Cuba:
Uma resistência
socialista
na América Latina
Entre todas as resistências populares anti-sistémicas que sublevam
actualmente a América Latina e são inúmeras ,
uma delas conseguiu fazer malograr a estratégia de
dominação dos Estados Unidos: a do povo cubano. Única
experiência
revolucionária
do Continente até ao momento vitoriosa, a mais antiga e radical das
lutas latino-americanas coloca à hegemonia capitalista um problema
insolúvel, que faz dela um perigo inaceitável pelo exemplo que
dá: Cuba é a prova de que é
possível
na América Latina uma resistência
socialista
, anti-imperialista e anti-capitalista.
É esta presença do socialismo revelando simultaneamente
uma perda de controlo, por parte das forças dominantes do capital, de
uma das peças da sua zona de influência máxima e o local
preservado de uma alternativa para esta região devastada pelo
neoliberalismo que motiva os esforços de isolamento dirigidos
contra ela
(elemento do eixo do Mal)
pela facção mais reaccionária do poder estabelecido nos
Estados Unidos. Apesar de mais de 40 anos de guerra não declarada contra
a Ilha, concretizada por inúmeras agressões directas ou
terroristas, pelo mais longo bloqueio da História, pela
ocupação militar de uma parte do território (base de
Guantánamo) e por uma propaganda mediática, o governo dos Estados
Unidos não conseguiu minar a base popular da Revolução,
nem a dos apoios exteriores a favor da
Cuba socialista
, pois o facto é que esta goza de um prestígio imenso nos meios
populares e progressistas. Muitos são os que, especialmente a Sul,
admiram, aderem e desejam partilhar os seus valores e o seu projecto social.
Há uma razão para isto, que é simples: os motivos que
impulsionaram outrora a Revolução em Cuba os estragos
sociais causados pelo capitalismo e a violência imperialista dos Estados
Unidos não desapareceram nem da América Latina nem dos
outros países do Sul; apesar de dificuldades reais de todos os
géneros, os princípios das origens justiça social e
independência nacional continuam a animá-la; para muitos,
os objectivos almejados um poder íntegro ao serviço da
grande maioria do povo e uma sociedade socialista continuam a constituir
uma necessidade de futuro.
Mas a reacção norte-americana não é a única,
longe disso, a obstinar-se contra a Ilha. Em França,
à esquerda
, há quem esteja persuadido da justeza da sua luta ao condenar Cuba, sem
julgar necessário saber mais sobre o que se passa realmente na Ilha do
que aquilo que é dito pelos órgãos de
comunicação unilateralmente hostis e posicionados nos seus
chavões mediáticos (prostituição,
corrupção, mercado negro, fachadas em ruínas
e
ditadura castrista
) ou pelo turismo intelectual. Os próprios comunistas, jurando
que não voltariam a cair noutra, desorientados por uma série de
derrotas e erros, preferem alinhar-se: dado que parece não passar de um
resíduo anacrónico do sovietismo, Cuba
deve
cair. Este artigo tem por objectivo lutar contra este
pensamento único anti-cubano
[1]
, que constitui uma das múltiplas faces ideológicas da
mundialização neoliberalguerreira actual.
A URSS e Cuba:
pacto neocolonial
ou detonador de desenvolvimento?
Num artigo recente de
Alternatives économiques
[2]
, O. Appaix descreve o socialismo cubano anterior a 1990 como
um pacto neo-colonial renovado
. Utensílio do pacote de ideias feitas sobre Cuba e preço
a pagar para publicar hoje nos meios de grande tiragem , a tese diz que
as relações da Ilha com a URSS são a
continuação, sob aparência de comunismo, da
posição de país explorado característica da sua
história pré-revolucionária. Um dos episódios seria
a
marginalização
do Che qualificado, no entanto, de
chefe de fila dos burocratas
e promotor de um plano que conduziu a uma
penúria alimentar terrível
. Como prelúdio, o autor recordava que, graças às quotas
açucareiras, os Estados Unidos asseguravam ao país uma
receita relativamente estável. Permita-me o leitor fazer aqui uma
breve incursão pela História, destinada a mostrar de que forma o
desconhecimento dos factos pode levar a este tipo de confusões.
A dependência
económica
de Cuba em relação aos Estados Unidos consolidou-se, sob a forma
política da colonização espanhola, antes da sua
intervenção militar de 1898. A independência dos Estados
Unidos cortou-os dos mercados ingleses e canalizou-os para a Ilha, que passou a
ser o principal ponto de escoamento externo dos seus produtos. Compravam
açúcar a Cuba 1° produtor mundial desde o
início do século XIX e forneciam-lhe em troca os meios de
o produzir: escravos, máquinas... A quota-parte das
exportações cubanas para os Estados Unidos era de 65 % em
1850, 85 % em 1875 e 90 % em 1895, em comparação com
5 % para a Espanha nas mesmas datas.
Em 1895, Cuba era ainda o 2° mercado externo dos Estados Unidos. Os
laços criados entre produtores de açúcar cubanos e
negociantes, industriais, armadores, banqueiros e negreiros estadunidenses
imbricavam a estrutura produtiva insular na estrutura do Norte e, desde muito
cedo, o centro de que a periferia cubana dependia deixou de ser a velha
metrópole imperial e passou a ser a futura hegemonia mundial. De 1898 a
1958, esta dependência reforçou-se através do assalto da
corporate finance
; Morgan e Rockefeller apoderaram-se de tudo o que aí gerava lucro:
centros açucareiros, minas, energia, tabaco
Em 1920 já
dominavam a Banca. Cuba não era nada, dir-se-á? Nada menos do que
o 3º
país destinatário dos capitais estadunidenses no mundo em 1925. O
seu crescimento extravertido guiou-se por uma
lógica de finança
: realizar lucros imediatos, repatriados para os Estados Unidos o
contrário do desenvolvimento. A "racionalidade" desta
estratégia de desemprego e de terras não utilizadas, sem
industrialização nem diversificação
agrícola, era tal que, antes de 1959, o 1°
produtor mundial de açúcar bruto estava reduzido a importar...
açúcar refinado! Os Estados Unidos não eram apenas o
fornecedor e cliente de Cuba, mas também o seu
proprietário.
O Estado acelerou a transferência de excedentes para o Norte e a
pilhagem do tesouro pela dívida pública. E quando F. Roosevelt
renunciou ao intervencionismo revogando a Lei Platt e instaurou o sistema de
quotas (1934), Cuba ganhou em autonomia? Na realidade a sua dependência
aumentou ainda mais: as quotas confinaram a Ilha à
exportação de açúcar bruto (entretanto reduzida a
metade), arruinaram as raras refinarias que possuía e obrigaram-na a
escoar os excedentes no mercado livre, o que fez baixar as
cotações e permitiu a Washington rever em baixa os seus
preços garantidos. Os EUA não asseguravam uma "receita
estável", mas pelo contrário encurralavam Cuba no
subdesenvolvimento, comprando a submissão das suas classes dominantes e
da sua ditadura pró-Estados Unidos
[3]
.
