Os direitos humanos dos prisioneiros na Base Naval dos EUA em Guantanamo — Projecto de resolução apresentado por Cuba na CDH, em Genebra

declarações de Felipe Pérez Roque [*]

. Após a votação contra Cuba na Comissão de Direitos Humanos da ONU, por 22 contra 21 votos [votação] , o seu ministro das Relações Exteriores, Felipe Pérez Roque, considerou em conferência de imprensa que isto constituía uma "vitória pírrica do governo do EUA" e que de modo algum as autoridades cubanas a assumiam como uma condenação. E não a entendemos assim, explicou, porque em nenhuma das suas partes utilizam-se os verbos "condenar", "repreender" ou "reprovar" e sim expressões como "instamos Cuba", "Cuba deveria evitar...", etc.

Roque argumentou que o desenlace constitui um fracasso para Washington, pois apenas 22 dos 53 países membros da Comissão dobraram-se às suas pressões e chantagens. "Este resultado, enfatizou", revela o desgaste e o descrédito dos Estados Unidos nas suas tentativas de condenar Cuba".

O ministro anunciou que Cuba submeteria à CDH, em Genebra, um projecto de resolução intitulado "A questão das detenções arbitrárias na Base Naval dos Estados Unidos em Guantanamo", na qual solicitará ao Relator Especial um relatório a respeito.

"Será uma magnífica oportunidade para que aqueles que se conluiaram contra Cuba e que se mostram tão preocupados com o tema dos direitos humanos, incluindo Honduras e Estados Unidos, se pronunciem sobre a existência ali (na base de Guantanamo) de um verdadeiro campo de concentração onde se violam todos os direitos e liberdades", considerou o ministro cubano.

O sentido principal desta apresentação é dar-lhes uma informação nova, adicional. Este documento que aqui está é um documento do Parlamento Europeu, e a resolução aprovada pelo Parlamento Europeu que fixa prioridades e recomendações da União Europeia para a Comissão dos Direitos Humanos (CDH). Foi aqui que os parlamentares europeus fixaram as prioridades à Comissão Europeia e aos governos europeus. Uma dessas prioridades diz:
"O Parlamento Europeu pede à presidência que patrocine uma resolução em que inste os Estados Unidos a esclarecer imediatamente a situação dos prisioneiros em Guantanamo no que se refere às normas em matéria de direitos humanos internacionais e direitos humanitários e consequentemente proceder ao seu julgamento ou colocação em liberdade. Reitera sua solicitação de criação de um mecanismo de vigilância das Nações Unidas, etc.

Alguém poderia responder porque esta prioridade foi ignorada pela União Europeia? Teríamos o direito de saber porque os governos da União Europeia que votaram contra Cuba esqueceram esta prioridade fixada pelo seu Europarlamento? Deveria a opinião pública europeia pedir-lhes conta da razão porque se enquadram atrás da liderança dos Estados Unidos contra Cuba e ignoram este mandamento do Parlamento Europeu? Deveria a imprensa europeia falar do assunto, editorializar?

Como houve este vazio, e isto é a última coisa que queremos informar, Cuba dentro de uns minutos estará a apresentar oficialmente perante a CDH este projecto de resolução sob o tema 17 do temário da CDH. O título deste projecto de resolução é "A questão das detenções arbitrárias na Base Naval dos Estados Unidos em Guantanamo".

Entre outras coisas, esse texto reafirma que todo ser humano tem o direito inerente à vida e o direito a não ser submetido a tortura ou tratamento ou castigos cruéis, inumanos ou degradantes. Diz, recordando que em conformidade com as disposições da Declaração Universal dos Direitos Humanos e do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que toda pessoa que seja presa será informada das acusações contra ele ou ela, será considerada inocente até que se prove sua culpabilidade, será conduzida rapidamente perante um juiz ou outro funcionário autorizado pela lei a exercer o poder judicial e terá o direito a um julgamento público dentro de um período razoável no qual tenha todas as garantias necessárias para sua defesa ou então ser libertado. Diz o seu texto:

