por Moon Of Alabama
O governo britânico afirma que os venenos "Novichok",
desenvolvidos há 30 anos atrás na União Soviética,
afetaram um agente duplo britânico. Mas essas substâncias podem nem
sequer existir. O governo britânico diz ainda que o governo russo
é responsável pelo incidente e anunciou sanções
contra o país.
Um
incidente semelhante ocorreu em 2001 nos Estados Unidos
. Envelopes com
esporos de Antraz foram enviados para vários políticos. Algumas
pessoas morreram. A Casa Branca disse ao FBI para
culpabilizar a al-Qaeda
, mas o Antraz acabou por se revelar ser de um laboratório de armas
químicas-biológicas dos Estados Unidos. O caso está ainda
por resolver.
Vil Mirzanyanov é o "denunciante" que "revelou" o
programa "Novichok" e seus venenos e publicou as fórmulas
químicas que deveriam permitir a qualquer laboratório decente
produzi-los. Mas nem a existência do alegado programa, nem a
existência das supostas substâncias foram alguma vez aceites pela
comunidade científica. O governo russo afirma não saber do
programa nem dos alegados venenos.
O drama elaboradamente construído em torno do
alegado envenenamento
do agente duplo britânico Skripal e da sua
filha transformou-se assim numa representação surreal. O governo
britânico não apresentou até agora nenhuma evidência
de que os Skripal foram envenenados ou que tivessem sido envenenados por
alguém. Nenhum boletim médico detalhado foi publicado. As
acusações britânicas contra a Rússia permitem
considerar que uma tentativa de suicídio esteja excluída. Por
quê?
Não há nenhuma avaliação independente do alegado
veneno. O governo britânico afirma que o seu próprio
laboratório de armas químicas em Porton Dow, a poucas milhas de
onde aconteceu o incidente, identificou o veneno como um dos produtos
químicos "Novichok".
Porém, em 2016, um dos principais químicos de Porton Down tinha
dúvidas que tais produtos químicos existissem. (Paul McKeigue,
Professor de genética estatística e epidemiologia genética
na Universidade de Edimburgo, Piers Robinson, Professor de política,
sociedade e política jornalismo na Universidade de Sheffield e o antigo
embaixador britânico Craig Murray
põem
isto em
destaque
).
Recentemente, em 2016, a Dra. Robin Black, chefe do Detection Laboratory a
única instalação laboratorial de detecção de
armas químicas do Reino Unido, em Porton Down, antiga colega do Dr.
David Kelly, publicou numa revista científica extremamente prestigiada
que a evidência da existência de Novichoks era escassa e a sua
composição desconhecida.
Nos últimos anos, tem havido muita especulação sobre uma
quarta geração de agentes nervosos (inovações
"Novichok") tivesse sido desenvolvida na Rússia, tendo sido
iniciada nos anos 70 do século passado como parte do programa
"Foliant", com o objectivo de encontrar agentes que pudessem
comprometer as contramedidas defensivas.
Informações sobre estes compostos têm estado dispersas no
domínio público, provenientes principalmente de um químico
militar russo dissidente, Vil Mirzayanov. Não há
confirmação independente das estruturas ou que as propriedades
desses compostos tenham sido publicadas.
(Black, 2016)
Robin Black (2016)
Development, Historical Use and Properties of Chemical Warfare Agents
. Royal Society of Chemistry
O Conselho Consultivo Científico (Scientific Advisory Board, SAB) da
Organização para a Proibição de Armas
Químicas (OPCW)
não reconheceu
os Novichoks como armas
químicas, porque encontrou poucas evidências de que existam. Os
EUA e o Reino Unido fazem parte da organização e ambos
concordaram com esta avaliação:
[o SAB] sublinhou que a definição de produtos químicos
tóxicos na Convenção abrange todos os potenciais
candidatos a produtos químicos que possam ser utilizados como armas
químicas. Sobre novos produtos químicos tóxicos não
constantes do anexo sobre produtos químicos, mas que, no entanto possam,
para a Convenção, representar um risco, o SAB faz
referência a "Novichoks". O nome "Novichok" foi usado
numa publicação de um antigo cientista soviético que
relatou a investigação de uma nova classe de agentes nervosos
apropriados para o uso como armas químicas binárias. "
O SAB afirma dispor de insuficientes informações para comentar
sobre a existência ou propriedades de "Novichoks
". (OPCW, 2013)
O antigo cientista soviético, Vil Mirzanyanov, que denunciou e escreveu
sobre os "Novichoks", vive agora numa
casa de 1 milhão de dólares
nos Estados Unidos. A agência de notícias AFP
acaba de
entrevistá-lo
sobre o recente incidente:
Mirzayanov, falando na sua casa em Princeton, Nova Jersey, disse estar
convencido de que Rússia levou a cabo uma forma de intimidar os
opositores do Presidente Vladimir Putin. "Só os russos"
desenvolveram esta classe de agentes nervosos" disse o químico.
"Eles conservaram-nos e ainda os mantêm em segredo".
A única outra possibilidade, disse, seria que alguém usasse as
fórmulas do seu livro para fazer uma tal arma.
"A Rússia fê-lo", diz Mirzanyanov, "OU
ALGUÉM QUE LEU O MEU LIVRO".
