O governo pretende reduzir o défice em 2008 cortando 4.287
milhões de euros na administração pública e
aumentando os aposentados em apenas 55 cêntimos por dia
RESUMO DESTE ESTUDO
Em 2005, as despesas de pessoal da Administração Pública
(Central, Local e Regional) correspondiam a 14,5% do PIB, e, em 2008, o governo
pretende que representem apenas 12,2% do PIB. Para conseguir isso, de acordo
com o Programa de Estabilidade e Crescimento 2007-2011, enviado à
Comissão Europeia em Dezembro de 2007, o governo pretende reduzir, em
2008, as despesas da Administração Pública em 4.267,7
milhões de euros relativamente às despesas que, segundo ele,
teria se não tivesse tomado medidas para as reduzir. Daquele total,
3.926.2 milhões de euros, ou seja, 91,9% referem-se a despesas de
pessoal. Relativamente a 2007, este valor representa um aumento no corte das
despesas com pessoal de 1.162,4 milhões de euros, o que só
será possível de obter através de elevado número de
trabalhadores ou despedidos, ou colocados na Situação de
Mobilidade Especial ou forçados a se aposentarem prematuramente o que, a
concretizar-se, aumentará o desemprego (actualmente o Estado é o
maior destruidor de emprego) e terá efeitos negativos na qualidade dos
serviços públicos prestados à população
(saúde, educação, etc.), e também por meio da
redução do poder de compra dos trabalhadores da
Administração Pública.
No documento que enviou para Bruxelas, e contrariamente ao que tem dito
internamente, o governo afirma que, pelo menos, 75% dos trabalhadores da
Administração Pública, para poderem progredir na sua
carreira, terão de esperar entre 6 a 11 anos, e os restantes 25% entre 3
e 6 anos, dependendo de ser 3 ou 6 anos, ou 6 ou 11 anos, do arbítrio
dos responsáveis dos serviços afectarem ou não recursos
para alterações de posições remuneratórias.
Portanto, fica assim claro que as carreiras dos trabalhadores da
Administração Pública manter-se-ão de facto
congelados por muitos mais anos, não sendo verdade o seu descongelamento
a partir do inicio de 2008 como tem afirmado o governo.
Em 2008, mais de 156.000 aposentados da Administração
Pública terão aumentos de pensões inferiores aos
diminutos aumentos que tiveram os reformados do regime geral da
Segurança Social.
[1]
Se o aumento em percentagem das pensões dos aposentados fosse igual aos
da Segurança Social os aposentados da Administração
Pública receberiam, em 2008, mais 34 milhões de euros. Entre 2007
e 2008, o aumento na pensão média dos aposentados é apenas
de 1,4%,que é inferior à subida da taxa de
inflação, portanto o poder de compra da pensão
média diminuirá. Entre 2007 e 2008, a pensão média
dos aposentados da Administração Pública aumentará
16,36 euros por mês, o que corresponde a um aumento de 55 cêntimos
por dia.
Há ainda que acrescentar a esta redução do poder de compra
das pensões a diminuição resultante do aumento da carga
fiscal em 2008 determinada pela redução do rendimento isento de
IRS dos aposentados que, de acordo com a Lei do Orçamento aprovada pelo
PS, passará de 6.100 euros para 6.000 euros, o que afectará mais
de 69% dos aposentados. Para além disso, há ainda que considerar
a eventual introdução de mais um desconto de 1% nos vencimentos
dos trabalhadores das Administrações Públicas a pretexto
do alargamento do subsidio de desemprego a estes. Este novo desconto, a
concretizar-se, determinará que os trabalhadores das
Administrações Públicas sofrerão um desconto
global nos seus vencimentos de 12,5% para os sistemas de saúde e
segurança social, enquanto os trabalhadores do sector privado descontam
apenas 11%, o que criaria uma discriminação grave entre os
trabalhadores das Administrações Públicas e os do sector
privado.
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O governo enviou à Comissão Europeia, em Dezembro de 2007, a
"actualização" do Programa de Estabilidade e
Crescimento 2007-2011 (PEC:2007-2011). A análise desse documento mostra
que se pretende reduzir em 2008, pelo terceiro ano consecutivo, o
défice orçamental para além dos compromissos que tinham
sido assumidos com Comissão Europeia, à custa fundamentalmente
dos trabalhadores e dos aposentados das Administrações
Públicas. O quadro I, construído com dados que constam do
PEC:2007-2011, mostra os cortes nas despesas que se pretende fazer nas
Administrações Públicas em 2008, nomeadamente nas despesas
com pessoal, para atingir a anunciada redução do défice
(-2,4% do PIB em 2008 no lugar de -2,6% inicialmente anunciado).