Surgida do húmus comum latino-americano, a Revolução
apoiou-se em séculos de resistência de um povo multi-racial: das
revoltas de escravos aos exércitos
mambises
(negros e mestiços) das guerras de independência, das
ocupações de
latifundios
pelos camponeses sem terra às lutas de resistência e sindicais
progressistas
As cadeias que prendiam a Ilha aos Estados Unidos, a
violência da reacção destes últimos a qualquer
progresso (reforma agrária
) e a desproporção da
relação de forças explicam o facto de a
Revolução só ter triunfado graças à
conjugação da determinação do povo cubano e do
apoio que lhe foi dado pela União Soviética. A ajuda desta
não deve no entanto fazer esquecer que o socialismo não foi
importado nem imposto em Cuba, tendo sido o culminar de um processo interno de
radicalização da luta de classes, no termo do qual as
forças revolucionárias convergiram quanto à necessidade de
uma emancipação nacional (anti-imperialista) e social
(anti-capitalista). Esta Revolução não conheceu o terror,
as "purgas" e os "goulags" para grande pena
dos peritos da "
barbárie moderna",
cujos ataques, neste prisma, não encontraram fundamento. No final de um
debate de fundo entre revolucionários (Rodriguez, Guevara
), foi
decidido o regresso ao açúcar, do qual dependiam após mais
de um século de dominação estadunidense
toda a economia
e a
frente operária-camponesa
como base da Revolução. Esta decisão foi adoptada sob
pressões internas e externas extremamente fortes que causaram as
dificuldades iniciais, mais do que um Che "
burocrata"
, e sem "
fome terrível"
: mobilização do povo em armas para defender a
Revolução, exigência de obter divisas face ao bloqueio
estadunidense, inexperiência da planificação e
penúria de quadros, complexidade da reforma agrária
Foi
possível censurar (mais frequentemente após ter acontecido o
inimaginável: o fim da URSS) o excesso da estratégia
açucareira ou determinadas
insuficiências
da sua planificação, mas é difícil negar que,
durante 30 anos, o motor açucareiro do país permitiu-lhe, apesar
dos fracos recursos em 1959 (nem indústria, nem petróleo
),
fazer trocas comerciais vantajosas com o bloco soviético e impulsionar
um desenvolvimento que, pela primeira vez na História, respondia
às necessidades do seu povo.
Significa isto que este desenvolvimento era
"auto-centrado"
ou que a Ilha era, em 1989, um país
"desenvolvido"
? Evidentemente que não. Devemos por esse facto ocultar a
diferença de natureza existente entre a Cuba de 1959 e a de 1989? Embora
a ruptura com o neocolonialismo deva ser situada no âmbito das estruturas
rigidificadas que este lhe legava e em primeiro lugar a da
especialização açucareira e das pressões que
o sistema mundial capitalista continuou a exercer bloqueio dos Estados
Unidos , as transformações operadas pela
Revolução foram
radicais
. A cooperação com o COMECOM "estabilizou" o
comércio, mas inverteu sobretudo o
sentido
da transferência de excedentes. A propriedade
nacional
dos meios de produção comandou a acumulação e
controlou a importação e a repartição. Foi deste
modo que se tornou possível incentivar o desenvolvimento
industrial
, parcialmente articulado, é um facto mas adaptado às
condições de um pequeno país , em torno do complexo
mineiro-metalúrgico-mecânico ou do agro-alimentar. Foram
impulsionadas novas produções até então
inexistentes: fabrico de maquinaria agrícola (ceifeiras), pesca,
produtos farmacêuticos
A edificação de
serviços sociais, uma forte redistribuição do rendimento e
a instauração da
libreta
[*]
alimentar reduziram as desigualdades e garantiram progresso, homogeneizando a
sociedade, liberta dos males do passado (iletrismo, desemprego, miséria,
segregação, corrupção, mafia
). Os cientistas
cubanos não só atingiram muitas vezes o melhor nível
mundial (farmácia, agronomia
), como servem o seu povo e por
vezes mesmo outros para além do seu. Por outras palavras, no final dos
anos 80, as condições de vida eram bastante boas em Cuba
decerto melhores do que noutros países da América
Latina-Caraíbas. Embora se continue a associar socialismo e
penúria alimentar,
os dados fornecidos pela FAO mostram que em 1990, mesmo para a
alimentação, Cuba vinha à cabeça da lista do
continente relativamente à disponibilidade quotidiana em calorias por
pessoa, enquanto que os dados do PNUD a classificam no 4° lugar em 30 no
mesmo ano. Um estudo estatístico da situação social a
partir dos indicadores das organizações internacionais revela
que Cuba conservava o seu avanço em 1994-95, no auge da crise do
pós-URSS, em quase todos os factores de
desenvolvimento humano
: saúde (segurança social, médicos, enfermeiros, camas de
hospital, esperança de vida
), educação (taxas de
escolaridade líquidas, racios alunos/professores, êxito escolar e
testes internacionais, bolsas, formação de adultos
),
igualdade (coeficientes de Gini, mobilidade social
),
protecção da criança (cuidados pré-natais, vacinas,
creches, ausência de trabalho infantil
), condição
feminina (melhor
índice de participação económica, política e
profissional
, maternidade, único país a reconhecer o direito ao
aborto...), trabalho (índices muito baixos de desemprego, reformas...),
segurança (mortalidade por homicídio quase nula, rara
delinquência...), diferença cidade-campo (infra-estruturas rurais,
crescimento limitado da demografia urbana, ausência de bairros de
lata...), ambiente (reflorestação, projectos de agricultura
biológica...), cultura (bibliotecas, quotidianos, filmes, desporto...).
A OMS indica que, apesar da crise dos anos 90, a taxa de mortalidade por
carências nutricionais manteve-se excepcionalmente baixa em Cuba 7
vezes menos do que na Argentina, 16 vezes menos do que no México...
Relativamente a 1996, a FAO publica indicadores de
subalimentação em Cuba 2 vezes inferiores aos da
Costa Rica, 3 vezes inferiores aos do Chile... Não se morre de fome na
Ilha, mesmo depois de 1990. Será pelo facto de Cuba se ter mantido
socialista?
Após o
fracaso
soviético:
desmoronamento ou recuperação de Cuba?
O desmoronamento do bloco soviético mergulhou a economia cubana numa
crise gravíssima. O desmantelamento do COMECOM, no interior do qual
estavam integradas as trocas comerciais de Cuba, provocou a queda das
exportações e das importações. Sucedeu-se uma forte
baixa do investimento e do consumo, e por conseguinte do PIB (-35% entre 1989 e
1994, ponto baixo da crise) e da produtividade. Depois da relativa
abundância da década de 80, no início dos anos 90
começou a faltar tudo materialmente na Ilha.
As fábricas ficaram sem combustível, matérias-primas,
peças sobressalentes... O défice orçamental aprofundou-se
sob o efeito da deterioração das contas das empresas
públicas e de uma vontade
política
de manter tanto quanto possível os níveis salariais, o emprego e
as despesas sociais, o que resultou na dilatação da liquidez,
traduzindo uma forte inflação e o enfraquecimento do peso. O
país entrou em período especial em tempo de paz.
