As eleições de 2010 no Brasil
por Ivan Pinheiro
[*]
entrevistado por
Caros Amigos
A Revista
Caros Amigos
número 155, que está nas bancas, apresenta uma reportagem
especial "Eleições 2010 Disputa de projetos ou falsa
polarização?", em forma de entrevistas com representantes de
sete Partidos "do campo democrático-popular e da esquerda",
segundo classificação da jornalista Tatiana Merlino. São
entrevistados, com as mesmas perguntas, Brizola Neto (PDT), Ivan Pinheiro
(PCB), Ivan Valente (PSOL), José Eduardo Dutra (PT), José Maria
de Almeida (PSTU), Luiza Erundina (PSB) e Renato Rabelo (PCdoB).
Aqui estão, na íntegra, as respostas do Secretário Geral
do PCB.
O que está em jogo nessas eleições?
Deveria estar em jogo um intenso debate sobre os grandes problemas nacionais,
uma discussão ideológica, o confronto de projetos, a
política externa brasileira, a integração da
América Latina, a soberania nacional, a reestatização da
Petrobrás, a redução da jornada de trabalho, a reforma
agrária e outros temas sobre o presente e o futuro do país.
Infelizmente, as oligarquias e a mídia podem, com a força que
têm, fazer desta eleição um par ou ímpar entre dois
projetos de administração do capital, um capitaneado pelo PT e
outro pelo PSDB.
Há um risco de os candidatos deste campo, que disputam quem é
mais eficiente para alavancar o capitalismo brasileiro, ficarem disputando qual
mandato de oito anos (FHC ou Lula) apresentaram os melhores indicadores
macroeconômicos: quem mais deu confiança aos investidores
internacionais, quem "destravou" mais a economia, quem criou mais e
piores empregos, quem reduziu mais o "Risco Brasil" etc.
O que pode mudar no cenário político do país?
Se o debate for centrado na administração do capital vai mudar
muito pouco. Podem mudar os comandantes da máquina pública, do
balcão de empregos e interesses. Alguma mudança de estilo. Se as
oligarquias conseguirem "americanizar" as eleições de
2010, ou seja, uma disputa entre a coca-cola e a pepsi-cola, as mudanças
serão menores ainda. No mundo todo, a burguesia força a barra
para estabelecer um bipartidarismo no campo da ordem, para afastar o risco de
uma alternativa de esquerda. O que pode determinar mudanças no Brasil
são fatores externos, como os desdobramentos da crise do capitalismo, a
tendência do imperialismo a potencializar sua agressividade e outros
fatores.
As mudanças serão pequenas até porque Lula, na
questão principal (a política econômica) manteve a
orientação do governo FHC. E este modelo não estará
em debate. O que estará em debate é a forma de
administrá-lo. Além do mais, as diferenças entre Lula e
Alckmin eram mais notáveis e significativas do que aquelas entre Dilma e
Serra.
O que pode provocar alguma mudança, na realidade, é o fato de
Lula não ser o Presidente a partir de 2011. Ninguém, como ele,
tem a capacidade de fazer a conciliação entre o capital e o
trabalho. Nada melhor do que um ex-operário formado no sindicalismo de
resultados para fazer um governo em que o capital aumente sua parcela no PIB em
relação ao trabalho e este interprete isso como um mal
necessário, para manter empregos, mesmo que a cada dia mais
precarizados. Para a burguesia que pensa, que não é troglodita, o
melhor cenário seria um terceiro mandato para Lula.
O que deve ser defendido pelas esquerdas?
Primeiro, temos que precisar o que significa esquerda hoje, nesta
diluição ideológica e nesta manipulação de
conceitos. Até o PPS (aliado do DEM e do PSDB) se considera "de
esquerda". Os socialdemocratas e social-liberais que apóiam
incondicional e sistematicamente o governo Lula se consideram "de
esquerda". Aliás, no Brasil, ninguém assume que é
"de direita".
Vou falar, portanto, do que considero como esquerda, um campo político
que, à falta de definição melhor, posso chamar de esquerda
revolucionária ou esquerda socialista, ou seja, aquela que não
quer reformar o capitalismo, mas superá-lo.
Portanto, penso que a verdadeira esquerda no Brasil deve envidar
esforços no sentido de criar uma frente, de caráter
anti-capitalista e anti-imperialista, permanente, para além das
eleições, voltada para a luta de massas. Não pode ser
apenas uma coligação eleitoral, como foi a chamada frente de
esquerda em 2006, que se dissolveu antes mesmo da realização do
primeiro turno; e que não tinha programa, mas apenas candidatos.
Esta frente deve incorporar, além dos partidos políticos
registrados no TSE, todas as organizações políticas,
político-socias e movimentos populares que se coloquem no campo da
superação do capitalismo, na perspectiva do socialismo. O
programa desta frente deve ser conformado não pelas cúpulas das
organizações que a compõem, mas a partir de um amplo
debate a partir das bases.
O que pode significar avanço ou retrocesso para o processo de
redemocratização do país?
O problema hoje no Brasil não é o risco de um golpe militar
clássico ou de novo tipo, como o que se deu na Venezuela, em 2002, como
tentativa, e agora em Honduras, como realidade. Os maiores riscos de
retrocessos políticos são a criminalização dos
movimentos sociais e da pobreza, as restrições ao direito de
greve, as limitações aos partidos políticos de esquerda,
através de cláusulas de barreira etc.
Os riscos maiores de retrocesso na questão democrática são
principalmente os de âmbito mundial. Com a crise do capitalismo e a
acirrada disputa por recursos naturais não renováveis, o mundo
corre riscos de guerras e conflitos de todo o tipo, com o recrudescimento da
agressividade do imperialismo.
Como os movimentos sociais podem interferir nesse processo?
Os movimentos sociais têm um papel fundamental a desempenhar no processo
de mudanças sociais, desde que não se limitem à esfera de
sua atuação específica, à parcialidade da luta. O
MST é um excelente exemplo de um movimento social, a meu ver o mais
importante do Brasil, que soube compreender isso. Hoje, o MST não
é apenas um movimento social, mas incide na questão
política, como a luta em defesa da Petrobrás e até na
solidariedade internacional.
Por isso, temos defendido que os movimentos populares participem da frente
anti-capitalista e anti-imperialista, no mesmo espaço com
organizações políticas.
[*]
Secretário-geral do PCB.
O original encontra-se em
e em
Caros Amigos
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/
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