Em 2005, as despesas de pessoal das Administrações
Públicas correspondiam a 14,5% do PIB, em 2007 a 12,8% do PIB e, em
2008, pretende-se que representem apenas 12,2% do PIB. Para conseguir isso, o
governo tenciona reduzir, em 2008, as despesas das Administrações
Públicas em 4.267,7 milhões de euros relativamente à
despesa que, segundo ele, ter-se-ia se não fossem tomadas medidas para
a reduzir. Daquele total, 3.926,2 milhões de euros, ou seja, 91,9%
são referentes a despesas de pessoal. Entre 2007 e 2008, o corte nas
despesas de pessoal aumentará em 1.162,4 milhões de euros.
É evidente que esta redução tão grande nas despesas
com pessoal só será possível de obter através de
elevado número de trabalhadores ou despedidos, ou colocados na
Situação de Mobilidade Especial ou forçados a se
aposentarem prematuramente, ou ainda como consequência da
verificação simultânea de todas ou de algumas delas, e
também por meio da redução do poder de compra dos
trabalhadores activos das Administração Pública.
A análise por rubricas que constam também do quadro anterior
confirma as conclusões anteriores, já que aquela
redução, segundo o próprio governo, será conseguida
da seguinte forma: (1) Através da diminuição das
admissões pela imposição da regra "saem dois para
poder entrar um" (menos 1.707,1 milhões de euros em 2008); (2) Por
meio do congelamento por mais anos das carreiras (menos 341,4 milhões de
euros); (3) Através da "contenção salarial", o
que significa aumentos dos vencimentos inferiores à taxa de
inflação (menos 170,1 milhões de euros); (4) Por meio ou
da colocação de trabalhadores na Situação de
Mobilidade Especial, ou através da redução de horas
extraordinárias e de abonos, etc. (menos 1.707,1 milhões de euros
em 2008).
O GOVERNO CONFESSA À COMISSÃO EUROPEIA AQUILO QUE TEM NEGADO
INTERNAMENTE
É importante referir que no Programa de Estabilidade e Crescimento:
2007-2011 enviado à Comissão Europeia, o governo reconhece uma
situação que tem repetidamente negado internamente. Para mostrar
isso transcreve-se na integra a passagem do documento que enviou para
Bruxelas em que se pode ver isso.
Em relação ao descongelamento das carreiras da
Administração Pública, o governo tem afirmado internamente
que elas serão descongelados a partir de 1 de Janeiro de 2008, o que
nega na pág. 15 do documento que enviou à Comissão
Europeia como se pode ver.
Portanto, se o responsável do serviço decidir no inicio do ano
não afectar recursos para alterações de
posições remuneratórias, e isso é um poder que lhe
dá a lei do governo, no lugar dos 5 anos que serão em
média necessários para o trabalhador progredir na carreira
serão precisos 10 anos.
E o quadro 5, constante da pág. 16 do mesmo documento governamental,
confirma de uma forma ainda mais clara a transcrição anterior:
Como mostra o quadro anterior enviado pelo governo à Comissão
Europeia, 5% dos trabalhadores, ou seja, aqueles que, de acordo com a lei do
SIADAP, poderão ser classificados com "desempenho excelente"
só terão assegurado a mudança da sua posição
remuneratório (progressão na carreira) ao fim de um
período que varia entre 3 (t3) a 5 (t5) anos; 20% dos trabalhadores
que, no máximo segundo a lei, poderão ser classificados com
"desempenho relevante" terão de esperar entre 4 (t4) a 6 (t6)
anos; e os restantes, ou seja, para a esmagadora maioria constituída
por 75% dos trabalhadores, que serão obrigatoriamente classificados com
"desempenho adequado", terão de aguardar entre 6 (t6) a 11
(t11) anos para mudarem de posição remuneratória, ou seja,
para progredirem na carreira, dependendo de serem 3 ou 5 anos, ou 4 ou 6 anos,
ou ainda 6 ou 11 anos do arbítrio dos responsáveis dos
serviços afectarem ou não recursos para alterações
de posições remuneratórias. Fica assim claro, que o
governo não diz a verdade quando afirma publicamente ( e repetiu isso
inúmeras vezes aos órgãos de informação) que
a partir do inicio de 2008 as carreiras nas Administrações
Públicas estariam descongeladas. De facto, a verdade é que para
75% dos trabalhadores da Administração Pública
serão necessários de 6 a 11 anos para poderem mudar de
posição remuneratória como sempre afirmavam os sindicatos
de Administração Pública, o que o governo sempre negou.
