A produtividade em Portugal está a diminuir, provocada pela quebra
continuada no investimento
RESUMO DESTE ESTUDO
O aumento da produtividade e a alteração do perfil produtivo da
Economia Portuguesa são vitais para Portugal poder sair da
situação de atraso em que se encontra e para ultrapassar a grave
crise em que está mergulhado. No entanto, como provam as últimas
Contas Nacionais Trimestrais divulgadas pelo INE, está a suceder
precisamente o contrário como consequência da politica centrada na
obsessão do défice.
Entre o 2º Trimestre de 2005 e o 2º Trimestre de 2006, a
produtividade por trabalhador em Portugal, a preços constantes de 2000,
passou de 5.405 euros para 5.377 euros, portanto registou uma quebra de -0,5%
se for calculada com base no VAB, e uma redução de -0,1% se for
calculada com base no PIB. Esta diminuição está associada
a quebra no valor do Investimento Total (FBCF) que diminuiu, no mesmo
período, em -7,2%, pois passou de 7.320,7 milhões de euros para
apenas 6.792,3 milhões de euros. Esta evolução conjunta
confirma a conclusão constante no Relatório da OCDE de 2006 que
considera que uma das causas mais importantes da baixa produtividade em
Portugal é precisamente o investimento reduzido, nomeadamente o
investimento de qualidade. A quebra continuada do investimento está a
agravar a situação e, a continuar, só poderá tornar
a crise mais prolongada e profunda.
Segundo o Banco de Portugal " a evolução das
exportações tem sido afectada pelo respectivo padrão de
especialização, caracterizado por um peso muito elevado de
produtos com baixos conteúdos tecnológicos e de capital humano
intensivo, como os têxteis, vestuário e calçado. Estes
sectores enfrentam uma concorrência acrescida por parte de novos
intervenientes no comércio internacional, produtores a baixos
custos." (págs. 9 e 10 do Boletim da Primavera). É evidente
também que com a quebra continuada do investimento que se tem
verificado torna-se quase impossível alterar o perfil produtivo
existente no País o que, a continuar, só poderá determinar
dificuldades acrescidas às empresas portuguesas para enfrentarem, com
êxito, a concorrência cada vez mais global.
Nos últimos dias, alimentado por alguns dados económicos
publicados pelo INE, que revelam uma ligeiríssima melhoria em alguns
indicadores, o 1º ministro, o ministro das Finanças, o governador
do Banco de Portugal, a comunicação social e os
"opinadores" dos media afectos ao governo, todos juntos e de uma
forma articulada, procuraram fazer passar a ideia de que a chamada
"retoma económica " tinha finalmente chegado a Portugal.
Tal mensagem visa criar a ilusão de que Portugal poderá
enfrentar os problemas graves com que se confronta com uma politica
económica centrada na obsessão do défice, na
redução do investimento, na manutenção de um perfil
produtivo baseado em produtos de baixa qualidade e baixo valor acrescentado,
numa população empregada com baixa escolaridade, baixa
qualificação profissional e com baixos salários, no
endividamento crescente da população, na manutenção
de graves desigualdades de rendimento e sociais, etc. No entanto, tal caminho
só poderá contribuir para tornar a crise mais prolongada e
profunda.
Com uma taxa de crescimento de 1,5% ao ano, que é superior às
previsões do governo que puseram Sócrates eufórico,
Portugal necessitaria de 26 anos para alcançar o valor actual do PIB por
habitante da UE15 que é 25.090 euros, pois o PIB por habitante
português actual é somente de 16.320 euros. E naqueles 26 anos a
União Europeia adiantar-se-ia muito a Portugal pois a taxa de
crescimento médio da UE15 é quase o dobro da taxa portuguesa.
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No seu Relatório de 2006 sobre a Economia Portuguesa, a OCDE considera
que em Portugal o "crescimento da produtividade tem sido constrangido
pelo baixo investimento o que tem contribuído pouco para alterar o
rácio capital-trabalho e para o crescimento da produtividade
total". Por outras palavras, segundo a própria OCDE, no nosso
País o baixo nível de investimento, nomeadamente do investimento
de qualidade (tenha-se presente que mais de 50% do investimento total em
Portugal tem sido realizado na "Construção), constitui uma
das causas mais importantes para a baixa produtividade do trabalho e
também baixa produtividade total portuguesa.
Este problema que enfrenta a Economia Portuguesa tem-se agravado com a politica
económica do actual governo centrada na obsessão do
défice, que tem determinado forte reduções do investimento
público (em 2006, uma redução de 28% quando comparado com
o investido realizado em 2005) e, por arrastamento, também no
investimento privado.