Apesar do endurecimento do bloqueio e das condições de vida se
terem tornado muito difíceis (consumo, transportes...), os Cubanos
suportaram o choque. Esta crise foi tanto mais visível quanto,
contrariamente aos planos de ajustamento estrutural capitalistas que concentram
os seus efeitos nos grupos não representados politicamente e
economicamente pobres, foi
toda a sociedade cubana
que sofreu o impacto. Embora seja evidente que o seu igualitarismo e a sua
homogeneidade não ficaram intactas as desigualdades aumentam pela
primeira vez desde 1959 , a estratégia de
recuperação
implementada em 1993-94 pela Revolução atingiu
parcialmente
os seus objectivos: a partir de 1995, a economia restabeleceu-se (em 2000 a
produção global subiu para 85% do nível de 1990); a
sociedade cubana, apesar de muito chocada pelo ressurgimento de desigualdades,
não se desmantelou; os pilares do sistema social cubano, abalados,
mantêm-se de pé: a educação e a saúde
continuam a ser gratuitas, o emprego e a reforma amplamente garantidos, a
alimentação de base e os serviços sociais (electricidade,
água, telefone, transportes, habitação...) a preços
módicos, a investigação e o internacionalismo
dinâmicos... Embora tenha procedido a reformas profundas, o Estado cubano
não efectuou
nenhuma
privatização do aparelho produtivo nacional, nem introduziu um
real mercado financeiro.... Será o impossível possível?
Não, mas aquilo que Cuba demonstra é que
um povo
pode optar por
resistir
à ordem mundial imposta pela hegemonia dos Estados Unidos. Pois a
orientação tomada, pela firmeza dos seus objectivos
salvar a todo o custo
a sociedade socialista construída pela Revolução e
as consequências assumidas a penúria devida ao
endurecimento do bloqueio foi uma
decisão política colectiva
: as diferentes opções que se desenhavam (código do
trabalho, sistema educativo, segurança social,
aposentação...) foram objecto, em plena crise, de
deliberações e de análises no seio das
organizações de massa e das unidades de produção.
As medidas fundamentais consistiram em dotar a economia de novos motores de
crescimento, destinados a substituir o sector açucareiro. As entradas de
capitais associadas ao turismo, aos investimentos directos estrangeiros (IDE) e
às transferências de devisas do exterior
(remesas)
permitiram à economia,
parcial
e
temporariamente
dolarizada
[4]
, retomar um crescimento sustentado e restabelecer o valor da moeda nacional.
O número de turistas duplicou entre 1993 e 1996 e aproximou-se dos 1,8
milhões em 2001. Estão registadas mais de 400 sociedades mistas
ou ligadas ao capital estrangeiro na Ilha, onde o total dos IDE se eleva a 4,5
mil milhões de dólares. Os rendimentos privados ultrapassavam os
mil milhões de dólares em 2000. O peso, depreciado contra o
dólar em 150/1 em 1994, revalorizou-se fenómeno raro na
América Latina tendo-se estabilizado em 21/1 desde 1996
até ao final de 2001 antes de aumentar para 26/1 após o 11
de Setembro e a redução do turismo a nível mundial. A taxa
de crescimento do PIB voltou a ficar significativamente positiva: 2,5% em 1995,
7,8% em 1996, 2,5% em 1997, 1,2% em 1998, 6,2% em 1999, 5,6% em 2000, 3% em
2001 e 2002, e provavelmente 5% em 2003. Tomamos como referência os dados
da CEPAL, elaborados em colaboração com a
Oficina Nacional de Estadísticas de Cuba
e não os da CIA, como o fazem de forma imprudente F. Vergara e J. Habel
em
L'État du Monde
[5]
questão de confiança. E também porque o PIB
per capita em PPC
[**]
, segundo a CIA que eles têm em
consideração e que situa a Ilha abaixo do Sudão, da
Mongólia ou da Papuásia Nova-Guiné (!), pouco acima do
nível do Bangladesh, da Mauritânia ou do Haiti (!!), poderia
desastrosamente sugerir (não é decerto a intenção
destes excelsos conhecedores, de longa data, do país) que os Cubanos
seriam hoje em média 2,5 vezes mais afortunados se não tivessem
feito a Revolução (Filipinas) e quase 6 vezes mais ricos se
tivessem continuado neo-colonizados pelos Estados Unidos (Porto Rico)
De
qualquer forma, o forte aumento da produção petrolífera
insular desde meados dos anos 90 contribuiu certamente para favorecer a retoma
económica.
Embora o processo de reforma e recuperação tenha sido até
ao momento relativamente controlado pelo governo, nem todos os seus efeitos
foram positivos, tal como já o dissemos, e as ameaças que pesam
sobre a sociedade cubana são tais que este recorda de forma recorrente a
sua vontade de pôr termo à dolarização assim que as
condições lho permitam. Além disso, o turismo introduziu
um desvio no acesso da população ao dólar, mesmo se
existem amortecedores, informais (solidariedade espontânea) ou formais
(empregados de hotéis ou motoristas de táxis que dão uma
parte das gorjetas a fundos colectivos redistribuídos aos que não
têm contacto com a clientela). Do ponto de vista macro-económico,
este sector pode acabar por absorver mais recursos do que aqueles que gera,
como acontece em inúmeros países do Sul. Os IDE que vêm a
Cuba em busca de lucro acarretam fluxos autónomos de saídas de
capitais. Correm o perigo de destabilizar as relações de
trabalho, e é necessária uma atenção particular por
parte do Estado e dos sindicatos para que os direitos sociais fiquem garantidos
nas sociedades mistas. As
remesas
cavam as desigualdades de forma preocupante 12% das contas
bancárias em dólares concentram 80% dos depósitos em 2000
e podem comprometer os valores da Revolução. Todavia,
não é sustentável declarar que se reconstituiu em Cuba uma
classe burguesa: o Estado continua a bloquear com firmeza as possibilidades de
acumulação nacional de capital privado
e os seus altos dirigentes não enriqueceram nem são
corruptíveis (os empresários estrangeiros sabem-no, na medida em
que não podem proceder em Cuba como o fazem noutros locais). É um
facto que o Estado autorizou o trabalho por conta própria, que permite o
despontar de múltiplas actividades (comerciantes, artesãos,
prestadores de serviços...), mas proíbe a
contratação de assalariados exteriores à família
detentora de licenças. Decidiu abrir lojas em que as compras se fazem em
dólares
(tiendas de recuperación de divisas)
e mercados agrícolas
(agro-pecuários)
nos quais camponeses privados, recentes beneficiários de medidas de
distribuição de terras, cooperativas (nomeadamente UBPC
[***]
) e
propriedades agrícolas estatais vendem uma parte dos seus produtos, mas
continua a fornecer, melhor ou pior, uma porção não
negligenciável do consumo de base a preços reduzidos (
libreta
) e mobiliza regularmente o exército para aprovisionar os mercados de
Estado o que retira toda a pertinência à ideia de reformas
piores
em Cuba do que as PAE
[****]
impostas pelo FMI (o que B. Théret defende).
