacionalistas alemães, hostilidade agravada pelos seus êxitos
científicos e o seu reconhecimento internacional (sobretudo após
a confirmação observacional da teoria da relatividade geral, em
1919).
A década de 20 foi de intensa actividade cívica e
científica, pontuada por numerosos convites e viagens ao estrangeiro. Em
1922 foi-lhe atribuído o Prémio Nobel de Física de 1921
pela interpretação do efeito fotoeléctrico. Mas,
encontrando-se de viagem ao Japão, não participou da
cerimónia de entrega do prémio.
Em 1933, Hitler chega ao poder na Alemanha. Einstein, judeu e socialista,
encontra-se ameaçado. É avisado por amigos e aconselhado a
emigrar. Einstein renuncia de novo à cidadania alemã. Depois de
passar pela Bélgica e Inglaterra, em Outubro de 1933 parte para os
Estados Unidos da América a caminho do exílio, onde se
naturalizou em 1940 como cidadão norte-americano (preservando todavia a
nacionalidade Suíça).
Faleceu em 1955 e as suas cinzas foram dispersas em local desconhecido.
A IMPORTÂNCIA DA OBRA DE EINSTEIN
Einstein é por alguns considerado como uma prova viva do conceito de
juízo sintético a priori, formulado por Kant em
Crítica da razão Pura
(1781), isto é, o que consegue elaborar uma teoria concebida pela
inteligência que, sem ingerência do empírico, traga algo de
novo acerca do sujeito, uma nova lei. Mas essa concepção
será por demais idealista. Einstein era um conhecedor do mundo
empírico, foi analista e reconhecido perito de patentes, ele
também inventor, co-autor de alguns trabalhos de índole
experimental. O original destaque que as experiências conceptuais
apresentam no seu processo de descoberta e exposição, revelam uma
poderosa capacidade teórica fortemente ancorada na
observação factual.
Hoje parece evidente. Mas no início do século XX a
descontinuidade na Natureza com a existência de átomos, e ainda
menos de corpúsculos de luz, não eram geralmente aceites, mesmo
entre os maiores cientistas. Os enormes avanços da Ciência durante
o século precedente, nos domínios da Óptica, da
Termodinâmica e do Electromagnetismo, tinham sido realizados considerando
a matéria e a energia como entidades contínuas. Não
só se interpretara com sucesso inúmeros fenómenos com
também se desenvolveram frutuosas tecnologias. Haveria alguns pontos em
dúvida, como sempre, mas como ousar questionar os pressupostos mais
básicos?
O efeito fotoeléctrico fora descoberto muito antes, mas sem que tivesse
despertado grande interesse nem oferecido qualquer utilidade. Einstein ao
interpretá-lo e ao descrever as suas leis (que só depois foram
plenamente verificadas) esclareceu também o real e revolucionário
significado da hipótese de Planck, que este em 1900 formulara como
expediente ao descrever o espectro de emissão de luz por corpos
incandescentes. Foi então (1905) que Einstein concebeu a natureza
corpuscular da emissão, absorção e
propagação da luz, em partículas contendo uma quantidade
elementar de energia simplesmente relacionada com a respectiva cor.
Tal concepção parecia contrariar radicalmente a teoria
ondulatória da luz, que ao longo do século XIX se consolidara
firmemente na interpretação qualitativa e quantitativa dos
fenómenos luminosos. Só alguns anos depois esses
corpúsculos receberam um nome próprio
fotão e foram inquestionavelmente aceites por todos,
ao revelarem o seu poder interpretativo em outros fenómenos que
entretanto foram descobertos ou estudados (designadamente o efeito
Compton).
Einstein iniciou pouco depois a generalização da teoria da
relatividade. Em 1907 ele equiparou o movimento em queda livre a movimento
inercial, para o qual as leis da relatividade especial deveriam ser igualmente
válidas (princípio da equivalência), e previu o
fenómeno da dilação gravítica do tempo. Finalmente
em 1916, enunciou de forma sistemática a teoria da relatividade
generalizada, segundo a qual a massa dos corpos distorce o contínuo
espaço-temporal, ditando a lei do seu movimento relativo.
A teoria, muito abstracta, carecia de verificação
empírica, o que era tanto mais difícil quanto a grandeza dos
efeitos preditíveis seriam extremamente pequenos no âmbito de
observações acessíveis à época. A
precessão do periélio de Mercúrio foi o seu primeiro e
imediato teste. O segundo foi o desvio de um feixe de luz na vizinhança
e sob a influência de um corpo maciço; este teste foi feito sobre
a observação do movimento de estrelas na vizinhança
aparente do Sol, por ocasião do eclipse solar total de 1919. Arthur
Eddington foi o grande promotor das expedições para o efeito
realizadas pela Royal Astronomical Society de Londres, na Ilha do
Príncipe e em Sobral no Brasil, cujos resultados suportaram as
previsões da teoria e contribuíram para a sua
aceitação internacional. A teoria da relatividade geral ganhou
rapidamente grande alcance científico e filosófico, dado que ela
é o suporte em que se formulam os modelos cosmológicos, e por
consequência, se firmam os avanços da Cosmologia.
