O iminente declínio do abastecimento de petróleo

por Nicholas C. Arguimbau [*]

. Olhem para este gráfico e tremam. Não foi feito pelo Earth First [NT 1] . Não foi feito pelo Serra Club [NT 2] . Não foi desenhado por socialistas nem por nazis nem por Osama Bin Laden nem por ninguém da Goldman- Sachs [NT 3] . Se você for adepto dos ' tea-partier " [NT 4] Republicanos, fiquem descansado que ele não foi feito por nenhum Democrata progressista. E vice-versa. Foi desenhado pelo Departamento da Energia dos Estados Unidos, e os militares do Joint Forces Command dos Estados Unidos contribuíram para a sua feitura.

O que é que ele indica? O abastecimento da mais importante fonte de energia mundial está em queda livre. Não num futuro distante, mas dentro de ano e meio. Dentro de 20 anos a produção de todos os combustíveis líquidos, incluindo o petróleo, cairá para metade do que é hoje. E a diferença precisa de ser colmatada por "projectos não identificados" que, segundo afirma um dos mais importantes geólogos mundiais do petróleo não passa de um "eufemismo para a escassez" e, segundo afirma o principal banqueiro da indústria petrolífera mundial "baseia-se na fé".

Este gráfico foi preparado para uma conferência do Departamento de Estado (DOE) na Primavera de 2009 . Observem bem o que ele representa, partindo do princípio que está correcto:

1. O petróleo convencional desaparecerá quase todo dentro de 20 anos, e não se conhece nada que o substitua.
2. A produção de petróleo a partir das actuais fontes convencionais tem vindo a diminuir a um ritmo pouco maior do que 4% ao ano, pelo menos há um ano, e vai continuar a diminuir por um futuro indeterminado.
3. O gráfico indica que já passámos o pico de produção e que já só há 750 mil milhões de barris de petróleo convencional (as áreas referidas na parte "convencional" do gráfico, extrapoladas para a direita como uma exponencial). Partindo do princípio que as reservas restantes eram de 900 mil milhões ou mais no ponto médio, então já passámos o ponto médio em pelo menos 150 mil milhões de barris, ou seja, 5 anos.
4. A produção total de petróleo de todas as fontes actualmente conhecidas, convencionais e não convencionais, vai manter-se "plana" em cerca de 83 milhões de barris por dia durante os próximos dois anos e depois começará a diminuir no futuro, a princípio lentamente, mas a um ritmo de 4% ao ano depois de 2015.
5. A procura vai começar a suplantar a oferta em 2012 e, dentro de apenas cinco anos, será já superior à oferta em 10 milhões de barris por dia. Os militares do Joint Forces Command dos Estados Unidos estão de acordo com estas conclusões específicas. ( http://www.jfcom.mil/newslink/storyarchive/2010/JOE_2010_o.pdf , p.31). Dez milhões de barris por dia equivalem à metade do consumo total dos Estados Unidos. Para compensar a diferença, o mundo teria que encontrar outra Arábia Saudita e pô-la a produzir em pleno dentro de cinco anos, o que é completamente impossível.
(Ver The Oil Drum, http://www.theoildrum.com/node/5154 ).

6. A produção das fontes convencionais existentes vai mergulhar dos actuais 81 milhões para 30 milhões de barris por dia em 2030, uma queda de 63% num período de 20 anos.

7. A satisfação da procura exige que se descubram, desenvolvam e explorem em pleno 60 milhões de barris por dia (105-45) de "projectos não identificados" no período de 18 anos entre 2012 e 2030 e cerca de 25 milhões de barris por dia até 2020, com base numa estimativa muito conservadora de um crescimento anual da procura de apenas 1%. O Instituto Oxford de Estudos Energéticos, independente, avaliou um possível crescimento de 6,5 milhões de barris por dia a partir desses projectos, incluindo as areias betuminosas canadianas, o que implica um défice de 18-19 milhões de barris por dia em comparação com a procura, e uma redução aproximada de 14 milhões de barris por dia na produção total de combustíveis líquidos relativamente a 2012, uma descida de 16% em 8 anos.