O Estado encoraja
joint ventures
e zonas francas, mas protege nelas os direitos do trabalho e o papel dos
sindicatos, e limita ao máximo as diferenças de rendimento: a
firma estrangeira paga salários em dólares a uma
empresa-ponte
que, por sua vez, paga aos trabalhadores remunerações em pesos,
sendo que a diferença financia as despesas públicas. A
planificação perdeu terreno, mas as transferências
monetárias, utilizando habilmente a dupla taxa de câmbio (uma
oficial sobreavaliada e a outra semi-oficial sem dúvida subavaliada),
asseguraram a continuidade dos serviços sociais (educação,
saúde, reforma, alimentação, habitação,
infra-estruturas...) por perequação inter-sectorial das entidades
emergentes para as entidades tradicionais simultaneamente implicadas na
racionalização da sua gestão (
perfeccionamiento empresarial).
Embora tenha de admitir provisoriamente o avanço dos mecanismos de
mercado, o Estado parece ter conseguido submetê-los aos interesses do
povo. Não é possível falar actualmente de
transição para o
capitalismo
em Cuba.
Estas mutações levaram a uma reestruturação do
sector açucareiro, acelerada em 2002 pelo encerramento de
centrales
e pela reconversão dos seus efectivos, deixando pressagiar uma
saída do açúcar após dois
séculos de especialização o que é, em si,
uma coisa positiva no contexto actual. Com excepção do tabaco,
cuja procura é forte, é na agricultura que os resultados foram os
mais decepcionantes. Há quem proponha como solução para as
dificuldades a privatização da terra, a fim de estimular o
campesinato. Não deu esta solução bons resultados no
Vietname, que se tornou auto-suficiente relativamente a vários produtos
e grande exportador de arroz? Esta opção não poderá
no entanto fazer esquecer, por um lado, que a colectivização
tinha acarretado fortes subidas de produção e, por outro lado,
que uma eventual transposição desta opção se
depararia com problemas ligados às especificidades do pequeno
campesinato cubano. Este não tem nem a mesma implantação
nem a mesma experiência que o do Vietname, por razões
históricas. A história de Cuba é a do desaparecimento das
culturas e saberes ameríndios (século XVI), das grandes
propriedades de criação de gado para o couro (XVII), das
plantações esclavagistas de canas (XVIII-XIX), das
açucareiras nas quais trabalhava um proletariado operário
assalariado (1886-1958)... e por conseguinte a de um pequeno campesinato
rejeitado para as margens dos
latifúndios
e obrigado a aprovisionar a mão-de-obra do açúcar. Apesar
da reforma agrária e da manutenção do sector privado
(tabaco...), quatro décadas de Revolução não foram
suficientes para constituir um tecido camponês, secular noutros locais.
Em resumo, uma privatização forte da terra conduziria muito
provavelmente ao ressurgimento de uma estrutura de propriedade rural
desigualitária e polarizada, como no passado. A venda livre
de produtos agrícolas permitiu a muitos camponeses enriquecer, mas por
agora essa liquidez não incrementa uma dinâmica de capital
controlando de forma privada uma criação de valor pelo emprego de
trabalho assalariado. Pode-se considerar que estes bloqueamentos
derivam de um autoritarismo incapaz de extrair lições do
êxito asiático; pela nossa parte, pensamos que é
necessário evitar a universalização de
receitas, tolerar trajectórias diferentes em
função do terreno e da História, e ter consciência
de que o
latifúndio
é um dos piores inimigos da América Latina.
O sucesso da investigação médica:
montra do regime
ou realidade social?
Já vai longe o tempo em que o matemático L. Schwartz declarava:
O carácter universal e democrático da
educação é inestimável neste país, onde a
Revolução é um poderoso estimulante do desenvolvimento.
Dentro de 5 ou 15 anos, Cuba disporá de cientistas de classe
internacional precisamente porque estes progressos são apoiados pela
Revolução
[6]
. No momento mais duro da crise (1994-95), Cuba continuava a investir na
Ciência e ocupava o 1° lugar na América Latina no que se
refere ao orçamento público para a investigação no
PIB, à frente da Costa Rica, e o dos investigadores na
população activa, muito à frente da Argentina e do Chile.
O número de cientistas a tempo inteiro elevava-se a 29.000 em Cuba, mais
do que no México (19.500), pouco menos do que no Brasil (32.000)
para 11, 92 e 163 milhões de habitantes, respectivamente. Os alicerces
deste sucesso foram colocados pelas medidas revolucionárias, que fizeram
de Cuba, a partir dos anos 60, o país mais igualitário do
Continente americano (coeficiente de Gini de 0,55 em 1955, 0,35 em 1962, 0,22
em 1986), e pela campanha de alfabetização que, num ano (1961),
reduziu a taxa de iletrismo de 35% para 3%, tendo depois sido consolidadas por
um sistema educativo universal e gratuito, igualitário e despojado de
discriminações sexistas e raciais, que dotou a Ilha de
investigadores de alto nível.
O voluntarismo cubano em matéria científica pode ser ilustrado
pela descoberta, pela equipa do Dr. Campa do Instituto Finlay em Havana, da
primeira vacina contra a Meningite B em 1985. Para demonstrar a sua
eficácia, os investigadores testaram-na em si próprios antes de
os peritos estrangeiros (incluindo norte-americanos) terem sido associados
à verificação dos resultados. Em 1989, foi lançada
em todo o país uma campanha de vacinação da
população com idades situadas entre os 3 meses e os 24 anos.
Desde então foram administradas milhões de doses na
América Latina, nomeadamente no Brasil para onde foram enviadas
gratuitamente quando o bloqueio dos Estados Unidos impediu a assinatura
atempada dos contratos. Uma quinzena de países (Coreia do Sul,
Rússia...) utilizaram esta vacina aquando de fases de
recrudescência da epidemia. Única eficaz até hoje no mundo,
esta vacina recebeu em 1993 a medalha de ouro da
International Property Organization
, o que pôs fim às difamações de que foi alvo.
Perante a agressividade das transnacionais farmacêuticas, foi patenteada (
Va-MenGOC-BC®
), e previu-se a sua comercialização por intermédio de uma
sociedade estrangeira. Durante dois anos, as negociações com a
firma anglo-americana Smith-Kline-Beecham foram entravadas pelo Departamento do
Tesouro, encarregado do controlo da aplicação do bloqueio.
Entretanto, mais de 500 pessoas morriam nos Estados Unidos de meningite por
meningococos do Grupo B. Foram necessárias a intervenção
de cientistas do mundo inteiro e a mobilização de deputados e de
cidadãos dos Estados Unidos para autorizar a importação da
vacina
por motivos sanitários favoráveis aos Estados Unidos
. Pela primeira vez, uma vacina descoberta e produzida num país do
Sul era administrada num país do Norte. Será um caso isolado,
utilizado como
montra do regime
? Não é C. Campa membro do Comité Central do Partido
Comunista de Cuba? Os laboratórios cubanos comercializam uma gama de
vacinas concebidas na Ilha (algumas compradas pela OMS) contra a hepatite B, a
leptospirose, o tifo, o hemophilus influenza..., assim como combinados
(difteria-tétano-coqueluche...). Os resultados dos testes da nova vacina
contra a cólera propagada em determinadas zonas da América
Latina são comparáveis aos das fabricadas nos Estados
Unidos. Registaram-se igualmente progressos em matéria de interferon, de
factor de crescimento epidémico, de genética médica, de
tratamento do colesterol (PPG), de diagnósticos por sistemas
ultramicroanalíticos, de anticorpos monoclonais, de medicina tropical,
de tratamento do vitiligo, de hemologia, de tratamento de doenças
mentais tratamentos que o Presidente da Associação Mundial
de Psiquiatria elogiou recentemente... Os centros de imunologia molecular
cubanos aperfeiçoaram vários tratamentos contra o cancro.