O governo também tem afirmado, na sua propaganda, que os trabalhadores
vão ter mais um benefício, que antes não tinham, que
são os prémios. No entanto, como se conclui rapidamente da
leitura das palavras do governo que se transcrevem da pág. 16 do mesmo
documento, os prémios têm um carácter extremamente
aleatório e residual.
Portanto, mesmo que o trabalhador reúna os requisitos para ter direito
ao prémio, mesmo nessas condições não está
garantido que ele receba o prémio. O recebimento efectivo depende de
existir a verba necessário para o pagar, a qual está dependente
também do arbítrio do responsável do serviço que
poderá ou não afectar no inicio de cada ano os recursos
financeiros indispensáveis.
PARA MUITOS APOSENTADOS DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS O
AUMENTO PERCENTUAL DAS PENSÕES SERÁ INFERIOR AO DOS REFORMADOS DA
SEGURANÇA SOCIAL
O governo tem afirmado que é seu objectivo fazer a convergência do
regime dos trabalhadores das Administrações Públicas com o
do sector privado a nível da Segurança Social. Mas isso apenas
quando lhe convém, ou seja, quando tem como objectivo retirar direitos
aos trabalhadores das Administrações Públicas. A provar
isso está a intenção do governo em aumentar as
pensões dos aposentados das Administrações Públicas
em 2008 ainda menos do que as do regime geral da Segurança Social, como
mostram os dados do quadro seguinte.
Os aumentos das pensões em percentagem que constam do quadro anterior
relativo aos aposentados das Administrações Públicas (CGA)
são os que constam do documento que o governo entregou aos sindicatos em
Novembro de 2007. Os aumentos que constam do mesmo quadro relativos ao regime
geral da Segurança Social resultam da aplicação dos
critérios estabelecidos na Lei 53-B/2006, com base nos quais se calculam
os aumentos anuais das pensões da Segurança Social. E como
rapidamente se conclui, todos os aposentados cujas pensões sejam
superiores a 1.222 euros terão um aumento em percentagem das suas
pensões inferior ao já reduzido aumento dos reformados do regime
geral da Segurança Social em 2008. E os aposentados que estão
nessa situação correspondem a mais de 38% do total dos
aposentados (mais de 156.000).
O AUMENTO DA PENSÃO MÉDIA DOS APOSENTADOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SERÁ EM 2008 DE APENAS 55
CENTIMOS POR DIA
O quadro seguinte, construído com base em estimativas elaboradas a
partir dos dados sobre a repartição dos aposentados por
escalões de valores das pensões divulgados pela CGA, e utilizando
os aumentos nas pensões que o governo tenciona fazer em 2008, que foram
dados a conhecer aos sindicatos, revela que o aumento das pensões dos
aposentados em 2008 não determinará qualquer melhoria no seu
poder de compra, e mais de 69% dos aposentados sofrerão mesmo uma
redução do seu poder de compra já que a subida da
inflação em 2007 (2,4%) é superior ao aumento que
vão ter na sua pensão (+1,9%, ou +1,7% ou mesmo 0%).
Entre 2007 e 2008, a pensão média aumentará menos que a
taxa de inflação verificada em 2007 (+2,4%) e menos também
em relação à que registará em 2008, pois passa de
1.179 euros para 1.195 euros, ou seja, terá um aumento médio de
1,4%. Em euros, a subida média é de 16,36 euros por mês, o
que corresponde a um aumento de 55 cêntimos por dia. Por outro lado, mais
de 69% dos aposentados terão um aumento na pensão inferior
à taxa de inflação verificada em 2007, pois as subidas
são apenas de 1,9%, ou de 1,7% ou mesmo de 0%.