O livro foi publicado em 2008 e está disponível encadernado,
brochado ou em formato electrónico por 8,16 dólares. Inclui uma
série de fórmulas que, diz Mirzanyanov, poderiam ser utilizadas
para produzir esses agentes químicos. Mas nem o laboratório de
Porton Down nem a OPCW parecem convencidos que isso seja possível. Eles
podem
acreditar que Mirzanyanov tem plena consciência disto.
Um leitor, do livro de Mirzanyanov observou:
[É necessário] haver um editor para controlar o seu brado
"sou um espantoso mártir épico"
e trazer as coisas de volta à ciência.
Outro leitor escreveu:
State secrets
é de longe a mais prolixa e dolorosamente estúpida novela sobre
armas químicas que já li, escrita por um cientista irritado que
desertou da Rússia! Se quer ouvir um empregado com ilusões de
grandeza a queixar-se de cada pessoa com quem já trabalhou então
este livro é para si, caso contrário não perca seu tempo.
A sério! Não acontece nada exceto que Vil
algumacoisov
ajudou a fazer coisas que matavam pessoas durante 30 anos e que obtém
uma (espécie de) consciência, deserta e queixa-se constantemente
acerca... de tudo.
Vil Mirzanyanov promoveu o seu livro num
vídeo de 2009
. Pouco depois
no seu blog
explicou porque havia
incluído fórmulas:
"Enquanto estava a escrever o meu livro "Segredos de Estado:
crônica de um participante no programa russo de armas
químicas", algumas pessoas de Washington insistentemente me
aconselharam a não incluir as fórmulas dos agentes
químicos da série Novichok no meu livro.
(...)
Perguntei por que seria má ideia publicar essa informação,
uma vez que seria para a segurança de todas as pessoas, pois os governos
iriam trabalhar para ter esses agentes químicos e seus precursores
incluídos na Control List. Eles responderam que "terroristas
poderiam usá-los em suas ações criminosas." Este tipo
de raciocínio tem sido usado sempre para assustar as pessoas e evitar
qualquer discussão. Graças a isto já estamos acostumados a
ignorar uma quantidade de problemas reais,"
Mirzanyanov além disto salienta que apenas pessoal experiente em
laboratórios bem equipados seria capaz de utilizar as suas
fórmulas. Agentes estatais dispõem desses laboratórios,
como o britânico Porton Down, mas os terroristas não têm
tais capacidades.
Mirzanyanov insistiu para que fossem incluídas as substâncias que
ele descreveu na lista de material controlado pela OPCW. Mas a OPCW, como visto
acima, rejeitou. Nem o seu conselho científico, nem o chefe do
laboratório de detecção de Porton Down estavam convencidos
de que estas substâncias ou o programa soviético descrito por
Mirzanyanov existissem.
O laboratório de armas químicas soviético em que
Mirzanyanov havia trabalhado era no Uzbequistão, não na
Rússia como Theresa May falsamente alegou. O laboratório foi
desmantelado com a
ajuda ativa dos Estados Unidos
.
A afirmação de Theresa May de que os Skripals foram envenenados
com agentes "Novichok" é altamente questionável. A sua
alegação de que apenas a Rússia poderia ser
responsável pelo incidente Skripal é obviamente um disparate.
A existência das substâncias descritas por Vil Mirzanyanov
está em sérias dúvidas. Mas se ele está certo
então qualquer Estado ou empresa com um laboratório decente e
pessoal competente pode produzir essas substâncias a partir das
fórmulas e descrições fornecidas no seu livro. Pelo menos
é o que o próprio Mirzanyanov diz.
Mas o mais perturbador sobre o caso não são as falsas
alegações de Theresa May. Ela está com problemas
políticos de fundo sobre as negociações do Brexit e outras
questões e precisa conseguir alguma manobra política de
diversão. Culpar a Rússia por "qualquer coisa"
está em voga e pode ajudá-la por algum tempo.
Não, a questão mais preocupante é o comportamento dos
media que falharam em assinalar que as reivindicações do May
são alaridos sem nenhuma evidência que suporte as suas
afirmações. O único jornal um pouco cético é
o
Irish Times,
que
considera altamente improvável
que o governo russo esteja por trás do envenenamento.
Theresa May exigiu e teve uma reunião da NATO sobre o caso. Mas a
declaração emitida pela NATO foi extremamente fraca. Apenas
apoiava a condução do inquérito britânico e pedia
à Rússia para responder às questões de
britânicas. Não apoiou as alegações de May, nem
tomou qualquer medida contra a Rússia. Um porta-voz francês disse
"nós não fazemos política de fantasia" e exigiu
"conclusões definidas"
sobre o caso antes de decidir qualquer
coisa. Também não foi dado apoio a May pela
administração Trump (Atualização: a embaixadora dos
EUA na ONU Nick Haley agora saltou em auxílio do Theresa May)
A história de que May quer propalar tem demasiados buracos para ser
sustentável. O envolvimento do
agente duplo britânico Skripal
no falso
relatório Steele sobre Trump
é provavelmente a verdadeira história por trás do
incidente.
Não está a chegar apoio internacional a May. O líder da
oposição britânica, Corbyn, tinha razão quando
exigiu provas das suas afirmações. Mais alguns abanões e o
seu castelo de cartas certamente virá para baixo.
Caso não tenha reparado: Os
EUA tinham acesso à fórmula "Novichok" desde 1999
:
Alguém pode acreditar que fossem incapazes de reproduzi-lo?