Está inclusivamente a ser objecto de análise clínica
avançada uma pré-vacina contra o SIDA. Os nossos meios de
comunicação preferiram difundir o
boato
de doentes presos em
sidatórios
(termo utilizado por Le Pen e retomado pelo seu efeito repulsivo),
enquanto que Cuba ministra aos portadores do vírus HIV os cuidados
terapêuticos disponíveis mais avançados, totalmente
gratuitos e em meio aberto a familiares e amigos. Por que motivo não se
pronunciaram sobre o facto de médicos cubanos se terem oferecido como
voluntários para serem inoculados com o vírus do SIDA e testar em
si próprios os tratamentos que descobriram?
O que levará um jovem cirurgião de Havana a operar os doentes por
480 pesos por mês, quando recebe ofertas de emprego de clínicas
privadas dos Estados Unidos? O que liga à sua profissão um dos
60.000 médicos de família cubanos, que exerce no edifício
em que habita, ele que não tem acesso ao dólar? O que fará
vir uma investigadora para Cuba após uma conferência dada no
estrangeiro, sabendo a diferença de riqueza que separa o seu país
do Norte? Em 1959, metade dos 6.000 médicos, quase todos privados,
urbanos, desafogados, partiram da Ilha. Se alguns se deixam hoje em dia tentar,
a grande maioria dos cérebros fica em Cuba. Por impossibilidade de
sair, diz-se? São numerosos os investigadores e médicos
cubanos que viajam no mundo inteiro (seria melhor denunciar a política
dos Estados Unidos, perfeitamente criminosa, que recusa a emissão de
vistos legais mas concede a nacionalidade a todo o emigrante, exclusivamente
cubano, que chegue ilegalmente ao seu território, incitando à
travessia perigosa do estreito da Florida). Por que ficam eles? Talvez porque
saibam que o sistema público que construíram e que os
Estados Unidos se obstinam em destruir põe à sua
disposição, apesar da crise, os meios para exercerem os seus
talentos. Porque um dos sentidos da sua vida é afirmar cada dia a sua
decisão de fazer com que o povo tenha uma vida melhor. Porque são
produtos da Revolução, que fez dos filhos e filhas de
operários e camponeses que eles eram os cientistas que são,
animados por um ideal alheio ao lucro. Face às pilhagens materiais,
destruições ambientais e desperdícios humanos do
capitalismo planetário, aquelas mulheres e aqueles homens demonstram que
uma sociedade
pode
existir colocando o
bem-estar das crianças no primeiro lugar da sua lista de
prioridades
, para utilizar as palavras do Director Regional da UNICEF para a
América Latina. O homem no centro, dizia o Che...
Um aspecto das relações cubano-estadunidenses sem dúvida
desconhecido do público francês é o das agressões de
carácter biológico organizadas a partir dos Estados Unidos e
destinadas a infectar culturas, rebanhos e população de Cuba. Um
exemplo flagrante de utilização deste tipo de meios foi a
epidemia de dengue hemorrágico que afectou a Ilha em 1981. No termo de
um escândalo que abalou a opinião pública dos Estados
Unidos, provou-se que este tipo de dengue, desconhecido na época, tinha
sido fabricado em laboratório com vista à sua
propagação intencional em Cuba. Após
vacinação dos soldados de Guantánamo, os Estados Unidos
proibiram às suas firmas (e a vários países) o
fornecimento de pesticidas anti-mosquitos e aviões de
disseminação destinados a travar a transmissão da
doença. A epidemia matou 158 pessoas em Cuba essencialmente
crianças. Foram detectadas outras operações deste
género, como é o caso da
tristeza
(insecto) encontrada no aeroporto nas bagagens de um cidadão
norte-americano em 1992. Pode-se evidentemente pensar que estes casos foram
totalmente arquitectados pelas autoridades cubanas. Mas isso parece
difícil quando as culturas são detectadas pela
primeira vez em Cuba (bactéria
Shiguella 1
da desinteria [1982]), na América (conjuntivite hemorrágica
[1981], síndroma
acaro steneotarsonemus
[1997]) e mesmo no mundo (dengue
Nova Guiné 1924 serotipo 2
), e mais ainda quando membros de organizações anti-cubanas
reconhecem publicamente nos Estados Unidos terem participado em tais
acções (vírus modificado da febre suína [1979]).
O bloqueio: pretexto ou guerra não declarada?
O bloqueio é por vezes apresentado como um fenómeno
secundário ou mesmo negligenciável. Para alguns, seria um
pretexto
para dissimular o
pesadelo do regime castrista
[7]
. Que gravidade teria para a Ilha se é tão fácil de
contornar? Muitos franceses tomaram agora consciência do que as
autoridades estadunidenses são capazes para destruir quem lhes resiste
(campanha anti-francesa de calúnias, boicote de produtos, controlo dos
meios de comunicação pela finança ou pelo exército,
manipulação dos factos e desprezo pela opinião
pública, chantagem sobre Estados soberanos do Conselho de
Segurança...), e têm a noção da força e do
orgulho que um povo sente ao assumir essa luta, assim como a simpatia e o
respeito que lhes granjeia por parte dos outros povos. Devemos lembrar-nos que
Cuba infligiu aos Estados Unidos, aquando da invasão da Playa
Girón (Abril de 1961), a sua única derrota militar na
América, e avaliar bem o bloqueio: trata-se de uma
guerra não declarada
de Washington contra a Ilha. Embora o bloqueio total tenha sido decretado em
Fevereiro de 1962, Eisenhower tinha já proibido o comércio entre
os dois países; por sua vez, Kennedy restringiu a liberdade de
circulação dos cidadãos norte-americanos que desejassem
viajar para Cuba. As operações efectuadas por um cidadão
dos Estados Unidos com a Ilha caíam sob a alçada do
Trading with the Ennemy Act.
Desde 1964, firmas estrangeiras que vendiam medicamentos ou material
médico a Cuba sofreram pressões no sentido de denunciarem os
contratos:
Ayerst Canada
(medicamentos),
Medix Argentina
(aparelhos de diálise),
Toshiba
(equipamentos),
Siemens
(detectores cardio-vasculares),
Thompson
(peças sobresselentes),
LKB Sweden
(materiais de laboratório)
Os Estados Unidos opõem-se
à entrada de Cuba nas organizações financeiras
internacionais. A Lei Torricelli, de Outubro de 1992, tinha por objectivo
travar o ímpeto dos motores da economia, golpeando as entradas de
capitais e de mercadorias mediante a cessação das
transferências de mais de 100 dólares por mês por parte dos
exilados, a proibição durante 6 meses, aos barcos que tivessem
feito escala em Cuba, de atracarem nos Estados Unidos e sanções
contra as firmas que negociassem com a Ilha abrangidas pela
jurisdição de Estados terceiros. A sua vertente política
pretendia virar os espíritos contra a Revolução pelo
intercâmbio de informações
. Este dispositivo foi criticado inclusivamente nos meios de
negócios e nas fileiras conservadoras dos Estados Unidos por entravar a
circulação de capitais.
