O que o capitalismo proporciona
A maior parte dos presidentes atravessam um ou mais períodos
económicos maus (recessões, depressões, crises, etc). Todo
presidente desde pelo menos Franklin Dellano Roosevelt gerou um
"programa" para responder ao período mau tal como
era pedido pelos cidadãos e os negócios. FDR e todo presidente
posterior prometiam que o seu programa iria "não só livrar
os EUA das perturbações económicas actuais como
também garantiria que nem nós nem os nossos filhos
precisarão enfrentar tais períodos maus no futuro". Obama
foi apenas o mais recente a dizer isso.
Nenhum presidente foi capaz de manter tal promessa. A actual crise capitalista,
agora a meio caminho no seu quinto ano sem fim à vista, prova que o
impedir de futuros períodos de baixa capitalista iludiu todo presidente
do passado e todos os seus prestigiosos e bem pagos conselheiros
económicos. Uma vez que o programa do presidente Obama não
é basicamente diferente os anteriores programas presidenciais,
não há razão para esperar que ele tenha êxito.
O fracasso em impedir crises capitalistas condenou milhões dos nossos
companheiros cidadãos a repetidas devastações de perdas de
empregos, benefícios e segurança além de lares arrestados
e perspectivas negras para os nossos filhos. Os custos familiares e
económicos do fracasso em lidar com crises capitalistas são
estarrecedores. Hoje dezenas de milhões de americanos ou não
têm trabalho ou devem aceitar empregos em tempo parcial quando precisam e
querem trabalho a tempo inteiro. De acordo com o governo dos EUA,
aproximadamente 30 por cento das ferramentas, equipamentos, fábricas,
escritórios, espaço comercial e matérias-primas permanecem
ociosos. Este sistema capitalista priva-nos da produção e riqueza
que podia ser produzida se os empregos negados ao povo fossem combinados com os
meios de produção ociosos.
Essa produção poderia reconstruir nossas indústrias e
cidades, poderia convertê-las em instituições
ambientalmente respeitáveis e poderia aliviar a pobreza nos EUA e mais
além. Se empregados, aqueles agora sem empregos podiam ter vidas
melhores, manterem seus lares e serem produtivos. Todos nós
poderíamos beneficiar-nos enormemente se não fosse o fracasso
abjecto do capitalismo para combinar as pessoas que querem trabalhar com meios
de produção não utilizados para o que precisamos.
O problema básico tão pouco tem a ver com políticas e
programas governamentais. Afinal de contas, os principais partidos
políticos, os políticos, lobistas e seus aliados nos media e na
academia cantam todos em uníssono para celebrar o capitalismo. Eles
têm insistido ao longo dos últimos cinquenta anos em que a
crítica o capitalismo, não importa quão fraco seja o seu
desempenho, era tola, sem fundamento, absurda, desleal ou pior. A sua lenga
lenga tem sido "o capitalismo cumpre as promessas"
("capitalism delivers the goods").
Por trás da cobertura protectora de uma proibição da
crítica quase total, o sistema capitalista estado-unidense deteriorou-se
(o resultado habitual quando é proscrita a crítica pública
de uma instituição social). Desde o desencadeamento desta crise
em 2007, o capitalismo tem estado a "proporcionar dificuldades"
à maior parte de nós. Ele ameaça de modo crescente
proporcionar dificuldades ainda piores nos anos pela frente. Promotores
acríticos do capitalismo estão agora a pressionar o governo a
reduzir serviços públicos exactamente quando a massa de
americanos os necessita mais do que nunca. O seu slogan e programa
básico insistem: "recuperação" económica
para poucos e austeridade para muitos.
Nas décadas de 1950 e 1960, o escalão de rendimento individual
que tributava os americanos mais ricos era de 91%, ao passo que hoje é
de 35%. Em 1977, o imposto que as pessoas pagavam sobre "ganhos de
capital" (ao venderem activos como acções e títulos a
preços superiores aos pagos por eles) era de 40%. Hoje aquela taxa
é de 15%. A massa do povo nunca desfrutou de cortes fiscais tão
maciços. Estes cortes fizeram os ricos ainda mais ricos enquanto
forçavam o governo a tomar dinheiro emprestado para substituir o que
já não podia ser obtido através dos impostos sobre os
ricos. Como é grotesco que os ricos agora utilizem dívidas do
governo como desculpa para eliminar serviços públicos para a
massa dos americanos!
A solução para crises capitalistas como aquela que hoje nos
aflige não é que o presidente promova outro programa de reformas,
regulamentações, estímulos económicos e
orçamentos deficitários. Já passámos por isso e
já o fizemos. Isso nunca funcionou para impedir este sistema
económico de condenar o povo a "tempos difíceis"
infindavelmente repetidos. Há muito que se deve sujeitar o capitalismo
à crítica séria, aberta e pública e debater o que
nunca deveria ter sido reprimido. Precisamos examinar se e como os EUA podem
fazer algo melhor do que o capitalismo.
Os sistemas económicos nascem, evoluem no tempo e morrem como
todas as instituições humanas. Em resultado do fim da
escravidão e do feudalismo, nasceu o capitalismo. Ele prometia, nas
palavras dos revolucionários franceses, "liberdade, igualdade e
fraternidade". Fez alguns progressos genuínos rumo àqueles
objectivos. Contudo, também ergueu alguns graves obstáculos para
alguma vez alcançá-los. O principal deles foi a
organização da produção no interior das empresas
capitalistas.
Nas empresas corporativas capitalistas que hoje dominam a economia, os seus
grandes accionistas e os conselhos de administração que eles
seleccionam estão na não democrática posição
exclusiva de tomarem todas as decisões chave. Os grandes accionistas e
conselhos de administração constituem uma pequena minoria
daqueles directamente ligados a empresas capitalistas. A maioria são os
trabalhadores das empresas e as populações de comunidades
dependentes das mesmas. Mas as decisões da minoria (acerca do que, como
e onde produzir e o que fazer com os lucros) impactam a maioria
incluindo provocar crises sem permitir à maioria qualquer papel
directo na tomada de tais decisões. É então dificilmente
surpreendente que a minoria exija e esteja em posição de tomar
para si própria a riqueza e a fatia de rendimento do leão. Ela
igualmente compra o controle da política a fim de impedir a maioria de
utilizar o governo para rectificar as suas desvantagens e
privações económicas. Eis porque agora temos salvamentos
governamentais para os ricos e austeridade para o resto de nós.
A menos que a sociedade se movimente para além da
organização capitalista da produção, as crises
económicas continuarão a acontecer e a gerar falsas promessas de
políticos de que as impedirão. É ingénuo esperar
que a minoria responsável por um sistema que para ela ainda funciona bem
democratize a economia e a política. Esta é a tarefa central dos
99%.
[*]
Professor emérito da Universidade de Massachusetts-Amherst e professor
visitante no Programa de Graduação em Assuntos Internacionais da
New School University, Nova Yok. Autor de
New Departures in Marxian Theory
(Routledge, 2006) e do filme documentário
Capitalism Hits the Fan,
www.capitalismhitsthefan.com
. Sítio web:
www.rdwolff.com
.
O original encontra-se em
http://mrzine.monthlyreview.org/2012/wolff160412.html
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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