O papel dos media na Nova Ordem Mundial
Se Marx tinha razão, ao dizer que as ideias dominantes no mundo
são sempre as ideias das classes dominantes, é muito claro que
essas classes -- em si -- não mudaram nada nos últimos cem anos.
Os donos do mundo continuam a ser os proprietários dos meios materiais
de produção, à escala nacional e internacional. No
entanto, é igualmente claro que as formas da sua dominação
ideológica se modificaram significativamente.
Tomo emprestadas estas palavras de Perry Anderson, editor da
New Left Review
, que me parecem particularmente adequadas para a abordagem do tema do nosso
painel.
Terminada a Guerra Fria, que se saldou pela vitória do bloco capitalista
sobre o socialista, e em que este foi não só derrotado como
desapareceu por completo como sistema mundial, proliferaram como cogumelos os
arautos do fim da história (emblemático título
do livro de Francis Fukuyama), a espalhar a mensagem de que o capitalismo era o
destino único e universal da humanidade, para o qual não haveria
alternativa.
A generalidade dos órgãos de comunicação social,
cumprindo o seu papel de «voz do dono», abriu o seu espaço a
estes preclaros pensadores, que tanto se empenharam em apagar a memória
do efectivo progresso social conquistado pelos trabalhadores e pelos povos em
geral graças à existência de um bloco socialista, como em
nos convencer que uma nova era de paz e desenvolvimento se abria à
humanidade com o fim do «equilíbrio do terror».
Não foi necessário muito tempo para se perceber que o mundo
unipolar resultante da liquidação do bloco socialista tinha dado
lugar à hegemonia imperialista dos Estados Unidos da América, e
que com o fim do chamado «equilíbrio do terror» se foi o
equilíbrio e ficou - em crescendo - o terror.
Ao longo de décadas, a simples existência da União
Soviética serviu de incentivo (e apoio) não apenas às
lutas contra a exploração do homem pelo homem e às
conquistas de elementares direitos sociais no interior dos próprios
países capitalistas, como às múltiplas lutas anticoloniais
levadas a cabo em todo o mundo pelos movimentos de libertação
nacional.
Desaparecida a URSS, os EUA sentiram-se com as mãos livres para impor
uma Nova Ordem Mundial. Um dos pontos de viragem ocorreu em 1999, com a
agressão militar da NATO contra a Jugoslávia, em nome dos
direitos humanos.
O princípio da soberania nacional, inscrito no direito internacional e
consagrado na Carta das Nações Unidas, foi o primeiro a cair sob
a Nova Ordem. E de novo os média se abriram aos teóricos da nova
doutrina do humanismo militar que, do alto da sua sabedoria, vieram
explicar às massas a perversidade da soberania nacional e a legitimidade
de recorrer a todos os meios para a imposição dos direitos
humanos tal como são entendidos no Ocidente pelas classes dominantes.
Tinha começado o que o filósofo liberal John Rawls designou por
nova era da Lei dos Povos, título do livro em que advoga o
uso da força por parte dos povos democráticos para
libertar os povos não democráticos.
A «bondade» da tese de Rawls foi amplamente testada no Kosovo, cuja
verdadeira história só agora começa a ser conhecida, longe
dos holofotes dos grandes meios de comunicação.
Num texto publicado em
The National Post,
em 06/Abril/04, o major-general canadiano Mackenzie, ex-comandante das
forças ocidentais na Bósnia, actualmente na reforma, afirmava
sobre a actuação da NATO no Kosovo e contra a Jugoslávia:
«Há cinco anos, nos écrans dos nossos televisores
sucediam-se imagens de albaneses do Kosovo que fugiam através das
fronteiras para procurar refúgio na Macedónia e na Albânia.
Relatórios alarmistas diziam que as forças de segurança de
Slobodan Milosevic levavam a cabo uma campanha genocida, e que pelo menos 100
mil albaneses do Kosovo tinham sido massacrados e enterrados em valas comuns
por toda a província. (...) O genocídio, proclamado pelo
Ocidente, jamais existiu: os 100 mil mortos, pretensamente enterrados nas valas
comuns, andam à volta de 2000, entre todas as etnias, contando com os
que caíram em combate».