Estas reacções, muitas vezes vivas
[8]
, eram menores comparadas com as que iria suscitar a Lei Helms-Burton. Esta
lei, que reúne os 9 projectos redigidos pelos deputados de
extrema-direita (Florida e Nova Jersey), aprovada em Março de 1996,
pretende reforçar as sanções
internacionais contra o governo de Castro
. O seu Título I generaliza a proibição de importar
bens cubanos, exigindo nomeadamente dos exportadores que provem que nenhum dos
seus produtos contém açúcar cubano, como já
acontecia com o níquel. Esta lei condiciona a autorização
das transferências de devisas para a Ilha à criação
de um sector privado e do salariato. Mais audacioso ainda, o Título II
estabelece as modalidades da transição para um poder
pós-castrista
estando excluída a possibilidade de Fidel ou Raúl Castro
se apresentarem às eleições (secção 205,
parágrafo 7) , bem como a natureza das relações a
manter com os Estados Unidos (adesão à NAFTA...).
[*****]
O Título III concede aos tribunais dos Estados Unidos o direito de julgar
acções por prejuízos e danos introduzidas por uma pessoa
singular ou colectiva de nacionalidade norte-americana que se considere lesada
pela perda de propriedades nacionalizadas pela Revolução e que
reclame uma indemnização aos utilizadores ou beneficiários
desses bens. A pedido dos antigos proprietários, o cidadão de um
país terceiro (e respectiva família) que tenha realizado
transacções com esses utilizadores ou beneficiários pode
ser objecto de um processo judicial nos Estados Unidos. As
sanções incorridas estão expostas no Título IV, que
legaliza a recusa de vistos de entrada a esses indivíduos e seus
familiares pelo Departamento de Estado. O tumulto provocado por esta lei, em
especial na Europa e entre os democratas nos Estados Unidos, não impediu
o Presidente Clinton de renunciar a opor-lhe o seu veto. As críticas
concentraram-se na extraterritorialidade destas normas, que pretendem
unilateralmente mundializar a aplicação do bloqueio à
comunidade internacional. A Lei Helms-Burton viola o direito internacional e o
princípio de soberania nacional, ao imiscuir-se nas opções
políticas de um Estado vizinho. As reticências expressas perante
as pressões exercidas para a economia de mercado demonstram que
não há consenso a este respeito à escala mundial, tal como
sobre a concepção do liberalismo como condição da
democratização.
O bloqueio imposto a Cuba pelos Estados Unidos é condenado por uma
maioria cada vez mais ampla de países membros da Assembleia Geral das
Nações Unidas. Em Novembro de 2002, pelo 11° ano
consecutivo, o representante dos Estados Unidos declarou que o seu governo
não cumpriria as injunções da ONU
(Resolução 56/9).
Votos da Assembleia Geral da ONU
sobre a necessidade de levantar o bloqueio
|
|
Por
|
Contra
|
Países contra o levantamento do bloqueio
|
|
1992
|
59
|
2
|
EUA, Israel
|
|
1993
|
88
|
4
|
EUA, Israel, Albânia, Paraguai
|
|
1994
|
101
|
2
|
EUA, Israel
|
|
1995
|
117
|
3
|
EUA, Israel, Uzbequistão
|
|
1996
|
138
|
3
|
EUA, Israel, Uzbequistão
|
|
1997
|
143
|
3
|
EUA, Israel, Uzbequistão
|
|
1998
|
157
|
2
|
EUA, Israel
|
|
1999
|
155
|
2
|
EUA, Israel
|
|
2000
|
167
|
3
|
EUA, Israel, Ilhas Marshall
|
|
2001
|
167
|
3
|
EUA, Israel, Ilhas Marshall
|
|
2002
|
173
|
3
|
EUA, Israel, Ilhas Marshall
|
Segundo Cuba, as perdas para a economia ultrapassam 70 mil milhões de
dólares. Embora todos os sectores sejam afectados (saúde,
educação, consumo...), o bloqueio trava sobretudo os motores da
recuperação e em primeiro lugar o turismo previsões
de fluxo de turistas norte-americanos em caso de autorização de
viagem a Cuba: 1 milhão no 1° ano, 5 milhões 5 anos depois.
A direcção da filial britânica do grupo
Hilton
teve de cessar há pouco tempo as negociações para a
gestão de hotéis, pois os seus advogados previam que os Estados
Unidos considerariam o contrato uma violação da Lei Helms-Burton.
A aquisição, por um grupo norte-americano, de sociedades
europeias de cruzeiros que atracavam em Havana levou à
anulação dos projectos com Cuba em 2002. Em
violação da Convenção de Chicago sobre a
Aviação Civil, os obstáculos que os Estados Unidos colocam
à compra ou aluguer de aviões, ao aprovisionamento em querosene e
ao acesso às tecnologias (localização por rádio,
reservas através da Internet...) teriam acarretado perdas de 153
milhões de dólares em 2002. O impacto sobre os IDE é
igualmente negativo. Os institutos de promoção dos IDE em Cuba
receberam até à data cerca de 530 projectos de
cooperação de firmas estadunidenses sem que nenhum tenha podido
realizar-se. Só para o sector das biotecnologias, o montante não
ganho está avaliado em 200 milhões de dólares. Os
domínios em que a propriedade estadunidense era dominante antes de 1959
estão hoje muito afectados pelo endurecimento do bloqueio, tal como o
sector açucareiro, cuja recuperação é entravada
pela proibição de acesso à primeira Bolsa mundial das
matérias-primas (Nova Iorque): a perda elevou-se a 195 milhões de
dólares em 2001. Determinados Bancos europeus decidiram reduzir os seus
compromissos sob a ameaça dos Estados Unidos, que informaram que
exigiriam indemnizações se os créditos fossem mantidos (
Bilbao Viscaya, ING...
). Outras firmas, pelo contrário, reafirmaram a sua vontade de
prosseguir as actividades. A
Sherritt
(Canadá) anunciou mesmo uma diversificação
(níquel, construção, petróleo,
telecomunicações...), apesar dos ataques na Bolsa contra a
cotação das suas acções e as recusas aos seus
dirigentes de vistos de entrada nos Estados Unidos. A
Domos
(México), co-proprietária da nova companhia cubana de telefones
Etecsa,
ampliou igualmente as suas actividades o seu presidente declarou que
iria gastar os seus dólares noutro lado que não nos Estados
Unidos.