8. A curva é praticamente idêntica à produzida pelos geólogos Colin Campbell e Jean Laherrere e publicada em "The End of Cheap Oil," no Scientific American, há doze anos, em Março de 1998. Eles calcularam que a produção de petróleo a partir de fontes convencionais iria diminuir de 74 milhões de barris por dia em 2003 (o que compara com os 84 milhões de barris por dia no gráfico do DOE) e cairia para 39 milhões de barris por dia até 2030 (o que compara com 39 milhões de barris por dia até 2030 no gráfico do DOE!) ( http://www.jala.com/energy1.php ). Campbell e Laherrere previram um "pico" em 2003, e o gráfico acima indica um "pico" (não necessariamente o pico real, mas o ponto médio de produção) em 2005 ou antes disso.

Portanto, se o gráfico está correcto, encontramo-nos à beira de um precipício, sem qualquer aviso prévio nem da indústria, que sabe bem o que possui, nem dos governos que proclamam proteger o interesse público. Conforme afirma Colin Campbell, um geólogo investigador que trabalhou para muitas grandes companhias petrolíferas e estudou exaustivamente o esgotamento do petróleo ( http://www.peakoil.net/about-aspo/dr-colin-campbell ), "Há muito tempo que andam no ar os sinais de alerta. Têm sido fáceis de ver, mas o mundo fechou os olhos e não quis ler a mensagem". ( http://www.greatchange.org/ov-campbell,outlook.html ). O mundo foi completamente transformado pelo petróleo durante o século XX, mas o gráfico tem razão, dentro de 20 anos, o petróleo praticamente desaparece mas a nossa dependência dele não. Em vez disso, temos:

  • Tempo zero para resolver como substituir os automóveis na nossa vida
  • Tempo zero para planear como fabricar e instalar milhões de fornalhas para calefacção a fim de substituir as existentes a petróleo, e zero tempo para produzir as infra-estruturas necessárias para realizar essa tarefa
  • Tempo zero para reformular os bairros suburbanos para que possam funcionar sem gasolina
  • Tempo zero para planear a substituição das maiores instituições militares da história, quase totalmente dependentes do petróleo
  • Tempo zero para planear alimentar nove mil milhões de pessoas sem a "revolução verde", uma criação da era do petróleo
  • Tempo zero para planear a substituição do petróleo enquanto combustível essencial na produção da electricidade
  • Tempo zero para planear a preservação de milhões de quilómetros de estradas sem asfalto
  • Tempo zero para planear a substituição do petróleo no seu papel essencial em TODAS as indústrias
  • Tempo zero para planear a substituição do petróleo no seu papel único de transporte de pessoas, produtos agrícolas, bens manufacturados. Num mundo sem petróleo que parece estar apenas a vinte anos de distância, não haverá navios alimentados a petróleo que transportem cereais dos Estados Unidos para outros países, não haverá aviões alimentados a petróleo que liguem as principais cidades do mundo, não haverá barcos alimentados a petróleo que transportem mercadorias chinesas para os milhares de milhões que hoje delas dependem
  • Tempo zero para planear a sobrevivência dos milhares de milhões de pessoas que se esperam até 2050 depois do "pico de todas as coisas"
  • Capital zero, por causa da incapacidade dos bancos e da dívida pública e privada, em resolver estes problemas

Porquê tempo zero?

Porque, se continuarmos a usar mais petróleo do que o gráfico permite, mais tarde ainda teremos menos.

Porque já estamos comprometidos em alimentar mais 2,5 mil milhões de pessoas do que temos actualmente.

Porque sempre que continuamos a aumentar diariamente o nosso consumo de petróleo, apesar de continuarmos a ter mais pessoas que precisam dele e milhares de milhões que merecem sair duma pobreza aviltante, estamos a contribuir para que a escassez futura do abastecimento seja cada vez maior.

A acreditar no gráfico, a procura vai suplantar a oferta por volta do final de 2011, e suplantar gravemente a oferta dentro de cinco anos. O que é que vamos fazer, e como é que o vamos fazer? Não temos tempo para decidir.

O GRÁFICO ESTÁ CORRECTO?

É muito pouco provável que as coisas possam ser melhores do que aquilo que o gráfico indica. Porquê?