Pouco mais tarde (1917), estudando a interacção da luz com a
matéria, Einstein previu o fenómeno da emissão estimulada
de radiação, um fenómeno discreto que passou relativamente
desapercebido, até que foi pela primeira vez utilizado para amplificar a
intensidade de um feixe de micro-ondas mediante uma cavidade reflectora em
ressonância maser (inventado por Charles Townes em
1954). Após o que, físicos e engenheiros, inventaram diversos
dispositivos capazes de emitir intenso feixes paralelos de luz coerente
os laser, que são poderosos instrumentos de
investigação e encontraram múltiplos domínios de
aplicação.
Em 1924, em correspondência mantida com Satyendra Bose, Einstein concebeu
um novo estado da matéria, constituído por um
condensado de átomos a temperatura extremamente baixa, que
exibiria superfluidez e coerência de movimento (análoga à
coerência da luz laser). Este estado só viria a ser realizado em
laboratório pela primeira vez em 1995, em Boulder na Universidade do
Colorado, com o auxílio de campos magnéticos e lasers utilizados
na contenção e arrefecimento de um vapor metálico, quase
imobilizando os átomos que ficam constrangidos a movimento sincronizado,
atingindo então o estado denominado condensado de
Bose-Einstein.
EINSTEIN NO NOSSO QUOTIDIANO
O trabalho de Einstein teve sua repercussão mais directa no plano das
ideias, das teorias físicas e da filosofia da ciência. Mas a sua
profundidade iria surpreendentemente revolucionar as nossas vidas no plano
prático quotidiano. Não que ele tivesse sido um inventor de
génio (de facto registou um par de patentes apenas) mas porque
interpretou e criou os quadros teóricos que explicam e conduziram
à descoberta de novos fenómenos e a invenção de
novos dispositivos técnicos.
O detector fotoeléctrico que faz actuar a abertura da porta ou acender a
luz, baseia-se no fenómeno fotoeléctrico que Einstein
correctamente interpretou. Esse efeito está sob múltiplas formas
omnipresente no mundo contemporâneo desde grandes dispositivos
astronómicos até máquinas fotográficas e
fotocopiadoras comuns.
Os lasers que gravam e lêem CD e DVD, são uma
invenção baseada numa descoberta teórica de Einstein, cuja
utilidade passou muito tempo desapercebida. Hoje, os lasers são
instrumentos fundamentais tanto no registo e leitura de
informação como na sua transmissão, designadamente
mediante a propagação via cabo óptico; estão
presentes nos gabinetes médicos e hospitais, em dispositivos de
diagnóstico e de tratamento; nos giroscópios que apoiam a
navegação de aviões (e condução de
mísseis e bombas teleguiadas); etc.
O relógio atómico, realizado em meados da década de 1950
nos EUA, Grã-Bretanha e União Soviética, depois
internacionalmente adoptado como padrão do tempo em 1967, utiliza um
amplificador de micro-ondas maser, sendo assim um resultado indirecto da
descoberta da emissão estimulada (Einstein, 1917); as versões
actuais de relógio atómico atingem a precisão de 1 segundo
em vários milhões de anos; e versões em desenvolvimento,
utilizando um condensado de Bose-Einstein (concebido em 1924) e luz laser,
permitirão uma precisão mil vezes superior.
Essas grandes precisões podem parecer preciosismos gratuitos, mas
não o são. Já estamos familiarizados com os GPS,
dispositivos que permitem fazer a localização exacta de um local
na Terra e, em consequência, estudar com rigor a sua forma e apoiar a
navegação de quaisquer veículos; aviões e navios
utilizam-nos há largos anos e os automóveis já
começaram a ser equipados com eles também. O GPS (Global
Positioning System), à semelhança do GLONASS soviético e o
próximo GALILEO Europeu (anunciado para 2008), é um sistema de
cerca de 24 satélites terrestres, seguindo trajectórias
previsíveis e monitorizáveis, cada um levando a bordo um
relógio atómico e um computador e um transmissor de sinais de
rádio codificados. Um observador na Terra, receberá os sinais
emitidos pelos satélites acima do seu horizonte e, com o auxílio
de um pequeno receptor GPS, por triangulação calcula a sua
posição; instrumentos correntemente acessíveis conseguem
uma precisão de alguns poucos metros. Mas para atingir esse grau de
rigor, o sistema tem de incorporar duas pequenas
correcções relativistas (isto é, fornecidas pela Teoria da
Relatividade), uma devida à velocidade a que se deslocam os
satélites e a outra devida à influência da gravidade
terrestre sobre a velocidade de propagação dos sinais de
rádio.
VIDA CÍVICA DE 1900 A 1939
Einstein viveu em Zurique desde 1895, tendo-se licenciado em 1900 na Escola
Politécnica, e aí permaneceu procurando arduamente um emprego
seguro, até 1902, quando foi admitido como terceiro oficial no
Serviço Suíço de Patentes em Berna.
A despeito da privação material, chegando mesmo a alimentar-se
precariamente, o ambiente cultural de Zurique proporcionava a Einstein
condições de grande enriquecimento; e é nesse ambiente
cultural que o jovem Einstein forja sua cultura científica e
personalidade.
