Curso de chiens de garde
Adiantam-se duas das vinte lições do Curso de uma
imaginária Universidade de Verão.
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Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e
corrupta formará um público tão vil como ela mesma.
[1]
Joseph Pulitzer O xonarlismo non morreu. De certeza, cada vez está máis presente. O que morreu e é unha verdadeira desgraza - é o xornalista tradicional, comprometido, axitador, inconformista, crítico Hoxe vivemos tempos de consensos esmagadores. [2] Carlos Reigosa |
Dispomos de centenas de canais/estações de TV/Rádio.
Têm um preço. Facultam-nos milhares de publicações
em suporte de papel/
on-line.
Têm um preço. Estamos cercados por condicionários da
inteligência/da vontade/dos desejos/da sensibilidade/dos impulsos
(políticos/comerciais/sociais/culturais). Convidam-nos a comprar o nosso
cativeiro/a nossa pulseira mediática. São realmente muitos mas
são demasiado semelhantes. Têm dono. Quase todos se declaram
objectivos/ isentos/ imparciais/ independentes. Utilizam muita cor e muito som
para seduzir/estontear: conduzir os rebanhos. Programam os dias e as noites
como os cabos de guerra planeiam as ofensivas: nós, telespectadores,
nós, radiouvintes, nós, leitores, não passamos de
consumidores de refeições preparadas com todos os
aperitivos/condimentos/aditivos das Indústrias da
Infor(matação) Controlada-Publicidade Dirigida. Comecemos por
desconfiar dos que têm necessidade de espectacularizar a
imparcialidade
e de nos envolver nos seus cenários. Tratemos de os sopesar como amigos
de ocasião ou inimigos de camuflado, que nos prestam algum
serviço ou dão algum alvitre ou montam emboscadas.
Lúdicas, por vezes. Tratemos de os ouvir como vendedores de mercadorias
emocionais/mentais, além do seu grande empenho em nos
caninizar/fidelizar como clientes/crentes do Grande Bazar
Mediático-Teologia do Mercado.
Acima de tudo, recomenda-se estado de alerta máximo perante a maior arma
de destruição (massiva/maciça) de
personalidades/colectividades, municiada pelo Neoliberalismo Globalizante: o
televisor. Para manter o estado de prontidão, face a esta Ogiva de
Cabeça Múltipla, é indispensável conservar o
comando sempre em posição correcta: dedo no gatilho.
Alguém nos quer constantemente ordeirizar/abater. Exerçamos o
direito de defesa/contra-ataque. Façamos
zapping
como
snipers
da GEU/Guerrilha Electrónica Universal. Disparemos à queima-roupa
na direcção dos pivots com semblante de Estado ou com ar de
privada/de comentadores de aparência contestatária ou de bobos WC.
Limpemos o
écran
do Sistema com sabão Radical. Para grandes males, grandes
remédios Deixemos de dizer:
É a hora do noticiário.
Não. É a hora do propagandiário. É ur(gente) que
cada cidadão do mundo tire um curso intensivo de
minas/armadilhas/espingardas com mira telescópica. Precisamos de um
Diploma de Atirador Multimédia/de Unidades Móveis de
Glo(balística). Assim, embora dispensando à TV a
atenção devida ao estatuto de instrumento-mor de clonagem de
seres humanos em carneiros, jamais deveremos descurar a Rádio/Imprensa
escrita/oferta livreira/as redes-
net.
Adaptemos a cada produtor/produto a especificidade da carga
balística/do alvo certeiro. Na nossa viseira deveremos, sem grandes
compassos de espera, actualizar as estatísticas: somos um país do
pelotão da frente
em número de consumidores de resíduos audiovisuais e de relva de
estádio e somos um país da
lanterna vermelha
a consumir livros e, quando consumimos, tendemos para a Literatura das
Doenças Infantis do Capitalismo/dos
Chiclets
Culturais de Hipermercado.
Best-seller,
na generalidade, quer dizer Linha Editorial de Cabeleireiro.
No entanto, como consumidores, deveríamos promover a
organização da resistência pessoal/nacional/global,
corporizável num novo tipo de associativismo, a que daremos um nome neo:
DECOMÉDIA.