  • A maior parte das entidades considera que ainda há um pouco mais de um milhão de milhões de barris de petróleo convencional. A partir deste número podemos fazer um cálculo simples: Ao ritmo actual de 30 mil milhões de barris por ano, ou seja, 82 milhões de barris por dia, ficará tudo esgotado dentro de 33 anos mas, como o consumo está a aumentar rapidamente, e não a diminuir, de facto ainda vai desaparecer mais cedo…
  • Um olhar mais atento ao gráfico revela que ele foi traçado na presunção de que os actuais campos petrolíferos convencionais mundiais contêm actualmente apenas 750 000 mil milhões de barris, o que só chega para nos manter durante 25 anos.
  • O gráfico assume uma taxa de declínio de 4% ao ano. Se as estimativas das reservas ainda existentes estiverem certas, não deve estar longe da verdade. Com efeito, 4% é uma taxa de declínio relativamente baixa, em comparação com o que se tem observado nos campos petrolíferos, de modo geral. Podem ter a certeza que a descida vai ser bastante rápida!
  • As principais companhias petrolíferas, que presumivelmente sabem melhor do que nós quanto petróleo possuem, "curiosamente deixaram de investir em mais capacidade de refinação, que certamente seria necessária se a produção fosse aumentar". (Campbell, http://www.greatchange.org/ov-campbell,outlook.html ). O excesso de capacidade de refinação para além da procura manteve-se perto dos 10 milhões de barris por dia na década de 90, mas caiu quase para zero na década passada em consequência de essa capacidade não ter sido aumentada. ( http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2006/01/chp1pdf/fig1_21.pdf ).
  • O Comando Supremo Conjunto Militar dos Estados Unidos também informou que a indústria petrolífera não tem investido na capacidade de refinação necessária para permitir a expansão da produção, e que "Mesmo que se iniciasse hoje um esforço concertado para colmatar essa carência, só ao fim de dez anos a produção seria compatível com a procura esperada". ("Joint Operating Environment 2010", 26. http://www.jfcom.mil/newslink/storyarchive/2010/JOE_2010_o.pdf ).
  • A fonte significativa de petróleo inexplorado mais frequentemente referida é as areias betuminosas de Alberta, Canadá. Como é necessário gastar uma alta percentagem do valor energético das areias betuminosas na sua própria extracção, a quantidade das reservas declaradas é enganadora, e dois investigadores independentes calcularam que é de esperar que a recuperação das areias betuminosas em 2020 seja de 3,3 milhões e 4 milhões de barris. Por conseguinte, é baixa a probabilidade de que as areias betuminosas possam ser uma contribuição significativa para a procura mundial de petróleo num futuro próximo. (Phil Hart e Chris Skrebowski, "Peak oil: A detailed and transparent analysis," http://www.energybulletin.net/node/30537 ).
  • A diferença para menos, legendada como "projectos não identificados", que é necessário colmatar dentro de 20 anos, corresponde a uma situação sem precedentes de uns 60 milhões de barris por dia, o que equivale a ¾ da produção total actual. Nunca na história fizemos uma coisa semelhante. Embora haja grandes depósitos de petróleo "não convencional", como sejam as areias betuminosas canadianas, a maior parte deles só estão a progredir lentamente quanto ao seu crescimento e consomem quase tanta energia na produção como aquela que geram. O Instituto de Estudos Energéticos de Oxford, independente, estimou um possível crescimento de 6,5 milhões de barris por dia em relação a esses projectos, quando precisamos mais do que isso, ano sim, ano não, apenas para mantermos a mesma situação. Portanto é pequena a probabilidade de reduzir significativamente o que quer que seja no que se refere a essa diferença para menos. Com efeito, os "projectos não identificados" podem ser entendidos apenas como um "eufemismo para a escassez". (Campbell http://www.greatchange.org/ov-campbell,outlook.html ). O Comando Supremo Conjunto Militar dos Estados Unidos chegou à mesma conclusão: que de todas as potenciais fontes de energia futuras "nenhuma delas nos dá razões para optimismo" ( http://www.jfcom.mil/newslink/storyarchive/2010/JOE_2010_o.pdf ). O banqueiro de investimentos da indústria petrolífera, Matt Simmons, considera-os "baseados na fé". ( http://www.simmonsco-intl.com/files/Northern%20Trust%20Bank.pdf , 4).
  • A teoria do "pico de Hubbert" sobre a depreciação do campo petrolífero, que previu o pico e a subsequente morte da indústria petrolífera dos EU, com 15 anos de antecedência e com um desvio de 2 anos quanto à sua ocorrência, (http://www.hubbertpeak.com/hubbert/1956/1956.pdf), afirma que, com os métodos normais de produção, um país atinge o pico da produção nos seus campos petrolíferos quando estes se encontram explorados a 50%, e a curva de produção começa a ter a forma de sino. O pico pode ser adiado através de técnicas de extracção inovadoras, mas isso só leva ao mais rápido declínio subsequente dos depósitos e da extracção total. O mundo atingiu o ponto médio das suas reservas na década passada, portanto o "pico" em 2005, implícito no gráfico acima, está muito perto daquele que seria de esperar.
  • Surpreendentemente, o Dr. Hubbert no mesmo documento de 1956, previu, com base em registos de apenas 90 mil milhões de barris de petróleo recuperado em todo o mundo, que o pico da produção mundial de petróleo situar-se-ia aproximadamente no ano 2000; esta previsão aparentemente bastante rigorosa feita por Hubbert tem sido bastante esquecida ( http://www.hubbertpeak.com/hubbert/1956/1956.pdf ). Sentimo-nos tentados a perguntar porque é que, se um homem conseguiu prever o momento do pico 44 anos antes de ele ocorrer, o Departamento de Energia dos Estados Unidos é incapaz de o reconhecer depois de ele ocorrer.
  • Há um sentimento comum que, lá porque não sabemos onde está o petróleo, não significa que a Mãe Jazida não esteja ali ao virar da esquina. Mas se procurarmos bem, as probabilidades são muito menores. O intervalo de tempo entre uma descoberta e a produção plena dum campo é de 30 a 40 anos, o que significa que, mesmo com a praticamente impossível descoberta de outra Arábia Saudita, o gráfico acima sofreria apenas mudanças imperceptíveis de produção entre o momento presente e 2030. Mas já não há descobertas dessas. O ritmo de descobertas de novo petróleo convencional tem vindo a diminuir regularmente de há QUARENTA ANOS para cá, apesar de continuarem as pesquisas com tecnologias cada vez mais sofisticadas. Houve dois acontecimentos fulcrais: o pico das descobertas por volta de 1968 e aquele dia em 1981 em que a descoberta de novos depósitos petrolíferos deixou de acompanhar a produção. Não há nada de complicado nisto. Conforme Campbell diz, o sinal de alerta para toda a gente ver
    "reconhecia pura e simplesmente dois factos inegáveis:

    • É preciso descobrir o petróleo antes de o produzir
    • A produção reflecte a descoberta só após um intervalo de tempo

      "A descoberta atingiu um pico nos anos 60 – apesar de toda a tecnologia de que tanto ouvimos falar, e de uma procura mundial para as melhores perspectivas. Não devia ser uma surpresa para ninguém que o correspondente pico de produção esteja agora em cima de nós". Com efeito, o segundo ponto de Campbell significa que o inevitável pico da produção de petróleo no início do século XXI, devia ser óbvio para todos desde o pico da descoberta no final dos anos 60.
    Campbell não está isolado. Conforme observa o Comando Supremo Conjunto Militar dos EU, "O ritmo de descobertas de novos campos de petróleo e de gás nos últimos vinte anos (com a possível excepção do Brasil), não oferece muitas razões para esperar que os esforços futuros venham a encontrar novos campos importantes" ("Joint Operating Environment 2010", 31).

  • O maior campo da Arábia Saudita, o Ghawar, está actualmente em declínio e parece que o país não tem nada para compensar esse declínio. Isso levou muita gente a concluir que o "Peak Oil is a Done Deal" (o "Pico do Petróleo é um Assunto Arrumado"). (Dave Cohen, ASPO/USA Energy Bulletin, 16 de Julho, 2008 ( http://www.energybulletin.net/node/45940 ).

SE É UM "ASSUNTO ARRUMADO", PORQUE É QUE ESPERÁMOS ATÉ AO ÚLTIMO MINUTO PARA PERCEBER ISSO?