Nessa parte da Europa Central estavam então em gestação
três grandes revoluções da passagem do século: o
marxismo, a psicanálise e a física moderna. Zurique era uma
incubadora de revoluções; nas repúblicas estudantis o
clima de liberdade era inebriante e discutiam-se a modernidade e o
socialismo; por lá passaram personalidades que se tornariam famosas:
Lenine (ideólogo e obreiro da revolução soviética),
Trotsky e Plekhanov; Rosa Luxemburg (revolucionaria internacionalista fundadora
do partido comunista Alemão); Théodor Herzl e Chaim Weizman
(fundadores de Israel); Jung (um dos fundadores da psiquiatria). Aí
passou muitas horas no Café Odeon, ponto de passagem e convívio
de radicais russos e de outros intelectuais, participando nas suas
tertúlias. Entre a adolescência e a juventude, Einstein lê
Kant e inicia-se na leitura de autores socialistas, particularmente Marx e
Mach. Tais leituras terão sido estimuladas pelo seu colega Friedrich
Adler. Este, estudante de física com inclinação para a
filosofia e leitor dos clássicos do marxismo, era um activista
político, que mais tarde abandonou a carreira científica para se
dedicar à política, no partido socialista austríaco.
Em 1902, pouco antes de assumir o seu primeiro emprego permanente, Einstein
cria com alguns amigos (Conrad Habicht e Maurice Solovine) a Academia
Olímpia que, como toda academia, tinha seus "membros
correspondentes" (seus outros amigos Paul Habicht, Michele Besso e Marcel
Grossman). Esse grupo de recém-licenciados à procura de emprego
constituiu uma contra-cultura das mais profícuas da história da
ciência comparável ao grupo de discussão liderado
por Freud, e que na mesma época se reunia em Viena.
Entretanto, a partir do seu
annus mirabilis
ganha progressivamente reconhecimento e notoriedade. Em 1914, pouco antes da
deflagração da Primeira Guerra Mundial, nomeado director do
Instituto Kaiser Wilhelm de Física e professor da Universidade de
Berlim, bem como académico na Academia das Ciências Prussiana,
instalou-se em Berlim e readquiriu a nacionalidade alemã. Assim
permaneceu em Berlim completando a sua teoria da relatividade generalizada, mas
de modo algum indiferente aos acontecimentos políticos e militares. Ele
opunha-se à guerra, alinhando com a corrente minoritária do
partido Social-Democrata que via na guerra a disputa entre as classes
dominantes das potências beligerantes.
Manifestou-se um pacifista oposto à guerra logo aquando da sua
deflagração e mostrou-se chocado pela iniciativa de colegas seus
que apoiaram o esforço de guerra alemão. Quando surgiu o
Manifesto de Fulda, também conhecido por Manifesto ao Mundo
Civilizado ou Apelo ao Mundo da Cultura, publicado em Outubro
de 1914 logo após o início da guerra, Einstein recusou-se a
subscrevê-lo. Era uma peça de propaganda que procurava contrariar
as notícias atrozes da guerra (como a destruição da
Biblioteca de Lovaina pelas forças alemãs) e colocar a
intelectualidade ao lado do militarismo alemão, tendo sido subscrito por
93 intelectuais alemães (incluindo muito cientistas ilustres). Aí
se afirmava que a ciência alemã deveria estar a
serviço da pátria e de suas forças armadas. Pelo
contrário Einstein, com G. F. Nicolai e F. W. Förster, redigiu um
contra manifesto, O Internacionalismo e a Paz ou "Manifesto
aos Europeus", que poucos tiveram a convicção e coragem de
assinar, e que a imprensa alemã procurou suprimir. Einstein aderiu
também à Liga da Mãe-Pátria, uma
associação política unitária de espectro largo que
defendia um rápido fim para a guerra e o estabelecimento de uma
organização internacional que prevenisse futuros conflitos
armados. Mais tarde, nos dias subsequentes ao armistício, quando o
Kaiser e mais sete monarquias europeias foram abolidas, Einstein afixou
à porta do seu gabinete Aula cancelada
Revolução. Mas ele, que se identificara com o movimento
estudantil radical e com colegas anti-belicistas, teve que desde já
prosseguir com eles na resistência para enfrentar a ascensão do
revanchismo militarista que não soçobrara e que acabou por
conduzir ao nazismo.
Entretanto, no plano internacional as relações científicas
haviam ficado seriamente prejudicadas pela guerra. A
desacreditação dos políticos militaristas alemães
perante a opinião pública aliada aparecia como fundamento para a
desacreditação dos cientistas alemães também. Por
outro lado, o Manifesto de Fulda havia contribuído para agravar a
desconfiança. A investigação científica
alemã foi por muitos apercebida corrompida sob preconceito
xenófobo ou desvirtuada por hipotética propaganda de guerra, e
até os mais evidentes sucessos da ciência alemã eram
atribuídos a plagiato ou espionagem.
Essa visão radical e redutora conduziu ao encerramento de muitos canais
de comunicação científica e, em particular, foi argumento
para a exclusão de participantes de encontros científicos
internacionais e até a supressão de fluxo de bibliografia
científica. A Royal Astronomical Society de Londres proibiu a
distribuição das suas publicações em países
inimigos, mesmo após o termo da guerra, pelo que cientistas da
alemães e austríacos recorreram à intercedência de
Eddington. Várias sociedades britânicas expulsaram os seus membros
correspondentes originários de países com que a
Grã-Bretanha estava em guerra. Um virulento sentimento
anti-alemão atravessou a Grã-Bretanha, a França e os EUA e
criou grandes dificuldades ao restabelecimento de relações
após o fim da guerra.