Efectivamente, de acordo com o Relatório do Banco de Portugal de 2005,
a diminuição acumulada verificada na FBCF (Investimento Total) em
Portugal, no período 2001 a 2005, já é superior a -15%.
O quadro seguinte construído com os dados das Contas Nacionais
Trimestrais referentes ao 2º Trimestre de 2006 que o Instituto Nacional de
Estatística (INE) acabou de divulgar, e que foram muito mediatizadas
pelo governo na sua propaganda apenas na parte que lhe interessou, revela o
agravamento da situação neste campo fundamental para o
desenvolvimento do País.
Como revelam os dados do quadro, a taxa de crescimento económico
registada no 2º Trimestre de 2006, quando comparado com o 2º
Trimestre de 2005, tomando como base o valor do VAB e não do PIB foi
apenas de 0,4%. E a diferença entre o valor do PIB e do VAB é
grande pois, de acordo com o INE, o PIB obtém-se a partir do VAB somando
a este os impostos. Portanto, o indicador que traduz de uma forma mais efectiva
o crescimento real do valor da riqueza de um país é o VAB e
não o PIB, pois o valor deste último é facilmente
condicionado pela politica fiscal do governo. E, repetindo, o crescimento,
entre o 2º Trimestre e 2005 e o 2º Trimestre de 2006, do PIB foi
efectivamente 0,9% como divulgaram os media, mas o aumento do VAB durante o
mesmo período foi apenas de 0,4%.
Mesmo este aumento foi conseguido fundamentalmente à custa da
utilização de mais trabalhadores e não devido ao aumento
da produtividade, ou seja, do valor produzido por cada trabalhador.
Efectivamente de acordo com os dados constantes das "Estatísticas
do Emprego 2º Trimestre de 2006" publicadas pelo INE, entre o
2º trimestre de 2005 e o 2º Trimestre de 2006, o emprego aumentou em
48.800, pois passou de 5.132.000 para 5.180.800.
Se dividirmos o valor do VAB do 2º Trimestre de 2005 e 2006
respectivamente 27.740,4 milhões de euros e 27.855,5 milhões de
euros pela população empregada em cada um destes
trimestres obtemos um valor por empregado de 5.405 euros para o 2º
Trimestre de 2005 e 5.377 euros para o 2º Trimestre de 2006. Isto
significa que a produtividade por trabalhador diminuiu -0,5% entre o 2º
Trimestre de 2005 e o 2º Trimestre de 2006. Se o cálculo for feito
com base nos valores do PIB por empregado, a diminuição da
produtividade é de -0,1% como mostram também os dados do quadro.
Por outro lado, os valores do Investimento Total (FBCF) também
constantes do quadro I revelam que, entre o 2º trimestre de 2005 e o
2º Trimestre de 2006, o investimento diminuiu -7,2%, pois passou de
7.320,7 milhões de euros para apenas 6.792,3 milhões de euros.
Estes dados mostram que existe uma correlação positiva entre
produtividade e investimento, ou seja, quando o investimento aumenta a
produtividade do trabalho também aumenta e, inversamente, quando o
investimento diminui também diminui a produtividade do trabalho, e
naturalmente também a produtividade total. A própria OCDE
reconhece esta correlação, como já se referiu, quando
considera no seu relatório de 2006 sobre Portugal que o aumento da
produtividade em Portugal tem sido "constrangido", ou seja,
dificultado pelo baixo nível do investimento.
É evidente que a quebra continuada no investimento que se está a
verificar em Portugal impede que a produtividade cresça a um ritmo
elevado, tendo determinado mesmo , como está a suceder em 2006, quebras
na produtividade a qual já é muito baixa quando a comparamos com
a média europeia (cerca de 63,5% da média da UE25 em 2005). E
aquela quebra a continuar, como consequência da politica seguida,
só poderá prolongar a crise e tornar ainda mais difícil a
sua resolução.