No mesmo artigo, o autor afirma que:
Foram os albaneses que começaram, mas nós
apresentámo-los como vítimas;
Milosevic limitou-se a reagir;
A NATO entregou o Kosovo à mafia;
Nós ajudámos o UCK a criar um Kosovo etnicamente
puro;
Encorajámos os terroristas do mundo inteiro.
Não se pense que Mackenzie, que actualmente trabalha como comentador de
assuntos internacionais para o
National Post
e para cadeias de televisão americanas, é algum santo
caído do altar: enquanto no activo, comandou tropas em diversos
cenários de guerra, do Vietname à América Central, e em
Sarajevo, durante a guerra civil, foi o responsável pelos contingentes
de 31 nações.
Já agora vale a pena lembrar que, passados estes anos, a
situação no Kosovo está ainda mais explosiva e
caótica do que antes, embora tenha saído dos alinhamentos dos
noticiários internacionais. De acordo com os dados disponíveis,
mais de 200 000 não albaneses foram forçados a abandonar o
Kosovo, e o punhado de sérvios, romenos e outros membros das minorias
étnicas que ficaram na província não podem sair em
segurança dos ghettos em que são forçados a viver.
Do ponto de vista económico, a Nova Ordem Mundial assenta na
globalização do livre mercado e, como afirma Michel
Chossudovsky (in
A Globalização da Pobreza e a Nova Ordem Mundial
) é sustentada pela pobreza humana e a destruição do
ambiente, o que segundo o autor origina o apartheid social, promove
o racismo e os conflitos étnicos, mina os direitos das mulheres e,
frequentemente, precipita os países para confrontos destrutivos entre
nacionalidades.
Os dados apontados por Chossudovsky são elucidativos:
(...) Uma minoria social privilegiada tem vindo a acumular vastas
fortunas à custa da grande maioria da população. O
número de multimilionários nos EUA subiu de 13 em 1982 para 149
em 1996 e ultrapassou os 300 em 2000. O «Clube Global de
Multimilionários» (com cerca de 450 sócios) é
detentor de uma riqueza total que excede em muito a soma dos produtos internos
brutos do grupo de países de baixo rendimento, com 59% da
população mundial (...).
Se esta realidade, paradoxal numa sociedade que dispõe dos meios
materiais, técnicos e humanos para que todos possam viver com dignidade,
é alarmante, mais alarmante é ainda que o processo de
acumulação da riqueza se desenvolva cada vez mais no âmbito
das actividades especulativas e que tais riquezas sejam sistematicamente
desviadas para contas confidenciais em paraísos fiscais. De acordo com o
próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), estima-se que
os bens
offshore
de empresas e de indivíduos atinjam os 5,5 mil biliões de
dólares, um valor equivalente a 25% do rendimento total mundial.
Afirmar que a guerra e o «mercado livre» andam de mãos
dadas - uma evidência neste início do terceiro
milénio - não será certamente uma novidade. Parafraseando
Chossudovsky, a guerra destrói fisicamente o que não foi
desmantelado através da desregulação, da
privatização e da imposição de reformas do
«mercado livre», ou, dito por outras palavras, a
«diplomacia dos mísseis» é uma réplica da
«diplomacia dos canhões» utilizada para implementar o
«comércio livre» no século XIX.
Aqui chegados, cabe perguntar: qual é o papel dos meios de
comunicação social nesta Nova Ordem Mundial? A resposta
não é tão simples como pode parecer.
A propósito da cimeira realizada esta semana em Nova Iorque sob o lema
«Fome Zero», o teólogo brasileiro, Frei Betto, enunciou
há dias uma verdade dura como punhos: A cada 24 horas morrem de
fome no mundo 100 mil pessoas, entre as quais 30 mil crianças com menos
de 5 anos de idade. No dia 11 de Setembro, o derrube das torres gémeas
de Nova Iorque completou três anos. Houve imensa comoção
internacional. A cada dia a fome faz desabar 10 torres gémeas repletas
de crianças. Ninguém chora nem se comove. Porquê?»
Como afirma ainda Frei Betto, o velho Marx tinha razão: ainda
não saímos da pré-história da humanidade. Somos 6,1
mil milhões de habitantes nesta nave espacial chamada Terra, dos quais 4
mil milhões vivem abaixo da linha da pobreza».
