A vergonha, a cólera e a traição de Tsipras
"Não há futuro para a Grécia se permanecer na
zona euro, nem tão pouco para os outros países do Sul da
Europa"
por Jacques Sapir
A Grécia retorna à actualidade com um incidente que mostra, com
tal
simplicidade que se torna evidente por si mesma, a realidade da opressão
exercida pela União Europeia sobre este pobre país.
O Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE)
[NR]
acaba de anunciar o congelamento do
"arranjo"
("toilletage")
da dívida decidido pelo Eurogupo de 5 de Dezembro último. Isso
significa claramente que os credores europeus da Grécia suspenderam as
medidas tomadas sobre a dívida na semana passada. Jeroen Dijsselbloem, o
presidente do Eurogrupo que dirige de facto o MES, afirma sem rodeios: "As
instituições chegaram à conclusão de que as
acções do governo grego parecem não estar em linha com
nossos acordos"
[1]
. Aquilo que está em causa é uma medida social, perfeitamente na
linha do que é autorizado ao governo grego pelos ditos
"acordos", em benefício dos reformados. Com efeito, o
memorando de Agosto de 2015, assinado como se recorda sob constrangimento, com
a faca na garganta, prevê que a Grécia possa dispor de quantias
equivalentes a 40% dos excedentes orçamentais suplementares obtidos pelo
país. Ora, em Outubro de 2016 este excedente orçamental elevou-se
a 3 mil milhões de euros. As medidas previstas pelo governo grego em
benefício dos reformados não custarão senão 674
milhões de euros. Como se constata, o MEE, e o sr. Dijsselbloem em
particular, conduz uma política de humilhação
sistemática do governo grego.
Recordemos que, desde que a Troika (ou seja, a União Europeia, o BCE e o
FMI) aplica as medidas de austeridade impostas pelos credores o PIB da
Grécia retornou ao seu nível de 2004. Os investimentos (em
capital fixo) desceram por sua vez ao nível de 1996, ou dito de outra
maneira, ao nível de 20 anos atrás.
A situação é ainda mais dramática se se examinarem
os investimentos por sector. Na indústria mecânica, a
situação está abaixo do nível de 1997. Para os
transportes, ao nível de 1996 e para a habitação bem
abaixo do nível de 1996. Hoje não só se esfaima e
assassina o povo grego como também se lhe retiram todos os meios para
poder um dia se reerguer.
A situação da Grécia hoje é a tal ponto
dramática que o FMI, que já viu muitas, conclama as
instituições europeias a autorizar as medidas tomadas pelo
governo grego e a anular uma parte importante da dívida grega. Mas nada
se faz e nem se fará. As instituições europeias não
desistem de obter a queda do governo Tsipras e efectuam em
relação a ele uma verdadeira
vendetta
política.
Isso mostra bem, como se fosse necessário, que a
capitulação de Julho de 2015 não serviu para nada.
Só uma política de ruptura com as instituições
europeias, e com o Eurogrupo, poderia permitir à Grécia
reencontrar uma esperança. Não há futuro para a
Grécia se permanecer na zona euro, nem tão pouco para os outros
países do Sul da Europa.
Foi da responsabilidade de Tsipras recusar a ruptura e isto apesar do mandato
claro que ele obteve do povo grego aquando do referendo. Mas o facto de ter
traído o seu mandato não o salvou da vingança das
instituições europeias. Será preciso recordar isto na
eleição presidencial de Abril-Maio de 2017 e não eleger
alguém cuja mão possa estremecer no momento decisivo.
18/Dezembro/2016
Acerca do MEE ver também:
MEE, o novo ditador europeu
, 16/Out/11
Acção colectiva europeia contra o MEE
, 04/Mar/12
MEE, um golpe de estado em 17 países
. Out/11
Governo pelos bancos e para os bancos
,04/Jul/12
Tratado estúpiodo
, 10/Abr/12
O Mecanismo Europeu de Estabilização, ou como a Goldman Sachs capturou a Europa
, 21/Abr/12
[1] Romaric Godin,
www.latribune.fr/...
O original encontra-se em
russeurope.hypotheses.org/5517
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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