Sintoma de decadência:
O triunfo de Schwarzenegger


por Lisandro Otero [*]

Clique na imagem para ler uma entrevista dele à revista 'Oui'. Após a eleição do cavalheiro, os editores da 'Oui' resolveram censurar esta entrevista. O triunfo de Arnold Schwarzenegger nas eleições da Califórnia é um sintoma da decadência irreversível na qual os Estados Unidos estão se afundando. É a vitória da imagem sobre o conceito, o êxito da figura em detrimento do raciocínio. Que um grupo majoritário de cidadãos tenha escolhido esse tosco símio, esse palerma grosseiro para dirigi-los, somente pode ocorrer em um país muito desorientado. É evidente que os norte-americanos estão abdicando da arte de pensar para entregar-se ao universo das imagens, à válvula de escape das ilustrações. A televisão, Hollywood, as efígies, historietas e estampas ocupam o lugar da observação, das análises e hipóteses.

Nenhum ser capaz do mínimo entendimento pode optar por um jumento, um tarado que confessou ser admirador de Hitler, que se sabe rebento de um pai que pertenceu ao partido nazista, um racista que qualificou os imigrantes mexicanos de “brownies” (mestiços), de quem se provou ser praticante de assédio sexual, um inexperiente absoluto no ofício político e um fanático dos extremismos da ultradireita norte-americana. Sem dúvida, uma parte do eleitorado californiano o escolheu, demonstrando sua própria degradação política e sua falta de perspicácia humana. O clã de Bush sabe que tem, nesse oligofrênico, um seguro baluarte para as eleições de 2004, e com seu respaldo troglodita tentará ganhar o mais importante estado eleitoral da América do Norte, razão pela qual o apoiou com todas as suas forças. Entretanto, Bush não lhe ofereceu seu apoio durante a campanha, não viajou à Califórnia e, por isto, terá que propiciar uma aproximação.

Menos de um ano depois que os californianos entregaram ao governador Davis um segundo mandado de quatro anos, produziram-se estes comícios revocatórios. Apresentaram-se 135 candidatos para substituí-lo. Um circo. Não se trata de um cargo qualquer, mas de dirigir o mais rico estado da união americana e a quinta economia do mundo. Davis tinha à sua disposição, um excedente orçamentário de 12 mil milhões de dólares e em um breve lapso de tempo o converteu em um déficit de 38 mil milhões. Em três anos desaparecem mais de 300 mil empregos nas indústrias do estado, elevando a quase 7% o índice de desemprego. A deterioração das estradas e o descaso com o sistema educacional suscitaram grande descontentamento. O custo de produção industrial é 32% mais elevado que a média nacional. Semelhante arte de prestidigitação merece, certamente, um castigo, porém não tanto como eleger um saco de músculo que, provavelmente, afundará ainda mais a Califórnia em um desastre econômico. Davis afirma, em sua defesa, que o ocorrido no estado não é mais do que um reflexo da recessão nacional e que as cifras do prejuízo são similares à contração da economia estadunidense

A composição social teve muito que dizer nestas eleições. Na Califórnia, 47% da população é branca, 32% são latinos, 11% asiáticos e 7% afro-americanos. Em torno de 45% dos eleitores são republicanos e 39% são democratas. Porém, as massas latinas e afro-americanas estão fartas dos políticos e não acorrem às urnas para votar, enquanto os brancos, sim, exercem o sufrágio. Schwarzeneger terá sérios problemas com o Congresso estadual, que está composto por uma maioria de democratas liberais. Tampouco poderá cumprir sua promessa de campanha de rebaixar os impostos, pois ver-se-ia sem fundos para atender às mais elementares obrigações sociais.

Schwarzeneger acumulou 56 milhões de dólares com suas incursões destrutivas na tela e está casado com uma Kennedy. Dificilmente poderá pensar nos humildes, na gente de baixo. Seu governo, como o de Bush, estará orientado para amparar aos opulentos, exonera-los de obrigações, permitir-lhes que realizem fusões de empresas, incrementem os monopólios, ampliem as transnacionais. Será um governador que nem sequer fala corretamente o idioma de seus governados.

Alguns pensam na repetição do caso Ronald Reagan. Porém, Reagan, sim, possuía uma sórdida experiência política adquirida durante as perseguições do macartismo, suas delações de companheiros artistas, seus extremismos fascistóides e suas conexões com a baixa politicagem. Schwarzeneger não tem essa prática ainda que, certamente, os mesmos preconceitos e obscurantismo. Dias aziagos esperam a Califórnia, com este campônio grosseiro e vaidoso que a fará afundar-se ainda mais no poço de suas desgraças.

[*] Escritor cubano radicado no México.

O original encontra-se em http://www.rebelion.org/imperio/031010otero.htm .
Tradução de Lígia Regina Klein.


Este artigo encontra-se em http://resistir.info .

14/Out/03