Sem o pessimismo de Chossudovsky -- para quem os meios de
comunicação globais fabricam as notícias e distorcem
abertamente o curso dos acontecimentos mundiais, impedindo o debate
crítico e mascarando a verdade -- considero que a
resposta à questão de qual o papel dos meios de
comunicação social nesta Nova Ordem Mundial implica em primeiro
lugar uma reflexão sobre as condições em que os
jornalistas exercem as duas vertentes da sua função:
informar
, explicando e contextualizando; e
opinar
, no pleno exercício da sua liberdade de expressão.
Todo o debate sobre a matéria estará inquinado à partida
se não se reconhecer uma evidência: o jornalista, como qualquer
ser humano, é um produto da sua educação, cultura,
experiência, e não um ser imune à sociedade que o rodeia,
quimicamente puro, ou seja, imune às influências do
mundo em que vive, à pressão dos seus sonhos e
ambições.
Uma coisa é o jornalista ter o dever de ser o mais objectivo
possível, outra, completamente diferente, é assumir que pode ser
a encarnação da objectividade.
Importa reter igualmente outro aspecto essencial muitas vezes esquecido: o
jornalista (salvo raras excepções) é um trabalhador por
conta de outrem, o que significa que apesar dos direitos que lhe estão
reconhecidos não é ele quem de facto detém o famoso
quarto poder. Se existe, e acreditamos que sim, este poder
está na verdade dependente de um outro de que pouco se fala: o poder
económico dos detentores dos órgãos de
comunicação.
Acresce que os jornalistas estão cada vez mais dependentes de fontes de
informação que não controlam - na dita aldeia
global são os grandes grupos que possuem capacidade para ter os
seus correspondentes espalhados pelo mundo -, e são cada vez mais
pressionados pela chamada guerra das audiências que
objectivamente impede a distanciação, reflexão e
aprofundamento das matérias a tratar.
E como se isto fora pouco, há ainda a ter em conta os danos
colaterais da guerra contra o terrorismo que se fazem sentir
desde os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 contra os EUA.
Um relatório do Comité para a Protecção de
Jornalistas (CPJ) divulgado o ano passado dava conta de alguns casos ocorridos
em 2002 que vale a pena lembrar:
Em Fevereiro, soldados norte-americanos no Afeganistão detiveram o
jornalista do
Washington Post,
Doug Struck, e impediram-no de investigar as denúncias sobre baixas
civis;
Em finais de Fevereiro, em resposta a uma carta do CPJ ao secretário
da Defesa, Donald Rumsfeld, pedindo explicações sobre o ataque
com mísseis ocorrido a 13 de Novembro de 2001 contra as
instalações da Al Jazeera em Cabul, o Pentágono afirmava,
embora sem fornecer qualquer prova, que o edifício era uma
conhecida sede da Al'Qaeda;
O sequestro e posterior assassinato de Daniel Pearl, repórter do
Wall Street Journal
, no início de 2002, causou grande consternação em todo o
mundo. Os seus algozes acusaram-no de ser um espião ao serviço
dos EUA e de Israel. A acusação, ao que tudo indica infundada,
levou no entanto o representante do CPJ em Washington, D.C., Frank Smyth,
quando testemunhou em Maio perante o Senado, a exortar a CIA a abster-se de
usar jornalistas não americanos como espiões. Desde os anos 70
que a CIA está proibida de recrutar jornalistas americanos como
espiões, excepto em circunstâncias extraordinárias, mas tal
proibição não se aplica a jornalistas estrangeiros. Como
Smyth fez notar, a percepção - ou mesmo o rumor - de que um
jornalista local trabalha para a CIA coloca-o obviamente em grande
perigo. Esta estratégia constitui igualmente uma ameaça
para os jornalistas norte-americanos, como tragicamente sucedeu com Pearl, pois
cria a ideia de que todos os jornalistas são potenciais espiões.