Profundamente preocupado por, segundo informação confiável, existir uma situação de privação de tais direitos que afecta um número não determinado de pessoas feitas prisioneiras em consequência das operações militares realizadas no Afeganistão e que actualmente se encontram em campos de detenção localizados na zona da Base Naval dos Estados Unidos em Guantanamo,

Consciente de que o Gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, diversos procedimentos temáticos da CDH e um importante número de ONGs, bem como um certo número de Estados com seus nacionais detidos nos referidos campos, exprimiram sua mais grave preocupação em relação à referida situação,

Levando em conta as disposições da Convenção de Genebra de 1949 sobre o tratamento dos prisioneiros de guerra,

1- Solicita ao Estado Parte do Pacto Internacional que exerce jurisdição efectiva sobre estes campos que proporcione ao Gabinete do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e aos demais Estados Partes do Pacto Internacional a informação necessária para tornar claras as condições de vida e o status jurídico das referidas pessoas, assim como os passos que deu para garantir o respeito aos seus direitos humanos e liberdades fundamentais e sua protecção em conformidade como Direito Humanitário Internacional;

2- Solicita também ao referido Estado parte que ponha fim às violações antes mencionadas e que tome as medidas necessárias para impedir aquelas que possam verificar-se enquanto as referidas pessoas se encontrarem sob a sua jurisdição efectiva;

3- Solicita ao Relator Especial sobre a Questão da Tortura, ao Relator Especial sobre a Independência dos Juizes e Magistrados e ao Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária que, no cumprimento dos seus mandatos considerem a situação descrita na presente resolução e informem sobre suas conclusões o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos;

4- Solicita ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos que apresente um relatório completo sobre a aplicação da presente resolução no 61º período de sessões da CDH.

Parece-nos que a comunidade internacional tem o direito de saber o que se está a passar ali, que a Base Naval de Guantanamo não pode ser um lugar fora da jurisdição dos mecanismos internacionais que cuidam dos direitos humanos e portanto nossa delegação está a apresentar este texto. Começará a gora a pedir o co-patrocínio desta resolução aos países que certamente compartilham estas preocupações, começará por pedir aos países da União Europeia que assinem como co-autores, co-apresentadores deste texto. Continuará com os países da Europa Oriental, como a Hungria, Croácia e Arménia. Depois ao Japão e à Coreia do Sul. Mais adiante solicitará reunião com a delegação chilena, mexicana, hondurenha, costarricense, guatemalteca, pedindo a todos para serem co-autores deste texto e para votar em favor desta resolução.

Assim pensamos apresentar este projecto de resolução sobre um assunto que levanta muita preocupação no mundo e sobre o qual sabe-se muito pouco, uma vez que em Guantanamo não houve acesso a relatores internacionais, à imprensa internacional. Aquele é um lugar secreto, um buraco negro, ao qual a opinião pública internacional não pode ter acesso. Cuba pedirá então aos governos, em primeiro lugar a estes 22 países, seu co-patrocínio e seu voto em favor deste texto, o qual solicita também que os relatores existentes sobre estes temas dirijam-se para ali a apresentem um relatório.
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[*] Votaram a favor do projecto norte-americano contra Cuba: Estados Unidos, Arménia, Austrália, Áustria, Chile, Costa Rica, Croácia, República Dominicana, França, Alemanha, Guatemala, Honduras, Hungria, Irlanda, Itália, Japão, México, Holanda, Peru, República da Coreia, Suécia e Reino Unido.
Opuseram-se: Bahrain, Burkina Faso, China, República do Congo, Cuba, Egipto, Etiópia, Índia, Indonésia, Nigéria, Paquistão, Qatar, Rússia, Arábia Saudita, Serra Leoa, África do Sul, Sudão, Swazilandia, Togo, Ucrânia y Zimbabwe.
Abstiveram-se: Argentina, Butão, Brasil, Eritreia, Gabão, Mauritânia, Nepal, Paraguai, Uganda, Sri Lanka.


[*] Ministro das Relações Exteriores de Cuba.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info .

18/Abr/04