A esta descida do poder de compra das pensões provocada pela
inflação há ainda a acrescentar a diminuição
que resultará do aumento da carga fiscal em 2008 determinado pela
redução do rendimento dos aposentados isento de IRS, que passa de
6.100 euros para 6.000 euros, de acordo com a Lei do Orçamento para 2008
aprovada pelo PS. Para além de tudo isto, interessa ainda referir a
eventual criação de mais um desconto de 1% nos vencimentos dos
trabalhadores a pretexto do alargamento do subsídio de desemprego
à Administração Pública. Este novo desconto, a
concretizar-se, determinará que os trabalhadores das
Administração Pública sofrerão um desconto global
nos seus vencimentos de 12,5% para os sistemas de saúde e
segurança social, enquanto os trabalhadores do sector privado descontam
apenas 11%, criando o governo assim uma discriminação grave entre
os trabalhadores da Administração Pública e os do sector
privado.
Interessa ainda referir, até porque isso tem servido de pretexto para
atacar os trabalhadores e aposentados das Administração
Pública, que aufeririam supostamente vencimentos e pensões
médias muito mais elevadas do que os do sector privado, o que resultaria
de um tratamento desigual em que eles seriam mais favorecidos. Quem faz tais
afirmações esquece-se, propositadamente ou não, que a
nível do País apenas cerca 14% do total de empregados têm o
ensino superior, enquanto nas Administração Pública a
percentagem de trabalhadores com o ensino superior ultrapassa os 42%. É
evidente que o facto da percentagem de funcionários público com o
ensino superior ser mais do triplo da que se verifica no sector privado
determina que a remuneração média e, consequentemente,
também a pensão média nas Administração
Pública seja superior à do sector privado. Para além
disso, e em relação às pensões, as carreiras
contributivas nas Administração Pública são em
média mais longas do que no sector privado (na
Administração Pública superior a 30 anos; sector privado
inferior a 30 anos); repetindo, é precisamente a
conjugação destas duas condições percentagem
muito mais elevada de trabalhadores com o ensino superior nas
Administração Pública do que no sector privado, e uma
carreira contributiva mais longa nestas de que no sector privado que
explicam que o vencimento médio e a pensão média sejam nas
Administração Pública mais elevados do que no sector
privado. Estudos recentes feitos por empresas de consultoria privadas, a pedido
e pagos pelo governo, revelaram, para surpresa de alguns, que as
remunerações pagas na Administração Publica a
trabalhadores são já inferiores às recebidas por
trabalhadores com idênticas qualificações do sector
privado, o que levou o governo a ocultar os resultados desses estudos.
AS INTENÇÕES DO GOVERNO E A OPOSIÇÃO DOS
TRABALHADORES
O corte de 4.267,7 milhões de euros que o governo pretende impor em 2008
nas despesas da Administração Pública, em que 91,9%
refere-se a despesas com pessoal, para reduzir o défice, é um
valor muito elevado que, a concretizar-se, terá inevitavelmente
consequências graves para os trabalhadores e para a qualidade dos
serviços públicos prestados à população.
No entanto, a experiência passada já mostrou que devido à
resistência dos trabalhadores, muitas das medidas enunciadas, quando
passam à prática acabam por serem concretizadas parcialmente ou
mesmo não são implementadas. Basta recordar o que está a
suceder a nível da colocação de trabalhadores na
Situação de Mobilidade Especial. De acordo com dados do
próprio governo constante do PEC:2007-2011 "até 30 de
Setembro de 2007 existiam 1.232 funcionários na situação
de mobilidade especial" (pág. 17). Portanto, para os milhares
anunciados pelo governo que deviam estar naquela situação no fim
de 2007 aquele numero reduzido é um fracasso importante. A falsidade de
que existiriam milhares e milhares de trabalhadores em excesso nas
Administração Pública, associada à
resistência dos trabalhadores, em particular contra o desmantelamento da
Administração Pública, é que está a
determinar aquele fracasso. É de prever que, com a
aproximação das eleições, se torne cada vez mais
difícil ao governo concretizar os seus propósitos.
02/Janeiro/2008
[1]
Ver
nosso estudo de 15/12/2007
sobre o aumento das pensões dos reformados da Segurança Social
em 2008.
[*]
Economista,
edr@mail.telepac.pt
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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