[3]
Como? Desde já, disparando o telecomando/sintonizador/abandonando nas
bancas e prateleiras o lixo do Sistema. Desde já, usando máscara
no mercado audiovisual e luvas no mercado impresso/abordando relutantemente
qualquer produto das ETAR`s do Poder/Saber. Desde já, cooperando na
formação de novos conteúdos/novos públicos, pois se
nos mantivermos como escaravelhos-bosteiros, arrastando os detritos da
Sociedade da Abundância e se não ampliarmos o Levantamento de
Rancho, restaremos na Pré-História Alimentar das
Cons(ciências).
Arrojemos, na primeira aula de ginástica cívica, um Livro
Proibido e outras publicações marginais contra os vazadouros
digitais/parabólicos/por satélite. Façamos um
esforço para não ofender demasiado a vista com a Imprensa de
Referência/Sarjeta, faces do mesmo sujeito, o capitalismo selvagem, que
finge comer com faca/garfo/guardanapo, fazendo, um, as necessidades debaixo da
mesa/outro, em cima da mesa. Não consumir é uma
opção de grande ascese democrática. Os
telespectadores/radiouvintes/leitores só ganharão em não
acumular resíduos no Sistema nervoso central. A Declaração
de uma Greve Geral por tempo indeterminado a produtos informativos/culturais
avariados talvez se revele uma Forma Superior de Contestação.
Haverá que exaltar a Ideal Liberdade de Imprensa e problematizar a Real
Liberdade de Empresa. Esta última tão receptiva a choques
tecnológicos como avessa a choques sociológicos.
Por outro lado, a auto-legendada Classe Jornalística não deve
ficar à espera de um questionamento ao retardador e do exterior. A
Comunicação é Social mas também comporta uma
dimensão de Sector e uma dimensão de actor. Existem volumes de
dossiers
atirados pelo patronato privado/estatal para a berma da estrada das
negociações. Existem atropelos à Liberdade de Imprensa e
ao Pluralismo que davam para congestionar um Tribunal de Delitos
Censórios-Laborais. A Comunicação Social está a
pedir um buzi(não). Alguma da energia do pseudo-jornalismo musculado da
Nossa Praça faria bem em ser aplicada em causa própria. E tem
prementes/pungentes motivos face às condições
profissionais/assistenciais. Seria uma excelente
cacha
acordarmos com uma vaga de inconformismo vinda de dentro. Teremos, contudo, de
manter a expectativa em limiares típicos de uma
classe
que só é francamente mobilizável quando os motores
sociais aquecem o ambiente e se desencadeiam disputas de amplificadores. As
associações ambientalistas deveriam integrar, sem tibiezas, na
sua Agenda, a maioria das publicações periódias e
não-periódicas e das emissões sonoras e visuais: para
além das mentes, quantas florestas não são devastadas e
quantas atmosferas não se degradam com as edições do
Sistema?
Há, entretanto, que conferir significado a uma
concertação/direcção de pequenos passos. O tempo
não está para conversões em massa mas para
conversões à massa. O que leva uns a entregar-se ao
inimigo/outros a enveredar pela resig(nação). Atitudes que podem
resolver aspirações ou cobrir indolências
particulares/esconder amarguras idealistas mas que nada contribuem para um
ab(anão) nos recintos do publicado e dos públicos. Contribuir
para um meio ambiente mais saneado implica uma
auto-desintoxicação mediática e um desinquinamento das
fontes. Seria bem necessário um Protocolo de Quioto para atenuar a carga
tóxica do Pla
net
da Informação. Mas quem o celebra? Não poderemos confiar
na grande maioria dos Estados nem na grande maioria dos empresários nem
na grande maioria dos assalariados nem na grande maioria dos infogaseados. Como
é do
contudo move-se
de Galileo Galilei, evoluir-se-á do
consenso esmagador
para o consenso emancipador, a partir de Pequenas Células de
Infocidadania/Redes de Contra-Projecto.
Eis o
Estado da Nação
dos Onze.