Arthur Eddington, director do Observatório de Cambridge, membro da Royal
Society e secretário da Royal Astronomical Society de Londres, sendo um
pacifista convicto, foi um dos poucos cientistas britânicos a manter
contacto com colegas em países inimigos ou neutros e a fazer
esforços para restabelecer os laços de cooperação
na comunidade científica internacional após o fim das
hostilidades. Foi o holandês de Sitter que o alertou para a nova teoria
da relatividade que surgira na Alemanha durante a guerra. Para além da
sua importância, ele viu na nova teoria uma oportunidade para reparar
danos provocados pela guerra, tanto mais que o interlocutor na comunidade
científica alemã, Einstein, era um pacifista também.
Daí o grande empenho, cívico e científico, colocado por
Eddington na mobilização da Royal Society para as
expedições às Ilhas do Príncipe e de Sobral bem
como na publicitação dos resultados que comprovavam a
teoria da relatividade. O próprio Einstein agradeceu a de Sitter ter
lançado uma ponte sobre o abismo do desentendimento.
O activismo político de Einstein incrementou ainda, após o termo
da Primeira Guerra Mundial. Ele advogou o pacifismo e a
não-violência e a cooperação internacional, e nesse
sentido utilizou todas as plataformas e particularmente os fóruns e
redes de contactos científicos, e colaborou com a Liga das
Nações.
Einstein contava a seu favor com o prestígio internacional que adquirira
e se consagrara na atribuição do prémio Nobel de 1921.
Participou intensamente na vida cultural, social e política durante a
República de Weimar, sendo por vezes porta-voz de posições
contra a ascensão virulenta e violenta do ultra-nacionalismo, racismo e
anti-semitismo, que atravessou a Alemanha durante a década de 20.
Contrariando a elevação das propinas dos estudantes, o seu
idealismo igualitário levou-o a oferecer aulas quotidianas e gratuitas
em horário pós-laboral. E, com o agravamento da
situação política geral, não só actuou no
palco das organizações cívicas como também tirou
partido das oportunidades proporcionadas por conferências
científicas para abordar questões de natureza política.
Crítico do nacionalismo e defensor de um governo mundial, em 1922
integrou o Comité para a Cooperação Intelectual da Liga
das Nações, em cujos trabalhos participou com regularidade entre
1924 e 27.
Foi nesse âmbito do Comité Permanente das Artes e Letras da Liga
das Nações, que procurava encorajar a cooperação
interdisciplinar entre intelectuais, que decorreu a correspondência entre
Einstein e Freud, entre 1931 e 33 (em alemão). Foi então coligida
e publicada simultaneamente em várias línguas sob o título
Porquê a Guerra?. Hitler acabara de assumir o poder na
Alemanha e forçaria esses dois famosos intelectuais ao exílio, de
modo que essa correspondência não foi extensa e não atingiu
grande audiência.
Eis um significativo excerto de uma das cartas de Einstein a Freud:
«(
) O insucesso, não obstante a óbvia sinceridade, de
todos os esforços feitos durante a última década para
atingir esse objectivo, deixa-nos sem alternativa de dúvida que fortes
factores psicológicos operam e paralisam esses esforços. Alguns
desses factores não têm de ser procurados longe. A
ambição pelo poder que caracteriza a classe governante em cada
nação é muito hostil a qualquer limitação de
soberania da nação. Esta fome de poder político suporta-se
frequentemente na actividade de um outro grupo, cujas aspirações
são de base puramente mercenária, económica. Tenho
especialmente em mente grupos pequenos mas determinados, activos em cada
nação, compostos por indivíduos que, indiferentes a
considerações sociais e constrangimentos, consideram a guerra, o
fabrico e o comércio de armas, simplesmente como oportunidade para
promover os respectivos interesses pessoais e incrementar a respectiva
autoridade pessoal.
Mas o reconhecimento deste facto óbvio é apenas o primeiro passo
com vista à apreciação do actual estado de coisas. Uma
outra questão decorre imediatamente dela: Como é possível
que esta pequena clique oprima a vontade da maioria, dos que estão
sujeitos a perder e sofrer em caso de estado de guerra, para serviço das
suas ambições. Uma resposta óbvia a esta questão
parece ser que a minoria, presentemente a classe governante, tem as escolas e a
imprensa, em geral a Igreja também, sob o seu controlo. O que lhe
confere o poder de organizar e governar as emoções das massas e
torná-las em seu instrumento. (
).»
Em 1933, quando o nazismo acedeu ao poder na Alemanha, Einstein deixou o
país, e depois de passar pela Bélgica e Inglaterra, partiu para
os EUA, procurando exílio e finalmente assumindo funções
na Universidade de Princeton.
Desde a sua visita aos EUA em 1932, e após optar pela permanência
definitiva em 1935, até ter atribuída a nacionalidade
norte-americana em 1940 (conservando a Suíça), mesmo nesse novo
contexto Einstein manteve a sua actividade cívica.
Ele apelou para que os refugiados fossem autorizados a emigrarem para os EUA.
Ele apoiou a Republica Espanhola durante a Guerra Civil, ao denunciar e apelar
ao fim do embargo de armas pelos países ocidentais à
República Espanhola, enquanto esta era assediada até ser
derrotada pela sublevação fascista, apoiada pelo nazi-fascismo
alemão e italiano.