Em finais de Agosto, tropas especiais que participavam na busca de Osama ben
Laden confiscaram os rolos de fotografias a Tyler Hicks, fotojornalista do
New York Times
, e obrigaram-no a apagar as imagens da sua câmara digital;
Em Setembro, a polícia de Washington deteve pelo menos cinco
repórteres que cobriam as manifestações contra o FMI e o
Banco Mundial. Segundo o jornalista Larry Towell, da agência
fotográfica
Magnum,
os jornalistas permaneceram durante várias horas num centro de
detenção até serem libertados, sem que tenha sido
formulada qualquer acusação contra eles;
Ainda em Setembro, um relatório do CPJ manifestava a
preocupação desta organização com o facto de
governos autoritários terem aproveitado a retórica da
guerra contra o terrorismo para justificar a
imposição de restrições à liberdade de
imprensa nos seus países. O relatório, intitulado Olhando
em frente, olhando para trás (Looking Forward, Looking
Back), referia que os governos da Eritreia, Rússia e
Zimbabué tinham qualificado de terroristas os jornalistas
que os criticavam. (Entretanto, com o mesmo pretexto, quer os EUA quer os
países da União Europeia aprovaram legislação
altamente lesiva dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos).
Dados mais recentes, de uma organização tão insuspeita de
simpatias de esquerda como a Repórteres Sem Fronteiras, revelam que, em
2003, foram assassinados 42 jornalistas; pelo menos 766 foram presos; pelo
menos 1460 agredidos ou ameaçados; e pelo menos 501 meios de
comunicação censurados. Se comparados com o ano anterior, estes
números revelam uma tendência preocupante, já que em 2002
foram mortos 25 jornalistas, 692, pelo menos, foram presos, 1420 agredidos ou
ameaçados e pelo menos 389 meios de comunicação foram
censurados.
Já este ano, no congresso da FIJ (Federação Internacional
de Jornalistas), realizado em Atenas de 24 a 30 de Maio, foi revelado que
durante os últimos 12 anos morreram em trabalho mais de 1100 jornalistas
e trabalhadores dos média, vítimas dos alvos das suas
denúncias ou tão simplesmente por se encontrarem no centro de
acontecimentos que tinham por dever relatar. Só no Iraque, desde o
início da guerra e até final de Maio, morreram 45 jornalistas e
profissionais dos média.
Não restam hoje dúvidas de que no mundo em que vivemos o
jornalismo se tornou uma actividade particularmente perigosa, mas mesmo numa
actividade de risco como o jornalismo pode ser, há perigos que
são inaceitáveis.
E inaceitável, em primeiro lugar, como disse o director da CNN, Chris
Cramer, ao intervir no Congresso da FIJ, é que os jornalistas sejam hoje
«alvos deliberados» e já não «vítimas
colaterais».
Inaceitável, como lembrou no mesmo Congresso o jornalista e autor John
Pilger, citando o exemplo da Al-Jazeera cujas instalações no
Afeganistão foram bombardeadas pelos EUA, apesar de a
estação de televisão ter dado as suas coordenadas ao
Pentágono, é que sejam «os nossos governos, os
exércitos dos nossos países que nos estão a matar».
Infelizmente, os problemas com que se debatem os jornalistas e,
consequentemente, os órgãos de comunicação,
não se limitam aos perigos enfrentados em cenários de guerra ou
de conflito.
A nível nacional e internacional assistimos hoje a uma ofensiva
generalizada contra os direitos mais elementares dos jornalistas, enquanto
trabalhadores, e uma não menos agressiva investida contra
princípios fundamentais da liberdade de imprensa.
A situação é agravada pela crescente
concentração que se regista no âmbito da
comunicação social. Segundo os dados disponíveis, o
sistema mundial dos meios de comunicação está nas
mãos de menos de 10 conglomerados mundiais de empresas, enquanto meia
centena de outras dominam os mercados regionais e outros segmentos residuais.
A nível nacional, cinco grupos dominam o sector: a Portugal Telecom,
Cofina, Impresa, Média Capital e Sonae, que detêm igualmente
muitas outras publicações, produtos e serviços, bem como o
controlo de tecnologias e serviços de telecomunicações e
Internet.
As consequências desta realidade são por demais evidentes: o
pluralismo, a independência, os serviços públicos de
rádio e televisão e os direitos dos trabalhadores dos
média estão cada vez mais ameaçados; o papel dos
órgãos de comunicação social no combate às
desigualdades e à exclusão social tende a desaparecer; a
excessiva comercialização dos média está a tornar
os jornalistas em meros «produtores de conteúdos» à
custa da qualidade jornalística.