"Podemos desejá-lo, podemos sonhar com ele, mas nunca voltará, o petróleo não é renovável, e por isso tempo virá em que se terá consciência de que JÁ NÃO HÁ MAIS PETRÓLEO". (ENO Petroleum Corporation, "Peak Oil - The Global Oil Crisis" http://www.enopetroleum.com/opecoilreservers.html ). É difícil imaginar um acto ou omissão que provoque mais prejuízo a um maior número de pessoas e animais do que a omissão dos "responsáveis" em anunciar com uma antecedência razoável que o fornecimento de petróleo iria acabar. Mas nós é que apanhamos em cheio o facto de não ter havido nenhum alerta prévio ao público em geral.

Os organismos de planeamento do governo encarregados de ajudar a população a sobreviver após o fim do petróleo não podiam ter agido pior ao reconhecerem o pico do petróleo apenas depois de ele ocorrer. Tal como o aquecimento global antropogénico ("AGA"), o "pico do petróleo" tem sido um assunto sujeito a décadas de negação [NR 1] . Não obstante a conhecida vitória de Hubbert ao apontar o pico da produção de petróleo dos EU através da simples observação de que a produção evidentemente atinge o seu pico depois de o abastecimento ter chegado a metade, pouca gente deu ouvidos a que, como o abastecimento mundial de petróleo convencional iria atingir o ponto médio na primeira década deste século, as dificuldades estavam ao virar da esquina. O facto é que a chegada a este ponto significava que já estávamos com problemas. Embora as fases iniciais de crescimento de um campo petrolífero (tal como as fases iniciais de crescimento em praticamente todas as coisas) sigam uma curva de crescimento exponencial, e os viciados do crescimento mundial adoram curvas exponenciais, a verdade é que é uma certeza matemática que, depois de atingir o ponto médio, quanto mais tempo se tentar ajustar o campo a um padrão de crescimento exponencial, mais íngreme será o seu fim. Se não desacelerarmos rapidamente, é precisamente isso que vai acontecer – o declínio depois do ponto médio só pode ser mais rápido do que a subida anterior.

O que Hubbert observou em relação às reservas petrolíferas americanas tem um significado intuitivo – à medida que o petróleo diminui no campo, a pressão desce, e por isso o fluxo começa a abrandar – o jorro do poço passa a ser uma bica. Mas se o proprietário do campo não revelar inteiramente o que é que está lá dentro, os observadores externos apenas podem fazer estimativas quanto ao que o futuro reserva a partir de princípios geológicos e das quantidades que o dono está a vender. E como todos sabemos, revelação total não é o nome do jogo no negócio do petróleo.

Se se deixasse que o campo libertasse apenas o seu ouro líquido a um ritmo natural, isso não seria mau, porque podiam aplicar-se observações como o Pico Hubbert. Mas, como a tecnologia evolui e a pressão do poço pode ser reforçada para compensar as reservas em declínio (por exemplo, bombeando água nos poços), o observador externo fica na incerteza. Restam as informações sobre as reservas da companhia, mas o rigor dessas informações é fortemente posta em dúvida. No seio da OPEP, que permite aos seus membros comercializar de acordo com a quantidade das suas reservas, (Hart, "Introduction to Peak Oil," www.philhart.com/content/introduction-peak-oil , há grandes tentações de aldrabar. Os observadores externos podem acompanhar os relatórios duma companhia sobre as suas reservas, mas esses relatórios são altamente suspeitos. Mantêm-se os mesmos durante anos, embora o país esteja a extrair grandes quantidades de petróleo sem reportar quaisquer novas descobertas e também podem subir bruscamente sem notícias de novas descobertas. Esses "relatórios" levam à conclusão inevitável de que muitas das declarações de reservas da OPEP são pura ficção. Se quiserem ver gráficos das reservas de petróleo da OPEP, contorcendo-se misteriosamente, podem dar uma vista de olhos ao estudo de Hart. Portanto, se julgavam que os especialistas tinham tudo na mão e nos alertariam de forma credível quando os problemas estivessem para chegar, pensem melhor nisso. Não só os membros da OPEP têm razões negociais internas para exagerar as suas reservas, como as companhias no mercado interno de acções querem convencer os seus accionistas da sua validade a longo prazo e todos os produtores de petróleo querem tranquilizar os seus clientes de que podem continuar a confiar no petróleo por muito tempo ainda. Ao esconder o futuro aos proprietários de casas, as companhias petrolíferas deram milhões e milhões a ganhar ao negócio imobiliário e aos bancos à custa dos que optam por viver nos subúrbios em vez de morar nos apinhados bairros "mais próximos", e as próprias companhias irão ganhar milhões e milhões no futuro próximo a vender aos consumidores apanhados pela dependência do petróleo, que podiam ter escolhido alternativas de modo mais consciente se soubessem até que ponto o colapso estava próximo.