Os Donos do Showinfo passeiam-se sobre a espinha dorsal de numerosos
red(actores)
chiens de garde
que se reviram com as cócegas ventrais. São mesmo sujeitos para
fingir que nada têm a ver com o retratado/cadastrado. É com este
Jornalismo Ordeirista & Diversionista que temos de nos haver em todos os
debates/combates. É com um ambiente político-jurídico cada
vez mais criminalizador das opiniões anti-sistémicas e da
investigação de fundo que teremos de nos posicionar como
cidadãos-consumidores. De certa maneira/havia mais liberdade de Imprensa
no fim do séc. XIX/princípio do séc. XX em Portugal do que
no fim do séc. XX/princípio do séc. XXI. Se
ressuscitasse/Rafael Bordalo Pinheiro passaria a vida de tribunal em tribunal,
para não dizer de cadeia em cadeia. Provavelmente teria de se refugiar
nas Caldas da Rainha a moldar falos e batráquios em nome do Zé
Povo e da Patroika/antiga Pátria. De facto e
de jure,
a pressão penal paira no clima de trabalho e contribui para o
défice de transparência. Quando é que Bordalo
voltará a chamar porco ao rei? O honrado red(actor) terá de se
precaver. Está de volta o Jornalismo de Entrelinhas. O ludibriado leitor
terá de se defender e treinar a vista. Na verdade e na generalidade, se
gastamos mais de dez minutos com um diário ou mais de quinze minutos com
um semanário da Uniformédia, é de recear um problema de
fixação doentia/amarração. Procuremos um
consultório perscrutador/respeitador de segredos íntimos.
Acomodemos as partes no divã e desvendemos o que nos vai na alma. Ler
jornais poderá significar saber menos? A desconfiança tornou-se
digna de caricatura.
Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data.
[4]
Neste panorama de mentiras e omissões programadas/dúvidas
armadilhadas/verdades superficializadas, é ur(gente) pugnar por um
Jornalismo Inqui(ético), que não se submeta a
consensos esmagadores.
Por este Jornalismo valerá a pena clamar e terçar como Ribine,
sinalizador de leituras essenciais:
Ajuda-me! Dá-me livros, daqueles que um homem, depois de lê-los,
não encontre sossego.
[5]
Este Curso pretendeu alertar alunos/adestrar candidatos/desiludir
estagiários/reescolarizar profissionais. Também teve a
intenção de intranquilizar telespectadores/radiouvintes/leitores.
Fez o possível por reintroduzir o espírito de verão no
inverno do nosso descontentamento.
[6]
Encerraremos o presente ciclo com um apelo/que gostaríamos de ver
retransmitido nos aparelhos de Comunicação ao abrigo do Direito
de Resposta.
Cuidado.
Acima de tudo e de todos/a lidar com a Televisão. Nunca será
demais reflectir sobre o poder fascinador/ regulador/ normalizador/ malfeitor
deste equipamento. Foi transformado numa prótese biológica/numa
arma ideológica e numa fábrica de teledependências.
Tornou-se sofisticada(mente) mediocratizada/mediocratizante. Os Espaços
Retóricos & Cénicos do Sistema estão empenhados em
transmitir/com abundantes e cativantes meios técnicos/a mesma
coisa/defender a mesma causa com caras de cartaz ou fortuitos convidados, mais
ou menos à mesma hora. O telespectador já não suporta o
rancho do dia nem os enlatados da noite?
Zapping.
Mude-se para um canal dito Segundo. Poderá conter menos carga
tóxica/até gratificantes surpresas. Mude-se para a
Mezzo.
Declare-se exilado político-musical.
Zapping.
Mude-se para as manhãs de domingo. As televisões também
obrigam os inocentes a madrugar. Regresse ao parque infantil. É menos
custoso suportar
horários nobres
do que
horários nobres. Zapping.
Mude-se para o National Geographic. Qualquer paisagem é menos
hostil/qualquer selva é menos feroz.
Zapping.
Mude-se para a CNN. Ficará a saber o que pensa o patrão. Evite
perder tempo com intermediários. Tempo é dinheiro.
Money.
Corte nos gastos.
Inscreva-se na RAMG/Resistência Anti-Mediática Global.