UM PERFIL PRODUTIVO QUE PROVOCA PERDA DE COMPETIVIDADE
Nos últimos anos, Portugal tem perdido, de uma forma continuada, quotas
no mercado externo Segundo o Relatório do Banco de Portugal de 2005,
tomando como base uma amostra correspondente a 70% das
exportações, a redução foi a seguinte: em 2004: -
7,3%; e, em 2005, : -10,2%. A OCDE aponta como causa da perda de
competitividade o facto de que as "empresas portuguesas têm mantido
a sua especialização na produção de mercadorias
tradicionais baseadas em trabalho intensivo (e naturalmente de baixo custo) e
de baixo valor acrescentado, estando a perder os mercados para onde exportavam
devido ao aparecimento de novos concorrentes com custos ainda mais baixos,
como é a China" (pág. 19, Relatório da Primavera de
2006). Segundo o Relatório do Banco de Portugal de 2005, as
exportações portuguesas de calçado estão a ser
substituídas por produtos cuja origem é fundamentalmente a China
sendo seguida pelas produções vindas do Vietname, Países
baixos e Roménia; as dos Têxteis e Vestuário por produtos
com origem da China e da Roménia e também da Índia,
Turquia , Marrocos e Bangladesh; na Maquinaria Eléctrica Portugal
está a ser substituído, em primeiro lugar, pela China, seguida
pelos Países Baixos, Polónia, Coreia do Sul, países Baixos
e Espanha; finalmente nos Veículos as exportações
portuguesas estão a ser substituídas fundamentalmente por
produções que têm como origem os novos países que
aderiram à União Europeia em 2004, a saber: República
Checa, Eslováquia, Polónia e até países mais
desenvolvidos como a Bélgica e a França.
Também o Banco de Portugal considera que "a evolução
das exportações tem sido afectada pelo respectivo padrão
de especialização, caracterizado por um peso muito elevado de
produtos com baixos conteúdos tecnológicos e de capital humano
intensivo, como os têxteis, vestuário e calçado. Estes
sectores enfrentam uma concorrência acrescida por parte de novos
intervenientes no comércio internacional, produtores a baixos
custos." (págs. 9 e 10 do Boletim da Primavera).
É evidente que este perfil produtivo não se alterou de forma a
justificar que o 1º ministro, todo o governo e mesmo o governado do Banco
de Portugal estejam tão eufóricos, nem é possível
alterar este perfil produtivo com a redução continuada do
investimento e sem aumentar significativamente o nível de escolaridade e
de qualificação da população empregada. Como o
investimento está a diminuir em Portugal tal facto está a
impedir, por um lado, a alteração do Perfil produtivo da Economia
Portuguesa e, por outro lado, a modernização da Economia
Portuguesa o que não deixará de ter sérias
consequências futuras. A juntar a tudo isto, e segundo o Eurostat, em
2005, apenas 26% da população portuguesa com idade compreendida
entre os 25 e os 64 anos tinha o nível de escolaridade correspondente ao
nível CITE 3-4 (9º ano e secundário), quando a média
comunitária era de 67,2%. E se limitarmos a análise à
população jovem (20-24 anos) o valor para Portugal era de apenas
48,4% quando a média comunitária (UE25) era de 76,9%.
O PERIGO PARA O PAÍS DAS ILUSÕES ECONÓMICAS DO 1º
MINISTRO SÓCRATES
Nos dias que se seguiram à divulgação das Contas Nacionais
referentes ao 2º Trimestre de 2006 pelo INE, que revelaram uma ligeira
melhoria em alguns indicadores económicos, o 1º ministro, o
ministro das Finanças, o governador do Banco de Portugal, e os
"opinadores" dos media afectos ao governo procuraram fazer passar a
ideia de que a chamada "retoma económica " tinha finalmente
chegado a Portugal. Desta forma procuraram criar a ilusão que é
possível ao País sair do estado de atraso em que se encontra sem
resolver os seus problemas estruturais graves desigualdades sociais e na
distribuição do rendimento; baixa escolaridade e baixa
qualificação profissional; investimento insuficiente e, na sua
maioria, de pouca qualidade; reduzido investimento em I&D; défice
externo elevado; etc. - como por magia.
Esta mensagem, que não tem qualquer consistência nem cientifica
nem empírica, visa criar a ilusão de que Portugal poderá
enfrentar os problemas graves com que se confronta com uma politica
económica centrada na obsessão do défice, na
manutenção de um perfil produtivo baseado em produtos de baixa
qualidade e de baixo valor acrescentado, numa população empregada
com baixos salários, no endividamento crescente da
população, etc..
A análise que se acabou de fazer, com base em dados do INE e em estudos
da OCDE e do Banco de Portugal, que a propaganda governamental ignorou ou mesmo
ocultou, prova que as causas das dificuldades que o País enfrenta
mantêm-se e têm tendência para se agravar ainda mais com a
politica centrada na obsessão do défice que está a ser
seguida, o que só poderá contribuir para prolongar e tornar mais
profunda a crise.
14/Setembro/2006
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Economista,
edr@mail.telapac.pt
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