A chegada ao poder de George W. Bush reforçou ainda mais o dispositivo
anti-cubano, tanto mais que determinados funcionários de origem cubana
nomeados no interior do seu Gabinete e do Departamento de Estado são
conhecidos por serem responsáveis pela muito reaccionária
Fundación Nacional Cubano-Americana
e por outros grupos de extrema-direita, cuja actuação é
de natureza comprovadamente terrorista, facto que foi denunciado pelas
administrações democratas. As restrições à
liberdade de circulação agravaram-se: em 2001, 698
cidadãos norte-americanos, contra 178 em 2000, foram condenados a
sanções penais por terem viajado para Cuba sem
autorização de saída do território. Toda a
estratégia dos Estados Unidos repousa na procura de uma
condenação da Ilha por
violação dos Direitos do Homem
, a fim de poder justificar a sua recusa de levantamento do bloqueio. Na
58ª sessão da Comissão dos Direitos do Homem em Abril de
2002, uma Resolução inspirada pelos Estados Unidos
convidou
Cuba a
realizar progressos no domínio dos Direitos do Homem cívicos e
políticos
, acrescentando
sem ignorar os esforços desenvolvidos para efectivar os direitos sociais
da população apesar de um ambiente internacional
desfavorável
. A nítida clivagem Norte-Sul que o voto desta
Resolução anti-cubana revelou só foi atenuada pela
submissão dos delegados latino-americanos que, tendo engolido a
vergonha, a aprovaram com excepção de um voto contra
(Venezuela) e duas abstenções (Brasil e Equador). A
pressão dos Estados Unidos foi tal que conseguiu inverter um voto
parlamentar (peruano) e ignorar as manifestações populares de
apoio a Cuba (México, Cidade da Guatemala, Montevideo, Santiago do
Chile)... O representante cubano perguntou se o modelo que lhe propunham era o
de um país do Norte no qual um homem acabava de ser eleito presidente
após um roubo eleitoral, ou o de um país do Sul no qual a
população, exasperada pelo caos causado pelo FMI, assaltava
camiões e supermercados para se alimentar...
O tema dos Direitos do Homem é demasiado grave para ser tratado com
ligeireza ou tolerar aproximações e boatos. Vamos direitos ao
assunto: a chamada
violação dos Direitos do Homem em Cuba
constitui a arma ideológica mais perniciosa utilizada pelos
Estados Unidos contra a Ilha. O que seria conveniente interrogar seriam os
mecanismos pelos quais o governo de um país que se sabe ter
nascido de um genocídio recente (século XIX), onde a
segregação racial manteve até tarde a sequela da
escravatura mais massiva do mundo, que exibe o espectáculo das suas
desigualdades abissais e de uma violência social patológica, que
apoiou as ditaduras mais sanguinárias da América Latina,
impondo-as por vezes através da liquidação de
experiências autenticamente progressistas, que mantém pela
força armada a ordem da sua hegemonia sobre um sistema mundial
iníquo, que não reconhece o Tribunal Penal Internacional com
receio de ver alguns dos seus antigos dirigentes serem obrigados a comparecer
perante a Justiça por crimes contra a Humanidade... acusa de
violação dos Direitos do Homem
o governo de um país onde nenhuma criança morre de fome nem
trabalha, onde a escola e a saúde são gratuitas, onde as
discriminações recuaram bastante mais do que no Norte, onde todos
têm acesso a uma alimentação a preços
módicos, onde o povo conquistou direitos sociais amplos e é
efectivamente associado à construção
político-económica do projecto de sociedade, onde a
segurança está garantida e a violência é
mínima, onde segundo o Presidente da Associação
Americana de Juristas declarou em 1994 não há
nem desaparecidos, nem assassinatos, nem torturas
...
Um dos elementos de resposta reside concerteza na natureza do conflito que
opõe os dois países, o qual, antes de ser compreendido
através do confronto Este-Oeste, deve sê-lo do ponto de vista das
suas relações bilaterais, extremamente singulares como já
o dissemos. São essas relações que explicam
simultaneamente a persistência do conflito após o desaparecimento
da URSS e o tratamento diferenciado que os Estados Unidos aplicam a Cuba em
relação a outros países comunistas, tais como
a China. Os Direitos do Homem
nunca
ocuparam um lugar privilegiado nas considerações que guiam a
estratégia externa dos Estados Unidos, e a violação desses
direitos
nunca
valeu (excepto por calculismo) às inúmeras ditaduras aliadas dos
Estados Unidos a suspensão de relações comerciais ou da
ajuda militar e económica. Aliás,
nunca
é evocada a violação dos Direitos do Homem em Cuba
antes de 1959
, numa época em que uma
real ditadura
, pró-Estados Unidos, prendia, torturava e assassinava os opositores. A
retórica de geometria variável dos Direitos do Homem é
dirigida contra Cuba porque a sua Revolução é um
pesadelo
, não para os Cubanos que
a fazem
há mais de 40 anos, mas para o
poder estabelecido
norte-americano: anti-capitalista, anti-imperialista, anti-racista, Cuba
defende a emancipação social, a libertação nacional
e a mestiçagem igualitária ou seja, o extremo oposto do
projecto neo-liberal imposto pelos Estados Unidos. Incentivamos o leitor a
consultar trabalhos
sérios
sobre esta questão
séria
, tais como os de P. Roman (aspectos políticos) ou de D. Evenson
(aspectos económicos).
[9]
O intervencionismo exterior: cinismo ou internacionalismo?
Pretendeu-se, mesmo nesta Revista, falar do
cinismo
da
estratégia castrista
em matéria de intervencionismo exterior
[10]
. Recordemos alguns factos. Desde 1962, pouco antes de o exército
francês se desligar do conflito argelino, a jovem Revolução
cubana inaugurava a sua longa série de operações de
solidariedade internacional, dando o seu apoio civil e militar à FLN.
Cuba acolheu dezenas de órfãos de guerra que o primeiro-ministro,
Bem Bella, reduzindo o tempo de visita a Washington, encontrou ao lado de Fidel
Castro ao descer do avião em Havana, em 16 de Outubro de 1962. Cinismo?
Enquanto os Estados Unidos se atarefavam no Vietname, várias centenas de
milhares de jovens cubanos de ambos os sexos ofereciam-se como
voluntários para lutar ao lado dos seus camaradas vietnamitas (que
só aceitaram a ajuda civil). Por cinismo? Enquanto o Ocidente fornecia
mercenários a Savimbi, apoiado pelo regime racista de Pretória,
os soldados sul-africanos e os seus aliados da UNITA foram definitivamente
derrotados em 1988 pelas forças armadas cubanas que combatiam ao lado
dos revolucionários angolanos. Foram elas que conseguiram preservar a
soberania de Angola, obter a autodeterminação da Namíbia e
dar ao povo da África do Sul o impulso decisivo para abater o apartheid
o que Mandela saudou oficialmente a partir de 1991. Seria por cinismo?
Cuba apoia desde 1959 todos os movimentos progressistas latino-americanos, os
mesmos que os Estados Unidos tentam por todos os meios eliminar, grande parte
das vezes com sucesso. De que lado está pois o cinismo?
Objectar-se-á: onde estão os fundamentos morais de uma
política que durante muito tempo se colou à da URSS? Uma
análise atenta revela que o
internacionalismo proletário
cubano, embora financeira e materialmente apoiado pela União
Soviética, foi conduzido de forma suficientemente autónoma em
relação a este país para se demarcar muitas vezes da linha
de Moscovo, que encontrou aliás assim frequentemente o sentido
revolucionário dos seus compromisso externos. Cuba, apesar de implicada
na Etiópia, irá ao ponto de reconhecer o direito à
emancipação dos rebeldes eritrenses. Enquanto que entre
nós os antigos da guerra da Indochina, da guerra da Argélia (dos
Aurès) ou da 1ª guerra do Golfo se vangloriam dos seus feitos, em
Cuba encontram-se os guerrilheiros da epopeia boliviana, os companheiros do
general Giap ou os vencedores de Cuito Cuanavale
[******]
... questão de
pontos de referência colectivos.