Significa isto que o mercado de trabalho dos jornalistas, aparentemente amplo
dada a diversidade de títulos, é na verdade cada vez mais
restrito, pois quem entre em conflito num determinado órgão fica
quase automaticamente com as portas fechadas em todos os restantes do mesmo
grupo. Ou seja, estão criadas as condições objectivas para
limitar e condicionar a liberdade de expressão e a liberdade de emprego.
As consequências das alterações verificadas em Portugal
neste sector, durante os últimos 15 anos, exprimem essencialmente uma
lógica de capital financeiro que subverte o papel de serviço
público dos meios de comunicação social.
A necessidade de remunerar o capital o mais rápida e abundantemente
possível vem impondo, entre outros aspectos, uma luta desenfreada pelas
audiências; o sacrifício da qualidade e do rigor informativos a
critérios de rentabilidade económica; a
transformação da informação jornalística em
mera mercadoria; a valorização artificial de temáticas de
mero entretenimento e até de promoção de produtos e
serviços numa lógica exclusivamente comercial; a
adopção de linguagens, estilos e opções editoriais
que põem em causa a autonomia editorial e técnica dos
jornalistas, e a sua deontologia profissional.
Esta nova realidade traduziu-se numa profunda alteração das
relações de trabalho, que passaram a pautar-se, pela parte das
empresas, pelo desrespeito generalizado por direitos consagrados em lei e nos
contratos colectivos de trabalho; pela tentativa de diminuição da
capacidade reivindicativa e do exercício de direitos fundamentais pelos
trabalhadores; pela sistemática utilização de trabalho
precário (recibos verdes e contratos a prazo) e precariedade dos
próprios salários; pelo esvaziamento das redacções,
designadamente com recurso às rescisões ditas amigáveis;
pela criação de condições objectivas -
através da insegurança da relação de trabalho, da
chantagem económica e da desarticulação das estruturas
representativas, designadamente dos Conselhos de Redacção - para
a auto-censura e a subordinação a normas e procedimentos
estranhos à independência dos jornalistas e à liberdade de
imprensa.
Acentuando uma tendência que já vinha a desenhar-se desde 2000, o
ano de 2003 ficou marcado pelo processo de emagrecimento das
empresas de comunicação social, quer nas detidas ou participadas
pelo Estado - RTP, RDP e Lusa -, quer nas pertencentes aos principais grupos
económicos.
As consequências deste processo foram devastadoras, já que
representaram uma diminuição drástica das
contribuições para a Segurança Social e para o Fisco, bem
como uma erosão acelerada dos recursos financeiros acumulados, em
virtude do recurso aos subsídios de desemprego e às garantias de
pré-reforma e/ou reforma antecipada.
Refira-se, a título de exemplo, que só os custos com o
Subsídio de Desemprego aumentaram 47% de 2000 para 2001 e 92,77% entre
2001 e 2002; por outro lado, os dados disponíveis no final de Julho de
2003, revelam que os encargos com o Subsídio de Desemprego tinham
crescido 60,17% em relação ao período homólogo de
2002.
É neste complexo quadro que os jornalistas têm de exercer a sua
actividade.
Pretender que os homens e as mulheres que com toda a dignidade se dedicam ao
jornalismo sejam heróis todos os dias é certamente irrealista.
Mas todos temos certamente o direito e o dever de lhes/nos exigir honestidade.
É quanto basta para que o pessimismo de Chossudovsky não se
transforme no pão nosso de cada dia. Porque o pior que nos podia
acontecer, parafraseando Adelino Gomes (
in Seminário Novas Guerras - Novas Censuras?
) seria chegar ao dia em que, ao olharmos a Newsweek, o Público ou
o Expresso, ao vermos a CNN, a SIC ou a RTP nos perguntaríamos se aquela
era a versão da verdade a que os jornalistas e editores haviam chegado e
tinham para nos dar, ou versão da verdade em que a Bush e Rumsfeld
convinha levarem-nos a crer.
Se tal acontecer, nem sequer podemos dizer que não fomos avisados. Como
afirmou Henry Kissinger (
in Conferência no Trinity College, Dublim, 12/Out/99
), O desafio básico é que a chamada
globalização é realmente um outro nome para o papel
dominante dos Estados Unidos.
[*]
Jornalista. Comunicação apresentada no Encontro Internacional 'Civilização ou
Barbárie", Moura, Setembro de 2004.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
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