Matt Simmons, o banqueiro que após a Faculdade de Gestão de Harvard passou a sua carreira como consultor sobre o pico do petróleo, desde as companhias petrolíferas até à última administração presidencial e, especificamente, a do presidente Bush, devia saber. E o que ele diz é que as companhias petrolíferas ocidentais, como a ExxonMobil, se opunham totalmente à ideia de dados transparentes porque isso iria revelar "até que ponto os seus campos petrolíferos estão realmente em mau estado e envelhecidos" (Energy TechStocks.com, "Meeting the Challenge Matt Simmons: Force All Oil Producers to Give Transparent Data"). Segundo a EnergyStocks.com, Simmons alertou para o facto de "a Arábia Saudita e outros importantes produtores de petróleo não fornecerem dados de produção transparentes tem deixado o mundo indefeso, incapaz de saber se pode manter um abastecimento adequado de petróleo face à procura crescente. Essa incerteza levou à indecisão sobre se o mundo deve investir as gigantescas somas de dinheiro necessárias a desenvolver fontes de combustíveis alternativas para transportes".

Há muito que se sabe até que ponto são maus os números publicados sobre as reservas pelos principais países produtores de petróleo. Gostamos de dizer que o que alto sobe, acaba por cair, mas não o aplicamos às reservas petrolíferas das nações membros da OPEP. As suas quotas de produção permitida dependem das suas reservas, por isso há uma tentação intrínseca de sobreavaliar as reservas e nunca reflectir a parte que foi extraída no valor das reservas reduzidas. Em 1988, as reservas de petróleo da OPEP, "duplicaram mágica e milagrosamente", sem qualquer descoberta correspondente de novos campos. As reservas declaradas oficialmente apresentam gráficos que seriam cómicos se não fosse o facto de que 6,8 mil milhões de pessoas, e o que mais virá, dependem dos números reais. (Ver http://www.enopetroleum.com/opecoilreservers.html )

Enfrentamos agora as consequências de os principais produtores de petróleo terem "mantido o mundo na ignorância": uma incapacidade quase total de resolver as graves dificuldades que enfrentamos, nos transportes, na alimentação, na habitação e no aquecimento dos milhares de milhões do número da população em crescimento. É difícil entender como é possível que uma entidade privada possa impor tanto sofrimento a tanta gente. Não precisava de ser assim. O governo dos EU e as suas coortes em todo o mundo podiam ter imposto a transparência às companhias petrolíferas quanto às suas reservas reais, e nós teríamos tido um aviso leal e a possibilidade de superar o desafio. Pois é, e a lua podia ser feita de queijo.