A ERA NUCLEAR
Perante a agressividade do imperialismo alemão, quando a
deflagração da Segunda Guerra Mundial parecia estar iminente,
Einstein interveio. Em Julho de 1939, depois de ler os comentários
manuscritos de Leo Szilard e Eugene Wigner sobre a fissão nuclear em
cadeia, terá ficado convencido de que os alemães poderiam
fabricar uma bomba nuclear. Esse foi um ponto de viragem. A 2 de Agosto,
Einstein escreveu uma famosa carta ao presidente Franklin Roosevelt,
alertando-o para a possibilidade de fabrico de uma bomba nuclear e advertindo-o
para a ameaça de a Alemanha poder desenvolver essa arma, e incitando-o a
antecipar-se. Aparentemente esta carta não causou grande impacto no
governo norte-americano, pois os recursos destinados à
investigação da fissão nuclear mantiveram-se
insignificantes. Por sugestão de mais alguns cientistas, Einstein
insistiu escrevendo uma segunda carta a Roosevelt, em 7 de Março de
1940; mas, uma vez mais, o presidente não foi aparentemente
influenciado. O projecto Manhattan só foi decidido em
Outubro de 1941. Tendo talvez influenciado remotamente essa decisão, ele
não foi porém parte activa do projecto Manhattan que
conduziu ao desenvolvimento de diversas tecnologias nucleares e das primeiras
bombas nucleares em concreto; porque não só ele era um pacifista
como era conhecido pelas suas ligações suspeitas
às correntes de esquerda.
Mas ainda antes da utilização da arma nuclear sobre o
Japão (Agosto de 1945), Einstein cedo manifestou a sua grande
preocupação relativamente à perspectiva da sua efectiva
utilização, bem como a uma futura corrida aos armamentos e
às guerras preventivas (carta a Niels Bohr, Dezembro 1944).
O lançamento da bomba nuclear em Hiroshima (6 de agosto de 1945)
produziu um doloroso impacto em todo o mundo e o sentimento de culpa em muitos
dos cientistas que haviam trabalhado no projecto Manhattan e que
depois, pelo seu críticismo, foram perseguidos como dissidentes de um
novo projecto imperial. Terminada a Guerra, Einstein protestou contra a
criminosa incineração nuclear de Hiroshima e Nagasaki em
Agosto de 1945, apenas três meses após a rendição da
Alemanha e quando a rendição do Japão apenas dependia da
sua formalização diplomática. Um novo expansionismo
militarista acabava de emergir das cinzas de uma guerra devastadora. Ele
lamentaria amargamente ter encorajado os primórdios desse projecto,
apesar das circunstâncias da ocasião, e em breve passou a ser
protagonista destacado nas campanhas que cresceram pela Paz, a
abolição de armas nucleares, e um governo mundial que assegurasse
a ordem mundial.
Esses anos foram assinalados pela fúria anti-comunista, alimentada pelo
ódio ao prestígio e poder que a União Soviética
adquirira pela sua resistência e papel determinante na derrota nazi e na
expulsão do império japonês do continente asiático.
Muitos cientistas que haviam participado no projecto Manhattan questionaram a
utilização da arma nuclear e recearam uma corrida armamentista
com a União Soviética. Então, com vista a contrariar essa
evolução, foi criado o Comité de Emergência de
Cientistas Atómicos, logo no próprio mês de Agosto de 1945,
cuja finalidade era conseguir que a energia nuclear fosse subtraída do
âmbito militar e colocada sob jurisdição internacional (
para congregar a influência desses cientistas junto aos respectivos
governos, para que sejam criados força militar e governo
supranacionais
). Este Comité era constituído por alguns dos mais
notáveis cientistas norte-americanos, incluindo os prémios Nobel
Linus Pauling, Harold Urey, Hans Bethe, Leo Szilard e Victor Weisskopf.
Einstein convidado, assumiu a presidência do Comité.
Como presidente desse Comité, Einstein procurou entrevistar-se com o
secretário de Estado para discutir o que considerava ser uma grave
ameaça à paz mundial. A entrevista foi declinada, e Einstein foi
recebido por um funcionário intermédio da Comissão de
Energia Atómica, a quem descreveu a política estrangeira do
governo norte-americano como expansionismo anti-soviético e
ambição imperial tendo então utilizado o termo
Pax Americana
que entraria no discurso político para descrição da
corrente fase histórica do imperialismo.
Ainda em nome do Comité Permanente de Cientistas Atómicos, em
telegrama de 24 de Maio de 1946, Einstein afirmava: A conquista da
energia atómica mudou tudo, excepto a nossa maneira de pensar, e, assim,
seguimos à deriva rumo a uma catástrofe sem limites. Nós,
os cientistas que libertaram essa imensa fonte de energia, temos uma tremenda
responsabilidade nessa disputa mundial de vida ou de morte, a fim de que a
conquista do átomo seja para o benefício de toda a humanidade e
não para a sua destruição.
Em esforço paralelo, na sequência dos contactos internacionais
promovidos por Federic Joliot-Curie e Paul Langevin (em França), Patrick
Blackett e John Bernal (no Reino Unido) e Linus Pauling (nos Estados Unidos da
América), entre outros, foi constituída em Londres, em Julho de
1946, a Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos
com o propósito de estabelecer o diálogo internacional pela
prevalência da Paz. Essa federação constituiu uma inovadora
plataforma de diálogo entre cientistas de todo o mundo, procurando
formas de entendimento e influência que obviassem aos riscos e às
consequências desastrosas de uma guerra nuclear, tendo sido um importante
"corredor" para o difícil diálogo leste-oeste durante a
"guerra-fria".