O internacionalismo constituiu
sempre
e
continua
a constituir o princípio da política externa da Cuba
revolucionária. Atingiu no passado uma amplitude por assim dizer
incrível
. O seu objectivo consistiu em satisfazer as necessidades vitais e as
aspirações profundas do povo cubano, partilhando os
avanços realizados em matéria de desenvolvimento e forjando os
laços de cooperação fraterna com os povos cuja causa era
também a emancipação nacional e social. Desde 1959, cerca
de 80.000 trabalhadores civis exerceram a sua profissão numa centena de
países e, por vezes, em condições difíceis. Apesar
de orçamentos extremamente restritivos, a crise económica dos
anos 90 não impediu a prossecução da ajuda a dezenas de
países do Sul essa ajuda foi mesmo aumentada para a Saúde
e a Educação. No final de 1999, a Escola latino-americana de
Ciências Médicas abriu as suas portas em Havana para formar jovens
que não tinham meios para estudar nos países de origem. Os
efectivos da Escola foram aumentados de 500 para 3.300, e em breve
ascenderão muito provavelmente a 10.000. Além destes aumentos,
6.000 estudantes estrangeiros frequentam gratuitamente um curso
universitário nas faculdades de medicina cubanas. Actualmente, somadas
todas as disciplinas, 11.000 estudantes estrangeiros, oriundos de mais de 20
países, beneficiam de bolsas do Ensino Superior em Cuba. De que forma
Cuba responde ao povo dos Estados Unidos cujo governo impõe o bloqueio?
Oferecendo 500 bolsas de estudo por ano a jovens desfavorecidos e discriminados
no seu país... Várias centenas de jovens estadunidenses,
sobretudo afro-americanos e hispânicos, chegaram já a Cuba para
fazerem os seus estudos, com todas as despesas pagas pelo Estado cubano.
Esta solidariedade é também uma batalha travada em todas as
tribunas do mundo para resolver os problemas económicos e sociais que
afectam os países do Sul. Nos encontros internacionais em que
participam, os representantes cubanos reclamam e propõem
sistematicamente soluções para a miséria e a fome, para a
carência de cuidados médicos e de instrução, para a
dívida e para o comércio desigual, para a
deterioração do ambiente..., recordando que estes males se devem
em grande medida à exploração de que o Sul é
vítima por parte dos países capitalistas mais ricos. Em Setembro
de 2000, na Cimeira do Milénio, Cuba declarou pôr à
disposição imediata da ONU, da OMS e dos Estados africanos o
pessoal necessário para um programa de luta contra a epidemia do SIDA
que assola o continente africano, nomeadamente formando profissionais deste
sector. Esta iniciativa conduziu à abertura de serviços
especializados de medicina em África, onde trabalham cubanos ao lado de
colegas africanos. Em 2002, cerca de 700 médicos cubanos
voluntários ministravam cuidados de saúde gratuitos,
será necessário repetir numa vintena de países. Ao
mesmo tempo que continuam a ser tratadas em Cuba crianças de Chernobyl,
multiplica-se o número de doentes estrangeiros que são acolhidos
na Ilha.
Na era da mundialização neo-liberal, o internacionalismo cubano
é irracional ou irrealista? Ele é simplesmente exemplar de
humanidade e faz da utopia uma prática quotidiana: apesar das suas
dificuldades, um povo decidiu oferecer os seus recursos humanos e materiais
para a construção de
outro mundo
, solidário. Quem pode, na sua consciência, condená-lo?
__________________
[*]
Francês, investigador no CNRS - Conseil National de la Recherche
Scientifique.
NOTAS
1- A sua linha é fielmente seguida pelo censor do
Monde (livros)
que reservou uma recepção especial ao nosso artigo
Cuba et le projet communiste
, saudando a saída do
Dictionnaire Marx Contemporain
(PUF, 2001).
2- Fidel Castro : 40 ans de règne, n° 210, Janeiro
de 2003.
3- Ver, a este respeito, a obra colectiva
Cuba révolutionnaire
, que publicámos nas edições L'Harmattan (2003).
4- Sobre a dolarização: Herrera e Nakatani no n° 171 da
Revista
Tiers Monde
(2002). Texto em português em
http://resistir.info/cuba/dolarizacao_cubana.html
5-
Cf.
a minúscula mas sensacional nota
q,
p. 400, da sua edição de 2003
(La Découverte).
6-
Granma
, 3 de Março de 1968, citado por Huberman e Sweezy,
Le Socialisme cubain
, Anthropos, 1969.
7- Devemos ler F. Hollande (
Le Nouvel Observateur
, 05-03-03)? Sim, pela sua aflitiva hipocrisia. O primeiro secretário do
Partido Socialista não compreendeu que, face a um perigo real, um povo
pode resistir e unir-se. Foi no entanto a sua defesa dos
ideais da esquerda
que o obrigou, a ele e a 82% dos Franceses, a levar à presidência
um Gaulista, o qual lhe ensinou entretanto a fazer frente aos Estados Unidos.
Que lições tem o PS a dar, a não ser a de calar os seus
pesadelos: da tortura na Argélia à
corrupção em África
?
8- O
New York Times
(15-06-92) considerou a lei
cruel e ignóbil
:
Há algo de indecente em ver vociferar estes exilados que vivem em
segurança em Miami e reclamam mais sofrimento para os seus
primos...
9- P. Roman (1999),
People's Power: Cuba's Experience with Representative Government
, Boulder: Westview Press (
cf.
a sua recensão na
Monthly Review
, vol. 54, n° 9). D. Evenson (2002),
Workers in Cuba Unions and Labor Relations
, NLG/Maurice & Jane Sugar Law Center for Economic & Social Justice, Detroit.
10- J. Habel no n° 52-53 de
Recherches internationales.
NOTAS DO TRADUTOR
* Espécie de caderneta que permite comprar alimentos e produtos de
primeira necessidade em determinadas quantidades nos armazéns do Estado
a preços excepcionalmente baixos e que se têm mantido inalterados
(N.T.)
** Paridade do Poder de Compra (N.T.)
*** Unidades Basicas de Producción Cooperativa (Unidades Básicas
de Produção Cooperativa) (N.T.)
**** Políticas de Ajustamento Estrutural promovidas pelo FMI (N.T.)
***** North American Free Trade Agreement (Acordo Norte-Americano de
Comércio Livre) (N.T.)
****** Batalha de Cuito Cuanavale (sudeste de Angola), na qual o
exército sul-africano foi derrotado em 1987 e que levou à
alteração da estratégia do Ocidente e da África do
Sul relativamente a Angola. Na sequência desta derrota, foram celebrados
os Acordos de Nova Iorque, em Dezembro de 1988, que permitiram a
cessação das hostilidades militares entre Angola e a
África do Sul, a retirada das forças sul-africanas que ocupavam o
sul de Angola desde 1982 e o início da descolonização da
Namíbia (N.T.)
Este ensaio encontra-se em
http://resistir.info
.
|