Evidentemente, como assinalámos, é possível produzir um gráfico aproximado, como o que está acima, apenas com os dados de produção e os dados das reservas. Os primeiros são públicos e os segundos são conhecidos até certo ponto. Durante muitos anos foi consensual para os que tomavam decisões que o mundo tinha um total (tanto de petróleo produzido como do que ainda estava no campo) de cerca de 2 milhões de milhões de barris de petróleo convencional e, conforme sublinhado por Campbell, quatro décadas de descobertas decrescentes deixaram-nos numa situação de incapacidade absoluta de aumentar as reservas disponíveis de forma atempada para minimizar a escassez que se aproxima. O número de dois milhões de milhões de barris era o número crítico para fazer o que um planeamento pode fazer, mas no início da década passada, os EU cerraram fileiras com o consenso do resto do mundo, declarando por intermédio do historicamente fiável US Geological Survey (USGS) que as reservas mundiais de petróleo convencional (tanto o consumido como o por consumir) andavam de facto mais perto dos três milhões de milhões do que dos dois, uma afirmação que, a ser verdade, proporcionava logo ao mundo, por um truque de prestidigitação, um abastecimento de mais trinta anos ao ritmo do consumo actual. Claro que os antigos funcionários do USGS contestaram essa estimativa por se basear "fundamentalmente em estimativas de cálculos de novas descobertas de petróleo" e por duplicar a habitual taxa de recuperação de 30 por cento das reservas "sem haver qualquer tecnologia à vista capaz de fazer isso". (Gordon, "Worries Swelling Over Oil Shortage," Energy Bulletin March 20-, 2005). As preocupações relativas à sobreavaliação das descobertas acabaram por estar certas: manteve-se a sua tendência para a descida. Só este facto criou uma discrepância entre as projecções do USGS e a realidade em aproximadamente 900 mil milhões de barris. Simultaneamente, os dados de produção pareceram atingir o pico em 2005, o destacado geólogo petrolífero da Universidade de Princeton, Kenneth Deffeyes, previu que 2005 era o ano, e Simmons referiu as mesmas preocupações. ( http://www.energybulletin.net/node/4835 e http://www.simmonsco-intl.com/files/Northern%20Trust%20Bank.pdf (p. 31). Apesar disso, com base no "pensamento positivo" do USGS, durante a administração Bush, o Departamento de Energia prognosticava um "pico de produção algures entre 2021 e o início do próximo século, sendo 2037 a data mais provável". ( http://www.energybulletin.net/node/4835 ). Nada de preocupante.

Com o pico iminente na realidade, tal como aconteceu com o "cepticismo científico" do aquecimento global [NR 2] , em 2006 a indústria apareceu com uma "teoria" publicada num relatório não revisto por pares, de que o "pico do petróleo" na sua totalidade era um falso conceito, e de que o comportamento real de um campo petrolífero ou de uma conglomeração petrolífera era um pico seguido por um "planalto ondulante" e a seguir uma descida suave de cerca de 2% ao ano, anos, ou mesmo décadas depois. Segundo a Cambridge Energy Research Associates (CERA), "É provável que a situação decorra em câmara lenta e que haja uma série de décadas para preparar o início do planalto ondulante. Isto significa que há tempo para avaliar a melhor forma de desenvolver alternativas energéticas viáveis que venham ao encontro do grosso das nossas necessidades de energia para transporte" ( www.cera.com/aspx/cda/public1/about/about.aspx ). Nada de preocupante

Plateau ondulante. A CERA acusou os defensores do "pico do petróleo" de não terem em conta o facto de que as estimativas das reservas evoluem com o tempo e que isso acontece de acordo com a tecnologia utilizada para a extracção do petróleo. Esta crítica é cínica, visto que a indústria se recusa a revelar quer a tecnologia que utiliza num dado momento quer as suas reservas reais, e as estimativas das reservas evoluem com o tempo mais por razões políticas do que por razões geológicas. Os factos que os defensores do "pico do petróleo" não podem ter em consideração são os factos que a indústria não revela. Conforme Simmons assinalou, "Com dados sólidos sobre a produção global dos campos de petróleo, 'podia ser comprovada a data do Pico do Petróleo' ". E, evidentemente, se a teoria do "planalto ondulante" estiver correcta, o que a indústria tem que fazer é revelar os factos para a comprovar, mas não o fazem. Além disso, as taxas médias de declínio de um abastecimento de petróleo são ditadas apenas por dois números: a que velocidade estamos a consumir petróleo e quanto resta. Taxas mais baixas de declínio hoje significam taxas mais altas de declínio amanhã. Estes são factos imutáveis mesmo que o "planalto ondulante" esteja correcto. Portanto, para evitar um declínio rápido no petróleo disponível, temos que descobrir e pôr a produzir hoje mesmo novos abastecimentos de uma dimensão incrivelmente grande. Apesar disso, a "teoria" da CERA conseguiu intimidar os burocratas o suficiente para que a posição oficial actual do DOE, conforme expressa ao Le Monde , não obstante o gráfico, seja de que estamos "a entrar num planalto" petrole.blog.lemonde.fr ).