O primeiro teste nuclear soviético (Agosto de 1949) negou o
monopólio nuclear norte-americano, e desencadeou a corrida no
desenvolvimento de armas nucleares.
As realizações materiais da União Soviética, e
concretamente o respectivo desenvolvimento da arma nuclear nesse clima de
Guerra-Fria, tiveram de ser negadas pelo imperialismo norte-americano. Esse
desenvolvimento teve de ser justificado pela acção de
espiões ou traidores que haveriam transmitido à outra parte o
segredo da bomba. Um episódio trágico foi a
acusação, julgamento e execução do casal Julius e
Ethel Rosenberg, no início da década de 50. A caça
às bruxas acabou por conduzir ao casal Rosenberg, que foram os bodes
expiatórios desse crime anti-patriótico. Porém
a manipulação era óbvia para um observador atento.
Einstein escreveu ao juiz do processo, alegando que este não provava a
culpabilidade para além de dúvida razoável, e que mesmo a
ter-se verificado fuga de informação científica, esta
não era de natureza vital. Sem ter obtido resposta, dirigiu-se
então ao Presidente Truman, mas este não respondeu
tão-pouco. Então divulgou a sua carta à imprensa e depois
escreveu uma outra carta aberta no
New York Times
em que, em última instancia, apelava à clemência
presidencial. Mas nem o prestígio de Einstein deteve a fúria
imperial, e o casal foi executado (Junho de 1953).
Os EUA procuraram retomar o ascendente no poder nuclear. Em Março de
1954, o teste da primeira super-bomba de Hidrogénio ou Termonuclear
norte-americana, no Atol de Bikini, significou um enorme passo em frente na
corrida armamentista, ao demonstrar a viabilidade e operacionalidade de bombas
mil vezes mais potentes que as de Hiroshima e Nagazaki. Mas no ano seguinte a
URSS testou a sua primeira bomba termonuclear também. Estava em marcha a
corrida armamentista, visando a política de
destruição mútua assegurada; a era nuclear
revelava-se apocalíptica.
FACE AO SIONISMO
Ao longo de toda a sua vida, Einstein nunca esqueceu a sua
condição de ascendência judia e nunca foi indiferente ao
destino dos judeus; nem a realidade à sua volta permitia tal
indiferença. Essa foi uma outra vertente da sua
intervenção cívica, para que foi conduzido pelo judeu
russo Chaim Weizmann, destacado militante pelo estabelecimento de uma
nação judia na Palestina, com quem Einstein estabeleceu amizade
no tempo de Zurique. A partir da década de 1920 Einstein toma partido;
ele não apoiou o nacionalismo sionista mas antes defendeu para a
Palestina um Estado baseado no modelo suíço, onde
muçulmanos e judeus pudessem viver lado a lado em paz.
Einstein contribuiu sobretudo para a fundação de uma universidade
hebraica na Palestina, movido pelo desejo que os judeus tivessem acesso
não discriminado à educação, em vista do clima
anti-semita que testemunhava nas universidades europeias. A sua ideia era o
estabelecimento de uma universidade onde judeus de todo o mundo pudessem
estudar sem serem vítimas de discriminação. Tirando
partido de ser um físico famoso, participou numa campanha de
angariação de fundos para a fundação da
Universidade Hebraica de Jerusalém, para a qual contribuiu com uma
série de conferências em universidades norte-americanas em 1921.
Quando a Universidade Hebraica foi efectivamente estabelecida em
Jerusalém, em 1923, foi ele quem fez o discurso inaugural. Entre 1925 e
1928, Einstein chegou a exercer funções na presidência da
Universidade. Mas a breve trecho ficou desapontado com o modo como a
instituição evoluiu e, em 1928, demitiu-se das suas
funções aí. Em 1933, na iminência de ter de partir
da Alemanha para o exílio, declinou a oferta da posição de
professor em Jerusalém.
As suas divergências com o curso do movimento sionista iriam
aprofundar-se. Em 1934 ainda participou no décimo sexto congresso
sionista em Zurique. Pouco depois, em face de notícias da
multiplicação de conflitos entre árabes e judeus na
Palestina, apelou publicamente a um entendimento justo no interesse de ambas as
partes, e interveio em privado junto de Chaim Weizmann, no sentido de serem
criados mecanismos para essa cooperação pacífica um
ideal que não se realizou. Finalmente em 1947, quando a ONU debatia o
futuro da Palestina, Einstein tomou partido contra a partilha que dividiria o
território em dois estados, propondo antes um território
único e desmilitarizado, ocupado pelos dois povos.
Internacionalista convicto, considerava a soberania nacional como um
instrumento de defesa face ao imperialismo mas receava com repulsa a sua
transformação em nacionalismo chauvinista. Um apoiante da causa
de Israel, com essas reservas, escreveu a Weizman, respectivo primeiro
presidente: Se não conseguirmos encontrar o caminho de honesta
cooperação e nos entendermos com os árabes, então
não aprendemos nada dos dois mil anos de desgraças e mereceremos
o destino que nos assaltar. Por morte de Weizman em 1952, declinou a
oferta para ser o futuro presidente de Israel. Diria depois O aspecto
mais importante da política (israelense) deve ser o omnipresente e
expresso desejo de instituir completa igualdade com os cidadãos
árabes que vivem connosco. A atitude que adoptarmos para com a minoria
árabe será o verdadeiro teste dos nossos padrões morais
como povo.
Por testamento, Einstein legou o espólio dos seus trabalhos
científicos à Universidade Hebraica de Jerusalém.
PORQUÊ O SOCIALISMO?
Nos últimos dez anos da sua vida, Einstein devotou-se às causas
do desarmamento nuclear e da paz, da igualdade e da justiça. Participou
no combate anti-racista e integracionista, e concretamente nos
primórdios do
Civil Rights Movement
ao lado de activistas negros como Paul Robeson; em 1954 permitiu
que o seu 75º aniversário fosse oportunidade para a
realização e projecção pública de uma
conferência de luta pelos direitos civis. Combateu o sectarismo
persecutório anti-comunista da administração
norte-americana por vezes personalizada pelo senador Joseph R. McCarthy,
tomando posição em defesa do casal Rosemberg (1953) e do seu
colega J. Robert Oppenheimer (1954), e em outras numerosas circunstâncias
públicas. Num período sombrio de intolerância e de
anti-comunismo militante, e de construção activa da nova ordem
mundial a política da Guerra-Fria, associou-se a
intelectuais de esquerda para contribuir para a fundação e defesa
de um projecto de esquerda a revista marxista
Monthly Review.
O compromisso cívico e a associação de Einstein aos meios
progressistas ficaram assim assinalados no facto de ser autor de um dos artigos
do número inaugural de
Monthly Review,
em Maio de 1949. Significativamente o título é
Porquê o Socialismo?
[
http://resistir.info/mreview/porque_o_socialismo.html
]
«(
) O capital privado tende a concentrar-se em poucas mãos,
em parte por causa da concorrência entre capitalistas e em parte porque o
desenvolvimento tecnológico e a crescente divisão do trabalho
encorajam a formação de unidades de produção
maiores à custa de outras mais pequenas. O resultado destes
desenvolvimentos é uma oligarquia de capital privado cujo enorme poder
não pode ser eficazmente controlado mesmo numa sociedade
democraticamente organizada. Isto é verdade, pois que os membros dos
órgãos legislativos são escolhidos pelos partidos
políticos, largamente financiados ou influenciados pelos capitalistas
privados que, para todos os efeitos práticos, separam o eleitorado da
legislatura. A consequência é que os representantes do povo
não protegem suficientemente os interesses das camadas desprivilegiadas
da população. Além disso, nas condições
existentes, os capitalistas controlam inevitavelmente, directa ou
indirectamente, as principais fontes de informação (imprensa,
rádio, educação). É assim extremamente
difícil e mesmo, na maior parte dos casos completamente
impossível, para o cidadão individual chegar a conclusões
objectivas e utilizar inteligentemente os seus direitos políticos.
(
)
(
) A produção é feita para o lucro e não para
o uso. Não há nenhuma disposição em que todos os
que possam e queiram trabalhar estejam sempre em posição de
encontrar emprego; existe quase sempre um exército de
desempregados. O trabalhador está constantemente com medo de
perder o seu emprego. Uma vez que os desempregados e os trabalhadores mal pagos
não fornecem um mercado rentável, a produção de
bens de consumo é restrita e tem como consequência a
miséria. O progresso tecnológico resulta frequentemente em mais
desemprego e não no alívio do fardo da carga de trabalho para
todos. A motivação do lucro, em conjunto com a concorrência
entre capitalistas, é responsável pela instabilidade na
acumulação e utilização do capital que conduz a
depressões cada vez mais graves. A concorrência sem limites conduz
a um enorme desperdício do trabalho e a esse enfraquecimento da
consciência social dos indivíduos que mencionei anteriormente.
Considero este enfraquecimento dos indivíduos como o pior mal do
capitalismo. Todo o nosso sistema educativo sofre deste mal. É incutida
uma atitude exageradamente competitiva no aluno, que é formado para
venerar o sucesso de aquisição como preparação para
a sua carreira futura.
Estou convencido que só há
uma
forma de eliminar estes sérios males, nomeadamente através da
constituição de uma economia socialista, acompanhada por um
sistema educativo orientado para objectivos sociais. Nessa economia, os meios
de produção são detidos pela própria sociedade e
são utilizados de forma planeada. Uma economia planeada, que adeque a
produção às necessidades da comunidade, distribuiria o
trabalho a ser feito entre aqueles que podem trabalhar e garanta o sustento a
todos os homens, mulheres e crianças. A educação do
indivíduo, além de promover as suas próprias capacidades
inatas, tentaria desenvolver nele um sentido de responsabilidade perante o seu
semelhante, em vez da glorificação do poder e do sucesso na nossa
actual sociedade. (
)»
O MANIFESTO DE RUSSELL-EINSTEIN
Na última etapa da sua vida, Einstein ainda contribuiu para um novo e
forte impulso ao movimento pacifista e anti-imperialista no plano
internacional, com repercussões duradouras.
Em carta de Bertrand Russel a Albert Einstein (Fevereiro de 1955), propondo um
manifesto destinado a colher um vasto apoio na comunidade científica,
aquele afirmava:
Como qualquer pessoa capaz de reflectir, estou profundamente chocado com
a corrida para aquisição de armas nucleares. (
) Embora a
bomba H seja actualmente o ponto central, ela não exaure a capacidade da
ciência de proporcionar novas alternativas, sendo provável que os
perigos advindos de material bélico bacteriológico sejam, em
pouco tempo, da mesma magnitude. (
) Isso reforçaria a
constatação fundamental de que a guerra e a ciência
já não podem coexistir.