Na mesma altura em que tudo isto se estava a passar, a ONU, o Congresso dos EUA, a administração Obama e a indústria petrolífera andavam a negociar as metas para a legislação do aquecimento global. Milagrosamente, embora talvez não tenha sido coincidência, foram acordadas as metas de redução de percentagens que coincidem exactamente com a percentagem das reduções no consumo do petróleo que serão fisicamente impostas sobre nós todos, a acreditar no gráfico acima: uma descida de 18% entre 2005 e 2020, e uma descida de 85% entre 2005 e 2050 (É possível extrapolar o gráfico, que assume níveis de descida exponenciais das reservas existentes a uma taxa de 4% ao ano). Isto compara com níveis de redução das emissões de CO2 de 17% entre 2005 e 2020 e de 80% entre 2005 e 2050 na proposta. Portanto, parece que estão estabelecidas as metas legislativas, seja qual for a razão, de modo que a indústria petrolífera pouco ou nada terá que fazer em qualquer caso, dada a redução das reservas ( http://ecoglobe.ch/energy/e/peak9423.htm ). É difícil ver como é que os negociadores chegaram a uma correspondência destas se não tivessem plena consciência do colapso iminente da produção e da esperada taxa de declínio. Coincidência? Talvez, mas de qualquer modo parece pouco provável. Intencionalmente ou não, as metas correspondem mais às necessidades das companhias petrolíferas do que às necessidades calculadas pelos cientistas.

Em resumo, com todas estas provas disponíveis, é difícil ver como é que a indústria e o Departamento de Energia podem não ter previsto este desfecho. Dadas as consequências, o facto de não terem alertado o público roça o criminoso. E se, por qualquer modo, se podem declarar inocentes, então ainda temos que perguntar porque é que não deram atenção ao alerta de Matt Simmons, consultor para o pico do petróleo da administração Bush, quanto à importância da transparência. Mas não o fizeram, e agora cá estamos.

CONCLUSÕES

Estamos por nossa conta. Dentro em breve vamos ter que lidar com cada vez menos petróleo, visto que não houve avisos prévios nem planeamento. Chegou a altura de as comunidades se prepararem para a independência energética comunitária, porque só essa via será segura. Isto significa depender do sol e do vento e da água que nunca nos faltaram. Isso significa cooperação uns com os outros para ultrapassar tempos muito difíceis. Isso significa encontrar alternativas ao petróleo para as nossas vidas o mais depressa possível – o petróleo que alimenta os nossos carros, o petróleo que aquece as nossas casas, o petróleo que alimenta os geradores para a nossa electricidade., o petróleo de que são fabricados os fertilizantes e insecticidas químicos, e os plásticos e os poliésteres, o petróleo de que os agricultores dependem para as bombas de irrigação, para o transporte dos produtos para o mercado, para trabalharem o solo para nos fornecerem os alimentos. Se acreditarmos no gráfico, todo o petróleo terá desaparecido dentro de 20 anos. E os progressistas e os " tea-partyers " têm que se lembrar que as pessoas que provocaram esta calamidade não são nossos amigos mas são pessoas em quem confiámos e em quem eles confiaram, por isso temos que trabalhar em conjunto para estar à altura dos problemas que nos atingem, e para "correr com os canalhas".

23/Abril/2010
N.T.
[1] Earth First! É: grupo radical de defesa do ambiente que surgiu nos EUA em 1979.
[2] Sierra Club: a mais antiga organização ambiental nos EUA, fundada em 1892.
[3] Goldman Sachs Group, Inc.: banco de investimento global que trata de investimentos, garantias, gestão e outros serviços financeiros.
[4] Tea Party: movimento político de direita nos EUA iniciado em 2009, constituído sobretudo por sectores da pequena e média burguesia afectados pela crise. A suas manifestações incidem sobretudo em questões fiscais.

N.R.
[1} No caso do aquecimento global, a negação tem toda a razão de ser. Ver Acerca da impostura global
[2} Ao contrário, o cepticismo cada vez aumenta mais – sobretudo a partir do recente Climategate .


[*] Jurista especializado em questões ambientais. Pode ser contactado em narguimbau@earthlink.net .

O original encontra-se em http://www.informationclearinghouse.info/article25306.htm . Tradução de Margarida Ferreira.


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
04/Mai/10