O Manifesto afirma: «(
) Na trágica situação que
confronta a humanidade, cremos que os cientistas deveriam reunir-se numa
conferência para avaliarem os perigos que resultam do desenvolvimento de
armas de destruição maciça, e discutirem uma
resolução no espírito da minuta anexa (
).
Resolução: Convidamos este Congresso, e por seu intermédio
os cientistas do mundo e o público em geral, a subscreverem a seguinte
resolução: Em vista do facto que em qualquer futura guerra
mundial serão certamente utilizadas armas nucleares, e que tais armas
ameaçam a sobrevivência da humanidade, instamos os governos
mundiais a reconhecer e a declarar publicamente, que os seus propósitos
não podem ser prosseguidos pela guerra mundial, e instamo-los,
consequentemente, a encontrarem meios pacíficos para a
resolução de todas as causas de disputa entre eles.
Max Born, Percy W. Bridgman, Albert Einstein, Leopold Infeld, Frederic
Joliot-Curie, Herman J. Muller, Linus Pauling, Cecil F. Powell, Joseph Rotblat,
Bertrand Russell, Hideki Yukawa
»
Os termos concretos do Manifesto foram elaborados por Russell. O Manifesto era
também um apelo para um congresso entre cientistas dos dois grandes
blocos político-militares emergentes da Segunda Guerra Mundial, mas tal
encontro não viria a materializar-se como previsto. A resposta de
Einstein para Russell, datada de 11 de Abril de 1955, concordando com os termos
do Manifesto, representa o seu derradeiro acto público. A morte de
Einstein, sete dias depois, precipitou a divulgação do Manifesto,
subscrito apenas pelos seus promotores mais directos, mas contribuiu
também para a sua grande ressonância.
Na sequência da divulgação do Manifesto Russell-Einstein
à comunicação social em Londres, a 9 de Julho 1955, o
físico alemão Max Born liderou o encontro e a assinatura, a 15 de
Julho 1955, da Declaração de Mainau (Alemanha) subscrita por 52
laureados pelo Prémio Nobel, que apelava à renúncia
à força como solução política última.
Por outro lado, em colaboração com Joseph Rotblat, Bertrand
Russell lançou o movimento pacifista Pugwash para a
cooperação entre cientistas de todo o mundo, na procura do
controlo das armas nucleares e pelo desarmamento, movimento que, tal como a
Federação Mundial dos Trabalhadores Científicos, já
fundado em 1946, sobreviveu e trabalha até ao presente.
Estes esforços de alguns dos mais prestigiados cientistas a nível
mundial, contribuíram nessa oportunidade para o lançamento de
vários outros movimentos pacifistas e anti-nucleares, a outros
níveis e com outros protagonistas, bem como muito concretamente para
sucessos diplomáticos que conduziram aos Tratados anti-nucleares PTBT,
TNP e outros posteriores.
ALGUMA BIBLIOGRAFIA ONLINE
Einstein Archives On-Line, The Hebrew University of Jerusalem
http://www.alberteinstein.info/
John J. Simon, Albert Einstein, Radical: A Political Profile, Monthly Review,
2005.
http://www.monthlyreview.org/0505jjs.htm
Federal Bureau of Investigation, Freedom of Information/Privacy Act Section,
Albert Einstein
http://foia.fbi.gov/foiaindex/einstein.htm
Sandra Ionno Butcher, The Origins of the RUSSELL-EINSTEIN MANIFESTO
Pugwash Histories Series, Number One, May 2005
http://www.pugwash.org/publication/phs/history9.pdf
Matthew Stanley, An Expedition to Heal the Wounds of War - The 1919 Eclipse and
Eddington as Quaker Adventurer
http://www.journals.uchicago.edu/Isis/journal/issues/
Rainer Santi, 100 years of peace making, A history of the International Peace
Bureau and other international peace movement organisations and networks. Pax
förlag, International Peace Bureau, January 1991,
http://santibox.ch/Peace/Peacemaking.html
C. A. dos Santos, Einstein na ETH, 2000
http://www.if.ufrgs.br/einstein/eth.html
John Stachel, How Did Einstein Discover Special Relativity? 1986.
http://www.aip.org/history/einstein/essay-einstein-relativity.htm
John D. Norton, University of Pittsburgh, HPS 2590 Einstein 1905, 2004.
http://www.pitt.edu/~jdnorton/teaching/2509_Einstein_1905.html
Answers.com, Albert Einstein
http://www.answers.com/main/
Vijay Prashad, To get Einstein, Frontline, Volume 19 - Issue 12, June 8-21, 2002
http://www.frontlineonnet.com/fl1912/19120720.htm
Matthew Stanley, An Expedition to Heal the Wounds of War, Isis, 2003, 94:57-89.
http://www.journals.uchicago.edu/
Wikipedia, Tests of general relativity
http://en.wikipedia.org/wiki/Tests_of_general_relativity
Peter Coles, The story of how a British scientist used an eclipse to provide
the evidence for Einstein's theory of general relativity
http://www.firstscience.com/site/articles/coles.asp
Bulletin of the Atomic Scientists
http://www.thebulletin.org/index.htm
Albert Einstein, Why Socialism? Monthly Review, May 1949.
http://www.monthlyreview.org/598einst.htm
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|